domingo, 29 de setembro de 2024

Isabel Furini (Poema) 71: Estelar

 

Newton Sampaio (Espetáculo)

Damião desce correndo aquele pedaço de rua.

— A campainha já parou de tocar. Vai começar a coisa.

Cruza com o Durvalino. Vai pras bandas da Amelinha, com certeza.

— Que pressa é essa, menino?

Nem responde. Estuga mais o passo.

— Tomara que ainda não tenha começado.

Atravessa a porta grande. Estranha o velho Gregório ainda na bilheteria.

— Pronto, padrinho. Ele mandou dizer que sim.

Entra no salão, com o pulso alterado.

Não. A função não começara ainda.

— Que sorte!

Ninguém quase. No reservado da direita, o Doutor Paiva, soleníssimo. Na terceira fila o seu Pernambuco, mais a família, gozando a delícia da permanente. Um pouco para trás, uma dúzia de espectadores. Lá em cima, como sempre, o negro Fabiano com a molecada. E bem na frente, rente à boca do palco, o Joca, afinando o instrumento.

— Coisa engraçada! Por que será que o pessoal não veio?

Juquita não compreende que o povo deixe de comparecer ao espetáculo do mágico.

— Ah! Quem sabe foi por causa da morte do Amâncio?

Acha que a razão é muito besta.

— Meu Deus! Morre um homem e agora ninguém mais se diverte?

Pela cabeça do Damião passa, de atropelo, um punhadão de pensamentos. Tem ímpeto de sair à rua e gritar:

— Pessoal! Ô, pessoal! Venha assistir ao espetáculo. Eu sei que o homem faz mágicas. Umas mágicas bonitas, eu sei.

E logo sente desejo de xingar o povo com os nomes mais feios do mundo. Detesta colossalmente, nesse momento, a gentalha da cidadezinha.

— Éguas! Bobalhões! Filhos da mãe!

Primeiro sinal. Música.

Segundo sinal. Silêncio.

Terceiro sinal. Aparece a cena, que é simples. Duas cadeiras. Uma mesa, com dois copos em cima. A caixa de papelão encardida. Vem o artista, desenxabido, vestindo uma roupa de gala muito surrada. A mulher é deselegante. Mais gorda ainda que dona Vitória. 

O homem parlenga dois minutos. Damião não entende bem. Só sabe que, a cada passo, ele solta:

— Cavalheiros... Damas...

As mágicas são bem bobas.

Umas coisas mais sem efeito, gastas, repetidas. O relógio que passa, invisivelmente, do bolso do espectador para a caixa de papelão. 

Um lenço branco que fica vermelho. O chapéu que vira passarinho.

No fim do espetáculo vêm aplausos tímidos, sem vontade. O homem se curva uma, duas vezes. A mulher agradece também.

Damião quer mais é derrubar o barracão, à custa de palmas. Só pra alegrar o mágico, que tem uns olhos muito tristes.

Diante da gaveta semiaberta, o velho Gregório, levantando a gola do casaco preto, aceita o fiasco com a resignação de sempre. E ainda troça, conferindo a aritmética da noitada:

— Está vendo? 25 pessoas. O delegado, o promotor, o Fabiano, os cinco moleques, o Pernambuco mais a família. Ao todo, treze pessoas que não pagaram. Doze entradas vendidas a 1$500 somam 18$000.

Conta redonda.

E articula, pausadamente:

— Dezoito mil réis.

O ilusionista foi ter com o empresário, no dia seguinte.

— O senhor ontem foi um pouco infeliz, não? — diz o velho.

— É. Não tive sorte, quase.

Faz um gesto de desalento:

— Já me aconteceu coisa parecida mais de dez vezes. Mas não faz mal.

— Paciência, amigo. A morte do Amâncio estragou a frequência. O senhor sabe. Povo do interior é assim. É muito respeitador.

O homem das mágicas tinha no rosto uma sombra de amargura infinita.

— Parece que não dá nem pra pagar o aluguel do teatro, não, seu Gregório?

Gregório levanta os ombros.

— Não importa. Perdoo o aluguel.

E fica pensando na coragem do homem em chamar aquilo de “teatro”.

Damião, no ângulo da saleta, espia com piedade a figura miserável do ilusionista. Tenta justificar consigo mesmo.

— Ele sabe fazer mágica. Sabe mesmo. O desastre foi a falta de assistência. Povo besta!

O artista solta um suspiro longo.

— Muito obrigado, seu Gregório, por sua boa vontade.

— Não há de quê. Disponha.

Já na porta, o homem volta-se. Fala, com brandura, humilde:

— Quando fui à sua casa, vi lá, num canto, uma pequena mala desocupada. O senhor não poderia fazer presente dela?

— Pois não. Pode ir buscar.

— É só carregar as bugigangas. A minha está tão velha...

Fica atrapalhado. Não sabe como explicar.

— Desculpe, senhor. Desculpe.

Damião aproxima-se discretamente do velho. E cochicha.

— Padrinho. Dê vinte mil réis ao coitado. Dê.

Gregório atende o menino. O artista ambulante agradece comovidíssimo. E abala rua acima.

No trem das quatro, Damião vai à estação.

Lá estão, no carro de segunda classe, quietinhos, o mágico e a mulher.

Damião se despede.

— Felicidades, amigo.

— Obrigado, menino.

O trem apita. Arranca, devagar. E logo desaparece, soltando fumaça, do lado do paredão.

Fonte:
Newton Sampaio. Ficções. Secretaria de Estado da Cultura: Biblioteca Pública do Paraná, 2014. Disponível em Domínio Público.  (Publicado originalmente em O Dia. Curitiba, 17/12/1936)

José Feldman (Dicas de escrita) Tipos de contos

Os contos são uma forma literária rica e diversificada, e podem ser classificados em várias categorias.

1. Conto Fantástico
Apresenta elementos sobrenaturais, instigando o leitor a questionar a lógica da narrativa.

Jorge Luís Borges — seus contos frequentemente exploram temas de labirintos e realidades alternativas, como em "A Biblioteca de Babel".

2. Conto de Horror
Foca em provocar medo ou angústia, frequentemente envolvendo o sobrenatural ou o grotesco.

Edgar Allan Poe — conhecido por contos como "O Corvo" e "O Gato Preto", que exploram a psicologia do terror.

3. Conto Realista
Foca na representação fiel da vida cotidiana e das experiências humanas.

Anton Tchekhov — seus contos, como "A Dama do Cachorrinho", retratam a vida comum com profundidade emocional.

4. Conto de Fadas
Inclui elementos mágicos e geralmente possui uma moral ou lição.

Hans Christian Andersen — conhecido por contos como "A Pequena Sereia", aborda temas de amor, sacrifício e transformação.

5. Conto Policial
Narrativas que giram em torno de um crime ou mistério, com a resolução sendo um elemento central.

Agatha Christie — seus contos e romances, como "O Assassinato de Roger Ackroyd", são famosos por suas intrincadas tramas de mistério.

6. Conto de Amor
Foca nas relações amorosas, suas complexidades e nuances, geralmente com um desfecho emocional.

Guy de Maupassant — seus contos, como "Bola de Sebo", exploram a natureza do amor e do desejo.

Carolina Maria de Jesus – "Quarto de Despejo", narra experiências de amor e desamor em um contexto de pobreza.

7. Conto de Humor
Busca provocar riso e divertimento, muitas vezes através de situações absurdas ou personagens caricatos.

Mark Twain — contos como "As Aventuras de Tom Sawyer", combinam humor com crítica social.

8. Conto Social
Aborda questões sociais, políticas ou culturais, muitas vezes com um viés crítico.

Machado de Assis — contos como "A Cartomante" refletem as tensões sociais e morais do Brasil do século XIX.

9. Conto Surrealista
Apresenta imagens e situações que desafiam a lógica e a razão, muitas vezes explorando o inconsciente.

Franz Kafka - contos como "A Metamorfose" exploram realidades absurdas e a alienação humana.

Julio Cortázar — em "A Casa Tomada", utiliza uma narrativa não linear e surrealista.

10. Conto de Aprendizado 
Foca no crescimento e desenvolvimento do protagonista.

J.D. Salinger — "O Apanhador no Campo de Centeio" é um exemplo de crescimento emocional e autodescoberta.

11. Conto de Viagem
Envolve aventuras em locais exóticos, refletindo sobre cultura e experiência.

Jack Kerouac — "On the Road" (embora um romance, tem elementos de conto de viagem) captura o espírito da exploração.

12. Microconto
 Narrativa extremamente curta, onde cada palavra conta.

Augusto Monterroso — "Quando acordei, o dinossauro ainda estava lá." é um exemplo famoso de microconto.

13. Conto histórico
Ambientado em um período histórico específico, explorando eventos, figuras ou contextos do passado.

José Saramago - contos que, embora não sejam sempre históricos, frequentemente refletem em suas narrativas as questões do tempo e da memória.
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Na continuação, explanaremos mais profundamente sobre cada um dos tipos de contos e seus expoentes.

Fonte: José Feldman. Dissecando a magia dos textos: Contos e Crônicas. Maringá/PR: IA Open.  Biblioteca Voo da Gralha Azul. 2024.

Vereda da Poesia = 122 =


Trova de
BRANDINA ROCHA LIMA
Recife/PE, 1916 – 1999, Moreno/PE

Foste aurora em minha vida,
meu sol de felicidade…
Hoje, és estrela perdida
no céu de minha saudade…
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Semi-Soneto de
JOSÉ FELDMAN
Maringá/PR

Solidão (1)

Na sombra fria da noite, eu desapareço, 
a solidão é manto que me resta, 
caminho por caminhos que não conheço, 
e a voz do eco é tudo o que se manifesta. 

Os sonhos se desfazem em murmúrios, 
as estrelas parecem tão distantes, 
e em cada passo, parecem ser augúrios, 
reflexos de um ser que sofre os instantes. 

Mas na penumbra, há um brilho escondido, 
um canto suave que embala a dor, 
sussurros do silêncio, eu ouço unido. 

E na tristeza, um traço de amor, 
pois mesmo só, o coração é sentido, 
na solitária dança do desamor.
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Trova Humorística de
IZO GOLDMAN
Porto Alegre/RS, 1932 – 2013, São Paulo/SP

Lá na casa da Maria
é muito estranha a porteira...
Não faz barulho de dia,
bate e range a noite inteira…
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Poema de
LUIZ POETA
(Luiz Gilberto de Barros)
Rio de Janeiro/RJ

Um poeta não é só substantivo

Sempre alguém diz que sou poeta até no nome...
...mas um poeta não é só substantivo...
o que se inventa, normalmente um dia some
e é assim: reinventando, eu sobrevivo.

Sou só mais um igual a tantos que diluem
nas suas dores, os seus sonhos e anseios,
seres que aprendem a criar versos que fluem,
polinizando a flor dos próprios devaneios.

Não modelei esse poeta que há em mim...
nasci assim, com esse dom especial
de abençoar, na solidão do meu jardim,
cada botão de cada flor original.

Não me sentei numa cadeira e copiei
o que pregava um ilustre professor,
mas diluí em cada olhar o que criei,
quando encontrei no meu olhar, meu próprio amor.

Meus mestres são sempre o melhor que alguém me dê,
sem me cobrar... o amor requer fraternidade...
e Deus repassa, a qualquer cristão que Nele que crê,
esse poder que existe dentro da humildade.

Deus misturou, em cada cor que eu desenhei,
o arco-íris da melhor abstração;
autodidata, cada linha que tracei,
foi um pedaço do meu próprio coração.

Sou, sim, poeta sem registro em cartório,
meu repertório não carece de um carimbo;
a inspiração é muito mais que algo simplório;
se alguém me bate, é com meus versos que me vingo.

Poetas choram poesias, quando o riso
que eles têm fazem da página, o caminho,
da sua lágrima melhor, tão sem aviso,
deixando um rastro moldado pelo carinho.

Não sou poeta só no nome, o meu olhar
capta a vida que respira ao meu redor
e é só o amor reaprender o que é sonhar,
que faço o mundo parecer muito melhor.
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Trova  Premiada em Irati/PR, 2023

LEONILDA YVONNETI SPINA 
Londrina / PR

No forró, por bebedeira,
Zé tropeçou num cascalho
e ficou a tarde inteira,
“carta fora do baralho”!
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Spina de 
SOLANGE COLOMBARA
São Paulo/SP

A Poesia Contida na Pintura
ou a Pintura Vista na Poesia?

Sequelas em cores
invadem, se calam,
apenas ali, revivem.

Traços finos entre si convivem,
ofuscam meu sentir, em aroma
fresco nas manhãs onde vivem.
Em sua nobre singeleza suspiro
beleza em tela, caso subjetivem.
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Trova Popular

Há uma espécie de planta
que vinga sem ter raízes...
Assim são certos sorrisos
nos lábios dos infelizes.
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Soneto de
CLÁUDIA DIMER
Eldorado do Sul/RS

Razão

Formou-se o Universo - o largo Estudo
humano explica que um motivo existe...
O céu, a Terra, a Lua, o Sol e tudo
tem um "porquê" na criação. Ouviste?

Surgiu a vida - um bem no qual me iludo...
Surgiu a morte para eu ser mais triste!
E fez-se o Mar e o vento em som agudo...
Onde há explicação que me conquiste?

Formou-se a chuva para a plantação,
e o amor para quê? Para a ilusão
que torna o meu viver fatal tolice!...

"Para tudo há razão". Quem foi que disse?
Meu existir teria uma razão
se dentro do teu sonho eu existisse!
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Trova de
DÉSPINA ATHANÁSIA PERUSSO
São Jerônimo da Serra/PR

O calor dos teus abraços
e o fulgor do teu olhar
são conquistas que os meus braços
têm vontade de alcançar.
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Poema de
ÁLVARES DE AZEVEDO
São Paulo/SP, 1832 – 1851, Rio de Janeiro/RJ

Meu Sonho

EU
Cavaleiro das armas escuras,
Onde vais pelas trevas impuras
Com a espada sanguenta na mão?
Porque brilham teus olhos ardentes
E gemidos nos lábios frementes
Vertem fogo do teu coração?

Cavaleiro, quem és? o remorso?
Do corcel te debruças no dorso....
E galopas do vale através...
Oh! da estrada acordando as poeiras
Não escutas gritar as caveiras
E morder-te o fantasma nos pés?

Onde vais pelas trevas impuras,
Cavaleiro das armas escuras,
Macilento qual morto na tumba?...
Tu escutas.... Na longa montanha
Um tropel teu galope acompanha?
E um clamor de vingança retumba?

Cavaleiro, quem és? — que mistério,
Quem te força da morte no império
Pela noite assombrada a vagar?

O FANTASMA
Sou o sonho de tua esperança,
Tua febre que nunca descansa,
O delírio que te há de matar!...
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Trova Humorística de
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA
São Paulo/SP

Prende a sogra na moenda
e aí prepara a cilada...
Faz negócio com a fazenda
mas..."de porteira fechada!"
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Soneto de 
AMILTON MACIEL MONTEIRO
São José dos Campos/SP

Ciúme, ou concorrência

Verdadeiro tapete de begônia,
em cor bem viva e alegre, magistral,
demonstrando nenhuma parcimônia,
invadiu por completo o meu quintal!

Fez do ordeiro recinto, babilônia;
não respeitou sequer meu roseiral,
que eu cuidava com tanta cerimônia,
pelas flores de tom angelical!

Minhas rosas de grande raridade
não aguentaram tanta crueldade
que as begônias fizeram na invasão!

Por ciúme, ou talvez intransigência,
as rosas, em repúdio à concorrência,
morreram sem abrir... mesmo em botão!
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Trova do 
Príncipe dos Trovadores
LUIZ OTÁVIO
Rio de Janeiro/RJ (1916 -1977) Santos/SP

Saudade: um eco perdido
de uma cantiga da infância...
Perfume de flor nascido
lá nas brumas da distância…
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Poema de
FERNANDO PESSOA
Lisboa/Portugal (1888 - 1935)

Dorme enquanto eu velo...
Deixa-me sonhar...
Nada em mim é risonho.
Quero-te para sonho,
Não para te amar.

A tua carne calma
É fria em meu querer.
Os meus desejos são cansaços.
Nem quero ter nos braços
Meu sonho do teu ser.

Dorme, dorme. dorme,
Vaga em teu sorrir...
Sonho-te tão atento
Que o sonho é encantamento
E eu sonho sem sentir.
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Trova Funerária Cigana

Eu sou triste como o luto,
que cobre os tenros filhinhos,
que na pobreza perderam
da terna mãe os carinhos.
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Soneto de 
JB XAVIER
São Paulo/SP

O mar e o vento
 
Ouço o bramido deste mar - tormento triste,
Vociferando na alameda da ilusão,
Tecendo espumas desde o dia em que partiste,
Na tentativa de alegrar meu coração!
 
O vento brando vai mentindo que ainda existe
- Em melodia de gentil diapasão –
As alegrias, e soprando ele persiste
Em transformar tua lembrança em emoção.
 
Então me calo ante o bramido do oceano;
Tento reter a espumarada em minhas mãos,
E outra lembrança, então de ti, eu acalento.
 
Mas segurar a espumarada é ledo engano,
É só mais um dos pensamentos, tolos, vãos,
Tal como foi tentar, por ti, parar o vento!
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Trova Hispânica Premiada em Santos/2014
HÉCTOR JOSÉ CORREDOR CUERVO
Boyacá/Colômbia, 1936 – 2020

El amigo verdadero
es leal en sus acciones
y está presente primero
en fatales situaciones.
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Poema de 
MÁRIO QUINTANA
Alegrete/RS (1906 - 1994) Porto Alegre/RS

Os Degraus

Não desças os degraus do sonho
Para não despertar os monstros.
Não subas aos sótãos - onde
Os deuses, por trás das suas máscaras,
Ocultam o próprio enigma.
Não desças, não subas, fica.
O mistério está é na tua vida!
E é um sonho louco este nosso mundo...
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Trova de
A. A. DE ASSIS
Maringá/PR

De todos ela atraía 
mil sorrisos, mas... que dó: 
casada, sofre hoje em dia 
os maus humores de um só... 
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Soneto de
SÁ DE FREITAS
Avaré/SP

Amo-Te
  
Amo-te tanto…mais que a própria vida,
 E te desejo tanto, na certeza,
 De que me queres quanto és tão querida,
 De que me prendes n’alma o quanto és presa.
 
Amo-te mais que o amor permite amar-se;
 Amo-te além do além que o amor desperta;
 Translúcido te amo sem disfarce;
 Te amo com a loucura de um poeta.
 
Amo-te como deve amar quem ama,
 E cercado por essa imensa chama,
 Do amor que me aprisiona em fortes laços:
 
Quero que o coração, no amor, se farte;
 Quero viver para poder amar-te…
 Quando eu morrer, que eu morra nos teus braços.
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Trova da
Princesa dos Trovadores
CAROLINA RAMOS
Santos/SP

Se eu sinto fugir a calma
e até viver me angustia,
eu abro as janelas da alma
e deixo entrar a Poesia!
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Hino de 
Arauá/ SE

Glória a Deus que nos deu esta terra
Tão formosa, serena e gentil
Arauá doce gleba que encerra
tradições deste amado Brasil.

Campos verdes imensos corridos
Pelas águas do antigo Arauá
Cantam lendas dos tempos já idos
Que, mais belos, alhures não há.

Salve, salve ó terra querida
Lindo berço que a virgem nos dá
Ah, possamos passar toda a vida
Em teu seio feliz Arauá.
Ah, possamos passar toda a vida
Em teu seio feliz Arauá.

O primeiro dos teus habitantes
Foi a mãe de Jesus, foi Maria
Dos heróis de teus feitos dos brilhantes
Esta feita a maior galeria.

Salve, salve ó terra querida
Lindo berço que a virgem nos dá
Ah, possamos passar toda a vida
Em teu seio feliz Arauá.
Ah, possamos passar toda a vida
Em teu seio feliz Arauá.

Camerino nasceu na Palmeira
E morreu pela pátria cantando
E os Correias, de fonte altaneira
Penetraram na História lutando.

Salve, salve ó terra querida
Lindo berço que a virgem nos dá
Ah, possamos passar toda a vida
Em teu seio feliz Arauá.
Ah, possamos passar toda a vida
Em teu seio feliz Arauá.

Já 100 anos nos diz tua história
De trabalho de paz e de fé,
Que prossigas na trilha da glória
Sempre firme, garbosa e de pé

Salve, salve ó terra querida
Lindo berço que a virgem nos dá
Ah, possamos passar toda a vida
Em teu seio feliz Arauá.
Ah, possamos passar toda a vida
Em teu seio feliz Arauá.
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Trova Humorística de 
ISTELA MARINA GOTELIPE LIMA
Bandeirantes/PR

Não há truque que dê jeito
e ela fica tiririca...
digo com todo o respeito:
– quando enfeita pior fica!
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Poema de 
CECÍLIA MEIRELES
Rio de Janeiro/RJ (1901 - 1964)

O Sonho do Oceano

Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
- depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar.

Minhas mãos ainda estão molhadas
do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre de meus dedos
colore as areias desertas.

O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo
meu sonho, dentro de um navio...

Chorarei quanto for preciso,
para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo
e o meu sonho desapareça.

Depois, tudo estará perfeito;
praia lisa, águas ordenadas,
meus olhos secos como pedras
e as minhas duas mãos quebradas.
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Trova premiada em Irati/PR – 2023
MARIA LÚCIA DALOCE 
Bandeirantes / PR

Nas rimas que eu desencalho
esta foi fácil de achar,
mas o achado pra cascalho
dei pra sogra procurar!!!
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Fábula em Versos de
JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry/França, 1621 – 1695, Paris/França

A perdiz e os galos

Um tinha uma perdiz e tinha uns galos;
Determinou com ela associá-los:
Desgostou a perdiz dos camaradas,
Que com ela saltaram às picadas;
Entendeu que por ser uma estrangeira
A tratavam os mais desta maneira.

Mas um dia que viu dois encrespados
Saltarem de pescoços levantados,
E em mútua guerra às cristas investirem,
E com unhas e bicos se ferirem:
«Não vai mau — diz a triste — se discorde
Esta gente entre si se arranha e morde,
Já não tenho razão para queixar-me;
Devo com suas guerras consolar-me.

Indício de incivil barbaridade
De todo o malcriado, que grosseiro,
Em vindo a seu país um estrangeiro,
O despreza e lhe mostra má vontade.
O preceito da santa caridade
Distingue o natural do forasteiro?
Ser judeu, mouro e herege o viageiro,
Não lhe tira o que tem por irmandade.

E se esse forasteiro se contenta
De ver que os naturais são mal unidos,
Também barbaridade representa:
Todos dum mesmo pai somos nascidos;
Se o sangue nos uniu, que nos alenta,
Não sejamos por ódio divididos.