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domingo, 15 de junho de 2025

Asas da Poesia * 38 *

 


Trova de
ARTHUR THOMAZ
Campinas/SP

O profeta idealiza
o futuro, em previsões…
E o poeta o finaliza
colorindo-o de ilusões…
= = = = = =

Poema de 
APARECIDO RAIMUNDO DE SOUZA
Vila Velha/ES

Visível

Choro lágrimas de saudade...
não há lenço que resista
a minha necessidade
de mantê-lo no bolso,
seco e limpo... limpo e seco... 

A todo instante
aumenta a ausência de você...
e todo mundo percebe
Somente você não vê,
A dor imensa que sinto.
= = = = = = 

Trova de
LEÔNCIO CORREIA
Paranaguá/PR

Se o beijo guarda o perfume
de estranha, esquisita flor
é porque o beijo resume
a vida e a glória do amor.
= = = = = = 

Soneto de
VICENTE DE CARVALHO
Santos/SP (1866 – 1924)

Velho tema (II)

Eu cantarei de amor tão fortemente
Com tal celeuma e com tamanhos brados
Que afinal teus ouvidos, dominados,
Hão de à força escutar quanto eu sustente.

Quero que meu amor se te apresente
— Não andrajoso e mendigando agrados,
Mas tal como é: — risonho e sem cuidados,
Muito de altivo, um tanto de insolente.

Nem ele mais a desejar se atreve
Do que merece: eu te amo, e o meu desejo
Apenas cobra um bem que se me deve.

Clamo, e não gemo; avanço, e não rastejo;
E vou de olhos enxutos e alma leve
À galharda conquista do teu beijo.
= = = = = = 

Trova de
APARÍCIO FERNANDES
Acari/RN, 1934 – 1996, Rio de Janeiro/RJ

Cartas de amor, esquecidas,
contendo um pouco do Céu!
Dois corações, duas vidas
resumidas num papel!
= = = = = = 

Soneto de
MÁRIO QUINTANA
Alegrete/RS (1906 – 1994) Porto Alegre/RS

A Rua dos Cata-ventos (VI)

Na minha rua há um menininho doente.
Enquanto os outros partem para a escola,
Junto à janela, sonhadoramente,
Ele ouve o sapateiro bater sola.

Ouve também o carpinteiro, em frente,
Que uma canção napolitana engrola.
E pouco a pouco, gradativamente,
O sofrimento que ele tem se evola...

Mas nesta rua há um operário triste:
Não canta nada na manhã sonora
E o menino nem sonha que ele existe.

Ele trabalha silenciosamente...
E está compondo este soneto agora,
Pra alminha boa do menino doente...
= = = = = = = = = 

Trova de
PROFESSOR GARCIA
Caicó/ RN

A terra inteira secou!…
E, a dor me fez sofrer tanto,
que quando a chuva voltou,
tinha secado o meu pranto!
= = = = = = 

Poema de 
CÉLIA EVARISTO
Lisboa/Portugal

Não domino…

Não domino o vento,
os sonhos,
o mar.

Não domino o tempo,
os dias
que teimam em passar.

Não domino a saudade
que, entretanto,
nasceu em mim.

Não domino a liberdade,
sou flor eternamente presa
ao teu jardim.

Não domino o ar que respiro
e as muitas vezes
que por ti suspiro.

Não domino o teu coração,
nem o meu coração domino,
quanto mais.

Porque se o dominasse,
e um dia te chamasse,
não fugirias jamais.
= = = = = = 

Trova de 
WANDA DE PAULA MOURTHÉ
Belo Horizonte/MG

A realidade transponho
e vivo em mundo ideal...
Quero as mentiras do sonho,
não as da vida real!
= = = = = = 

Soneto de 
AMILTON MACIEL MONTEIRO
São José dos Campos/SP

Cor de brasa

Num canto do jardim de minha casa
duas roseiras crescem, majestosas,
com flores rubras, lindas, cor de brasa
e aveludadas pétalas cheirosas.

Quem as plantou, não sei, mas bem me apraza
exaltar o valor das laboriosas
mãos que, com amor e jeito, deram asa
a que vingassem em formas primorosas.

Pois aprecio muito a mão que planta
e só por isso a entendo como santa,
merecedora de me abençoar!

Plantar é um beijo dado à Natureza,
que fica à nossa espera, com certeza,
para o mundo crescer e embelezar!
= = = = = = 

Trova de
ZAÉ JÚNIOR
Botucatu/SP, 1929 – 2020, São Paulo/SP

A cadeira de balanço
balançou toda a família...
meu avô, no sono manso,
meu neto, em louca vigília!
= = = = = =

Hino de
SARAPUÍ/ SP

Sarapuí, Cidade da Paz;
da virtude e do labor,
tens a vida emoldurada na ordem;
no respeito e no humano calor.
Acesa tens a chama da fé,
definindo o teu perfil.
Ao cumprir o teu destino de glória,
avivas o ideal do Brasil.

Assim és Sarapuí,
cortejada pelos tropeiros.
Tornaste povo fecundo e operoso.
Sempre cordial e hospitaleiro.

Tens na flor do algodão,
bela e rica altiva estás.
Verdes prados ondulantes refletem;
seu vasto sentimento de paz.
A interpridez seu filho marcou,
na conquista de um lar feliz,
sua gente exalta e crê na família,
sonhando com o bem do país.
= = = = = = 

Trova Premiada de
RITA MARCIANO MOURÃO 
Ribeirão Preto/ SP

Sem ter fortuna aparente,
sob a luz de um lampião
fui bem mais rica e mais gente
naquela casa de chão.
= = = = = =

Recordando Velhas Canções
INSENSATEZ 
(samba bossa, 1961) 
Tom Jobim e Vinícius de Moraes

A insensatez que você fez
Coração mais sem cuidado
Fez chorar de dor o meu amor
Um amor tão delicado

Ah! Porque você foi fraco assim
Assim tão desalmado
Ah! Meu coração quem nunca amou
Não merece ser amado

Vai meu coração, usa a razão
Usa só sinceridade
Quem semeia vento, diz a razão
Colhe sempre tempestade

Vai meu coração
Pede perdão, perdão apaixonado
Vai porque quem não pede perdão
Não é nunca perdoado
= = = = = =

Trova de
VANDA FAGUNDES QUEIROZ
Curitiba/PR

Onde a sombra cobre e embaça
o sol que anima e clareia,
eu quisera ser quem passa
e reacende a luz alheia.
= = = = = =

Trova de
NEMÉSIO PRATA
Fortaleza/CE

Nos bailes não dava trela,
e a todos dizia não;
mas no fim foi a donzela
quem "dançou": ficou na mão!
= = = = = = = = =   

Poema de
ADÉLIA PRADO
Divinópolis/MG

Para perpétua memória

Depois de morrer, ressuscitou
e me apareceu em sonhos muitas vezes.
A mesma cara sem sombras, os graves da fala
em cantos, as palavras sem pressa,
inalterada, a qualidade do sangue,
inflamável como o dos touros.
Seguia de opa vermelha, em procissão,
uma banda de música e cantava.
Que cantasse, era a natureza do sonho.
Que fosse alto e bonito o canto, era sua matéria.
Aconteciam na praça sol e pombos
de asa branca e marron que debandavam.
Como um traço grafado horizontal,
seu passo marcial atrás da música,
o canto, a opa vermelha, os pombos,
o que entrevi sem erro:
a alegria é tristeza,
é o que mais punge.
= = = = = = = = =   

Epigrama de
LAFAIETE SPÍNOLA CASTRO
Bahia

É um caso de embasbacar,
mas, que faz a gente rir:
O De Nancy – a velar…
E seu talento – a dormir!

(Sobre o literato baiano De Nancy Avelar)
= = = = = = = = =  

Décima de
ADEMAR MACEDO
Santana do Matos/RN, 1951 – 2013, Natal

Perdão na eternidade
 
Para alcançar o perdão
no reino da eternidade,
vão pesar meu coração
na balança da verdade;
pra saber a quantidade
dos meus erros capitais,
entre os pecados mortais
e meus atos de bonança,
quando eu botar na balança
Deus sabe quem pesa mais!…
= = = = = = = = =  

 Sextilha Agalopada, de
THALMA TAVARES
(Vicente Liles de Araújo Pereira)
São Simão/SP

Martins Fontes amou uma roseira
e com ela casar-se pretendeu.
Sofreu tanta ilusão o bom poeta
que as delícias trocou do himeneu
pelo encanto floral da Natureza
e à pureza das rosas se rendeu.
= = = = = = = = =  

Trova de
LUIZ OTÁVIO
(Gilson de Castro)
Rio de Janeiro/RJ, 1916-1977, Santos/SP

Nessas angústias que oprimem,
que trazem o medo e o pranto,
há gritos que nada exprimem,
silêncios que dizem tanto!.. 
= = = = = = = = =  

Poema de
JAQUELINE MACHADO
Cachoeira do Sul/RS

Palavras 

Não pronuncio palavras sombrias 
porque todas elas
já foram lançadas em minha direção. 
São duras feito pedras. 
E como machucam... 
Se fugi de algumas delas? 
Não. 
Acolhi todas. 
E as transformei em bênçãos. 
= = = = = = = = =  

Quadra Popular

Mandei buscar na botica
remédio para uma ausência,
me mandaram a saudade,
coberta de paciência.
= = = = = = = = =  

Trova de
JESSÉ FERNANDES DO NASCIMENTO
Angra dos Reis/RJ

Me esculpindo a cada dia,
vendo no Mestre o padrão,
tento chegar - que utopia! -
mais perto da perfeição.
= = = = = = = = =  

Sextilha de
HÉLIO PEDRO
Caicó/RN

Surge em cada alvorecer,
o sol que cumpre o seu plano
de aquecimento ao planeta
sem que falte ano após ano,
mas no mundo o que mais falta
é o calor do ser humano.
= = = = = = = = =  

Haicai de
ANIBAL BEÇA
Manaus/AM, 1946 – 2009

Morcego em surdina
morde e sopra o velho gato.
Não contava o pulo...
= = = = = = = = =  

Pantun do
PROFESSOR GARCIA
(Francisco Garcia de Araújo)
Caicó/RN

Pantun de elevada prece

TROVA TEMA:
Na aurora de cada dia,
a Deus elevo uma prece;
- Pai, enchei de poesia
nosso povo que padece!
(Joamir Medeiros – RN)

PANTUN:
A Deus elevo uma prece;
ó Pai, salvai por favor,
nosso povo que padece
por falta de pão, de amor,

Ó Pai, salvai por favor,
os excluídos do afeto,
por falta de pão, de amor,
vivem sem lar e sem teto.

Os excluídos do afeto,
não têm voz, nem têm razão,
vivem sem lar e sem teto
ante a cruel exclusão.

Não têm voz, nem têm razão,
por berço, a melancolia,
ante a cruel exclusão
na aurora de cada dia.
= = = = = = = = =  

Trova de
A. A. DE ASSIS
Maringá/PR

Aceitas dar-me os deleites 
da próxima contradança?... 
– Aceito, desde que aceites 
não me apertar contra a pança!
= = = = = = = = =  

Soneto de
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA
São Paulo/SP

Aceitação

É sorrateira… chega de improviso.
Não há ninguém que a queira ou que a cobice!
Tento aceitá-la… sinto que é preciso
pois expulsá-la, eu acho que é tolice.

Não bate à porta… entra sem aviso.
Põe em meu rosto triste, tal meiguice!
E me faz calma… abranda o meu sorriso
 me dá também um “quê” de criancice.

Mas, não vem só… me traz esta saudade
e a nostalgia desta dor que invade
meu coração e nele  se encarcera.

Pondero bem… e ao discutir comigo
refaço sonhos e, feliz, lhe digo
“Entre, velhice… estava à sua espera”
= = = = = = = = =  

Soneto de
EDY SOARES
(Edmardo Lourenço Rodrigues)
Vila Velha/ES

Quando eu partir

Dá-me o teu colo, afagos e aconchego,
conta-me histórias, dá-me o teu abraço,
sê meu parceiro em coisas que hoje eu faço,
demonstra em vida que me tens apego.

Quando eu mais velho reclamar cansaço,
estende o braço e dá-me paz, sossego
e, ao fim da vida apenas desapego,
deixa eu partir, sem muito estardalhaço.

Não me interessa quem me chora a morte,
melhor saber que em vida eu tive a sorte
de não ter tido amigos de mentira!

Quando chegar o dia da partida,
se vou deixar um corpo já sem vida,
pouco me importa quem acenda a pira.
= = = = = = = = =  

Aldravia de
FRANCISCO NUNES
São Caetano do Sul/SP

o
salva-vidas
morreu
afogado
na
tristeza
= = = = = = = = =  

Sextilhas de
FAGUNDES VARELA
Rio Claro/RJ, 1841 – 1875, Niterói/RJ

Amo o cantor solitário
Que chora no campanário
Do mosteiro abandonado,
E a trepadeira espinhosa
Que se abraça caprichosa
À forca do condenado

Amo os noturnos lampírios
Que giram, errantes círios,
Sobre o chão dos cemitérios,
E ao clarão das tredas luzes
Fazem destacar as cruzes
De seu fundo de mistérios

Amo as tímidas aranhas
Que lacerando as entranhas
Fabricam dourados fios
E com seus leves tecidos
Dos tugúrios esquecidos
Cobrem os muros sombrios

Amo a lagarta que dorme,
Nojenta, lânguida, informe,
Por entre as ervas rasteiras
E as rãs que os pauis habitam
E os moluscos que palpitam
Sob as vagas altaneiras

Amo-os, porque todo o mundo
Lhes vota um ódio profundo,
Despreza-os sem compaixão
Porque todos desconhecem
As dores que eles padecem
No meio da criação.
= = = = = = = = =  

Trova de
LUCÍLIA A. T. DECARLI
Bandeirantes/PR

A felicidade é rara
e bem poucos a conhecem…
Os que a viram “cara a cara”,
nunca mais dela se esquecem!
= = = = = = = = =  

Poema de
ADOLFO CASAIS MONTEIRO
(Adolfo Vítor Casais Monteiro)
Porto/Portugal, 1908 – 1972, São Paulo/SP

Aurora

A poesia não é voz - é uma inflexão.
Dizer, diz tudo a prosa. No verso
nada se acrescenta a nada, somente
um jeito impalpável dá figura
ao sonho de cada um, expectativa
das formas por achar. No verso nasce
à palavra uma verdade que não acha
entre os escombros da prosa o seu caminho.
E aos homens um sentido que não há
nos gestos nem nas coisas:
voo sem pássaro dentro.
= = = = = = = = =  

Epigrama de
ROBERTO CORREIA
Salvador/BA, 1876 – 1941

No Brasil, é pragmática,
Das discussões na fervura,
Entrar – no meio – a gramática,
No fim a descompostura.
= = = = = = = = =  

Glosa de
FRANCISCO PESSOA
(Francisco José Pessoa de Andrade Reis)
Fortaleza/CE, 1949 - 2020

Cada passo é mais um sonho 
ao longo do caminhar

Esteja alegre ou tristonho
O poeta enxerga a vida
Tal a terra prometida…
Cada passo é mais um sonho.
Chega ao destino risonho,
Pelo prazer de rimar
E antes mesmo de apear
Em pensamentos, imerso,
Olha pra trás, vê seu verso
Ao longo do caminhar.

Usei todos os atalhos
Que encontrei pelo caminho,
Fiz de quando em quando um ninho,
Fiz de estrelas agasalhos.
Os meus cabelos grisalhos
Tingidos pelo luar,
Retratam bem meu andar…
Embora um tanto tardonho,
Cada passo é mais um sonho
Ao longo do caminhar.
= = = = = = = = =  

Trova de 
NEIDE ROCHA PORTUGAL 
Bandeirantes/PR

Entre o barro e o pó da estrada
das lavouras de onde eu venho,
minha herança, na jornada,
são esses calos que eu tenho!
= = = = = = = = =  

Spina* de
SOLANGE COLOMBARA
São Paulo/SP

Semente

Renasço cada manhã,
ecoando em silêncios
esta intensa sensação

de sentir-se viva, uma ilusão
em que fragmentos da alma
unem-se aos ecos no chão,
germinando de novo a vida...
abraçando a voz do coração.
= = = = = = = = =  

* O Spina é um poema de duas estrofes. A primeira de três versos com três palavras, obrigatoriamente, iniciada por uma acepção trissílaba. A última palavra desta estrofe rimará sempre com a última do terceiro e quinto versos. Cada palavra dos versos está representada pelo sinal diacrítico (til). A segunda estrofe é composta por cinco versos com cinco palavras em cada verso.

Palavras compostas com e sem hífen são censuradas no início do poema. Da mesma forma que a ênclise e a mesóclise.

O último verso da primeira estrofe rimará sempre com o terceiro e quinto verso da segunda estrofe. Além deste esquema rímico obrigatório: ABC//DECFC se admite rimas nos demais versos. No entanto, não se deve mudar o esquema rímico obrigatório.

O título e a métrica são opcionais. Ao optar pela métrica regular, não se deve, jamais, alterar a quantidade de palavras dos versos com o intuito de alcançar a métrica desejada.

As conjunções: mas, e, porém, no entanto, entretanto, pois, todavia, contudo, são todas proibidas. As palavras compostas por hífen são contadas como uma única palavra. As compostas sem hífen são contadas individualmente. A aglutinação de palavras por apóstrofo não as tornam vocábulos únicos. Cada elemento será contado como único.

Utilizar palavras iguais nas rimas quando os seus significados forem diferentes; não são permitidas rimas imperfeitas nas sequências obrigatórias.

As palavras contendo as chamadas consoantes mudas (e sonoras) que tenham três sílabas compostas por consoantes e vogais podem iniciar o SPINA.
= = = = = = = = =  = = = = = = = = =  = = = = 

sexta-feira, 13 de junho de 2025

Asas da Poesia * 37 *

 


Poema de
SAMMIS REACHERS
São Gonçalo/RJ

Lantejoula

A menina, ainda em seus quatorze anos, 
anotava o nome dos que não a notavam. 

Nem era ninguém, mocinha ainda,
e já tecia galáxias em seu coração de fiandeira.
= = = = = = = = =  

Trova de
IZO GOLDMAN
Porto Alegre/ RS, 1932 – 2013, São Paulo/ SP

A grandeza imaginária
que todo vaidoso tem,
é uma estrela solitária
brilhando sobre... ninguém... 
= = = = = =

Soneto de
ANTERO DE QUENTAL
Ponta Delgada/Portugal, 1842 – 1891

Uma Amiga

Aqueles que eu amei, não sei que vento
Os dispersou no mundo, que os não vejo...
Estendo os braços e nas trevas beijo
Visões que a noite evoca o sentimento...

Outros me causam mais cruel tormento
Que a saudade dos mortos... que eu invejo...
Passam por mim... mas como que tem pejo
Da minha soledade e abatimento!

Daquela primavera venturosa
Não resta uma flor só, uma só rosa...
Tudo o vento varreu, queimou o gelo!

Tu só foste fiel - tu, como dantes,
Inda volves teus olhos radiantes...
Para ver o meu mal... e escarnece-o!
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Trova de
NEIDE ROCHA PORTUGAL
Bandeirantes/PR

Tua cantiga de amor
adormece em tempos idos,
mas o vento, a meu favor,
vem soprá-la em meus ouvidos!
= = = = = = 

Poema de
MYRTHES MAZZA MASIERO
São José dos Campos/SP

Duelo íntimo

Esta noite
Fora do meu costume,
Eu me nego a me deitar nessa cama vazia
Enrolada nos restos de tua ausência
Prolongada
E sempre impune...

Esta noite
Prefiro dormir sozinha e encurralada
Neste abandono
Sob a coberta pesada
De minhas emoções extenuadas,
No chão frio do meu sono...

Prefiro qualquer coisa
Que ficar nesta noite sem fim,
A esperar que tua ausência
Tão presente e contínua,
Estenda sobre mim,
Neste corpo sem dono,
Os restos mortais de um amor
Desgastado, esfarrapado
E em ruína!
= = = = = = 

Trova de
ANTONIO MANOEL ABREU SARDENBERG
São Fidélis/RJ

Procura longa e constante,
num sempre querer achar…
Um sonho louco e distante,
impossível de alcançar…
= = = = = = 

Soneto de
EUCLIDES DA CUNHA
Cantagalo/RJ, 1866 – 1909, Rio de Janeiro/RJ

Dedicatória

Se acaso uma alma se fotografasse
de sorte que, nos mesmos negativos,
A mesma luz pusesse em traços vivos
O nosso coração e a nossa face;

E os nossos ideais, e os mais cativos
De nossos sonhos... Se a emoção que nasce
Em nós, também nas chapas se gravasse
Mesmo em ligeiros traços fugitivos;

Amigo! tu terias com certeza
A mais completa e insólita surpresa
Notando - deste grupo bem no meio -

Que o mais belo, o mais forte, o mais ardente
Destes sujeitos é precisamente
O mais triste, o mais pálido, o mais feio.
= = = = = = = = = 

Trova de
PROFESSOR GARCIA
Caicó/RN

A poesia se engalana,
mas só se torna completa,
quando se faz soberana
na voz do próprio poeta!
= = = = = = 

Poema de
CECÍLIA MEIRELES
Rio de Janeiro/RJ, 1901 – 1964

Herança

Eu vim de infinitos caminhos,
e os meus sonhos choveram lúcido pranto
pelo chão.

Quando é que frutifica, nos caminhos infinitos,
essa vida, que era tão viva, tão fecunda,
porque vinha de um coração?

E os que vierem depois, pelos caminhos infinitos,
do pranto que caiu dos meus olhos passados,
que experiência, ou consolo, ou prêmio alcançarão?
= = = = = = 

Trova de 
WANDA DE PAULA MOURTHÉ
Belo Horizonte/MG

Alegrias coleciono
neste meu tardio amor.
É na colheita do outono
que os frutos têm mais sabor.
= = = = = = 

Poema de 
GUILHERME DE ALMEIDA 
Campinas/SP, 1890-1969, São Paulo/SP

Nós, I

O pequenino livro, em que me atrevo
a mudar numa trêmula cantiga
todo o nosso romance, ó minha amiga,
será, mais tarde, nosso eterno enlevo.

Tudo o que fui, tudo o que foste eu devo
dizer-te: e tu consentirás que o diga,
que te relembre a nossa vida antiga,
nos dolorosos versos que te escrevo.

Quando, velhos e tristes, na memória
rebuscarmos a triste e velha história
dos nossos pobres corações defuntos,

que estes versos, nas horas de saudade,
prolonguem numa doce eternidade
os poucos meses que vivemos juntos.
= = = = = = 

Trova de
ZAÉ JÚNIOR
Botucatu/SP, 1929 – 2020, São Paulo/SP

Das estações, a mais triste,
a que mais me causa dor,
é a primavera que existe
num coração já sem flor!
= = = = = = 

Hino de
TUPÃSSI/ PR

Na planície verdejante e ondulada
Na paisagem mais linda que há
Tu nasceste Tupãssi adorada
Filha altiva do gigante Paraná
Na clareira da floresta então aberta
Na marcha rumo à civilização
Implantaram esta cívica oferta
Que será eterna em nosso coração.

Quanto amor na ideal trajetória
Da lavoura eclodindo no chão
A mostrar que o labor traz a vitória
Dos que lutam com fé e união
Terra da mãe de Deus, Tupãssi.
Minha vida e meu bem querer
Outra igual juro que nunca vi
Sou teu filho e por ti vou viver.

Os verdes campos de riquezas colossais
Nos garantem um futuro alvissareiro
Com ajuda de braços leais,
Nós seremos um grande celeiro
Um amanhã radiante este é o tema
Desta terra de paz e esplendor
Pois unidos venceremos, eis o lema.
De um povo capaz e lutador.
= = = = = = 

Trova Premiada de
RITA MARCIANO MOURÃO 
Ribeirão Preto/SP

Tiro a máscara e ouço aflita,
de um mar de farsas sem fim,
meu outro eu que ainda grita
por vida dentro de mim.
= = = = = = 

Poema de
MARTINS FONTES
Santos/SP, 1884 – 1937

O que se Escuta numa Velha Caixa de Música

Nunca roubei um beijo. O beijo dá-se,
ou permuta-se, mas naturalmente.
Em seu sabor seria diferente
se, em vez de ser trocado, se furtasse.

Todo beijo de amor, longo ou fugace,
deve ser u prazer que a ambos contente.
Quando, encantado, o coração consente,
beija-se a boca, não se beija a face.

Não toquemos na flor maravilhosa,
seja qual for a sedução do ensejo,
vendo-a ofertar-se, fácil e formosa.

Como os árabes, loucos de desejo,
amemos a roseira, olhando a rosa,
roubemos a mulher e não o beijo.
= = = = = = = = =  

Trova de
ADOLFO MACEDO
Magé/RJ

Condeno toda arbitragem
que muda as regras da história...
- Vencer no grito é vantagem,
mas sem gosto de vitória.
= = = = = = = = =

Soneto de
CAROLINA RAMOS
Santos/SP

Rosa de sangue

Dom sublime, a Poesia furta ao solo
as almas simples que Deus prestigia.
E transforma um pigmeu num louro Apolo,
glorificado à luz que não pedia!

Poesia é mãe que o filho abraça e ao colo
recolhe a dor que o peito lhe crucia.
Terno traço de união de polo a polo,
é sol na treva... é luar, em pleno dia!

Poesia é amar a própria angústia! É erguer
a taça da amargura e, sem morrer,
sorve-la, gota a gota, em noite incalma!

É estigma? É carisma? Glória ou cruz?
Poesia é estranha rosa, que seduz:
- Rosa de Sangue... com perfume de Alma!
= = = = = = = = =  

Quadra Popular de
AUTOR ANÔNIMO

Lá no céu caiu um cravo
de tão grande desfolhou.
Quem não amou neste mundo
no outro não se salvou.
= = = = = = = = =  

Soneto de
VINICIUS DE MORAES
Rio de Janeiro/RJ, 1913 – 1980

Soneto da desesperança

De não poder viver sua esperança
Transformou-a em estátua e deu-lhe um nicho
Secreto, onde ao sabor do seu capricho
Fugisse a vê-la como uma criança.

Tão cauteloso fez-se em seus cuidados
De não mostrá-la ao mundo, que a queria
Que por zelo demais, ficaram um dia
Irremediavelmente separados.

Mas eram tais os seus ciúmes dela
Tão grande a dor de não poder vivê-la,
Que em desespero, resolveu-se: - Mato-a!

E foi assim que triste como um bicho
Uma noite subiu até o nicho
E abriu o coração diante da estátua.
= = = = = = = = =  

Trova de
HENRIETTE EFFENBERGER
Bragança Paulista/SP

A paz nem sempre é perfeita,
esconde-se em descaminhos,
entre dores, fica à espreita,
como rosa entre os espinhos.
= = = = = = = = =  

Poema de
CASTRO ALVES
Freguesia de Muritiba (hoje, Castro Alves)/BA (1847 – 1871) Salvador/BA

Bárbara

Erguendo o cálix que o Xerez perfuma.
Loura a trança alastrando-lhe os joelhos,
Dentes níveos em lábios tão vermelhos,
Como boiando em purpurina escuma;

Um dorso de Valquíria... alvo de bruma,
Pequenos pés sob infantis artelhos,
Olhos vivos, tão vivos, como espelhos,
Mas como eles também sem chama alguma;

Garganta de um palor alabastrino,
Que harmonias e músicas respira...
No lábio - um beijo... no beijar - um hino;

Harpa eólia a esperar que o vento a fira,
- Um pedaço de mármore divino...
- É o retrato de Bárbara - a Hetaira. 
= = = = = = = = =  

Trova de
JESSÉ NASCIMENTO
Angra dos Reis/RJ

À mesa, família unida;
passou o tempo e, afinal,
cada um no lar, na vida,
vive em mundo digital...
= = = = = = = = =  

Poemeto de
SOLANGE COLOMBARA
São Paulo/SP

As folhagens agitadas
sentem o frescor
do crepúsculo
que vai de encontro
ao horizonte, enquanto
gaivotas repousam
no pôr do sol.
= = = = = = = = =  

Trova de
JOSÉ TAVARES DE LIMA
Juiz de Fora/MG

Ajuda os de mãos vazias,
porque colheita não temos
igual à das alegrias
que vêm do bem que fazemos!…
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Soneto de
FILEMON MARTINS
São Paulo/ SP

Não me esqueço…

Não me esqueço dos versos comoventes
que escrevi com perene inspiração,
quando vivi nos chapadões florentes
da minha terra em meio do Sertão.

Depois, parti... Sofri dores pungentes
numa luta sem fim de solidão.
Desolado, vivi dias ingentes
e se caí, jamais fiquei no chão.

Vejo, porém, que os meus cabelos brancos
são apenas troféu para consolo
de quem viveu aos trancos e barrancos...

Desafiei a vida, estou cansado,
só resta agora um pensamento tolo;
sou poeta, sou livre e aposentado.
= = = = = = = = =  

Trova de
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA
São Paulo/SP

– Depressa!… A bolsa ou a vida.
– Mas, que sufoco, senhor!…
Diz a livreira polida.
– Não sabe o nome do autor?
= = = = = = = = =  

Poema de
CÉLIA EVARISTO
Lisboa/ Portugal

No silêncio de um olhar

É na distância de um primeiro olhar
que se dá o primeiro beijo,
tímido, 
desajeitado,
por vezes estranho
e outras delicado,
deixando um arrepio na pele,
sem que os lábios 
se tenham verdadeiramente tocado.

Palavras ditas no silêncio,
gestos sentidos sem tocar,
um misto de sentimentos
sentidos num simples olhar. 

Sem fronteiras,
outras barreiras,
sem obstáculos a transpor.
Apenas um coração aberto,
tão cheio de amor.

Por mais breve que seja um olhar
poderá prender, 
cativar,
poderá ser, 
estar,
querer,
sonhar.

Olha-me com atenção
e, no pleno silêncio das nossas vozes,
ouve o meu coração.
= = = = = = = = =  

Trova de
SUELY BRAGA
Osório/RS

Muitas rosas só não falam.
      Não nos ferem com espinhos.
      Um doce perfume exalam
      e nos cobrem de carinhos.
= = = = = = = = =  

Poema de
SILMAR BOHRER
Caçador/SC

Oh sorte!

As rimas andam ausentes
nestas primícias de agosto,
estarão - será - descontentes
ou mesmo com algum desgosto ?

Não consigo os mais saborosos
dos meus versos companheiros,
por isso andam desgostosos
aqueles versinhos brejeiros.

Um versejador de pés-quebrados
não pode querer assim tantos
mais do que uns mal rimados,

Mas oh sorte, a Poesia tem benevolência
me borrifando com seus encantos
algum bálsamo pura essência.
= = = = = = = = =  

Poeminha de
A. A. DE ASSIS
Maringá/PR

E agora, vovô?
– Agora,
nas mãos dos netos,
sou que nem ioiô. 
= = = = = = = = =  

Soneto de
JÉRSON BRITO
Porto Velho/ RO

Coração errante
 
Reinado de infinitas amarguras
És tu, meu coração débil, sofrido.
Demais amaste e, não correspondido
Como antes não sorris, não mais fulguras.
 
Lamentas tuas tristes desventuras
No lúgubre jardim já ressequido,
Em vão buscas o aroma outrora haurido,
Nas barras da saudade te enclausuras.
 
Fizeste das lembranças o universo
Repleto de plangência, enfim, perverso
Onde há daquela luz rasto pequeno.
 
Entendo que vagueies sem consolo,
Seria assaz injusto se por tolo
Tivesse quem está de amor tão pleno.
= = = = = = = = =  

Poetrix de
GOULART GOMES
Salvador/BA

Pessoix

um terço de mim delira
um terço de mim pondera
outro terço: ah! quem dera!
= = = = = = = = =

Soneto de
LUIZ POETA
(Luiz Gilberto de Barros)
Rio de Janeiro/RJ

Quem me alimenta

Quando alguém se esvai de  mim, há  alguém que  entra, 
mas minha alma se transforma em gratidão.
Nunca esqueço quem deu, ao meu, coração,
a afeição por cada irmão que nele  adentra.

Quem se alimenta do que eu amo, me alimenta, 
não  violenta meu amor com desesperos; 
o que é  sensível  não carece dos esmeros 
de quem se enfeita com a mais fútil vestimenta.

Coloquial,  o meu amor sempre evita 
erudições, porque a vil demagogia 
é  prima-irmã de qualquer vã diplomacia 

que faz do amor, a indiferença que o  habita
e o transforma num  relógio  emperrado
sobre o silêncio de um balcão... abandonado.
= = = = = = = = =  

Trova de
ANDRÉ RICARDO ROGÉRIO
Arapongas/PR

Quando, então, do céu descer
um brilho no seu olhar,
é porque no entardecer 
meus sonhos vão te buscar.
= = = = = = = = =  

Poema de
J. G. DE ARAÚJO JORGE
Tarauacá/AC (1914 – 1987) Rio de Janeiro/RJ

A luz

Ela veio...( E a minha alma tinha a porta
aberta, e ela entrou...Casa vazia
e estranha, esta que em plena luz do dia
lembrava a tumba de uma noite morta...)

Que ela havia chegado, eu nem sabia...
Mas, pouco a pouco, e a data não importa,
minha alma, por encanto, se conforta,
e há risos pela casa...E há alegria...

Quem abrira as janelas? Quem levara
o fantasma da dor sempre ao meu lado?
Os antigos retratos, quem rasgara?

E acabei por fazer a descoberta:
- ela espantara as sombras do passado
e a luz entrara pela porta aberta!
= = = = = = = = =  

Trova de
ANTONIO JURACI SIQUEIRA
Belém/PA

O homem sofre ante os impulsos
das religiões e das ciências
pois pior que algemar pulsos,
é agrilhoar consciências!...
= = = = = = = = =  

Poema de
ÓGUI LOURENÇO MAURI
Catanduva/SP

A cor dos olhos dela

O matiz dos olhos dela é uma pintura,
Mais parece um manso lago transparente;
Onde o azul das águas traça a formosura,
Misturado ao verde do meio ambiente.
       
Em seus olhos, vejo um lago cristalino,
Sem perder o verde, réplica do céu...
Quando chove, lembra o choro repentino
Da saudade que ela tem de mim, ao léu.
            
Traz, a cor dos olhos dela, tal beleza,
Um requinte de magia sem igual;
Predomina o verde tom da Natureza,
Com o anil do céu a dar toque final.
             
Este lago azul, matiz verde ao redor,
Normalmente calmo, sofre oscilação.
Vem com seus revoltos que já sei de cor,
Presos aos ditames de seu coração.
              
Foi, a cor dos olhos dela, o atrativo
Que me pôs sob os grilhões de seu fascínio...
Que em meu peito fez lugar mais que exclusivo;
Coração meu, à mercê de seu domínio! 
= = = = = = = = =

Trova de
ARTHUR THOMAZ
Campinas/SP

A casinha é sem riqueza,
mas nela a paixão é tanta,
que não floresce a tristeza.
Solidão… a gente espanta!
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Soneto de
EDY SOARES
Vila Velha/ES

Além mar

Há mesmo quem diga que o mar tem mistérios
jamais desvendados por seus navegantes; 
que a Terra, no centro dos seus hemisférios,
além de quaisquer profundezas distantes,

conserva um lugar, o maior dos impérios,
sob a proteção das carrancas gigantes,
que impedem de entrar os krakens deletérios, 
e acolhe em seu seio os marujos errantes...

O certo é que as ondas que espraiam, pacatas, 
irmãs das tormentas que afundam fragatas, 
não trazem notícias do abismo profundo...

E enquanto as procelas sacodem navios
que ainda navegam nos mares bravios
os náufragos dormem no fundo do mundo.
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