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quarta-feira, 17 de setembro de 2025

Célio Simões (O nosso português de cada dia) “Duas caras”


O notável escritor, filósofo, professor, romancista, artista plástico, ensaísta, poeta, político, advogado e imortal da ABL Ariano Suassuna, um dos maiores nomes da literatura brasileira, em uma de suas apresentações, narrou que certa vez uma senhora indiscreta, ao saber que ele era do signo de Gêmeos, teria afirmado que todo “geminiano” possui “DUAS CARAS”. 

Apanhado de surpresa viu-se Suassuna confrontado com a crença que associa as pessoas de Gêmeos com o estereótipo de "duas caras", sinônimo de falsidade. de quem age sem firmeza de propósitos, sempre “acendendo uma vela a Deus e outra ao diabo”. De pronto, respondeu Ariano em tom jocoso:

- E você acha que se eu tivesse duas caras, eu usaria esta?...

A invertida demonstra a agilidade mental, a sagacidade e o bom humor do festejado dramaturgo paraibano, que de forma leve e inteligente, usou a vil acusação para engordar seu vasto repertório de situações cômicas.

Embora “DUAS CARAS” seja geralmente utilizada em sentido pejorativo, não se pode circunscrevê-la aos nascidos sob Gêmeos, signo que felizmente não tem o monopólio de albergar em seus limites cronológicos o tanto de gente falsa que existe em nossa volta, pois eles frequentam com desenvoltura e posando de sinceros, todas as demais faixas imaginárias do Zodíaco.

Atualmente não mais se discute a origem da expressão "DUAS CARAS". Remonta ela à dualidade inerente à natureza humana e ao vezo da manipulação, alcançando quem age com hipocrisia, falsidade e dissimulação, dependendo da situação. A expressão não tem uma origem única e pontual. Sofreu desenvolvimento gradual, encontrando paralelos em metáforas muito antigas, que evidenciam e desnudam a dualidade das pessoas. 

Exemplo mais remoto de “dupla face” foi o de Judas, ao entregar Jesus aos sacerdotes, não em troca de sinecuras, porém movido pela cupidez argentária de receber trinta moedas de prata. Ele era o tesoureiro do grupo e como tal, o responsável por administrar o dinheiro da comunidade de apóstolos, vendo na ignóbil oferta oportunidade imperdível de acumular riqueza pessoal, da qual, por sinal, sequer pode desfrutar, pois esmagado pelo peso do arrependimento resultante de sua vil traição, enforcou-se. 

Séculos depois, Joaquim Silvério dos Reis repetiu nas Alterosas o gesto infame de Iscariotes, ao trair os inconfidentes em troca do perdão de suas elevadas dívidas com a Coroa portuguesa, aliado ao medo de perder sua patente militar de coronel e seu prestigiado status social. Como o apóstolo maldito, agiu por ganância, oportunismo e interesses pessoais, não propriamente por lealdade à Coroa Portuguesa ou convicção política. Estudiosos da ciência jurídica e da História admitem que a atitude do coronel Silvério dos Reis pode ser considerada a primeira "delação premiada" do Brasil, instituto jurídico através do qual o delator é recompensado por revelar o envolvimento de seus pares. 

A colaboração ou delação premiada, pelo qual o investigado em um processo penal recebe benefícios em troca da deduragem. está prevista em diversas leis brasileiras e em qualquer delas, as informações do “colaborador” causam superlativo estrago, tanto que a protagonizada por Silvério dos Reis fulminou a Inconfidência Mineira e motivou o martírio de Tiradentes.

Há hipóteses, entretanto, que dão ensejo a acusações infundadas sobre alguém ter agido com “duas caras”. Como exemplo, vale lembrar o caso do ex-jogador da Ponte Preta de Campinas (SP). Na partida final do Campeonato Paulista do de 1977 disputada com o Corinthians, uma das mais memoráveis da história pois o Coringão buscava encerrar um longo jejum de títulos do campeonato paulista, no terceiro e decisivo jogo, ele foi expulso no início da partida após uma discussão com o árbitro. 

E sem o seu principal artilheiro, a Ponte Preta foi derrotada por 1-0 e o Corinthians finalmente sagrou-se campeão. Por coincidência, no ano seguinte, o jogador foi contratado justamente pelo Corinthians, o que aumentou a desconfiança de que ele teria facilitado a vitória do seu novo clube, o que nunca foi provado, pois o jogador com veemência sempre negou esse fato, no que foi corroborado pelos demais jogadores da Ponte, assim finalmente se livrando de ser rotulado de “duas caras”. 

É inevitável que essa repudiada expressão surja da observação do comportamento de indivíduos insinceros, que agem ao sabor da conveniência ou da situação que lhes parece mais favorável, fazendo jus ao rótulo de "falso" ou "hipócrita". A propósito, o vilão Duas-Caras do Batman, é um indicativo clássico dessa dualidade, com um lado bom e outro mau. Virou ele um dos mais famosos "Duas Caras" da nossa cultura, ajudando a popularizar o termo e consolidar a assertiva de que ter “duas caras" é próprio de alguém desonesto, sem decência e sem integridade moral.

O típico “duas caras”, exibe facetas contraditórias, marcadas pela hipocrisia (ostenta uma imagem, diversa do que é na verdade é), pela duplicidade (tem atitudes diferentes em contextos distintos), são vistos como os “morde-e-assopra” pelo povo, pois dizem uma coisa e fazerem outra, que estão “deste lado” mas também “do outro”, que são moralistas inflexíveis mas topam transigir, tudo, claro, em troca de vantagens, ainda que insignificantes.  

O tema é tão palpitante, que assegurou o êxito da novela “Duas Caras”, da rede Globo, exibida entre 2007 e 2008. Aguinaldo Silva caprichou na trama e alcançou grande invulgar sucesso de audiência abordando a história de um homem que, após roubar a fortuna da esposa, assume nova identidade. O enredo pode ser interpretado de várias maneiras, mas torna-se impossível não associá-lo à falsidade, mudança de comportamento, da ocultação de intenções, para concluir sobre existência de diferentes facetas da personalidade de cada um, dependendo da situação que enfrenta ou pretende enfrentar.

Para a Psicologia, a dupla personalidade pode ser resultado de experiências traumáticas ou mecanismos de defesa. Acredita-se que a pressão social pode levar pessoas a mostrar diferentes "caras", para de algum modo tirar proveito. A Filosofia exorta que a falta de autenticidade pode ser justificada pela dualidade do espírito humano. Entretanto, dúvida não resta que o selo de “duas caras” encerra impressão muito negativa sobre terceiro, associado que está à hipocrisia, à falsidade, à enganação, à dissimulação, ao disfarce e à capacidade de alguém se fazer passar por quem não é. 

Na música, tal a expressão descreve um tipo de personalidade falsa, que assim age para enganar os outros, especialmente em contextos amorosos. Tais composições (existem várias na MPB) são frequentemente cantadas para expor a decepção em um relacionamento, quando uma pessoa descobre, sob o peso da decepção, que a outra não é quem parecia ser, sentindo-se traída em sua confiança. A música "DUAS CARAS" de Paula Mattos, usa essa metáfora para expressar a dor de descobrir a infidelidade do parceiro.

“A minha raiva é não ter
aquela raiva de você
deve ser porque não deu, pra te esquecer.
Sofro sabendo que era só um truque
quando beijava tirando o look.
Dói saber que existem duas de você
uma é o meu amor a outra é meu desprazer.
Quem é você?
Quem tá aqui na minha frente
a verdadeira ou a que mente?
Quem é você?
Que dá o céu e tira o chão
a verdadeira ou a que mente
a top 1 na ilusão
e o pior de tudo ainda amo essa decepção
você é duas caras zero coração”

A paulistana Edna Frigato, famosa por seus poemas que exploram a profundidade das emoções humanas e a importância da autenticidade, sintetizou de forma magistral o que se deve pensar sobre esse tipo de gente: “O problema de conviver com pessoas de duas caras é que a gente nunca sabe a qual delas nos dirigir, já que as duas são falsas”. 

Excelente reflexão, diga-se de passagem, para encerrar esta crônica, pois dificilmente poderíamos conceituar de modo mais exato esse abominável desvio de personalidade, como fez numa única e antológica frase, essa carismática pensadora e poetisa brasileira.
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CÉLIO SIMÕES DE SOUZA é paraense, advogado, pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho, escritor, professor, palestrante, poeta e memorialista. É membro da Academia Paraense de Letras, membro e ex-presidente da Academia Paraense de Letras Jurídicas, fundador e ex-vice-presidente da Academia Paraense de Jornalismo, fundador e ex-presidente da Academia Artística e Literária de Óbidos, membro da Academia Paraense Literária Interiorana e da Confraria Brasileira de Letras em Maringá (PR). Foi juiz do TRE-PA, é sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, sócio correspondente do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, fundador e membro da União dos Juristas Católicos de Belém e membro titular do Instituto dos Advogados do Pará. Tem seis livros publicados e recebeu três prêmios literários.

Fontes:
Texto enviado pelo autor. 
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing  

sexta-feira, 12 de setembro de 2025

Dicas de Escrita (Como Escrever o Resumo de um Livro)

coescrito por Annaliese Dunne* no Wikihow


Escrever o resumo de um livro ajuda qualquer um a absorver o que está lendo, bem como facilita a consulta a referências — para o caso de você precisar se lembrar dos pontos principais da obra, por exemplo. Para isso, leia o livro com atenção e faça anotações sobre ideias, trechos e personagens importantes. Depois, use-as para redigir e revisar o trabalho final!

Método 1: Fazendo anotações

1 Faça anotações enquanto lê. 

Use um caderno quando for avançar na leitura para escrever seus pensamentos. Assim, você vai conseguir registrar tudo de forma correta, facilitando o trabalho nos passos seguintes.

Se possível, anote as informações em vários pedaços de papel. Você pode usar um para as impressões gerais e suas ideias básicas, outro para listar os personagens e eventos, outro para falar dos temas principais da obra etc.

Você também pode listar as palavras que não conhece para pesquisar. Encontre seus significados em um dicionário e, em seguida, anote suas definições.

Não sublinhe nem marque o livro: além de permanentes, essas marcas não vão servir muito para a sua memorização.

2 Monte uma lista dos personagens principais.

Escreva o nome e uma breve descrição das personalidades ou características principais dessas pessoas. 

Inclua uma ou duas linhas para falar dos desejos e objetivos de cada uma. Depois, use as anotações para pensar em como os personagens ilustram os temas centrais do livro.

Você também pode criar uma linha do tempo dos principais eventos do livro, ainda mais se a cronologia for complicada ou confusa. Faça várias delas se a história der saltos entre o passado e o presente.

3 Divida o livro em seções.

Pense, por exemplo, em três partes — começo, meio e fim — para não ficar sobrecarregado. Depois, organize suas anotações de acordo com elas.

No começo, apresente os personagens principais e o cerne da história.

No meio, explore o principal "problema" do livro, seja a batalha entre o bem e o mal ou até um assassinato misterioso.

No fim, resolva o problema principal do livro.

4 Identifique o ponto principal de cada seção.

Pense no que o autor explora em cada parte, bem como na relação que elas têm entre si.

5 Determine a ideia principal do livro.

Conforme avança na leitura, pense em que lição a obra quer ensinar e nos temas que são recorrentes: algo de que os personagens falem, um defeito das pessoas que cause problema atrás de problema etc.

Por exemplo: talvez o autor queira mostrar aos leitores que o orgulho faz as pessoas tomarem decisões ruins. Para demonstrar isso, os personagens principais vivem se metendo em situações inusitadas porque são orgulhosos e arrogantes.

Se estiver lendo uma obra de não ficção, a ideia principal pode ter algo a ver com a história ou a sociedade. Talvez o autor queira mostrar aos leitores que comer fast food é nocivo — e, para isso, traga vários exemplos que comprovem suas afirmações.

Método 2: Montando e editando o resumo

1 Descubra se há alguma orientação quanto ao tamanho do resumo.

Se o texto for parte de um trabalho de escola ou faculdade, você provavelmente vai ter que respeitar algum limite de palavras ou linhas. Aproxime-se ao máximo desse número: se for curto demais, vai parecer que não leu o livro; se for muito longo, vai ser muito prolixo.

Por exemplo: se o limite for de 200 palavras, escreva entre 190 e 200.

Mesmo que esteja escrevendo o resumo por conta própria, tente deixá-lo curto, com cerca de 500 palavras, para que ele seja uma ferramenta de consulta acessível.

2 Descreva os pontos centrais e os personagens principais da história.

Comece apresentando o título e o autor do livro e, depois, dizendo o que acontece na obra — tudo em poucas frases, como uma introdução breve.

Por exemplo: "A obra Harry Potter e a Pedra Filosofal, de J.K. Rowling, conta a história de um menino órfão que descobre que é um bruxo. Ele descobre também que existe um mundo fantástico, repleto de bruxos e bruxas do bem e do mal, durante seu primeiro ano na escola de magia de Hogwarts".

3 Explique os pontos principais das seções do livro.

Use suas anotações para resumir o desenrolar da história. Dedique algumas frases a explicar o que acontece em cada seção, como os eventos se sucedem, e por que esse trecho é importante no enredo como um todo.

Essa parte do resumo pode ficar assim: "A primeira parte do livro apresenta o mundo dos bruxos. O leitor vivencia essa experiência com o próprio Harry, que também é lançado naquele mundo novo. Conforme a história progride, fica claro que há algo de ruim acontecendo em Hogwarts — e Harry e seus amigos, Rony e Hermione, decidem descobrir o que é. O fim da obra traz uma série de testes e provações que o menino precisa superar com a ajuda dos amigos e o amor de sua mãe".

4 Conclua com a ideia central do livro.

Termine o resumo dizendo qual a lição que a obra passa. Consulte suas anotações e lembre-se do que havia pensado antes. Escreva uma última frase bem impactante.

Por exemplo: "J.K. Rowling usou a história para mostrar que até pessoas talentosas precisam de amizade e amor para superar o mal".

5 Não dê sua opinião no resumo.

Ele deve conter uma descrição neutra do livro, focada em fatos. Não escreva sobre o que sente quando lê a obra ou dos pontos em que concorda e discorda do autor.

6 Faça uma revisão gramatical do resumo.

Veja se há erros de ortografia ou gramática. Leia o texto em voz alta para encontrar vírgulas fora de lugar e afins e reconte o número de palavras.

Mesmo que esteja escrevendo o resumo para uso pessoal ou para um clube de leitura, ainda é essencial fazer uma revisão — pois o texto tem que fazer sentido. Leia-o com cuidado para saber se há algo a ser mudado.

7 Mostre o resumo a um colega, ainda mais se tiver que entregá-lo na escola ou faculdade.

Essa é uma ótima ideia, já que a pessoa vai detectar erros que você não veria. Se pedir a um colega de sala, ele também pode lhe entregar o texto que escreveu para que ambos se ajudem!

Método 3: Lendo com atenção e cuidado

1 Vá para um lugar quieto, onde possa ler sem distrações.

Fique longe da TV; ponha o celular no modo silencioso e deixe-o guardado; concentre-se somente no livro e no tempo que vai dedicar à leitura.

Leia perto de uma lâmpada ou janela para não forçar os olhos.

2 Divida a leitura em etapas curtas.

Leia em sessões de 20 minutos para não se cansar. 

Se gosta mesmo do livro, leia por uma ou duas horas de cada vez. Dessa forma, vai processar o enredo com mais calma.

3 Se tiver um prazo, dedique tempo suficiente para a leitura.

Ninguém gosta de ficar a noite toda acordado para ler o livro e escrever o resumo de uma vez. Separe pelo menos duas semanas para obras menores e um mês para as maiores. Leia um pouco todos os dias.

Se tiver que fazer o resumo para um trabalho de escola ou faculdade ou um clube de leitura, comece a ler assim que possível. O professor ou orientador do grupo provavelmente calculou quantas semanas são necessárias para que cada pessoa leia a obra e faça o resumo sem pressa.

4 Releia trechos importantes.

É fácil detectá-los: eles acontecem, por exemplo, quando um personagem principal descobre algo significativo ou quando há uma reviravolta surpreendente.

Esses trechos não costumam focar em descrições, e sim em mudanças significativas do enredo: um evento trágico, a resolução de um conflito etc.

5 Preste muita atenção nos personagens principais.

Preste muita atenção nos personagens principais. Os protagonistas são aqueles cujos erros, ações e sentimentos têm a ver com os pontos centrais do livro. Leia com muito cuidado quando eles aparecerem.

6 Não se distraia com os detalhes menores.

Quando estiver escrevendo o resumo, não precisa incluir informações muito específicas sobre personagens, descrições ou partes do enredo que são secundários. Mesmo que ainda tenha que ler esses trechos, não se sinta preso a eles.
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* Annaliese Dunne é Professora de Inglês de Ensino Médio. Com mais de 10 anos de experiência no ramo, é experiente no ensino de gramática e de escrita, assim como no de interpretação. É formada em Inglês.

Fontes:
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing 

sábado, 6 de setembro de 2025

Célio Simões (O nosso português de cada dia) “Meia tigela”

O premiado romancista e acadêmico Ademar Amaral, comentando em rede social mais uma sandice do títere venezuelano em fim de carreira, que da toca onde está homiziado propôs ao Brasil o envio de uma brigada de mil homens e mulheres do meio rural, sabidamente carentes de qualquer treinamento militar, visando com esse imaginário reforço de infantaria mambembe se defender de eventual confronto com as forças navais americanas, foi cáustico e direto: 
- “Pobre de nós se entrarmos na lorota desse ditador de meia tigela”. 

Ao assim se manifestar, esse grande escritor paraense colocou na expressão “MEIA TIGELA”, toda a repulsa que a bravata lhe causou, enfatizando ainda mais o sentido degradante que ela tem, geralmente dirigida a alguém despido de competência, lucidez, conhecimento ou habilidade naquilo que faz. Muito usada nos dias de hoje, essa designação aviltante surgiu em Portugal na Idade Média. E durante todo o período feudal ganhou força de gíria, de lá chegando ao Brasil com a mesma conotação depreciativa com que foi concebida.

No feudalismo, o bem mais precioso dos suseranos era a terra, que lhes assegurava produção farta e prosperidade, passaporte para o enriquecimento gerado pelo controle do comércio, donde vinha a influência, o mando político, os privilégios e o poder sem contestações em determinada região. Para impulsionar a produção em seus domínios territoriais, possuía a nobreza uma legião de servos incumbidos da atividade agrícola, exaustivo trabalho pago com alimentos, sempre servidos em rústicas e primitivas tigelas.

Havia absoluta necessidade dessa mão de obra gratuita e os servos que se destacavam pela maior produtividade, recebiam suas refeições em tigelas transbordantes de comida, ao contrário daqueles que não cumpriam as metas ditadas pelo patronato, no plantio ou na colheita, punidos com o recebimento de apenas metade da porção dos primeiros, minguada meia tigela de comida e designados pejorativamente como “trabalhadores de meia tigela”. 

Como na Europa, os negros que à força labutavam nas minas de ouro do Brasil Império, na sombria época da escravidão, nem sempre conseguiam alcançar as “metas” que lhes eram impiedosamente impostas. Quando isso acontecia, o que não era raro pela exaustão física e a subnutrição, como reprimenda recebiam apenas metade da tigela de comida e o injurioso epíteto de “meia tigela”, para que todos vissem o infeliz como uma pessoa despida de valor.

Chamar um profissional "meia tigela", longe de ser inconsequente brincadeira, tem sentido deveras ofensivo, porquanto alude a alguém com reputação de medíocre, desqualificado, sem versatilidade no que faz ou se propõe a fazer. E a expressão alcança com a mesma e deletéria intensidade o trabalhador intelectual, técnico ou manual, de vez que o alvo é sempre a pessoa e não o trabalho por ela realizado.

Engenheiros cometem erros graves nos cálculos de uma edificação, onde a falha no dimensionamento da estrutura, resulta na queda do prédio. Médicos se equivocam em cirurgias, como no caso de São Paulo em 2022, onde um cirurgião plástico foi denunciado por 20 pacientes cujos corpos restaram deformados após os procedimentos realizados, desaguando numa enxurrada de denúncias ao CRM/SP e em ações indenizatórias na justiça. Advogados sem preparo e juízes mal preparados desconhecem, vulgarizam ou afrontam o direito das partes. Odontólogos desatentos removem dentes saudáveis de seus aflitos clientes. Professores se perdem em proselitismo político e nada ensinam. Jornalistas deturpam notícias para atender interesses insondáveis, enfim, esta ligeira amostragem inclui o inconsequente comandante italiano que abandonou o “Costa Concórdia”, logo depois que o navio de cruzeiro se chocou com um rochedo e afundou matando 32 pessoas, em janeiro de 2012, todos se igualam como profissionais de “meia tigela”, sem competência em seu ofício, de conceito claudicante, por fazerem tudo muito mal feito. Chamado à atenção pela pintura desastrosa feita num apartamento de luxo, o mela-mão “meia tigela” ainda se saiu com esta:

- É patrão, eu ainda sei fazer pior...

Alguns relatos sugerem que a expressão também era usada antigamente para designar pessoas de baixa posição social, os que não tinham o privilégio de quebrar a tigela em certos rituais familiares, como era comum entre a nobreza da Idade Média. Em qualquer hipótese, a expressão sempre será considerada depreciativa, por isso deve ser evitada em tratamentos mais formais ou em conversas com pessoas sensíveis a alusões discriminatórias. 

Na literatura, o cearense Alves de Aquino, editor da revista Mutirão, que incentiva meritoriamente os novos autores do Ceará, se autointitula o “Poeta de Meia-Tigela”, embora não o seja, pois já publicou obras como  o “Memorial Bárbara de Alencar & outros poemas” (ano 2008) e lançou o livro “Concerto N. 1 Nico em Mim Maior para Palavra e Orquestra - Realidade de Combinações Puramente Imaginárias” (em 2010), nome respeitado das letras cearenses, que se empenha em romper com o lugar-comum em sua poética. 

Na musica popular brasileira, a dupla “Cacique e Pajé” lançou “PESCADOR MEIA TIGELA”, tirando sarro com a classe dos que buscam nas águas, por diletantismo ou profissão, o prazer da pesca ou o sustento da família:

“Pescador MEIA TIGELA gosta muito de pescar
Leva caixa de cerveja mantimentos no picuá
Leva barraca de luxo, leva até a sacaria
Pra trazer peixe pra casa ele sonha com esse dia.

Cadê o peixe pescador MEIA TIGELA?
Pra você não passar fome come pão com mortadela...”

Sequer escapou do injurioso conceito o escrete canarinho. Sob o título de “Seleção Meia Tigela”, o jornalista Leal Júnior, colunista do Portal LJ de Miracema do Tocantins (TO), na edição de 12/10/2024 questionou o pífio futebol da seleção brasileira, que nem de longe lembra a fase gloriosa de craques dignos desse nome que conquistaram cinco títulos mundiais, afirmando sem rodeiros: 

“Ao que parece, não tem jeito; nem mesmo diante do fraquíssimo time chileno (a seleção) conseguiu jogar bem; venceu praticando um futebol decepcionante. Vejo que os brasileiros abandonaram de vez o escrete canarinho, pois, poucas pessoas se arriscam até tarde da noite esperando a bola rolar, e mesmo assim passam o jogo cochilando ou só acordam no outro dia. Infelizmente hoje a realidade é essa! (...). Vamos ficando mesmo com nosso futebolzinho feijão com arroz das séries A e B do brasileirão. Pelo menos vai entretendo! É o que eu penso!!!”

Se bem analisado, dizemos agora nós, é o que a maioria pensa também...
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Célio Simões de Souza é paraense, advogado, pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho, escritor, professor, palestrante, poeta e memorialista. Membro da Academia Paraense de Letras, membro e ex-presidente da Academia Paraense de Letras Jurídicas, fundador e ex-vice-presidente da Academia Paraense de Jornalismo, fundador e ex-presidente da Academia Artística e Literária de Óbidos, membro da Academia Paraense Literária Interiorana e da Confraria Brasileira de Letras, em Maringá (PR). Foi juiz do TRE-PA, é sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, sócio correspondente do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, fundador e membro da União dos Juristas Católicos de Belém e membro titular do Instituto dos Advogados do Pará. Tem seis livros publicados e recebeu três prêmios literários.

Fonte:
Enviado pelo autor
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing  

sábado, 30 de agosto de 2025

Dicas de Escrita (Como Criar um Bom título de Livro) – 2, final

texto de Alicia Cook*
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INSPIRANDO-SE EM OUTRAS FONTES

1
Pesquise. 

Anote os elementos fundamentais da sua história, principalmente objetos e locais. Pesquise sobre eles e procure por uma inspiração para criar seu título.

Por exemplo, se o enredo é centrado em uma esmeralda que é passada através de gerações de uma mesma família, você pode pesquisar sobre elas e irá descobrir que são associadas com fé e esperança para criar um título para o livro (como "A Pedra da Esperança", por exemplo).

2
Dê uma olhada em suas próprias estantes de livros. 

Inspire-se vendo os títulos dos livros que possui, anotando os que mais chamarem sua atenção.
Anote tanto os títulos que chamarem sua atenção agora, durante sua pesquisa, quanto os que você já conhecia anteriormente.

Analise sua lista e tente determinar o que os títulos de sucesso possuem em comum. Por exemplo, eles apelam para os sentidos das pessoas, a imaginação delas, suas curiosidades, etc?

3
Use uma alusão. 

Uma alusão é uma referência ou uma frase retirada de um contexto externo, como outra obra literária, uma música ou até algo comum, como um slogan ou o nome de uma marca.

Muitos autores já se inspiraram em obras clássicas, como William Faulkner, cuja obra Sound and the Fury (O Som e a Fúria) é inspirada no solilóquio de Macbeth, e John Steinbeck, que se inspirou na canção patriótica americana "The Battle Hymn of the Republic" para dar o título Grapes of Wrath (As Vinhas da Ira) a seu livro.

Outros escritores já se utilizaram de provérbios vernáculos, como Anthony Burgess, que definiu o título de seu livro como A Clockwork Orange (Laranja Mecânica) inspirando-se no provérbio Cockney “queer as a clockwork orange” (tão estranho quanto uma laranja mecânica).

Muitos outros também já se inspiraram na cultura popular, como Kurt Vonnegut, que usou o slogan da marca Wheaties para o livro Breakfast of Champions (Café da Manhã dos Campeões).

EVITANDO ERROS COMUNS

1
Crie um título que se relacione com o tipo de seu livro. 

Se você escolher um título que parece ser de outro gênero e não do conteúdo de sua obra, os leitores ficarão confusos e alienados.

Por exemplo, se o título do romance dá a entender que é uma obra de fantasia (Os Dragões da Velha Torre, por exemplo), mas o enredo é sobre ataques terroristas nos Estados Unidos, você vai alienar as pessoas que comprarem o livro procurando por uma história de fantasia, enquanto os que gostam de temas de guerra e terrorismo nunca irão adquirir esta obra, pois não farão ideia de que o livro, com este título, aborda o assunto.

2
Limite a extensão. 

Na maioria dos casos, títulos breves e impactantes fazem muito mais sucesso que os longos e difíceis de serem lembrados.

Por exemplo, o título “Um Homem e sua Aventura Solitária ao Escalar o Perigoso Monte Himalaia" é menos atraente aos leitores que "Desbravando a Montanha Mortal", mais curto e mais imaginativo.

3
Torne-o interessante. 

Títulos que usam linguagem poética, imagens vívidas ou um pouco de mistério tendem a ser mais atraentes a leitores em potencial.

Linguagem poética num título, como “A Rose for Emily” (Uma Rosa para Emily) ou Gone with the Wind (E o Vento Levou) irá atrair leitores com um jogo de frases elegante, que promete uma história ou estilo de escrita igualmente poéticos.

Títulos que evocam imagens vívidas agradam leitores, pois invocam coisas tangíveis e significativas. Um título como Midnight in the Garden of Good and Evil (Meia-Noite no Jardim do Bem e do Mal), apesar de longo, cria imediatamente uma ideia e uma imagem vívida da batalha entre o bem e o mal.

Dar um toque de mistério ao título também irá atrair leitores. Something Wicked This Way Comes (obra de Ray Bradbury, que também faz alusão a Macbeth, lançada no Brasil como "No Templo das Tentações", mas se traduzida ao pé da letra pode ser interpretada como "Algo Perverso Está Vindo") ou “The Black Cat” (O Gato Preto) são títulos que dão informações suficientes para levantar perguntas que irão atrair o leitor a continuar lendo.

4
Use aliterações com muita moderação. 

Apesar da aliteração — que consiste na repetição de sons sucessivos no começo de palavras — poder realmente chamar a atenção ou deixar um título muito mais memorável, é um recurso que também deixará o título sem graça e medíocre se não for feito corretamente.

Aliterações sutis, como I Capture the Castle (Castelo dos Sonhos, no Brasil, mas pode ser traduzido como "Eu Capturo o Castelo") ou The Count of Monte Cristo (O Conde de Monte Cristo), poderão deixar os títulos mais atrativos.

Aliterações forçadas ou óbvias, por outro lado, podem rapidamente desestimular um leitor a ler sua obra ("A Aventura Amedrontadora de Amélia Amendola" ou "O Guia Gourmet do Grande Guilherme").

DICAS

Se um título parecer familiar demais a você, provavelmente ele já foi usado — usado em excesso, até — e deve ser evitado.

Caso não consiga criar o título de jeito nenhum, tente fazer "brainstorm": escreva livremente, faça listas ou crie um agrupamento das ideias que permeiam seu texto; o que melhor funcionar para você.

O título deve ser bem simples e não longo demais.
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* Alicia Cook é uma Escritora Profissional que mora em Newark, New Jersey. Com mais de 12 anos de experiência, Alicia é especialista em poesia e usa sua plataforma para defender famílias afetadas por vícios e para combater os preconceitos relacionados a doenças mentais e a vícios. É formada em Inglês e Jornalismo pela Georgian Court University e possui MBA pela Saint Peter's University. Alicia é poeta bestseller pela Andrews McMeel Publishing e seu trabalho já foi destacado por inúmeras plataformas midiáticas, como NY Post, CNN, USA Today, Huffington Post, LA Tims, American Songwriter Magazine e pela Bustle. Foi apontada pela Teen Vogue como uma das 10 poetas de redes sociais a serem seguidas. Sua mixtape com poemas, "Stuff I've Been Feeling Lately" foi finalista no Goodreads Choice Awards de 2016.
Fontes:
https://pt.wikihow.com/Criar-um-Bom-T%C3%ADtulo-de-Livro
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing

sexta-feira, 29 de agosto de 2025

Dicas de Escrita (Como Criar um Bom título de Livro) – 1

texto de Alicia Cook*
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O título pode parecer algo sem importância, mas ele possui um impacto significativo em como sua história é interpretada. Muitas vezes, ele irá determinar se alguém irá ler ou ignorar o que você escreveu. Felizmente (ou infelizmente), geralmente é o título que atrai as pessoas, independentemente da quantidade de tempo e do esforço feito para escrever a história. Logo, apesar de ser tentador dar um título qualquer ao seu livro, não faça isto!

INSPIRANDO-SE COM SUA HISTÓRIA

1
Obtenha inspiração através de um tema chave do enredo. 

Um título de sucesso deve se adaptar à história de maneira adequada mas evocativa.

Pense no tema principal de sua história: é a vingança? Alienação? Tristeza? Ao determiná-lo pense em títulos que representem tal tema. Se, por exemplo, for redenção, um bom título pode ser “A Reconquista”

2
Dê o título baseando-se em um local importante de sua história. 

Se uma cidade, vila, floresta ou qualquer outro lugar é de fundamental importância em seu enredo, use o nome dele como título.

Por exemplo, se o ponto crucial de sua história acontecer em uma cidade chamada Santa Cecília, adote o nome dela como título do livro ou, se preferir, inspire-se em eventos que lá acontecem durante o desenvolvimento da narrativa, intitulando a obra como "Os Alienígenas de Santa Cecília" ou "As Cinzas de Santa Cecília”.

3
Escolha um título inspirado por um acontecimento decisivo da história. 

Se houver um evento em particular que influencia todos os personagens ou dá uma guinada no enredo e modifica os eventos subsequentes, utilize-o como inspiração para seu título.
Por exemplo, pense em algo como "Morte Entre Ladrões" ou "Tragédia Noturna".

4
Baseie o título em seu personagem principal. 

Dar o nome de um importante personagem da história ao livro pode fornecer uma simplicidade atraente ao título. No entanto, o nome de tal personagem deve ser notável ou memorável.

Muitos autores conhecidos escolheram dar o nome de seus personagens às suas obras: Charles Dickens, com David Copperfield, Charlotte Bronte, em Jane Eyre, Miguel de Cervantes, em Don Quixote, sem falar em escritores mais contemporâneos, como J.K. Rowling na série "Harry Potter" e Rick Riordan em "Percy Jackson".

5
Crie um nome baseando-se em uma frase memorável da história. 

Se você colocou uma frase original e inteligente em sua narrativa, que captura um tema ou elemento importante da história, utilize ou adapte-a para o título.

Por exemplo, obras como To Kill a Mockingbird (O Sol é Para Todos), They Shoot Horses, Don’t They? (Mas Não se Matam Cavalos?) e Sleepless in Seattle (Sintonia de Amor) possuem seus título baseados em frases que são ditas durante a história.
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continua…
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* Alicia Cook é uma Escritora Profissional que mora em Newark, New Jersey. Com mais de 12 anos de experiência, Alicia é especialista em poesia e usa sua plataforma para defender famílias afetadas por vícios e para combater os preconceitos relacionados a doenças mentais e a vícios. É formada em Inglês e Jornalismo pela Georgian Court University e possui MBA pela Saint Peter's University. Alicia é poeta bestseller pela Andrews McMeel Publishing e seu trabalho já foi destacado por inúmeras plataformas midiáticas, como NY Post, CNN, USA Today, Huffington Post, LA Tims, American Songwriter Magazine e pela Bustle. Foi apontada pela Teen Vogue como uma das 10 poetas de redes sociais a serem seguidas. Sua mixtape com poemas, "Stuff I've Been Feeling Lately" foi finalista no Goodreads Choice Awards de 2016.
Fontes:
https://pt.wikihow.com/Criar-um-Bom-T%C3%ADtulo-de-Livro
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sexta-feira, 22 de agosto de 2025

Dicas de Escrita (Como fazer um Prefácio)

Um prefácio de livro é um texto introdutório que geralmente apresenta o livro ao leitor, contextualizando a obra e, em alguns casos, o autor. Ele serve para criar uma conexão inicial com o leitor, despertar seu interesse e prepará-lo para a leitura. 

Como fazer um prefácio:

1. Decidindo quem escreverá o prefácio:

Pode ser o próprio autor ou outra pessoa, como um colega escritor ou especialista. 

2. Apresente o livro e o autor:

Brevemente, introduza o tema do livro e, se for o caso, o autor, suas motivações e trajetória. 

3. Contextualize a obra:

Explique o contexto em que o livro foi escrito, as razões que levaram o autor a escrever, as fontes utilizadas, as dificuldades enfrentadas, etc. 

4. Crie uma conexão com o leitor:

Utilize uma linguagem envolvente, desperte a curiosidade e mostre o valor da obra para o leitor. 

5. Seja instigante:

Deixe o leitor curioso para saber mais sobre o livro, mas evite spoilers. 

6. Estruture o prefácio: 

Abertura: Comece com uma frase impactante que prenda a atenção do leitor. 

Desenvolvimento: Apresente as informações relevantes sobre o livro e o autor. 

Conclusão: Encerre com uma mensagem que reforce o valor da obra e convide o leitor a continuar a leitura. 

O que incluir no prefácio:

Apresentação do autor:
Se for um autor iniciante, o prefácio pode ser uma oportunidade para apresentar sua trajetória e experiência. 

Motivação para a escrita:
Explique as razões que levaram o autor a escrever o livro. 

Contexto histórico e social:
Dependendo do tema do livro, pode ser útil contextualizar a obra em seu tempo. 

Processo criativo:
Detalhes sobre como o livro foi escrito, as dificuldades enfrentadas e as fontes utilizadas. 

Impacto da obra:
Pode-se mencionar o impacto que o livro pode ter nos leitores ou em determinado público. 

Agradecimentos pelo autor:
É comum que o autor agradeça a pessoas ou instituições que o ajudaram na produção do livro. 

Dicas:

O prefácio não deve ser uma análise crítica da obra. 

Evite revelar detalhes que possam estragar a surpresa do leitor. 

Seja breve e objetivo, um prefácio muito longo pode desmotivar o leitor. 

Se o livro for uma reedição, o prefácio pode explicar as mudanças e novidades da nova versão. 

Se o livro tiver um prólogo, o prefácio pode complementar a introdução, apresentando o autor e o contexto. 

Lembre-se que o prefácio é um espaço para criar uma conexão com o leitor e apresentar a essência da sua obra.

Fontes:
Texto obtido com IA do Google
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quinta-feira, 21 de agosto de 2025

Marcelo Spalding (Os direitos do leitor)

Muito se fala sobre o dever de ler, a importância da leitura. Mas ler não é um dever, ler é um direito de todo cidadão, pois a leitura nos constitui como seres pensantes e nos permite participar da arena das ideias, representada em palavras escritas ou faladas.

O texto que melhor trata do direito da leitura é chamado "Os direitos imprescindíveis do leitor", publicado no livro "Como um romance", de Daniel Penac. Abaixo reproduzo seus 10 tópicos e algumas de suas justificativas.

I | O direito de não ler 

"(...) O dever de educar consiste, no fundo, no ensinar as crianças a ler, iniciando-as na Literatura, fornecendo-lhes meios de julgar livremente se elas sentem ou não a "necessidade de livros". Porque, se podemos admitir que um indivíduo rejeite a leitura, é intolerável que ele seja rejeitado por ela. É uma tristeza imensa, uma solidão dentro da solidão, ser excluído dos livros – inclusive daqueles que não nos interessam." 

II | O direito de pular páginas 

"(...) se não decidem por si mesmos por aquilo que está à disposição, pulando as páginas de sua escolha: outros o farão no lugar deles. Outros se armarão das grandes tesouras da imbecilidade e cortarão tudo que julgarem "difícil" demais para eles. Isso dá resultados assustadores. Moby Dick ou Os miseráveis reduzidos a resumos de 150 páginas, mutilados, estragados, raquíticos, mumificados, reescritos para eles numa linguagem famélica que se supõe ser a deles. Um pouco como se eu me metesse a redesenhar Guernica sob o pretexto de que Picasso tivesse jogado ali traços demais para um olho de doze ou treze anos."

III | O direito de não terminar um livro

"(...) Ao contrário das boas garrafas, os bons livros não envelhecem, somos nós que envelhecemos. E quando nos acreditamos suficientemente "maduros" para lê-los, nós os atacamos mais uma vez. Então, das duas uma: ou o reencontro acontece ou é um novo fiasco. Talvez tentemos de novo, talvez não. Mas o certo é que não é por culpa de Thomas Mann se não pude, até hoje, chegar ao cume de sua Montanha mágica."

IV | O direito de reler

"Reler o que me tinha uma primeira vez rejeitado, reler sem pular, reler sobre um outro ângulo, reler para verificar, sim... nós nos concedemos todos esses direitos. Mas relemos sobretudo gratuitamente, pelo prazer da repetição, a alegria dos reencontros, para pôr à prova a intimidade. (...)"

V | O direito de ler qualquer coisa

"(...) Chegou o momento em que pedimos ao romance uma outra coisa que não seja a satisfação imediata e exclusiva de nossas sensações. Uma das grandes alegrias do "pedagogo" é – toda leitura sendo autorizada – a de ver um aluno bater sozinho à porta da fábrica Best-seller para subir e respirar na casa do amigo Balzac."

VI | O direito ao bovarismo (doença textualmente transmissível)

"(...) Em outros termos, não é porque essa mocinha coleciona Sabrina que ela vai acabar engolindo arsênico numa concha. Forçar a mão nesse estágio de suas leituras é nos separar dela, negando nossa própria adolescência."

VII | O direito de ler em qualquer lugar

VIII | O direito de ler uma frase aqui e outra ali

"Eu colho, nós colhemos, deixemos que eles colham, ao acaso. É a autorização que nos concedemos de pegar qualquer volume de nossa biblioteca, de o abrir em qualquer lugar e de mergulharmos nele por um momento, porque só dispomos, justamente, desse momento. (...) Quando não se tem nem o tempo nem os meios de se oferecer uma semana em Veneza, por que se recusar o direito de passar lá cinco minutos?"

IX | O direito de ler em voz alta

X | O direito de calar

"O homem constrói casas porque está vivo, mas escreve livros porque se sabe mortal. Ele vive em grupo porque é gregário, mas lê porque se sabe só. Esta leitura é para ele uma companhia que não ocupa o lugar de qualquer outra, mas nenhuma outra companhia saberia substituir. (...) Os raros adultos que me deram a ler se retraíram diante da grandeza dos livros e me pouparam de perguntas sobre o que é que eu tinha entendido deles. A esses, claro, eu costumava falar de minhas leituras. Vivos ou mortos, ofereço a eles essas páginas."
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Marcelo Spalding é jornalista, professor, escritor e editor, com 10 livros individuais publicados e mais de 150 livros editados. Professor de oficinas de Escrita Criativa presenciais e online desde 2007, fundou e dirige a Metamorfose Cursos. É pós-doutor em Escrita Criativa pela PUCRS, doutor e mestre em Letras pela UFRGS e formado em Jornalismo e Letras. Ex-professor universitário, atuou como professor de Escrita Criativa e Jornalismo na graduação e no PPG Letras da UniRitter, além de coordenar o Pós-graduação em Produção e Revisão Textual e a Editora UniRitter. É idealizador do Movimento Literatura Digital, editor dos sites minicontos.com.br e escritacriativa.com.br e autor do livro Escrita Criativa para Iniciantes, além de ter criado o primeiro jogo de tabuleiro de Escrita Criativa do Brasil.

Fontes:
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quarta-feira, 20 de agosto de 2025

Célio Simões (O nosso português de cada dia) “Conto do Vigário”

A expressão "Conto do Vigário", da qual deriva uma outra igualmente desabonadora - vigarista - diz respeito a golpe, trambique, artimanha, trapaça ou fraude, onde a vítima é miseravelmente enganada por meio de uma história bem elaborada, fantasiosa, rocambolesca, mas bem bolada e convincente. 

Sua origem remonta às antigas, em que os vigaristas, que não utilizavam violência física, porém a lábia como arma de ataque, se passavam por representantes do vigário ou usavam sem pudor a figura do próprio vigário, para lhes emprestar credibilidade, alicerçando melhor seus golpes. 

Assim, "Conto do Vigário" tem raízes históricas lastreadas em práticas enganosas que se popularizaram em Portugal e no Brasil, aperfeiçoando-se através dos tempos, principalmente na era da internet para aplicação de golpes contra os incautos, agora com a decisiva contribuição da inteligência artificial, que adultera com fidelidade a imagem e a voz das pessoas, para divulgação escancarada de mentiras, engodos, burlas e falsificações. 

Em tempos de crise econômica, com elevado desemprego e redução salarial, fazendo aumentar a angústia coletiva, é até compreensível, embora não aceitável, a proliferação de golpes por pessoas despidas de escrúpulos, que se aproveitem da aflição alheia para faturar alto, seja oferecendo produtos ou serviços prometendo excelentes resultados, com quase nenhum esforço e sem sair de casa, desde que mediante determinado investimento, que sem dúvida vai fazer falta ao infeliz, que piamente acredita no suposto milagre. 

Medicamentos anunciados com alarde, que prometem resolver as dores físicas ou psicológicas dos que padecem, são ofertados todo dia pelo rádio ou TV, com a ressalva de que não podem ser encontradas em farmácias convencionais, para serem adquiridos mediante compra virtual, com pagamento adiantado, de insuscetível devolução ou estorno se o “tratamento” resultar frustrado. Puro golpe, com milhares de vítimas engordando a conta bancária dos espertalhões, refinados profissionais do “Conto do Vigário”. 

Também é comum nas redes sociais conselhos sobre como aplicar melhor o suado dinheiro de cada qual, com golpistas acenando com enriquecimento fácil ou investimentos de alto rendimento, o que acaba em decepção, pois nada de milagroso ou imprevisível acontece no mercado financeiro ou no mercado de ações, atrativos irresistíveis para quem deseja acumular fortuna, levando vida mansa. São “pegadinhas” de vigaristas e o final é bastante conhecido: os “investidores” depenados e o pilantra levando vida de barão. Os idosos, por índole crédulos ou necessitados, são as vítimas prediletas dos escroques.

Uma das versões mais anedóticas da origem dessa expressão, envolve uma acirrada disputa entre duas igrejas - do Pilar e de N. S. da Conceição - por uma bela imagem de Nossa Senhora, onde um dos vigários, como forma de encerrar a contenda, propôs que se amarrasse a dita imagem a um burro para deixá-lo escolher a igreja sem interferência de ninguém. Pactuaram que para onde o animal fosse, a venerada Santa ficaria lá. O tal burro, que desde novo pertencia ao vigário da igreja do Pilar e por isso era apegado ao dono, acabou rumando para aquele templo, garantindo àquela igreja a posse definitiva do ícone religioso, revelando-se a esperteza do sacerdote só muito tempo depois. 

Existe uma outra versão sobre a origem da expressão. No século XIX, várias pessoas se apresentavam como se fossem emissários do vigário, solicitando ajuda financeira para que pudesse ser guardada em segurança, suposta mala recheada de dinheiro. Após acumular os mil-réis alheios com essa conversa mole, o espertalhão sumia com a grana recebida, para repetir o mesmo golpe em outras cidades, onde o povo é receptivo e solidário aos pedidos de ajuda. 

Na música brasileira, o festejado Trio Parada Dura interpreta a música “Conto do Vigário”, composição de José Homero, destacando-se a última estrofe do texto poético, que aborda o tema: 

“Casamento não prende ninguém
não obriga ninguém ser otário
se pra um ele é loteria
para mim foi conto do vigário”

Na literatura, o livro do escritor José Augusto Dias intitulado “Os contos e os Vigários”, trata de episódios sobre o “Conto do Vigário”, abordando uma gama de fatos reais que podem ser analisados. Referido livro contém inúmeras referências de fontes importantes, tentando entender esses laços de sociabilidade - se é que se pode chamar assim - entre o vigarista e sua vítima. 

No trecho a seguir pode-se identificar a reação e o sentimento do otário em relação ao ocorrido, que no papel de vítima, talvez desejasse ser ele mesmo o vigarista, daí sua frustração: 

“Aqueles que são enganados acabam finalmente por adquirir a pungente consciência de que se tornaram vítimas de tramoias bem armadas, mas tão poucos procuram a polícia ou a imprensa para reclamar do fato – com isso interrompendo, como já vimos, os circuitos pelos quais tais acontecimentos poderiam chegar a ser posteriormente conhecidos. há dois motivos básico para isso e um deles é absolutamente banal: a vergonha!”

Isto acontece porque ninguém quer passar por otário. Tal premissa, adaptada, burilada e deturpada pelos vigaristas, tornou-se nacionalmente conhecida como é ainda hoje - "Conto do Vigário" - usado para descrever fraude ou enganação, envolvendo história fantasiosa e persuasiva. Nesse contexto, “vigarista” ou “golpista” dá no mesmo: indica quem se aproveita da confiança e da ingenuidade de outrem para tirar proveito, principalmente financeiro. 

O vigarista é e sempre será um trapaceiro, indivíduo cheio de manhas e astúcias; espertalhão, finório e ladino, trampolineiro contumaz em busca de vantagens. Popularmente virou “trambiqueiro”, porém sua saga estará sempre ligada a golpes e fraudes, praticadas com a torpeza dos que nasceram com esse duvidoso talento. Tenha portanto, muito cuidado com eles ou com elas!...
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Célio Simões de Souza é paraense, advogado, pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho, escritor, professor, palestrante, poeta e memorialista. Membro da Academia Paraense de Letras, membro e ex-presidente da Academia Paraense de Letras Jurídicas, fundador e ex-vice-presidente da Academia Paraense de Jornalismo, fundador e ex-presidente da Academia Artística e Literária de Óbidos, membro da Academia Paraense Literária Interiorana e da Confraria Brasileira de Letras, em Maringá (PR). Foi juiz do TRE-PA, é sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, sócio correspondente do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, fundador e membro da União dos Juristas Católicos de Belém e membro titular do Instituto dos Advogados do Pará. Tem seis livros publicados e recebeu três prêmios literários.
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