domingo, 30 de setembro de 2012

Mário Quintana (Dos Leitores)


Vicência Jaguaribe (Complô no Reino da Fantasia)


Uma palavra para o leitor

Esta história não deve, de maneira alguma, causar-lhe estranheza, leitor, pois o fenômeno não é novo: não é a primeira vez que personagens de ficção saem das páginas dos livros, ganham autonomia e penetram no mundo real. Vou dar só um exemplo: na peça teatral Seis personagens à procura de um autor, do italiano Luigi Pirandello, seis personagens, ao serem rejeitadas por seu criador, entram na vida real e tentam convencer um diretor de teatro a encenar suas histórias.

**********

Conta-se — mas eu não assino embaixo — que, certa vez, viu-se, no castelo do Príncipe Rodolfo, herdeiro do reino da Appelândia, uma movimentação desusada: há três dias, cavalariços sonolentos limpavam as cocheiras e reorganizavam as baias para receber mais animais; fornecedores chegavam a todo momento para abastecer as despensas; criados domésticos limpavam e arejavam os aposentos fechados e com cheiro de mofo, trocando a roupa de cama, acendendo lareiras e enchendo as grandes tinas de banho, com uma água que talvez nem fosse usada — dizia-se, em surdina, que a maioria dos príncipes não gostava de banho —; chefes de cozinha de fama internacional começavam a preparar pratos que, só de olhar, despertavam não apenas a fome, mas a vontade de comer.

Sua Alteza Real receberia em seu castelo os príncipes que tinham suas vidas e aventuras registradas e deturpadas nos tradicionais contos de fada. Ele próprio fora atingido no papel que desempenha no conto “Branca de Neve e os sete anões”. Mas isso vamos deixar para depois.

Tudo pronto, o príncipe Rodolfo vestiu sua roupa principesca, com manto de príncipe, sapato de príncipe, chapéu de príncipe e tudo o mais de príncipe, e esperou. Se alguém duvidava ser ele um príncipe de verdade, a dúvida acabava ali, naquele momento. Ser príncipe estava em seu corpo e em sua alma: no jeito de olhar, de falar, de andar, de dar ordens, de amar e de odiar. Dizem que os príncipes fazem tudo isso diferente de nosotros. Não confirmo nem nego essa afirmação porque nunca em minha vida vi um príncipe de verdade.

Os convidados fizeram-se anunciar um a um para imprimir à entrada mais pompa e circunstância: 

Sua Alteza Real o Príncipe Nicolau, do Reino da Hipnolândia e da história “A Bela Adormecida”;

Sua Alteza Real o Príncipe Alexandre, do Reino da Cindelândia e da história “Cinderela”;

Sua Alteza Real o Príncipe Aníbal, do Reino da Ferolândia e da história “A Bela e a Fera”;

Sua Alteza Real o Príncipe Orlando, do Reino da Ursolândia e da história “Branca de Neve e Rosa Vermelha”;

Sua Alteza Real o Príncipe Alberto, do Reino da Bravolândia e da história “O príncipe que não temia coisa alguma”;

Sua Alteza Real o Príncipe Ambrósio, do Reino da Sapolândia e da história “Rei Sapo ou Henrique de Ferro”.

E foram anunciados outros príncipes de terras longínquas, cujas histórias eram pouco conhecidas. O príncipe Rodolfo encaminhou suas altezas a um grande salão decorado de espelhos e de lustres feitos do cristal mais puro. 

Todos entraram e a porta foi fechada. Aquela era uma reunião cuja pauta devia ficar em completo sigilo. Príncipes de reinos mais pobres olhavam aparvalhados para tanta beleza e luxo. Os do Oriente admiravam-se com a diferença do gosto e da noção de beleza. Os dos países mais próximos observavam tudo com uma pontinha, deste tamainho, de inveja.

Quando todos se acomodaram, o Príncipe Rodolfo, sentado na cabeceira da enorme mesa, abriu a reunião, falando o maravilhês, língua usada por todos os que vivem na dimensão da magia e do maravilhoso.

— Meus amigos, dignos Príncipes dos reinos vizinhos e dos reinos longínquos, vocês devem ter ficado curiosos e também preocupados com o meu convite. Deixem-me dizer-lhes o motivo pelo qual eu, presidente da Associação dos Príncipes dos Contos de Fada — APCF —, convoquei-os para esta reunião: rever a posição e a caracterização dos príncipes nos contos de fadas. Relendo, há pouco tempo, algumas obras famosas, tomei consciência de como somos tratados nas histórias. E não gostei do que descobri.

(Vamos dizer a verdade sobre o despertar da consciência crítica do Príncipe Rodolfo. Não foram os livros que ele diz haver lido, mas algo muito mais sério. Um dia, quando admirava aquela sala e seus lustres, acompanhado do pai, o Rei William, ouviu dele a informação do encantamento que envolvia o aposento: se uma pessoa tivesse certeza do que queria, se estivesse disposta a corrigir os erros de uma situação, ao fixar-se em um dos espelhos teria o senso crítico intensificado. Na primeira oportunidade, o Príncipe voltou ao salão e, ao mirar-se em um dos espelhos, enxergou a própria vida e a de muitos dos seus pares, como elas eram retratadas nas histórias. E não gostou do desvelamento feito pelo seu senso crítico agora aguçado.)

— Nossas vidas são exatamente como vou aqui expor. Digo, sem titubeio, que não temos nenhuma importância, nenhum carisma e, principalmente, não temos caráter ou personalidade.

— Vossa Alteza nos chamou aqui para nos falar de nossos defeitos e fraquezas? — Ouviu-se a vozinha fraca do Príncipe Sapo.

— Não. — Retomou a palavra o Príncipe Rodolfo. — Chamei-os para alertá-los sobre a maneira como os escritores nos apresentam em suas histórias. Eles desvalorizam nossas figuras. Esse é um ponto que atinge todos os príncipes dos contos maravilhosos, que só existem neles e por eles. Nesses contos, não temos nem nomes; somos conhecidos pelo nome da protagonista da história, que geralmente está presente no título da narrativa — o príncipe de “Branca de Neve”; o príncipe de “Rapunzel”, e assim por diante. Cada um de nós é simplesmente o Príncipe, como se não fôssemos indivíduos, mas entidades sociais ou pessoas jurídicas. Você, por exemplo, Príncipe Nicolau, seu nome não aparece uma única vez na história da Bela Adormecida. E, o que é mais, grave: amputaram o seu conto. Ele termina no seu casamento com a princesa ex-adormecida. Nada daquele final macabro, que faz até jacaré chorar.

— É verdade que o cortaram nesse ponto?! E o que fizeram com o restante?

— Ora! Amassaram e jogaram no lixo. Não vê que agora, no mundo do reality show, é proibido contar para as crianças certos detalhes das histórias. Também inventaram um tal de politicamente correto, que está levando os novos escritores a deformar as histórias tradicionais.

— Como pode ser isso? — Perguntou o Príncipe Ambrósio.

— Pode, meu amigo, no mundo do reality show, as coisas mais estapafúrdias acontecem. E tudo é muito contraditório. A minha história foi alterada: inventaram que  Branca de Neve acordou com um beijo meu. Imaginem se eu beijaria uma defunta ou uma quase! Os deuses me protejam! A verdade é que, quando a vi deitada no esquife, bela como eu jamais pensara que uma princesa pudesse ser, apaixonei-me. Tentei comprar o esquife, mas os anões negaram-se a vendê-lo. Quando, porém, entenderam que eu ficara profundamente apaixonado pela garota e ouviram minha declaração de amor — Dai-me, então, como um presente, pois não posso viver sem ver Branca de Neve.  —, tiveram piedade de mim e mandaram-me levar o caixão. Os servos que traziam o esquife para o meu castelo tropeçaram. A urna não caiu, mas balançou muito, o que fez a princesa expelir o pedaço da maçã envenenada preso em sua garganta. Imediatamente após o incidente, pedi a princesa em casamento.

E com sua história — “Rei Sapo ou Henrique de Ferro” —, Príncipe Ambrósio, ainda foi pior. Nem príncipe aparece. Em uma das versões modernas da história, o sapo se transforma, vejam só, em um corretor de imóveis, que planeja construir, na bela floresta do reino da Sapolândia, o que eles chamam de shopping- center. Outro detalhe: até o criado tem nome — Henrique. E Vossa Alteza, nada.

— Mas qual a razão de fazerem isso com a minha história?

— Acho que foi para denunciar a destruição das florestas que está acontecendo por lá, pelo mundo da realidade.

— E o que houve com minha história? — A pergunta vinha do príncipe Alexandre.

— A sua história, Alteza, já é ridícula desde que foi inventada — falou o príncipe Rodolfo, com sua franqueza habitual. Quem já viu um príncipe de sangue real ir de casa em casa com um sapato na mão, procurar a dona desse sapato, que poderia até ser uma plebeia, para com ela se casar! E, ainda por cima, Vossa Alteza prepara a festa, dança com a jovem desconhecida e ninguém sabe, nem a jovem, muito menos o leitor da história, que seu nome é Alexandre.

— Suas palavras me ofendem, príncipe Rodolfo. 

— Desculpe-me. É esta minha boca que insiste em ser sincera, por isso exagera na verdade.

— Desculpas aceitas, Príncipe Rodolfo.

— E sabe, Príncipe Alexandre  —, continuou o Príncipe Rodolfo — que os estudiosos descobriram uma versão da sua história muito mais antiga do que a europeia que conhecemos? E, talvez, bem mais interessante. É chinesa e parece ter sido a primeira versão escrita do conto “Cinderela” ou “Branca de Neve”.

— Interessante, muito interessante! Mas humilhante para este Príncipe aqui, que nem original é. — Choramingou o Príncipe Alexandre.

— Bem — retomou a palavra o Príncipe Rodolfo — para encerrar nossa reunião, um detalhe dos mais graves: todos nós, os príncipes, parecemos, nos contos de fada, uns idiotas. Apaixonamo-nos, à primeira vista, pela primeira jovem bonitinha que aparece e, rápido como a queda de um raio, contratamos casamento. E ainda somos apresentados como uns imbecis e preguiçosos, que levam a vida caçando, passeando e tentando encontrar dragão. Não temos nenhum papel no reino, a não ser procurar uma noiva e defendê-la dos dragões e das maldições das bruxas. Isso me deixa desolado. E tem mais: aquele felizes para sempre já está tão fora de moda! Quem é feliz para sempre, principalmente casando com as princesas mofinas dos contos de fada? Princesas que não fazem nada de proveitoso, não conseguem nem vestir-se sozinhas, passam os dias esperando a chegada de seus falsos heróis. São tão sensíveis, mas tão sensíveis mesmo, que sentem o desconforto causado por uma ervilha colocada sob vários colchões. Me dá vontade de falar como falam os príncipes e os não príncipes do mundo real: Minha amiga, me dá um tempo. Que tal se garantir um pouco e esperar menos?  Afinal de contas, o que as pessoas do mundo do reality show pensam que nós, moradores do mundo paralelo da fantasia, somos, para nos representar assim?

— É, a situação é grave e vergonhosa. O que Vossa Alteza sugere que façamos? — Perguntaram os príncipes ao mesmo tempo.

— Sugiro uma crise de ilustrações. Sem ilustrações, nada de livro para criança. Cada um de nós se encarregará de achar alguém com o poder de fazer desaparecerem todas as ilustrações das histórias que foram alteradas. Vamos marcar outra reunião para de hoje a um mês.

Satisfeitos, Suas Altezas dirigiram-se à sala onde serviriam o almoço, que foi digno dos deuses. Depois do almoço, repousaram uma meia hora e foram à caça. O Príncipe Rodolfo, com seu senso crítico hipertrofiado pela permanência na sala mágica, pensou um pensamento tão estranho quanto polêmico: Será que os contadores de histórias não estão certos na caracterização — ou falta de caracterização — dos príncipes? Parece que somos todos iguais: parasitas em busca de aventuras e de um amor instantâneo, feito leite em pó.

**********

P.S. A partir daquele dia, as editoras que trabalhavam com livros infantis foram processadas e tiveram que pagar boas indenizações aos clientes, por venderem livros cujas ilustrações se apagaram.

Fonte:
A Autora

Antonio Manoel Abreu Sardenberg (Projeto Entre Poetas)



LUZ 
Antonio Manoel Abreu Sardenberg 
São Fidélis "Cidade Poema" 

Como a luz de um sol irradiante 
surgindo na manhã de primavera, 
procuro loucamente a todo instante 
ser também sua luz, doce quimera. 

Envolver o seu corpo com calor, 
fazer do nosso encontro um acalento, 
sonhar que a vida é feita só de amor, 
amar por toda a vida este momento! 

Em seguida, num cálido aconchego, 
sem pudor, e sem medo, e sem juízo, 
trançar os nossos corpos num apego, 
fingir que o nosso mundo é paraíso! 

Comer com gosto todas as maçãs, 
ignorando que o fruto é proibido... 
deixar que o despertar do amanhã 
desfaça esse sonho concebido! (sem pecado) 

ÂNSIA DE VIVER
Simone Borba Pinheiro

Meu tempo, não tem tempo
de esperar por ti.
Por ti que, só enganos, somou
aos meus desenganos.

A noite fria já não tem mais lua
E eu amor, já não sou mais tua.
Meu corpo hoje, se aquece em outros braços
e, é por isso que rompo todos os laços
com o tempo passado,
que nunca teve tempo para mim.

Cansei de esperar pelo vinho
que depois de feito,
já não fazia mais efeito em mim.
Cansei do dia, da noite,
da vida vazia
que se apoderou de mim.

Perdoe amor, os meus desencantos,
mas hoje só canto,
a alegria de viver.
Viver o amor, sem pranto,
com outro amor no meu canto,
cantando pra eu dormir!

POR AMOR 
Maria Tomasia

Por amor a ti, qualquer coisa faço;
enfrento ventos, atravesso brumas,
sem medo algum, vou até o espaço,
cruzo mares e me visto de espumas.
Desde que te entreguei meu coração,
nada existe que não possa enfrentar;
das vaidades fiz juras de abnegação...
só não deixo nosso amor se fragmentar.
Por amor a ti, transponho fronteiras;
para te encontrar, vou ao fim do mundo.
Sempre te amarei de todas as maneiras,
porque o que sinto é muito profundo.
Lembra que ninguém te amou assim;
por isso, peço-te, esquece o passado.
Olha o presente e o que tens, enfim:
amor como o meu tem que ser cultuado.

DOR...
Ciducha

Fala-me da dor
que meu coração abriga,
e que tanto nos castiga...

Fala-me de amor!
Do amor sofrido, não vivido,
desse amor feito de expectativas...

Fala-me da esperança,
que não ouso apartar-me dela, e a carrego
para onde vou, ou então seria o fim...

Fala-me agora disso tudo!
Estou cansada demais
para ter sono...
Ferida demais
para sentir dor...
Abandonada demais
para estar só...
Assustada demais
para ter medo...
E tão ostensivamente perseguida demais...
para fugir!

Depois... em outro tom,
com outro som,
fala-me de paz, de amor,
de esperança,
para que eu possa finalmente,
desvencilhar-me dessa dor tão terrível, e...
crer!

ORGULHO
Daria Farion

E foi na Áustria que André conquistou,
No peito as medalhas ostentou.
Lindo, garboso para o Brasil emigrou
E nesta Terra linda sua Maria encontrou.

Terra abençoada, esposa dedicada eis o laurel.
Prole numerosa, suor a pingar no solo arado.
Nas mãos dos filhos nunca uma enxada colocou,
Longe, longe para colégios enviou.

Meu André, minha Maria quanto orgulho!
Meus pais que a décadas partiram,
Mas do meu coração nunca saíram.
Numa realidade virtual eu afirmo:
- Saudade é vida, 
Vida sem vocês. 

AH! SAUDADE
Nancy Cobo

Saudade do tempo de escola, 
da primeira professora, 
da infância, mesmo sofrida, 
dos avós que se foram, 
dos pais que já partiram, 
das brincadeiras inocentes, 
da juventude que, agora, queremos que volte...

Saudade dos bailes da vida, 
do primeiro Amor, 
do verdadeiro Amor, 
aquele que, de corpo e Alma,
se entrega ao coração, 
mas que, um dia, perdeu-se no caminho...

Caminho esse que quero voltar 
para tentar encontrar 
a felicidade que ficou, 
a saudade do que foi, 
saudade do que é, 
saudade de você.

Fonte:
Antonio M. A. Sardenberg

Raquel Ordones (Cordel do Amor)


Amor, sem aclaração. 
Não adianta tentar 
E não há o que falar 
Contexto do coração 
Expresso em emoção 
Uma parte é sentida 
A outra: ação contida 
É transparência no ser 
Vem para entorpecer 
É a essência da vida! 

Está no sol da manhã 
Na claridade do dia 
E nos raios de magia 
Beleza do flamboyant 
É o sabor da maçã 
É a condição querida 
E jamais causa ferida 
É a alma integral 
Feição incondicional 
É a essência da vida! 

O caminho do andejo 
É café quente com leite 
No inverno em deleite 
É a delicia do beijo 
É a ânsia do desejo 
É a laranja partida 
É a rosa concedida 
O desabrochar da flor 
O abraço de calor 
É a essência da vida! 

Está nos olhos da criança 
No seu sorriso sincero 
E no Deus que eu venero 
Estampa da esperança 
Na certeza da aliança 
Na risada divertida 
Na poesia que é lida 
Fé que é força na hora 
No instante de agora 
É a essência da vida! 

Amor é tudo de bom 
É o cheiro de perfume 
Na entrega se resume 
Da nota ele é o tom 
E da voz ele é o som 
É primavera florida 
No colo a acolhida 
Está no ato do toque 
E do batom o retoque 
É a essência da vida! 

Enfim: amor é amor 
E com nada se compara 
O mundo anda e para 
Do orbe é o motor 
Da paixão é o ardor 
Sentimento de guarida 
Emoção não esquecida 
É uma ave que voa 
Profundeza que ecoa 
É a essência da vida! 

Fonte:
A Autora

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 683)


Uma Trova de Ademar  

O tempo, qual sanguessuga, 
para aumentar meu desgosto, 
fez nascer mais uma ruga 
entre as rugas do meu rosto! 
–Ademar Macedo/RN– 

Uma Trova Nacional  

Diz-me esta ruga esculpida, 
entalhe que o tempo fez, 
que a primavera da vida 
só nos floresce uma vez. 
–Jaime Pina da Silveira/SP– 

Uma Trova Potiguar  

Meus sentimentos dispersos
podem ser lidos com calma,
pois na emoção de meus versos
há pedaços de minha alma. 
–José Lucas de Barros/RN– 

Uma Trova Premiada  

2002   -   Belém/PA 
Tema   -   FRUTO   -   M/H 

O mundo, a cada minuto,
mostra a ironia presente,
pois, nem sempre colhe o fruto
a mão que planta a semente!...
–Rodolpho Abbud/RJ– 

...E Suas Trovas Ficaram  

Ah, que estranho desafio
e esquisita proporção:
quanto mais fica vazio,
mais nos pesa o coração! 
–Pe. Celso de Carvalho/MG– 

U m a P o e s i a  

Jesus Cristo em favor da humanidade 
deu a vida, pregado numa cruz, 
tantos outros assim como Jesus 
foram vítimas de tal barbaridade; 
Luther King em prol da liberdade 
expos suas ideias liberais, 
igual a Gandhi na Índia e outros mais 
que tiveram a luta interrompida; 
muita gente doou a própria vida 
rebatendo problemas sociais! 
–Carlos Aires/PE– 

Soneto do Dia  

MORTE DAS ROSAS. 
–Pe. Antônio Tomás/CE– 

Nos canteiros orlados de verdura,
de mil gotas de orvalho umedecidas,
cheias de viço e de perfume ungidas,
desabrocham as rosas a ventura.

Mas a vida das rosas pouco dura,
e em breve a desgraça enlanguescida
a fronte curva nos hastes pendida,
a um raio de sol que além fulgura...

E vão perdendo as pétalas mimosas,
a um sopro mal dos vendavais infestos,
é o despojo final das tristes rosas...

E de cor vermelha pelo chão tombadas
fazem lembrar sanguinolentos restos
de pobres corações despedaçados.

sábado, 29 de setembro de 2012

Mário Quintana (Arte Poética)


Trova 230 - A. A. de Assis (PR)


Folclore Portugues ( A Lenda "Aninha-a-Pastora")


Conta a lenda que há muito tempo, talvez no tempo dos afonsinhos, apareceu no vale do Jamor uma pastorinha com o seu rebanho. Ninguém sabia donde ela viera, mas também a ninguém interessava saber. E a pastora por ali ficou, achando o local propício para si e para as suas ovelhas. 

 Todas as manhãs pela alba banhava-se a pastora na ribeira que atravessava o vale, límpida e cantante. Depois, o resto do dia, entretinha-se ora cantando, ora correndo atrás dos borregos. Por vezes, quedava-se horas a fio olhando o ramejar das árvores ou observando os pardais a construir os ninhos ou a alimentar as crias. 

 No Inverno, quando o tempo custava mais a suportar, a pastora alapava-se com o rebanho sob as fragas, esperando que a chuva passasse, agarrada às suas ovelhas preferidas para manter algum calor. 

 Assim passava o tempo a pastorinha que um dia chegou ao vale do Jamor com um rebanho de ovelhas. 

 Certo dia, porém, passou por ali um cavaleiro - que alguns dizem que era o rei - em vistosa cavalgada, acompanhado de alguns moços de armas que com ele iam montear no vale. Os olhos do cavaleiro deram subitamente com os da pequena pastora, que, encostada a uma árvore, bebia tranquilamente uma gamela de leite. Surpreendido com a inesperada visão, o cavaleiro exclamou: 

 - Meu Deus, como será possível que tal beleza exista assim perdida neste vale?! 

 E, encantado, o cavaleiro tentou saber da pastora tudo quanto lhe dizia respeito: 

 - Onde vives, pastora? - perguntou o cavaleiro.

 - Por aí, senhor. 

 - Na aldeia, queres tu dizer? 

 - Não. Vivo aqui, no vale, com estas poucas ovelhas. 

 - A quem pertence o rebanho, pastora? 

 - Ninguém, meu senhor. Encontrei-o no caminho e seguiu-me até aqui. 

 - Não vais querer que eu acredite nessa história, mulher?! Diz a verdade! 

 - Senhor, esta é a verdade, acreditai! 

 O velho aio do cavaleiro, que ouvia a conversa, inquieto com o que parecia simples de mais, interveio: 

 - Tende cuidado, meu amo. A pastora mais parece o demónio a tentar-vos! 

 A rir, o cavaleiro respondeu-lhe: 

 - Ora, velho aio! Se o demónio fosse tão belo como esta mulher, fácil lhe seria tentar o mundo! Deixai-vos disso!. .. 

 Pois, meu amo, vamos ver se o que digo não é verdade! 

 E virando-se para a pastora, que tremia, perguntou: 

 - Onde está a tua família, rapariga? 

 - Não tenho ninguém. 

 - Como te chamas? 

 - Não sei, nunca ninguém me chamou .. 

 - E as ovelhas, encontraste-as! 

 - É verdade, senhor. 

 Pois vede, meu amo, se tudo isto não é muito estranho!.. Por mim, acho que deveis ter cuidado! 

 - Ora, velho medroso! Que há de estranho numa pastora que vive sozinha e não tem família. Depois .. é tão bonita! 

 Enquanto dizia isto, o cavaleiro olhava a pastora, sentindo crescer em si uma ternura magoada e dolorida por haver quem fosse obrigado a viver em tal solidão. E num repente, como quem sente uma necessidade súbita e insuportável de suprir os desamores da vida, o cavaleiro disse suavemente à pastora: 

 - A partir de hoje nunca mais viverás só! Vou levar-te para a corte! 

 - Não quero sair daqui, senhor! - murmurou perentória a rapariga. 

 Pois então, virei eu viver contigo! Mandarei construir uma casa para ti e um redil para as ovelhas.

 E, virando-se para os acompanhantes, ordenou: 

 - Senhores, trazei vestidos e joias, mandai vir pedreiros e artífices que quero uma casa aqui! E tu - acrescentando, virando-se para um deles - tu que sabes vestir e pentear, aninha a pastora! 

 Sem mais uma réplica, obedeceram os companheiros ao cavaleiro - ou seria rei? No vale do Jamor cresceu uma casa onde viveu o cavaleiro com a pastora que mandara aninhar. E à volta dessa casa surgiu, pouco a pouco, uma povoação que durante muito tempo se chamou Aninha-a-Pastora. 

 Hoje, passaram-se os anos, esqueceu-se a lenda, e Aninha-a-Pastora chama-se Linda-a-Pastora. 

Fonte:
Lendas Portuguesas da Terra e do Mar, Fernanda Frazão, disponível em Estudio Raposa

Constança Lucas (Poemas)


PALAVRA

Perdi-te sem nunca te saber
 envelhecemos os sons
 cansada de maus usos
 embarcou para terras velozes
 não soubemos cochichar
 nos abraços que ardiam
 por inventarmos alguém
 para sabermos perder
 perdi-te vontade de falar
 nesta cadência muda

“FOI NUM ADEUS…”

Foi num adeus que mais te amei
 nas nossas mãos as cores cantaram
 numa harmonia de saudades futuras
 nos quereres contorcidos em ondas quentes
 onde o lenço imaginado corria pelo vento
 nas ruas da nossa cidade encantada
 só de palavras e afeições longas
 olhávamos as folhas em silêncio
 por tanto querermos os toques
 em arrepios de ternuras
 lânguida corri pelo teu corpo
 por nada nele deixar de querer
 fiquei embevecida com o teu canto
 por infinitos tempos das nossas peles

“SONHO”

Escuta este sonho não é para ti
 ele pertence-me
 não desisto do meu medo
 da minha alegria
 da minha amargura
 de querer que acabe a realidade
 tudo me cansa
 tão profundamente
 quando me querem invadir
nos meus sonhos
 mesmo não os conhecendo

E por vezes quero que me deixem
 ver o mundo
 mandar a realidade tomar banho
 mudar de cheiro
 deixar de me perseguir
 nesta angústia de nada poder
 e ao mesmo tempo saber
 que tanto posso

Sonho nas noites
 de dias sem tempo
 acordada ou mesmo a dormir
 sempre num parque
 de cores caídas
 nesta nossa casa
 tão nossa
 mas os sonhos
 alguns são só meus
-
DO OUTRO LADO DO VIDRO

Pela janela, um rubor de nuvem,
 alguém sem articulação, rabisca,
 do outro lado do vidro, lá em baixo
 observo-o como quem não entende

Sinto falta de mais árvores
 a calçada tem um dono
 que não gosta das folhas
 e o rapaz rabisca como quem marca
 um território fictício

AS MÃOS

ardes em febre de eletricidade
 por esconderes almas
 de ti e por ti desenho
 contigo aprendi a desejar
 o que só dentro de mim existe
 as palavras crescem,
 em teus dedos amáveis
 para depois esquecermos
 o silêncio triste

TENS SIDO

Tens sido um ás nessa de protocolos 
acho que me contagiei 
Vales pelos sorrisos provocados 
pelas tuas e pelas minhas palavras 
não de entrelinhas, sem linhas mesmo 
cada palavra escrita 
talvez não fossem nunca ditas 
Vales pelas provocações 
dos conhecimentos de mundos 
onde o convencional perde lugar 
mas está presente 
Vales pelo pedaço de coração 
que roubastes 
sem saber onde o colocar 
anda no firmamento 
Vales assim nesta amizade 
que sem tempo vive 
sem lugar cresce 
com carinho segue 
Vales pela liberdade 
de conhecer e não concordar 
Vales pela diferença 
num mar de águas comuns 
Valho por assim sentir,
mesmo assim saber dizer-te 
sem medos demasiados 
mas com a vida pulsando 
neste mundo tão torto 
Oiço is a beautiful day 
de bem com os meus sentimentos 
saberás dizer-me mais de ti sem protocolos

Fontes:

Constança Lucas (1960)


Constança Lucas nasceu em Coimbra, em 1960 e cursou até o colegial em Portugal. 

Passou a viver em São Paulo no fim da década de setenta, onde fez Licenciatura Plena em Artes Plásticas na FAAP - Fundação Armando Alvares Penteado e Mestrado em Poéticas Visuais - Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo - USP , Pós-Graduação em Artes na ECA - Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo - USP

Fez diversos cursos de artes plásticas, literatura, fotografia e de história da arte, em museus e instituições culturais. 

Viveu em Lisboa de 1988 a 1992, onde realizou algumas exposições de pintura e desenho, coletivas e individuais. 

 Também desenvolveu a pintura em azulejos e trabalhos na área de artes gráficas. 

Tem participado de várias exposições coletivas desde o início da década de oitenta em diferentes países  (Portugal, Espanha, Bélgica, Checoslováquia, França, Hungria, Itália, Japão, Argentina, Alemanha, Austrália e Brasil). Realizou diversas exposições individuais em Portugal e no Brasil. 

É autora de inúmeros desenhos publicados em jornais, revistas e livros. 

Atualmente vive e trabalha em São Paulo. Desenvolve o seu trabalho em pintura, desenho, gravura, aguarela e infografia.

Fonte:
http://www.netsaber.com.br/biografias/ver_biografia_c_4895.html

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 682)


Uma Trova de Ademar  


Uma Trova Nacional  

Matuto filosofante 
vendo filme que arrepia: 
- E esse era o inferno de “dante”... 
Imagine o de hoje em dia!... 
–Dorothy Jonsson Moretti/SP– 

Uma Trova Potiguar  

Senhor Cornélio, com medo
das balbúrdias do apagão, 
chegou em casa mais cedo 
nos rastros do Ricardão. 
–Djalma Mota/RN– 

Uma Trova Premiada

1996  - Pouso Alegre/MG 
Tema  - VERÃO –  Venc.

"Não conto mais com você!..."
 - Diz a mulher, lá da sala.
 "Se no verão não se vê,
 no inverno, então, nem se fala !..."
- Rodolpho Abbud/RJ

...E Suas Trovas Ficaram  

Com “fome zero”... zerado; 
a fome em mim fez um fosso, 
que o intestino delgado 
tá quase engolindo o grosso. 
–Francisco Macedo/RN– 

U m a P o e s i a  

Um candidato a prefeito 
falando aos aduladores 
distante dos eleitores: 
vamos ganhar esse pleito! 
Sou cidadão de conceito, 
só eu levo essa parada; 
porem o que mais me agrada 
nesta tremenda disputa, 
é ter um ano de luta 
e quatro sem fazer nada. 
–Vicente Gonçalves/PB– 

Soneto do Dia  

MEU ORGULHO. 
–Pedro Torquato Maciel/SP– 

Muito cedo morreu, infelizmente, 
o grande Rui, o mestre consagrado, 
a quem prestei auxílio eficiente 
na sua profissão de advogado. 

No escritório, à Rua do Senado, 
nós dois a trabalhar conjuntamente, 
íamos dando conta do recado, 
a contento, aliás, de toda gente. 

Obedecendo às normas do Direito, 
o meu trabalho, rápido, perfeito, 
em pouco tempo lá ficou notório. 

Tanto assim que, no meio de doutores, 
não poucas vezes mereci louvores 
por ter varrido bem o escritório!