sábado, 3 de dezembro de 2011

Trova Ecológica 57 - Wagner Marques Lopes (MG)

Trova e imagem enviadas pelo autor. Montagem por José Feldman.

Neoly de Oliveira Vargas (Caderno de Trovas)


Nasceu em Sapiranga, Rio Grande do Sul, em 26 de dezembro de 1926. Professora do Ensino Fundamental, especializada em alfabetização, aposentada. Delegada da UBT em Sapucaia do Sul, aonde reside há cerca de 60 anos. Membro da UBT Rio Grande do Sul deste 1986. Tem diversas trovas premiadas em concursos e Jogos Florais.

Ao marujo que anda absorto,
cuida que o dito malogra,
“um amor em cada porto”
e em cada porto uma sogra!

A verdadeira amizade,
não exige recompensas,
assim como nos aplaude,
nos corrige, sem ofensas.

Cansado, o velho marujo
tenta a manobra no cais,
o caso é que o dito cujo
nem consegue atracar mais.

Doces lembranças guardadas,
no peito, quem não as tem?
De caminhar de mãos dadas
por sobre os trilhos do trem.

Entrou no mar, o "pelado"...
saiu correndo do banho,
com um siri pendurado
num lugar, pra lá de estranho.

Herói dos inconfidentes,
não conheceste a vitória,
mas teu nome, Tiradentes
ficou gravado na História!

Lembra uma taça de vinho,
de inebriante sabor,
quando, com muito carinho,
tu me beijas, meu amor.

Numa ilusão, tal criança,
volto sempre ao mesmo cais,
naquela doce esperança
de te ver uma vez mais.

... O problema é que essa gente,
com tanta "oferta" hoje em dia,
vai logo pros "finalmente",
pois nada mais arrepia!

O Rosário de Maria,
a meditar nos conduz,
são as lágrimas que um dia,
Jesus derramou na cruz.

Pelo sol, pela beleza,
deste céu, do mar, da flor,
e por toda a natureza,
eu te agradeço, Senhor.

Pra que teu lar seja um templo,
pleno de amor e de paz,
mostra o caminho do exemplo,
que é sempre o mais eficaz.

Quando a saudade me abraça,
num devaneio febril,
até na nuvem que passa
eu diviso o teu perfil.

Quando a Olívia reclamou
dos “deveres” do marido,
o marujo retrucou:
- o espinafre tá vencido!

Surpresa a noiva ficou,
numa ansiedade maluca,
quando o noivinho tirou
a dentadura, a peruca...

Tanto ódio!...Tanta guerra!...
Mandai “bons ventos”, senhor,
aos quatro cantos da terra,
somente espalhando amor!

Tristeza, estresse, por que?
Tenha uma vida sadia!
- Participe da UBT,
faça uma trova por dia.

Um amigo verdadeiro,
é jóia que não tem preço,
na vitória, é companheiro,
nos ampara no tropeço.

Viver é recomeçar,
olhar em frente, sorrir,
é ter coragem, lutar
acreditar no porvir.

José Paulo Paes (Poemas para Brincar)


CONVITE

Poesia
é brincar com palavras
como se brinca
com bola, papagaio, pião.

Só que
bola, papagaio, pião
de tanto brincar
se gastam.

As palavras não:
quanto mais se brinca
com elas
mais novas ficam.

Como a água do rio
que é água sempre nova.

Como cada dia
que é sempre um novo dia.

Vamos brincar de poesia?

CEMITÉRIO

1
Aqui jaz um leão
chamado Augusto.
Deu um urro tão forte,
mas um urro tão forte,
que morreu de susto.

2
Aqui jaz uma pulga
chamada Cida.
Desgostosa da vida,
tomou inseticida:
era uma pulga suicida.

3
Aqui jaz um morcego
que morreu de amor
por outro morcego.
Desse amor arrenego:
amor cego, o de morcego!

4
Neste túmulo vazio
jaz um bicho sem nome.
Bicho mais impróprio!
Tinha tanta fome
que comeu-se a si próprio.

ATENÇÃO, DETETIVE


Se você for detetive,
descubra por mim
que ladrão roubou o cofre
do banco do jardim
e que padre disse amém
para o amendoim,

Se você for detetive,
faça um bom trabalho:
me encontre o dentista
que arrancou o dente do alho
e a vassoura sabida
que deixou a louca varrida.

Se você for detetive,
um último lembrete:
onde foi que esconderam
as mangas do colete
e quem matou os piolhos
da cabeça do alfinete?

PATACOADA

A pata empata a pata
porque cada pata
tem um par de patas
e um par de patas
um par de pares de patas.
Agora, se se engata
pata a pata
cada pata
de um par de pares de patas,
a coisa nunca mais desata
e fica mais chata
do que pata de pata.

PESCARIA

Um homem
que se preocupava demais
com coisas sem importância
acabou ficando com a cabeça cheia de minhocas.
Um amigo lhe deu então a idéia
de usar as minhocas
numa pescaria
para se distrair das preocupações.
O homem se distraiu tanto
pescando
que sua cabeça ficou leve
como um balão
e foi subindo pelo ar
até sumir nas nuvens.
Onde será que foi parar?
Não sei
nem quero me preocupar com isso.
Vou mais é pescar.

LETRA MÁGICA

Que pode fazer você
pra o elefante
tão deselegante
ficar elegante?
Ora troque o f por g!

Mas se trocar, no rato,
o r por g,
transforma-o você
(veja que perigo!)
no seu pior inimigo:
o gato.

PARAÍSO

Se esta rua fosse minha,
eu mandava ladrilhar,
não para automóvel matar gente,
mas para criança brincar.

Se esta mata fosse minha,
eu não deixava derrubar.
Se cortarem todas as árvores,
onde é que os pássaros vão morar?

Se este rio fosse meu,
eu não deixava poluir.
Joguem esgotos noutra parte,
que os peixes moram aqui.

Se este mundo fosse meu,
eu fazia tantas mudanças
que ele seria um paraíso
de bichos, plantas e crianças.

GATO DA CHINA

Era uma vez
um gato chinês

que morava em Xangai
sem mãe e sem pai,

que sorria amarelo
para o Rio Amarelo,

com seus olhos puxados,
um pra cada lado.

Era um gato mais preto
que tinta nanquim,

de bigodes compridos
feito mandarim,

que quando espirrava
só fazia "chin!"

Era um gato esquisito:
comia com palitos

e quando tinha fome
miava "ming-au!"

mas lambia o mingau
com sua língua de pau.

Não era um bicho mau
esse gato chinês,

era até legal.
Quer que eu conte outra vez?

RESPOSTAS


- Vá plantar batata.
- Depois você descasca?

- Vá lamber sabão.
- Pois não. Mas me empresta a sua língua
que a minha já está limpa.

- Vá ver se eu estou na esquina.
- Fui e nada vi: o bobo estava aqui.

- Vá caçar sapo.
- Cacei, aqui está: mande logo pro papo.

PROFISSÕES

O MARUJO

Marinheiro pequenino
bebeu água ao se deitar.
Acordou de madrugada:
a sua cama era um mar.

O CARPINTEIRO

Bate bate martelinho
mas não bata feito cego.
Cuidado com o meu dedo
que o meu dedo não é prego.

O BOMBEIRO

Blen blen blen blen
Quem vem? Quem vem?
É o bom bombeiro
e vem ligeiro.
Alguém o chama.
Ele vem que vem
blen blen blen blen.


ANA E O PERNILONGO

para Aninha Vogt

1
Toda semana
eu me lembro da Ana,
Para mim não há semana
sem Ana.

2
Havia um pernilongo
chamado Lino
que tocava violino.
Mas era tão pequenino
o Lino
e tocava tão fino
o seu violino,
que nunca ouvi o Lino
nem vi o Lino.

DICIONÁRIO


A
Aulas: período de interrupção das férias.

B
Berro: o som produzido pelo martelo quando bate no dedo da gente.

C
Caveira: a cara da gente quando a gente não for mais gente.

D
Dedo: parte do corpo que não deve ter muita intimidade com o nariz.

E
Excelente: lente muito boa.

F
Forro: o lado de fora do lado de dentro.

G
Girafa: bicho que, quando tem dor de garganta, é um deus-nos-acuda.

H
Hoje: o ontem de amanhã ou o amanhã de ontem.

I
Isca: cavalo de Tróia para peixe.

J
Janela: porta de ladrão.

L
Luz: coisa que se apaga, mas não com borracha.

M
Minhoca: cobra no jardim-de-infância.

N
Nuvem: algodão que chove.

O
Ovo: filho da galinha que foi mãe dela.

P
Pulo: esporte inventado pelos buracos.

Q
Queixo: parte do corpo que depois de um soco vira queixa.

R
Rei: cara que ganhou coroa.

S
Sopapo: o que acontece quando só papo não adianta.

T
Tombo: o que acontece entre o escorregão e o palavrão.

U
Urgente: gente com pressa.

V
Vagalume: besouro guarda-noturno.

X
Xará: um outro que sou eu.

Z
Zebra: bicho que tomou sol atrás das grades.

Fonte:
José Paulo Paes. Poemas para brincar. SP: Editora Ática, 1996. Texto-base digitalizado por Sueli Ducat

Aluísio de Almeida (O lendário Peabiru)


Ernani Donato estreou na literatura de ficção com Os contos muito humanos, da editora A Gazeta de Limeira, curiosa e rara editora, já vitoriosa no interior do planalto milagroso, e conhecida além das fronteiras. Não podemos fazer a crítica desse livro, porque não nos sentimos autorizados a esses altos vôos, mas tão somente louvar, ao jovem autor, uma esplêndida força de vontade que vence os obstáculos de toda sorte, inclusive os encargos penosos da profissão e a limpeza de suas histórias, muito humanas e, entretanto, sem os realismos muito tristemente humanos que se vêem por aí, e, por isso, não é dos tais livros que os educadores, pais e mestres, têm de desaconselhar à juventude.

Em 1946, já havia o autor publicado O livro das tradições que é um pouco de ficção e muito de imaginação e estilo, associados a fatos históricos e lendários do povoamento do sertão paulista; de Botucatu para a frente. Aparecerá, enfim, alguém para seguir na esteira de Paulo Setúbal? Há quanto tempo não se tenta o romance histórico, o verdadeiro romance histórico, em que os fatos principais, os lugares e os personagens são descritos segundo os documentos, e a ficção se reduz aos diálogos, aos monólogos e psicologia dos comparsas, interpretada de acordo com os dados históricos, por sua voz. Resta ainda muito assunto, à procura de um estilo e de um escritor de pulso. Sem vocação nem autoridade de profeta, todavia, ficamos pensando que este moço está procurando o seu caminho entre a história e ficção, e merece o apoio dos que lhe podem dar.

Ernani Donato é tão entusiasta das nossas antigüidades, que chegou a organizar explorações de velhos caminhos a serra de Botucatu, por onde lhe parecia terem os bandeirantes viajado em suas passadas de sete léguas.

Sem inventar nada, mas copiando autores de boa nota, já escrevemos e publicamos que existiu um caminho, antes de 1500, ligando o Atlântico ao atual Paraguai, os tupis de São Vicente aos guaranis do Paraguai, estrada batida de nove palmos de largura... E com ramificações! Eis aqui o feixe de comunicações aludido: São Vicente, Piratininga, Cananéia-Itapetininga, Paranaguá-Curitiba, Santa Catarina-Tibagi, eram as descidas do planalto para o mar. Tronco: São Paulo-Tibagi. Ligando-se a este, dois novos ramais, um começando nos Campos Gerais (Paraná), outro em Itapetininga, para alcançarem o Guaíra e o Paraguai pelas Sete Quedas. E conhecendo um velho caminho fundo entre Itapetininga e a serra de Botucatu, chegamos a pensar que podia ter sido, ao menos, calcado sobre o antigo peabiru! Hoje, estamos convencidos de que toda essa argumentação só tem valor, expressa dessa forma: os bandeirantes e, depois os tropeiros, quando caminhavam por terra no centro e sul do Brasil, não iam às cegas, mas de um modo geral seguiam aqueles rumos e direções acima delineados. No mais, mito, puro mito!

O leitor curioso pode procurar, sobre esse tema, esta bibliografia: "A conquista espiritual", de padre Antônio Ruiz de Montoya, em Anais da Biblioteca Nacional, 1876. "História da República Jesuítica do Paraguai", pelo cônego João Pedro Gay, na Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, tomo 26. "O caminho do Paraguai a Santo André da Borda do Campo", por Gentil de Assis Moura, ma Revista do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, tomo 13. "Antônio Raposo", por W. Luís, na coleção precedente, tomo 9. "O apóstolo São Tomé na América", por monge Camilo Passalaqua, mesma coleção, tomo 8. "São Paulo de Piratininga no fim do século XVI", Teodoro Sampaio, mesma coleção, tomo 4. "Historia de la conquista del Paraguai, Rio de la Plata y Tucuman", pelo padre Pedro Lozano da Companhia de Jesus, com notas de André Lamas Buenos Aires, 1873-1875, primeira e única obra da "Biblioteca del Rio de la Plata". Crônica da Companhia de Jesus no estado do Brasil", Simão de Vasconcelos, 1864. História geral das bandeiras, de Afonso de Escragnole Taunay. História do Paraná, Romário Martins etc.

Vimos pessoalmente esses livros, exceto o de Lozano, que é básico, mas em João Pedro Gay está a citação essencial. Conseguimos ler rapidamente a história do Paraguai, do padre Guevara (em manuscrito) e a "Argentina", de Ruy Dias de Guzman, na Biblioteca Nacional. Especialmente para as viagens de Álvaro Nunes Cabeça de Vaca, cujo itinerário de Santa Catarina a Assunção seria na direção do peabiru, e guiado pelos índios. Isto, porém, já é interpretação.

É curioso lembrar que Jaime Cortesão, escrevendo uma valiosa coleção de artigos sobre o bandeirismo, crê na existência de um peabiru, sem entrar em pormenores E. Taunay não nos pareceu muito entusiasta, apenas analisando os autores que o precederam, sem emitir o juízo definitivo. de sua grande obra sobressai como um estribilho a referência aos caminhos andantes dos rios.

Para compreender o mito do peabiru, é preciso não o separar do outro, o do Pai Sumé. Era a estrada de São Tomé. E se Pai Sumé é um mito, o caminho tem que o ser.

Os primeiros povoadores e catequistas da América do Sul encontraram entre as tradições orais dos indígenas essa de que um homem extraordinário, de barba e branco, viera ensinar-lhes o cultivo da mandioca e outras coisas de sua pequena cultura ou civilização material e, perseguido, retirou-se na direção do mar, deixando as pegadas nas pedras. Este é o arcabouço da lenda. Há tantas versões! Montoya atribui a essa personagem uma cruz de madeira enterrada no Guaíra e até um cemitério, o cemitério de Pai Sumé. Não faltaram exagerados para dizer que os indígenas derramavam água em forma de cruz nos recém-nascidos.

Em diversos lugares se dizia que o Pai Sumé passou. Também nos grandes rios. Também nos grandes rios. Pareceria que fosse um mito da raça ou grupo guarani, se não o houvesse entre os caraíbas, nas Antilhas.

Releva notar que Pai e Sumé não são palavras portuguesas e que, se a primeira é tão conhecida e de grafia uniforme, a segunda admite outras interpretações ortográficas da fonética indígena.

Desejamos lembrar que os jesuítas não foram nem os únicos, nem os primeiros a usar a lenda do Pai Sumé interpretando-a como história de São Tomé, e aproveitando-a para a catequese. Por exemplo, dela falaram os primeiros franciscanos que vieram a Santa Catarina, o agostiniano frei Joaquim Bráulio a menciona em sua História do Peru etc.

Pondo os pingos nos is, a coisa não se passou assim: vendo os inteligentes jesuítas que os índios acreditavam na existência de um Sumé, imediatamente traduziram para São Tomé a palavra e da lenda fizeram um reforço para a sua apologética, com o bom desejo de convencerem os índios a se batizarem.

Não. Quando eles começaram a catequese, a história do Sumé ? São Tomé, já existia e, se eles acreditaram piamente nisto, não estavam usando de nenhum estratagema e hipocrisia.

Nunca se poderá saber quem e onde foi o primeiro europeu que no Brasil traduziu Sumé por Tomé. Foi o primeiro cristão medianamente instruído que sabia ter São Tomé evangelizado os índios, segundo a tradição milenar. É bom também não simplificar o problema com um atestado de atraso mental aos portugueses, que teriam feito somente a troca de duas letras, pois os espanhóis também se deixaram levar pela semelhança de sons, mais longínquos no caso deles. E os mais altos espíritos da época acreditavam nisso. Um deles é o famoso exegeta, cujos comentários à Escritura são um monumento, o padre Cornélio a Lapide, que nunca veio ao Brasil. De seu comentário ("Epístola aos romanos"), tiramos só o finalzinho: "Zomé que parece não ser outro que são Tomé". Ele era professor universitário e escreveu "parece". Atitude científica.

É preciso ainda lembrar que não se trata de dogma de fé, mas de uma opinião dos católicos do tempo das descobertas acerca da vinda de São Tomé às Américas, um fato histórico, que explicavam pelo milagre e também inutilmente pelas antigas e certas comunicações da Ásia com a América. Inutilmente, pois o milagre da volta pelo oceano a pé enxuto podia ser invocado para a vinda.

O padre Simão de Vasconcelos (Crônica da Companhia de Jesus no estado do Brasil, edição de 1864, Rio de Janeiro) se estende sobre o assunto e enumera uma porção de pegadas de São Tomé que ele viu pessoalmente ou pessoas fidedignas lhes referiram, por exemplo, em São Vicente, em Cabo Frio, na Bahia; Logo ressalta a conclusão: o Sumé saiu, sim, pelo oceano, mas em tantos lugares! Mas como é possível que não enxergassem a lenda?

Supomos que, apertados, teriam que dizer que só duas dessas pegadas foram as últimas, e que nos outros casos ele teria, o Sumé, voltado a outras partes do Brasul, como em São Tomé das Letras, ali no sul de Minas Gerais...

Como chegaram a atribuir a São Tomé os vestígios? Não inventavam, os índios vizinhos explicavam: Pai Sumé! Eles traduziam: São Tomé.

Eis o resumo dessas considerações: é certíssimo que existiu o mito do Pai Sumé entre os indígenas americanos. Apelando para o milagre, os crentes podem atribuir a São Tomé o que os índios pagãos atribuíam a Sumé. Trata-se de uma hipótese, de uma possibilidade e o milagre, para os que cremos, é possível.

Não é fato histórico, provado, porque as pegadas são o único documento e tão mal interpretado. É um fato lendário, cuja tradução em linguagem vulgar é pode ser que sim, pode ser que não.

Dizíamos que Montoya foi o pai do peabiru, do caminho de São Tomé, nesse sentido que foi o primeiro a descrevê-lo. Ele encontrou um trecho de caminho a cem léguas do mar, no atual estado do Paraná, com oito palmos de largo etc. e perguntou aos índios o que era aquilo. A chave para todas as respostas veio logo: o caminho do pai Sumé.

Montoya é um nome que não pode ser alistado entre os mentirosos vulgares, nem mesmo um alucinado pelos sacrifícios da catequese, a ponto de criar caraminholas ou macaquinhos no sótão. Ele viu, e ouviu e marcou o lugar. Não, porém, o viu e ouviu dizer cem léguas de caminho, como parece que o interpretam, mas viu um pedaço de caminho num lugar distante cem léguas da costa. Podia ser um quilômetro e até menos. Agora temos o direito de emitir muitas hipóteses para explicar o que ele viu, viu e interpretou pegadas e vestígios da passagem de São Tomé. E isso não tem valor algum. É o mesmo que dissesse vendo um sambaqui, que São Tomé passou por ali, salvo a rima...

O caminho de São Tomé não existiu, sobrevivendo 1500 anos ou mais ao seu milagroso aparecimento. E que viu o padre Montoya? Alguma coisa parecida com caminho, um caminho natural, feito acaso por ação física e química das águas, um trechinho. Ele acreditava que fosse o derradeiro vestígio e resto da grande trilha de que lhe falavam os guaranis.

Eis o texto completo:

"Os habitantes do Brasil todos dão como certo que São Tomé Apóstolo veio a pé para estar bandas, e o lugar primeiro aonde chegou foi a vila de Santos chamada (tradução literal) que está para as bandas do sul, no dia de hoje mesmo se vê a pegada do santo, onde ele tinha saído em terra. Eu, por mim, não vi aquelas pedras, porém, a cem léguas de distância, do mar vi um caminho de cerca de oito palmos que ele tinha trilhado. Por aquele caminho tinha crescido um capim tenro e fino, pela borda dele, porém, cresceu até a altura de meia vara. Aquele caminho vai bastante comprido, e caminho de São Tomé chamam-no as gentes por ali moradoras. Os nossos filhos também declaram que aquele caminho era assim chamado". O texto vem junto com o original impresso em guarani, e este, assim como o manuscrito, existe na Biblioteca Nacional.

Fontes:
Almeida, Aluísio de. "O lendário peabiru". O Estado de São Paulo. São Paulo, 20 de junho de 1948. Disponível em http://www.jangadabrasil.com.br/revista/julho92/al92007a.asp
Imagem = http://www.gilsoncamargo.com.br

Contos de Sempre (Os Seis Companheiros Invencíveis)


Era uma vez um homem que tinha muita habilidade para tudo: sentou praça, serviu o rei e, quando a guerra acabou, o rei mandou-o embora e deu-lhe dois vinténs para as despesas da viagem. O homem não gostou do presente, e protestou, no caso de encontrar quem o ajudasse, vingar-se do rei, que fora tão ingrato para ele.

Quando ia andando, viu no meio de uma grande mata um homem que arrancava árvores, como quem arranca cebolas.

- Ó homem! Queres vir daí comigo? – perguntou-lhe o soldado.

- Com a melhor das vontades, mas primeiro deixa-me levar este feixezito de lenha a minha mãe.

E pegando em cinco árvores, atou-as, pô-las às costas e partiu.

- Olha, nós dois havemos de conseguir tudo.

Foram andando, andando, e encontraram um caçador, de joelhos, com a espingarda apontada.

- O que estás a fazer aí, caçador?

- O que estou fazendo? Daqui a duas léguas está um mosquito numa folha de carvalho! Quero ver se lhe meto um grão de chumbo no olho esquerdo.

- Anda daí, caçador, nós três havemos de conseguir tudo.

Foram andando, andando, e chegaram a uns moinhos que se moviam muito depressa. Mas o que era melhor é que não havia vento.

O soldado observou:

- Ora esta! Não faz vento, e os moinhos andam.

E nisto foram andando, até que encontraram um homem em cima de uma árvore. Tapava com uma das mãos uma venta e assoprava pela outra venta.

- Que diacho estás tu aí a fazer, não me dirás? - perguntou o soldado.

- A dez léguas daqui há sete moinhos: como vês, sou eu que os faço andar com o sopro da minha venta esquerda.

- Anda daí, meu rapaz, nós quatro havemos de conseguir tudo.

O homem desceu e foi ter com os três. Foram andando, andando, quando deram com um indivíduo que estava firmado numa perna só, tendo a outra no chão, ao seu lado.

- Aqui está um maganão que quer com certeza descansar - notou o soldado.

- Corro muito - respondeu o tal indivíduo -, e para não correr tanto, desatarraxei a outra perna. Quando tenho ambas as pernas, corro mais depressa do que as andorinhas voam.

- Que me dizes?

- Anda daí, nós cinco conseguiremos tudo.

Foram andando, andando, quando no meio do caminho encontraram um indivíduo que tinha o chapéu inclinado sobre uma orelha.

- Salvo o devido respeito, meu caro senhor, - disse o soldado - parece-me que podia pôr o chapéu de um outro modo.

- Nessa é que eu não caio, meu amigo; quando ponho o chapéu direito na cabeça, faz um frio tal que os pássaros caem mortos, gelados, no chão.

- Anda daí, homem, nós seis havemos de conseguir tudo.

Foram andando, andando, até que chegaram a uma cidade, onde o rei anunciava que, se houvesse alguém que vencesse na carreira sua filha, receberia em prémio a mão da princesa, mas que se fosse vencido era degolado.

O soldado foi ter com o rei, e disse-lhe que tinha um criado que estava pronto para correr com a princesa.

O rei respondeu:

- Pois sim, mas olha que, se for vencido, as cabeças de vocês ambos são cortadas.

O soldado aceitou, e ordenou ao andarilho que atarraxasse a perna e que não se deixasse vencer.

A aposta era que seria vencedor o que trouxesse primeiro uma bilha de água de uma fonte que havia dali a uma légua.

A princesa e o andarilho receberam cada um a sua bilha, e partiram ao mesmo tempo. Ainda bem a princesa não tinha dado dois passos, e já o diacho do homem se perdia de vista. Chegou à fonte, encheu a bilha, e vinha já de volta, quando no meio do caminho lhe dá o sono; pôs a bilha no chão, e deitou-se. Pegou porém num crânio de cavalo e encostou nele a cabeça, julgando que a dureza do travesseiro o não deixaria dormir muito.

A princesa, que corria como outra qualquer pessoa, chegara à fonte, enchera a bilha e vinha já de volta, quando deu com o seu rival que estava ferrado num profundo sono.

- Bem, tenho o inimigo em minhas mãos!

E esvaziando a bilha do dorminhoco, pôs-se a caminho. Mas o caçador, que estava no alto de um castelo, vira tudo.

- Nada! A princesa não levará a melhor.

E apontando a espingarda, fez fogo e quebrou, sem fazer mal ao que dormia, o crânio do cavalo que lhe servia de travesseiro.

O homem acorda, dá com a bilha esvaziada, e vê que a princesa levava já uma grande distância.

Não perdeu o ânimo, voltou à fonte, encheu a bilha, e chegou a vencer a princesa.

- Até que enfim! - disse o andarilho. - Isto é que eu chamo andar e mexer as pernas.

O rei e a filha estavam furiosos. O vencedor não passava de um miserável soldado com baixa; resolveram dar cabo dele e dos cinco que o acompanhavam.

- Tenho um meio, um bom meio, verás. Não escaparão da que lhes vou preparar!

E com o pretexto de lhes querer dar um banquete, fê-los entrar num quarto cujo soalho, paredes e portas eram de ferro.

No meio do quarto estava uma mesa coberta de pastéis, doces e frutas.

- Entrem, entrem, e comam até fartar!

E assim que os viu dentro foi-se à chave e fechou-os por fora. Depois ordenou ao cozinheiro que acendesse um fogão debaixo daquela sala, até que o ferro ficasse vermelho.

Os seis companheiros, que estavam comendo e bebendo, começaram a sentir calor: ao princípio imaginaram que era do comer, mas o calor ia cada vez a mais, até que eles levantaram-se e foram até à porta para a abrirem. Estava a porta fechada por fora. Viram logo que o rei lhes queria fazer alguma das suas.

- Deixá-lo lá - observou o homem do chapéu. - Vou já fazer um frio tal, que não haverá calor que possa com ele.

E pôs o chapéu direito na cabeça. O calor desapareceu logo e os pratos gelaram na mesa.

Duas horas depois, o rei, imaginando que os homens estavam cozidos e recozidos, mandou abrir a porta, e veio ele mesmo em pessoa ver a sua obra. Achou os seis companheiros contentes e felizes, e dizendo que queriam sair dali para se aquecerem um pouco, tal era o frio que havia dentro daquela sala.

O rei, furioso, foi ter com o cozinheiro e perguntou-lhe porque não cumprira as suas ordens.

- Real senhor, saiba vossa majestade que cumpri. Aqueci o ferro até ele ficar vermelho.

O rei foi ver e reconheceu que o cozinheiro não mentia. Não sabendo porém como desfazer-se daqueles hóspedes tão incómodos, mandou chamar o soldado e falou assim:

- Se prescindires dos direitos que tens sobre minha filha, dar-te-ei tanto ouro quanto quiseres.

- Aceito, meu senhor, aceito, mas há-de dar-me tanto quanto puder levar um dos meus criados: nesse caso não exijo a mão da princesa.

O rei bateu as palmas de contente; o soldado disse que havia de vir buscar o dinheiro dentro de quinze dias. No entretanto reuniu os alfaiates que havia em todo o reino e encomendou-lhes um grande saco. Quando aquele saco, que levara quinze dias a coser por um exército de alfaiates, estava pronto, o valentão que arrancava árvores, como quem arranca cebolas, pegou nele às costas e apresentou-se no palácio.

O rei perguntou que espécie de homem era aquele valentão que trazia às costas um saco tão grande... Quando soube quem era, ficou desesperado por ver que dinheirão caberia ali dentro...

Mandou vir um tonel que fazia suar os dezasseis homens que o trouxeram: o valentão pegou no tonel com uma só mão e, metendo-o no saco, perguntou:

- Então é só isto?

O rei mandou buscar todos os seus tesouros, que foram direitinhos para o fundo do saco.

- Mais! Mais! Mais! - gritava o homem.

O rei mandou buscar setecentas carruagens carregadas de ouro e o valentão meteu-as, assim como os bois que as puxavam, dentro do enorme saco.

- Enfim, o melhor é ir metendo a esmo tudo o que eu apanhar ao alcance da mão!

E foi metendo, metendo tudo!

- O saco ainda não está cheio, mas afinal fechemo-lo assim mesmo.

E atando com uma grande corda a boca do saco, atirou-o para os ombros e partiu.

Assim que o rei viu que todas as suas riquezas iam às costas de um só homem, mandou reunir toda a sua cavalaria e deu ordem para que prendessem os seis companheiros, e que lhes tirassem o saco. Os regimentos abalaram atrás dos fugitivos.

- Alto aí! Alto aí! Senão, sereis esquartejados - gritaram os comandantes da tropa.

- O que é que vossemecês dizem? - tornou o homem que soprava pela venta -nós esquartejados! Esperem que eu vos ensino a todos!

E tirando a mão da venta, soprou, soprou, e não lhes digo nada!, soldados, cavalos, comandantes, tudo foi pelos ares.

Um velho general pediu misericórdia e o homem deixou de soprar, não sem lhe dizer:

- Vai dizer ao teu rei que não mande mais tropa contra a gente, que eu atiro-a toda por esses ares...

O rei, quando tal soube, redarguiu:
- Deixá-los lá, parece que aqueles homens são feiticeiros. Os seis companheiros dividiram todas aquelas riquezas, casaram-se, tiveram muitos filhos e foram muito felizes até à hora da morte.

Fonte:
José António Gomes e Isabel Ramalhete (Seleção e coordenação). Contos de Sempre. Porto/Portugal: Porto Editora, Setembro de 2004.

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 414)

Uma Trova Nacional

Teve um infarto na cama
a noiva que é tão frajola,
ao ver que, em vez do pijama,
o noivo pôs camisola.
–MAURÍCIO FRIEDRICH/PR–

Uma Trova Potiguar

A mulher, belo animal,
a muitas coisas se atreve,
até o fio dental;
ela enfia onde não deve...
–ZÉ DE SOUZA/RN–

Uma Trova Premiada

2005 - Belém/PA
Tema: DÍVIDA - Venc.

Devo-te oitenta! Mas quero
pagar-te em nota de cem...
- Me empresta mais vinte! Espero
devolver no mês que vem!
–RENATO ALVES/RJ–

Uma Trova de Ademar


O esquecimento é meu drama!
Estou vendo a coisa preta...
Pus o pijama na cama
e fui dormir na gaveta.
–ADEMAR MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


"Abre , meu bem, a janela,
me esquenta que a neve cai..."
Quem abriu foi a mãe dela,
quem me esquentou foi o pai!
–APRYGIO NOGUEIRA/MG–

Estrofe do Dia


Eu sozinho, corri o mundo inteiro
a procura de grandes aventuras
sem temer o perigo e as lonjuras
ganhei fama de grande aventureiro,
na muralha da china eu fui pedreiro,
trabalhei como ourives em Omã,
fui soldado na guerra do Irã
detonando granada, bomba e traque;
viajando nas terras do Iraque
galopei no cavalo de Sadan.
–HÉLIO CRISANTO/RN–

Soneto do Dia

Quem com Ferro Fere...

–FRANCISCO MACEDO/RN–


Chicó bravo macho e voraz garanhão,
mulher deu bobeira, o Chicó faturava,
viúva, solteira, nenhuma escapava,
bonita, charmosa, brechó ou “canhão”.

A sua mulher em total solidão,
sabia de tudo ficava calada,
de tanto sofrer e de ser corneada,
tomou certo dia a melhor decisão.

O grande Chicó que vivia de festa,
danou-se a sentir a coceira na testa...
Ele não sabia da lei do retorno.

A lei não perdoa e Chicó, garanhão,
tornou-se uma vítima do Ricardão,
de tanto trair, tanto mais se fez corno!

Fonte:
Textos enviados pelo Autor

Cecília Meirelles (Livro de Poemas)


CANÇÃO

Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
- depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar

Minhas mãos ainda estão molhadas
do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre de meus dedos
colore as areias desertas.

O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo
meu sonho, dentro de um navio...

Chorarei quanto for preciso,
para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo
e o meu sonho desapareça.

Depois, tudo estará perfeito;
praia lisa, águas ordenadas,
meus olhos secos como pedras
e as minhas duas mãos quebradas.

MOTIVO

Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
Sou poeta.

Irmão das coisas fugidias
Não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.

Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno e asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.

CANÇÃO I

Nunca eu tivera querido
dizer palavra tão louca:
bateu-me o vento na boca,
e depois no teu ouvido.
Levou somente a palavra
deixou ficar o sentido.

O sentido está guardado
no rosto com que te miro,
neste perdido suspiro
que te segue alucinado,
no meu sorriso suspenso
como um beijo malogrado.

Nunca ninguém viu ninguém
que o amor pusesse tão triste.
Essa tristeza não viste,
e eu sei que ela se vê bem...
Só que aquele mesmo vento
fechou teus olhos, também...

DESTINO

Pastora de nuvens, fui posta a serviço
por uma campina desamparada
que não principia nem também termina,
e onde nunca é noite e nunca madrugada.
(Pastores da terra, vós tendes sossego,
que olhais para o sol e encontrais direção.
Sabeis quando é tarde, sabeis quando é cedo.
Eu, não.)

Pastora de nuvens, por muito que espere,
não há quem me explique meu vário rebanho.
Perdida atrás dele na planície aérea,
não sei se o conduzo, não sei se o acompanho.
(Pastores da terra, que saltais abismos,
nunca entendereis a minha condição.
Pensais que há firmezas, pensais que há limites.
Eu, não.)

Pastora de nuvens, cada luz colore
meu canto e meu gado de tintas diversas.
Por todos os lados o vento revolve
os velos instáveis das reses dispersas.
(Pastores da terra, de certeiros olhos,
como é tão serena a vossa ocupação!
Tendes sempre o início da sombra que foge...
Eu, não.)

Pastora de nuvens, não paro nem durmo
neste móvel prado, sem noite e sem dia.
Estrelas e luas que jorram, deslumbram
o gado inconstante que se me extravia.
(Pastores da terra, debaixo de folhas
que entornam frescura num plácido chão,
Sabeis onde pousam ternuras e sonos.
Eu, não.)

Pastora de nuvens, esqueceu-me o rosto
do dono das reses, do dono do prado.
E às vezes parece que dizem meu nome,
que me andam seguindo, não sei por que lado.
(Pastores da terra, que vedes pessoas
sem serem apenas de imaginação,
podeis encontrar-vos, falar tanta coisa!
Eu, não.)

Pastora de nuvens, com a face deserta,
sigo atrás de formas com feitios falsos,
queimando vigílias na planície eterna
que gira debaixo dos meus pés descalços.
(Pastores da terra, tereis um salário,
e andará por bailes vosso coração.
Dormireis um dia como pedras suaves.
Eu, não.)

A DOCE CANÇÃO
A Christina Christie

Pus-me a cantar minha pena
com uma palavra tão doce,
de maneira tão serena,
que até Deus pensou que fosse
felicidade - e não pena.

Anjos de lira dourada
debruçaram-se da altura.
Não houve, no chão, criatura
de que eu não fosse invejada,
pela minha voz tão pura.

Acordei a quem dormia,
fiz suspirarem defuntos.
Um arco-íris de alegria
da minha boca se erguia
pondo o sonho e a vida juntos.

O mistério do meu canto,
Deus não soube, tu não viste.
Prodígio imenso do pranto:
- todos perdidos de encanto,
só eu morrendo de triste!

Por assim tão docemente
meu mal transformar em verso,
oxalá Deus não o ausente,
para trazer o Universo
de pólo a pólo contente!

BALADA DAS DEZ BAILARINAS DO CASSINO


Dez bailarinas deslizam
por um chão de espelho.
Têm corpos egípcios com placas douradas,
pálpebras azuis e dedos vermelhos.
Levantam véus brancos, de ingênuos aromas,
e dobram amarelos joelhos.

Andam as dez bailarinas
sem voz, em redor das mesas.
Há mãos sobre facas, dentes sobre flores
e com os charutos toldam as luzes acesas.
Entre a música e a dança escorre
uma sedosa escada de vileza.

As dez bailarinas avançam
como gafanhotos perdidos.
Avançam, recuam, na sala compacta,
empurrando olhares e arranhando o ruído.
Tão nuas se sentem que já vão cobertas
de imaginários, chorosos vestidos.

A dez bailarinas escondem
nos cílios verdes as pupilas.
Em seus quadris fosforescentes,
passa uma faixa de morte tranqüila.
Como quem leva para a terra um filho morto,
levam seu próprio corpo, que baila e cintila.

Os homens gordos olham com um tédio enorme
as dez bailarinas tão frias.
Pobres serpentes sem luxúria,
que são crianças, durante o dia.
Dez anjos anêmicos, de axilas profundas,
embalsamados de melancolia.

Vão perpassando como dez múmias,
as bailarinas fatigadas.
Ramo de nardos inclinando flores
azuis, brancas, verdes, douradas.
Dez mães chorariam, se vissem
as bailarinas de mãos dadas.

Eduardo Frieiro (O Mameluco Boaventura)


O romance O mameluco Boaventura, publicado em 1929, de Eduardo Frieiro, remete ao passado de Minas e busca reviver a turbulenta civilização do ouro. Em meio a esse contexto, a vida sentimental do mameluco Fernão Boaventura conduz a narrativa e se mescla aos episódios de conquistas e riquezas dos arraiais do ouro.

Neste romance de fndo histórico, Frieiro desenvolve uma história em que a ação é o elemento forte da narrativa. Os episódios são recortados de forma a apresentar um painel típico do século XVIII nas Minas Gerais, na época do governo do Conde de Assumar.

Em O mameluco Boaventura, a situação do Brasil-Colônia que abrange as grandes revoltas em torno de personagens fictícias, faz a História confundir-se com a ficção e as personagens com o real. Em meio a isso, desenvolve-se a história de um herói – Boaventura – que passa pela turbulência da vida, perde sua amada e se transforma em seguidor de um caminho que transcende a sua essência.

Não faltam ao enredo ingredientes resgatados do Romantismo. A heroína, que tem a morte como única saída, é um exemplo entre vários da formulação romântica tão ao gosto dos escritores brasileiros do século passado. O romance de Frieiro, no entanto, é comedido. A situação do casal que enreda o romance é mais um pretexto para sediar o ambiente das Minas Gerais do que um drama de dimensões desproporcionais, que transborda sentimentalismos. O tratamento às situações heróicas acontece num plano mais realista do que propriamente romântico, ou seja, não há o derramamento sentimentalista que alguns autores românticos conferiam ás suas personagens. Recriar um passado histórico e trazê-lo como enredo é, também, uma reminescência romântica que encontramos neste romance. Claro está que o enfoque é diferente; não encontramos na trama de Frieiro aquele ufanismo próprio dos românticos.

Outras cenas, ao longo da narrativa, resgatam traços fortes do Realismo/Naturalismo, como por exemplo, o espancamento do escravo Eliezer, descrito com todos os detalhes cruéis. Ou, então, a descrição detalhada e chocante da cafusa nanica e corcovada Rita.

Também as pequenas mostras do caráter de algumas personagens denotam um certo tom realista na obra de Frieiro. Não se quer dizer com isso que O mameluco Boaventura seja um exemplo da obra Realista; ele está filiado ao Modernismo, dada a data de sua primeira publicação. Desponta no romance de Frieiro, acima de qualquer julgamento crítico ou filiação a uma determinada estética, uma pesquisa séria e competente acerca do tema tratado e do engedramento da linguagem que caracteriza o tempo tratado nesse texto, acerca do período colonial mineiro.

Dois momentos históricos são recriados por Frieiro nesse romance. O primeiro, de menores proporções no enredo, foi o conflito emboaba de 1709, de que o narrador dá notícia ao contar sobre a corrida dos primeiros reinícolas às Minas do Ouro.

O segundo momento histórico se deu por volta de 1920, “quando os levantes de mineiros refletiam a insatisfação ante o fisco”. Frieiro recria o levante fazendo contracenar as personalidades que encabeçaram o episódio, como o Conde de Assumar e seus dragões, e as personagens ficcionais, como o mameluco Boaventura e seu séqüito, por exemplo.

Sobressai, no romance como na História, a ferocidade de D. Pedro de Almeida, o Conde de Assumar, governador da Capitania. A seqüência do comando de Assumar e o destino dos rebeldes não está no enredo; o curso da história muda, com a mudança de Boaventura. É a ele que acompanhamos até o final da narrativa, contemplando o momento de sua tomada de consciência diante dos fatos que fizeram dele a personagem forte, atrevida e rebelde.

Toda a trama que envolve Fernão Boaventura é relatada por um narrador em terceira pessoa. Ele vai contar uma história acontecida num tempo remoto, distanciando, assim, o tempo da enunciação do tempo do enunciado. O romance de Frieiro recria o cenário colonial brasileiro pondo-nos em contato com a linguagem da época, sem com isso deixar a narrativa pedante ou ilegível. O seu vocabulário, de admirável precisão nas descrições e de louvável contemporaneidade nos diálogos, dá-nos a impressão de que defrontamos um escritor que se deixa absorver pelo assunto que versa”.

O romance de Frieiro, apesar da época de publicação (1929), muito pouco, ou quase nada, tem das primeiras tendências modernistas. Frieiro era, na verdade um avesso ao movimento modernista, como se verá a seguir. O mameluco Boaventura pode ser considerado um romance linear, em que não se constatam novidades narrativas. Isso não quer dizer que não tenha sua expressividade.

O autor aborda um tema regional de pouca monta no contexto histórico brasileiro, visto a pouca historicidade acerca dos levantes nas Minas do Ouro em nossa produção didática. Essa temática, então, é um dos atrativos do romance de Frieiro.

Personagens

Fernão Boaventura: Filho de Caetano Boaventura e uma cunha (daí o nome de mameluco), era um rapaz valentão e atrevido que ficara rico com a herança deixada pelo pai. Fernão fora educado no colégio de jesuítas, em São Paulo, onde “fez o currículo de humanidades e freqüentou lições de artes, teologia e casos de consciência”. Mas não tinha nada a ver com aquilo; a vida eclesiástica não combinava com seu temperamento ardiloso. Está sempre acompanhado de seu capanga Chicão, um negro forte e corajoso. Apaixona-se por Violante, a filha de seu inimigo Vilarinho, o Trasmontano. Rapta a jovem, mas não alcança o casamento pois tem de fugir à perseguição do pai de Violante e das forças do governo, por ter-se aliado aos amotinados do levante de Pitangui. Adoece mortalmente, mas é salvo por seu padrinho, o Frei Tiburciano, que, além de curá-lo, abre-lhe as portas do evangelho. Termina a história a caminho do convento beneditino, no Rio de Janeiro, onde irá filiar-se.

Caetano Boaventura: Pai de Fernão. Veio de Taubaté atrás do ouro das Minas. Ficou riquíssimo com as datas metalíferas que adquiriu às margens do Ribeirão do Carmo.

Frei Tiburciano de São José: Frade capuchinho, padrinho de crisma de Fernão. Tinha seus cinqüenta anos, era robusto e bem disposto. Em sua face redonda e avermelhada pendurava-se uns óculos. Era um homem íntegro, considerado modelo de bom sacerdote.

José Gomes Vilarinho: Era de uma família de Trás-os-Montes, o que lhe conferia a alcunha de Trasmontano. Enriquecera rapidamente com as rendosas lavras minerais e fazendas de criação nos Currais da Bahia, sem falar no comércio de aguardente, fume e carne, que lhe rendiam bons lucros. Morava num casarão assombrado no Arraial de Baixo. Era casado pela segunda vez com D. Maria Joaquina, com quem não tivera filhos. Era um homem rígido e formal, incapaz de alguma cordialidade. Tratava a mulher cerimoniosamente; no fundo, desprezava-a por sua esterilidade sem remédio.

Violante: Filha do Trasmontano e enamorada de Boaventura. Dama formosa, delicada, recém-vinda da Bahia, onde morava com a avó. Era filha do primeiro casamento de seu pai. Pesava sobre si a ameaça de um enorme sacrifício. Sei pai, após sua fuga com Boaventura, jurava encerra-la num convento da Bahia. Isso não chegou a acontecer, porque Violante morre, nos seus poucos vinte anos, de paixão e penúria.

Andresa: Era a mucama de Violante. Era uma mulata ardente, bonita e astuta. Namorava com Eliezer, com quem se encontrava às escondidas do patrão. Fiel à sua Violante, Andresa é a intermediária do romance da moça e Boaventura. Foge com a sinhazinha e Fernão, quando o rapaz rapta a jovem amada.

Eliezer: Escravo fiel de Boaventura. Fora flagrado em seus amores com Andresa e pagou caro por isso. Levou uma surra enorme dos homens do Trasmontano. A pedido de seu patrão, combina com Andresa um plano para ajudar o namoro proibido de Fernão e Violante, não sem antes consultar o feiticeiro Manuel Oxalá. Eliezer era vivo e ladino; gostava de tocar sua pequena flauta de bambu, com que fazia serenatas a Andresa.

Manuel Oxalá: Era um preto ancião, já caquético, de cabelos e barba brancos. A ele recorreu Eliezer para falar sobre a missão de que fora encarregado. Queria saber se seria novamente castigado. Eliezer entregou a ele os galos e o bornal das oferendas para o sacrifício, mas isso não bastara. O velho bruxo queria também a recompensa adiantada do trabalho que ia fazer, o que explicou direitinho fazendo o gesto universal do polegar e o indicador da mão direita que exprime dinheiro. Depois de receber as moedas do rapaz, o negro seguiu o ritual e, por fim, tranqüilizou Eliezer.

Alf. Suzarte: Rapaz bem apessoado, alferes de auxiliares do terço da Vila-Real de Sabará. Era um sujeito sem escrúpulos, de quem se contavam histórias bem escabrosas. Certa vez envolvera-se com a amaziada de um negociante baiano, com quem fugira. Era caso de morte publicamente executada, mas o alferes foi se esconder junto aos homens de seu terço e nada lhe aconteceu. Segundo uma crítica tendenciosa do Frei Tiburciano, Suzarte gostava de se poluir com escravas negras. Estava encantado por Violante, a quem pretendia corrigir, com o tempo, os calundus de sinhazinha caprichosa. Morreu nas mãos de Fernão, por época do levante de Pitangui.

D. Pedro de Almeida, o Conde de Assumar: Era o governador da Capitania de São Paulo e Minas (1919). Era ex-comandante do exército português na guerra da sucessão de Espanha. Descendia da ilustre estirpe dos Almeidas. Tinha pouco mais de trinta anos. Seu governo foi austero e baseava-se na seguinte tática: dividir para reinar. Na prática, isso significava trocar força e prestígio por favores. Ordenou rigorosa devassa e o pronunciamento dos cabeças nos levantes ocorridos nas Minas.

Dona Querubina: Era uma viúva que tinha uma pensão e uma loja de comidas e bebidas nos campos da Cachoeira. Por duas vezes Fernão esteve na pensão de D. Querubina. Uma, quando fugia da Vila-Rica por ocasião do desacato que fez ao escrivão, quando fora tomar satisfação sobre as terras suas que passaram às mãos do Trasmontano. Outra, quando foge de Pitangui, após o fracassado levante. É na pensão de D. Querubina que Fernão se restabelece e se introniza nos aprendizados divinos.

Além dessas personagens, figuram no romance o Figueirinhas, mercador de escravos e bugingangas; Nicota e Josefa, serviçais de D. Querubina; o Taturana, capanga de Vilarinho; o Ouvidor; Martinha, mulher de André Baracho; Manuel Nunes Dias, o famigerado caudilho aclamado ditador pelos Emboabas; Antônio Pereira, o português que comprara por oitocentas oitavas de ouro, as casas, as ferramentas e as terras do último morador do extinto Arraial do Carmo; o frade suro em cuja tonsura Fernão urinou, por vingança na pessoa errada, e que raptou a Nicota; e a feia Rita, a nova serva da pensão.

Enredo

A narrativa tem início com a venda de um escravo a André Baracho, um bem sucedido comerciante estabelecido em Passagem, a meio do caminho entre a Vila do Carmo e a Vila-Rica. O vendedor é Figueirinha, um mercador do Reino acostumado a abastecer a região com mercadorias vindas por navios. Baracho menosprezava a mercadoria, o mercador valorizava seu produto. O negócio se fecha nas duzentas oitavas, ambos os mercadores sabendo que fizeram um bom negócio.

André Baracho, é um imigrante português bem-sucedido, com sua loja de regatão, suas lavras de ouro, roças de milho e por volta de 1706, com os primeiros reinícolas que vinham atraídos pela fama das descobertas do ouro nos sertões das Minas Gerais.

Chegou pobre; o que tinha de seu trazia às costas. Era, entretanto, ambicioso e meteu-se em especulações de toda sorte: “mercadejava escravos, barganhava animais, receptava e contrabandeava o ouro”. A única característica que manteve foi a rudeza de seus hábitos; era um sujeito grosseirão. Bom negociante, andou a apossar-se de umas jazidas que eram de direito de Fernão Boaventura, herdadas de seu falecido pai. Baracho, sentindo que poderia ter complicações com o mameluco, transferiu as terras recém-adquiridas para o Transmontano, numa transação, certamente, ilegal.

Caetano Boaventura, paulista de Taubaté, chegou às Minas como todos os outros aventureiros, logo aos primeiros rumores da descoberta do ouro. De início, explorou o Ribeirão do Carmo e a Serra do Ouro-Preto, cujo ouro propiciou-lhes bens e riqueza.

Caetano era viúvo e seu único descendente era seu filho Fernão, que teve como alcunha carijó. Quando Caetano Boaventura morreu, em 1715, o jovem mameluco herdou todos os seus bens. Não tardou que Fernão fosse tomar satisfação da negociata de Baracho. Fernão Boaventura era um jovem temido nas Minas, onde “só a violência e o estrondo das armas impunham respeito”. Acompanhado de seu grupo, foi ter às terras do Batatal, onde tinha um lavradio de ouro. Mandou enxotar as escravas de Baracho, que lá estavam com o pretexto de vender aguardente, doces e outras comidas. Na verdade, as escravas serviam para entregar ao receptador o ouro roubado pelos escravos empregados nas minas. Em seguida, Fernão seguiu para as terras adquiridas recentemente pelo Transmontano e pôs para correr os que ali trabalhavam na extração.

Fernão e seu grupo continuaram seu caminho para Vila-Rica, a fim de resolver a pendência das terras que passaram para o Transmontano por intermédio do escrivão local. Chegaram sem muito alarido, já que Vila-Rica era um território dominado quase que exclusivamente pelos representates do rei. Os paulistas haviam perdido esse território para os reinícolas, que souberam explorar as minas, consideradas esgotadas pelos paulistas, com técnicas em uso nas colônias espanholas. Com isso, reativaram a extração. Assim surgiu o arraial do Ouro-Preto, “núcleo da futura Vila-Rica, a mais opulenta e povoada da Capitania.” A descrição de Vila-Rica é bastante precisa.

Dando sequência à narrativa, o episódio do suposto padre Sinfrônio destaca um acontecimento que parece comum à época: o rapto de uma escrava para que servisse a um clérigo. O caso é que Fernão e seu grupo buscavam pouso na casa de Dona Querubina. Lá, avistaram um padre, que confundiram com o tal Sinfrônio de quem ouviram a história sobre ter roubado uma mulata escrava do velho Boaventura. Quiseram, então, vingar o acontecido. A vingança acertou a pessoa errada e o bando dispensou o pouso da viúva.

Outro flagrante dos costumes de então aconteceu com Eliezer, um escravo de Boaventura que namorava Andressa, a mucama de Violante, filha de José Gomes Vilarinho, o Transmontano. O casal foi descoberto e Transmontano mandou dar um corretivo no rapaz, aproveitando a ausência de Boaventura. A surra foi grande. Quando soube do acontecido, Fernão invadiu a casa do Transmontano para uma vingança. Enquanto afrontava o dono da casa, o grupo de Fernão tirava a forra na senzala.

A cena serviu para a apresentação da jovem Violante, que intercedeu para que a violência acabasse. Seu pedido impressionou Fernão, que atendeu à súplica da jovem. Daí em diante, Fernão Boaventura começou a cortejar a moça, à revelia de Vilarinho e de D. Maria Joaquina, madrasta da jovem.

José Gomes Vilarinho chegara ao Brasil ainda jovem, recomendado a um rico mercador da Bahia, para quem trabalhou como caixeiro. Casou-se com uma das filhas do mercador, com quem teve uma única filha, ficou viúvo, mudou-se para as Gerais para negociar por conta própria, contraiu segundas núpcias com uma paulista, que não lhe dera filhos. Morava no Arraial de Baixo, na vila do Ribeirão do Carmo.

Após o pedido de Violante, a respeito da invasão de Boaventura e seu grupo em terras do Transmontano, Fernão tornou-se outra pessoa. Enamorou-se.

Naquela noite, Fernão dormiu mal. A moça Violante não lhe saía do pensamento. Aquele pedido tão doce inaugurou um desejo enorme no peito do rapaz. Precisava revê-la! Mas como, naquele vilarejo em que as poucas famílias viviam reclusas em suas propriedades, distantes do movimento? A família de Violante, apenas raramente, aparecia na missa dominical da matriz do Carmo.

Fernão esperou cinco longos dias até o evento. Arrumou-se com esmero, esperando fazer boa figura. Aguardou no adito da igreja a chegada da família Vilarinho. Com ares de fidalgo, Fernão faz uma reverência discreta à passagem da moça, o que deixou o Trasmontano contrariado. Violante só percebeu a presença do rapaz à saída; olhou-o com seus olhos cinzentos e pareceu reconhecê-lo. Poucas vezes teve o mameluco a mesma oportunidade; percebendo a insistência do rapaz, o Transmontano decidiu não retornar à missa do Carmo. Fernão esperava em vão. Estava enfeitiçado por aquela menina.

No dia 19 de abril de 1719, D. Pedro de Almeida, o Conde de Assumar, ofereceu um sarau à condessa pelo seu aniversário. Estavam presentes as personalidades mais consideráveis da Vila do Carmo e da Vila-Rica. Entre eles, a família Vilarinho. Estava também, para contragosto do Transmontano, o jovem Boaventura. Fora levado por seu padrinho, o Frei Tiburciano de São José, homem de letras e santidade. Estava presente, também, para desventura de Fernão, o jovem e bem apessoado alferes Suzarte.

A conversa continuava, agora sobre o governo do Conde de Assumar. Nos dizeres dos dois, era ele um homem austero, disciplinador, de carreira feita nas armas. Era apoiado pelos paulistas, com exceção da cobrança dos quintos, contra o que toda gente se recentia.

Frei Tiburciano aproveitou o ensejo para cobrar do conde o bispado no Carmo. Nova preleção se estendeu, desta vez partindo do próprio Conde de Assumar. Dizia ele que “os frades não querem também que os povos destas Minas tenham superiores”. Reclamou que os religiosos se sentiam desabrigados a contribuir com as taxas – que ele chamava de obrigações – para a Coroa. Frei Tiburciano terminou a conversa, levantando uma questão polêmica: a troca de favores entre o governo e a Igreja.

Os festejos continuaram, com danças e conversas. Instigada pelos presentes, Violante cantou trovas e xácaras, acompanhada pelo Alferes. Boaventura havia se prontificado a acompanhá-la na viola, mas ela ignorou a presteza do rapaz. Após sua apresentação, Fernão tomou da viola e anunciou que ia cantar. Cantou as primeiras estrofes da cantiga da Menina fermosa, cujos versos reclamavam do temperamento intempestuoso de uma dama tão formosa. Lançou um olhar para Violante e continuou a cantiga, que nos versos era a resposta da moça fermosa, mas que tomava o significado de uma resposta da própria Violante.

O governador interrompeu oportunamente a cantoria e anunciou uma próxima festa para o ano, recepcionada por um rico minerador. Fernão aproveitou o sussurro geral e disse à Violante: “Adoro-a, Violante...” A revelação deixou a moça ruborizada e lhe trouxe lembrança que não conseguiu definir. Veio à sua cabeça a cena do insulto a seu pai, e a sua indecisão em posicionar-se do lado do pai ou do rapaz. Gostaria de odiar Fernão, mas seu coração não consentia nisso. Chamava-lhe a atenção o olhar altaneiro e decidido do rapaz. Agradava-lhe a fisionomia do jovem, seu porte, sua pele morena. Recordou todas as atitudes do rapaz para com ela, com certo prazer. Lembrou-se de que aguardava ansiosamente cada domingo, até que o pai não mais a levasse à missa do Carmo.

Na saída da festa, Fernão arranjou um jeito de segurar demoradamente a mão que Violante lhe estendeu. Mais adiante, trocaram um olhar que queria dizer muitas coisas ao seu coração.

Fernão não ficava um só instante sem maquinar algum modo de falar com a moça. Era cada vez mais impossível saber de Violante, a moça não saía para nada, ninguém tinha notícias dela. Fernão ficava circulando o casarão dos Vilarinho, em vão. Teve então uma idéia. Pediu a Eliezer que reatasse com Andresa, para que a moça pudesse interceder por ele com Violante. Em troca, Fernão prometeu a alforria do escravo. Eliezer, apesar do medo que sentia ao lembrar-se do castigo que sofrera, acabou por concordar. Antes, porém, consultou o Manuel Oxalá, que depois de muito ritual e trabalhos de candomblé, disse que Eliezer podia ficar tranqüilo que tudo iria correr bem. Assim foi. Andresa passou a cumprir sua função de recadeira muito direitinho. Dizia à Violante o quanto Boaventura gostava dela e nem ligava às ameaças da moça de ir contar ao pai aquela travessura. Aos poucos, o rapaz Fernão era o assunto constante das duas.

Todos os dias, Fernão Boaventura passava com seu cavalo nas imediações do casario. Parava um pouco em frente à janela de Violante, que o espreitava por trás das cortinas, para não ser vista por ele. Inteirado disso, todas as vezes Fernão tirava o chapéu em cumprimento e ia-se embora, muito satisfeito. Violante era reservada, achava aquilo de gostar do mameluco uma loucura. Mas, como resistir à conquista daquele rapaz ousado?

D. Maria Joaquina, a madrasta, desconfiava do comportamento da enteada. Tratou de conspirar um plano para casar Violante com algum rapaz digno da família. Veio-lhe à cabeça o rapaz Suzarte. Contou suas dúvidas sobre os sentimentos da moça para o Trasmontano, que ficou muito espantado.

Diante da argumentação de D. Maria Joaquina, que sugeriu o Suzarte como saída para o possível relacionamento de Violante e Fernão, o Trasmontano voltou a se acalmar. Afinal, “o alferes não é de todo mau.(…) Dizem que não é lá de muitos bons constumes…” Combinaram convidar o alferes para uma visita. O alferes logo percebeu o arranjo dos Vilarinho e gostou da idéia. Violante é que se mostrava distante; não escondia o desamor que tinha por Suzarte. Vilarinho resolveu que era preciso fazer aquele casamento o quanto antes.

No dia 16 de julho realizavam-se no Carmo grandes festas religiosas e profanas, em homenagem à padroeira da Vila. Havia missa, procissões e, em seguida, o melhor da festança: as cavalhadas, cujo enredo recriava os torneios entre Cristãos e Mouros, com o sabor das histórias de Carlos Magno e os doze pares de França, e se recompunha o rapto da Princesa Floripes.

Como era de se esperar, a princesa foi representada por Violante. Fernão usou as cores dos cavaleiros cristãos – em que fazia boa figura – e Suzarte as cores do bando mouro. Também era esperado que o jovem Boaventura aprontasse alguma com o alferes. De fato, o mameluco arranjou um jeito de emparelhar-se com o outro e fê-lo ir ao chão. A platéia vibrou como a façanha. Um dos rituais da cavalhada é um cavalheiro tirar a argolinha pendente de um arco e oferecê-la a alguém da platéia. Num arroubo, Fernão realizou a façanha e entregou, publicamente, o objeto da proeza à Violante. A moça ficou atônita, ruborizada, com receio do pai, mas colocou seu lencinho na ponta da lança que lhe trouxe a oferenda. Fernão deixou o picadeiro radiante de orgulho e felicidade.

Outra tarefa do evento era o rapto da donzela. É claro que Boaventura realizou o feito, para infelicidade do Trasmontano. Tudo foi tão rápido que ele nada pôde evitar. Novamente o público delirou.

Algum tempo depois da festa, Fernão foi ter uma conversa com o padrinho, o Frei Tiburciano. Abriu seu coração, contando de sua paixão pela filha do Vilarinho. O frei espantou-se muito da coragem e audácia do rapaz; logo se confortou, comentando que a moça estava de casamento marcado com o alferes. Fernão não escondeu sua surpresa. Os dois conversaram sobre o comportamento do Suzarte, que não era nada exemplar. Entre outros malfeitos, o alferes gostava de se envolver com uma outra escrava, o que aos olhos do frei e, certamente, de toda a gente branca do lugar, era considerado uma libertinagem, um ato vergonhoso. Desgostoso com a notícia do casamento e certo de que isso era contra os desejos de Violante, Boaventura afirmou que a moça seria dele, ou de mais ninguém.

Arma, então, um novo plano.

Aproveitando que o Vilarinho estava ausente, deu ordens para que fosse, dizer no casario que o Trasmontano fora atacado e estava em perigo. Diante do fato, os empregados do velho saíram em seu socorro, deixando Violante, a madrasta e Andresa sozinhas. Boaventura, então, pôde se aproximar da jovem Violante e, em presença de D. Maria Joaquina e da jovem assustada, disse a que vinha.

Violante deu dois passos à frente. A força irresistível daquele homem a arrebatara de vez. Diante da indignação da madrasta, Violante seguiu o homem que amava.

O jovem casal principiou sua jornada, acompanhados do grupo e Boaventura e da dedicada Andresa. Fernão decidiu que Violante só seria sua diante da bênção de Deus. No caminho, encontraram um grupo de caçadores de ouro. Estavam esmorecidos da luta infértil da cata do ouro. A estação não estava boa para aquele grupo. Um de seus negros já tinha fugido, outro morreu de febre, outro foi comido por uma onça. Boaventura disse a eles sobre a fartura de ouro em Cuiabá, e o grupo de animou. Pediram liçensa para acompanhar o bando de Fernão. Iriam até Pitangui, comprariam alguns escravos para engrossar o grupo e seguiriam para Cuiabá.

O velho Trasmontano, desesperado com o acontecido, jurou matar Boaventura. Queria mesmo que o mestiço tivesse mil vidas para acabar com todas elas, tamanha sua raiva. Organizou um bando de homens valentes e foi atrás do roubador da filha. Uma chuva repentina flagrou-os em meio à jornada, o que atrasou em um dia a busca do Trasmontano. Chegando a Pitangui, o velho pai ficou sabendo que a filha estava hospedada em casa de uma família paulista, amiga de Fernão. Ficou sabendo, também, que semanas atrás, houve um motim na vila por causa de um juiz que tinha vedado o comércio de aguardente. O povo de lá havia expulsado o tal juiz, sob ameaça de morte, caso quisesse continuar na vila. O conde de Assumar, ciente do caso, enviou para a vila o ouvidor e uma pequena tropa de dragões. Ao saberem das proporções do incidente, resolveram buscar reforços no Carmo. O chefe do motim contra o juiz, um truculento caudilho paulista, temendo um ataque, resolveu amotinar-se com seus sequazes duas léguas adiante da vila, local de fácil defesa.

Assim que soube do paradeiro da filha, Vilarinho foi até a tal casa. O dono da casa assegurou que Violante estava segura lá, mas o Trasmontano insistia em que a moça fosse embora com ele. Nesse entremeio, Boaventura adentrou a casa e disse que nem o diabo impediria que a moça ficasse com ele. O fazendeiro se interpôs na discussão e o Vilarinho saiu esbravejando. Que podia fazer ele? Pedir reforços à justiça? Àquela justiça que estava ameaçada?

Enquanto isso, o Conde de Assumar acertou com o comandante da tropa de dragões o que deveria ser feito contra os amotinados de Pitangui. Fazia parte do colóquio, o alferes Suzarte, a chamado do governador. D. Pedro levantou reforços em Sabará e no Caeté, mais de cem homens dispostos a seguir com os dragões. Ouviu-se que havia mais de mil homens amotinados em Pitangui, vindos de fazendas dos arredores. Segundo Suzarte, os paulistas eram valentes, mas não entendiam da arte de se fazer guerra. O alferes Suzarte via nisso um bom pretexto para tirar a limpo o rapto de sua noiva.

O que sucedeu, então, foi que Boaventura e seu grupo uniram-se aos amotinados. Com os reforços encomendados pelo governador, foi fácil travar a batalha. Os revoltosos foram acuados e os que sobraram trataram de fugir para as terras de Cuiabá. Essas notícias chegavam até Violante, que estava adoentada em casa do fazendeiro Capitão Juca. Em sua convalescência, a jovem Violante via-se corroída pelo remorso.

A notícia de que o ouvidor acabara de tomar conta da vila e que iria abrir uma devassa para punir os cabeças revoltosos deixou Violante atônita. Sem notícias de Fernão, sua dor era infinita. Nisso, ouviu-se o galope de cavalo. Boaventura chegava, foragido, para despedir-se da amada. Ele contou que, estando ele e seus homens próximos à vila, perceberam uma patrulha em sua direção. Fernão mandara que metade de seus homens seguissem na frente e ele e o resto do grupo ficaram escondidos, acoitando a patrulha, que caiu na cilada. No combate, Fernão matou o alferes Suzarte. Os patrulheiros, no entanto, eram em maior número e acabaram vencendo o embate. Muitos homens de Boaventura tombaram, entre eles seu fiel guarda-costas, Chicão. Agora estava se despedindo, impossibilitando de levar adiante sua vida naquele lugar. Instantes depois da fuga, a patrulha invadiu a casa em busca do mameluco. Era tarde! Violante não resistiu a tanta agrura. Morreu na flor de seus vintes anos, do mais puro amor.

Escapando de Pitangui, Fernão juntou-se ao acampamento dos insurretos paulistas, ao sul do Rio Pará. Notícias da vila chegavam a qualquer momento. Primeiro, o governador queria punir severamente o chefe paulista; segundo, a força de dragões fora acrescida e enviada para prender os amotinados; depois, a morte de Violante.

Desorientado, Boaventura decidiu não acompanhar o grupo. Retornou à Vila-Rica e pediu pousada na casa da boa Querubina. Ela lhe contou que o frade suro, aquele que foi vingado por Fernão no lugar do outro que roubara a escrava do velho Boaventura, havia fugido com a Nicota, a escrava que ajudava Querubina no serviço da cozinha.

Boaventura estava tão desgastado, que adoeceu. A febre era forte. Querubina mandou chamar um curandeiro. A febre não cessava. Foi chamado um barbeiro-cirurgião, que também não obteve resultado. Chamaram, então, Frei Tiburciano para que tomasse as últimas providências que um frei pode tomar: encomendar a alma de seu afilhado. Mas Fernão se recuperou. Querubina atribuiu o milagre ao frade. Pediu-lhe a bênção e não deixou de renovar o raminho de alecrim aos pés de Nossa Senhora das Mercês, a quem recorrera em favor em Boaventura.

Fernão recuperou-se, graças aos remédios caseiros do frei e dos carinhos de Querubina. A fragilidade a que esteve exposto serviu para abrir-lhe a mente e o corpo para um novo momento em sua vida. “Sentia que o germe de um anseio religioso lhe entrava na alma.”

A partir daí, Fernão e seu padrinho entabularam um aprendizado sobre a “ordem de Deus” e os pecados do homem. “O homem é uma dissonância na harmonia universal e parece destinado a desconjuntar o plano da Providência”, dizia o frei. Era eloqüente e impressionava, cada vez mais, o Boaventura. E o arrependimento, a tônica forte do discurso, sensibilizou plenamente o rapaz. Frei Tiburciano, que viu despontar no sofrido afilhado uma nova pessoa, não deixou de contemplá-lo com a mais fina filosofia sobre a força da natureza. A analogia que faz entre Criador e criatura, referindo-se ao trabalho das formigas, era de grande esmero. Com isso, iniciou Fernão na vida religiosa que o rapaz optou por seguir.

Fonte:
Profª Carla Fagundes, disponível em http://www.passeiweb.com/na_ponta_lingua/livros/analises_completas/o/o_mameluco_boaventura

Eduardo Frieiro (1889 – 1982)


Eduardo Frieiro (Matias Barbosa, 1889 — Belo Horizonte, 1982) foi um professor universitário e escritor brasileiro.

Eduardo Frieiro nasceu em Matias Barbosa, na Zona da Mata mineira, mas cresceu no bairro Carlos Prates, em Belo Horizonte. Filho de imigrantes espanhóis, chegou à capital em 1898, para acompanhar o pai, pedreiro que participaria da construção da "nova capital". Devido à sua descendência, habituou-se a ler os autores castelhanos.

Foi professor catedrático de Literatura Espanhola e Hispano-Americana na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), da qual recebeu o título de professor emérito.

Fundou a Faculdade de Filosofia dessa Universidade, onde ministrou também aulas de Filologia Românica, além de lecionar História do Livro na Faculdade de Biblioteconomia.

Primeiro diretor da Biblioteca Pública de Minas Gerais, hoje Biblioteca Pública Estadual Luiz de Bessa.

Além de suas atividades acadêmicas, Eduardo Frieiro contribuiu por mais de 40 anos com o jornalismo literário, assinando regularmente artigos para jornais e revistas.

O escritor foi membro da Academia Mineira de Letras, e em 1936 recebeu o Prêmio Machado de Assis pelo conjunto de sua obra, concedido pela Academia Brasileira de Letras.

Publicações
– O Clube dos Grafômanos, (romance), Edições Pindorama, Belo Horizonte, 1927;
– 0 Mameluco Boaventura (romance), idem, idem, 1929;
– Inquietude, Melancolia (romance), idem, idem, 1930;
– 0 Brasileiro Não É Triste (ensaio), ed. Os Amigos do Livro, 1931;
– A Ilusão Literária (ensaio), idem, idem, 1932;
– 0 Cabo das Tormentas (romance), idem. idem, 1936;
– Letras Mineiras (ensaio), idem, idem, 1937;
– Os Livros, Nossos Amigos (ensaio), Livraria Paulo Bluhm, Belo Horizonte, 1941. A 2ª e 3ª edições da Editora Pensamento, São Paulo, 1945 e 1957;
– Como Era Gonzaga?, publicações da Secretaria de Educação do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, 1950;
– O Diabo na Livraria do Cônego (ensaio), Livraria Cultura Brasileira, Belo Horizonte, 1946; a 2ª ed.
– Páginas de Crítica e Outros Escritos (ensaio), 1955;
– O Alegre Arcipreste e Outros Temas da Literatura Espanhola (ensaio), Livraria Oscar Nicolai, Belo Horizonte, 1959;
– O Romancista Avelino Foscolo (biografia).
– Feijão, Angu e Couve (ensaio), Editora Itatiaia, Belo Horizonte, 1950.

Fontes:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Eduardo_Frieiro
http://www.fafich.ufmg.br/dcs/departamento/projeto-memoria/um-pouco-de-historia/quem-e-quem/eduardo-frieiro/

II Seminário Internacional de Crítica Literária


Seminário discute tensões da crítica literária contemporânea

Ficção versus realidade, tradução, exposição midiática e obras multimídia serão parte dos debates

II Seminário Internacional de Crítica Literária

quarta 7 a sexta 9 de dezembro

A crítica literária atual se depara com um cenário novo e desafiador. Como lidar com as interações entre autor e exposição midiática intensa, produção literária e intercâmbio cultural, literatura e hibridismo artístico? Qual o sentido da crítica nos dias de hoje? De 7 a 9 de dezembro, o II Seminário Internacional de Crítica Literária explora essas questões, na sede do Itaú Cultural, em São Paulo.

Participam do evento intelectuais e críticos brasileiros e estrangeiros como Marjorie Perloff (Estados Unidos), Marisa Lajolo (Brasil), João Cezar de Castro Rocha (Brasil), David Toscana (México), Berthold Zilly (Alemanha), Luiz Costa Lima (Brasil) e Mario Perniola (Itália), além de outros escritores, teóricos, tradutores e filósofos, de várias nacionalidades e linhas de pensamento.

São 8 convidados internacionais e 11 nacionais. Os debates têm curadoria da escritora, professora e pesquisadora Maria Esther Maciel e da consultora e produtora cultural Selma Caetano. A mediação será realizada por 6 especialistas brasileiros.

entrada franca - ingresso distribuído com meia hora de antecedência
reserva para grupos: itaucultural@comunicacaodirigida.com.br

quarta 7

17h30 O Papel da Crítica no Jogo entre Realidade e Ficção

com David Toscana (México) e José Castello (Brasil)

A literatura não tem compromisso algum com a explicação, mas, sim, com a invenção. Os escritores já não se iludem: a literatura não é, e nunca foi, um espelho capaz de refletir, com nitidez e perfeição, o mundo real. Em que medida, no complexo, veloz e fragmentado século XXI, a literatura ainda pode – se é que um dia conseguiu fazer isso – dar conta da realidade?

20h A Crítica Biográfica e os Desafios da Ficção

com Italo Moriconi (Brasil), Leonor Arfuch (Argentina) e Marisa Lajolo (Brasil)
mediação Regina Zilberman

A valorização midiática da figura do escritor, aliada à profusão editorial de obras biográficas e autobiográficas, tem exigido da crítica contemporânea um reposicionamento diante das complexas relações entre vida e literatura, autor e obra, realidade e ficção. Que estratégias de abordagem têm sido usadas pela crítica no trato dessas questões? Até que ponto a vida de um autor serve como referência para a leitura de uma obra?

quinta 8

15h A Tradução como Crítica

com Berthold Zilly (Alemanha), Márcio Seligmann-Silva (Brasil) e Paulo Henriques Britto (Brasil)
mediação Marcelo Tápia

Tradução, crítica e criação são práticas interligadas. O ato de traduzir implica um diálogo crítico-criativo com outras culturas e com a própria tradição literária, interferindo também, de forma incisiva, no próprio fluxo da produção literária do presente. Em que medida, nesse movimento, a tradução reinventa também seus próprios conceitos e mecanismos de leitura? O que define a força crítica do trabalho de tradução?

17h30 A Crítica de Poesia em Tempos Digitais

com André Vallias (Brasil), Eduardo Sterzi (Brasil) e Marjorie Perloff (Estados Unidos) |
mediação Lourival Holanda

O advento de novos suportes digitais tem possibilitado o surgimento de expressões poéticas cada vez mais híbridas, mediadas por diferentes relações entre texto, imagem, interatividade e vários recursos multimídia. Como a crítica de poesia tem lidado com essas mudanças? Em que medida ela tem criado novos procedimentos e fundamentos de abordagem e reflexão para lidar com as linguagens poéticas do mundo digital?

20h A Crítica Literária como Intercâmbio Cultural

com Antonio Gonçalves Filho (Brasil), João Cezar de Castro Rocha (Brasil) e Martín Kohan (Argentina) |
mediação Luiz Ruffato

A crítica quase sempre desempenhou o papel de avalizadora da produção literária e, assim, serviu como parâmetro principal do intercâmbio cultural entre os países. Em tempos de rápida circulação de informações, a crítica literária ainda tem espaço para desempenhar esse papel? Se não, quais são os novos mecanismos disponíveis e quais as consequências da substituição da crítica literária por eles?

sexta 9

17h30 Crítica Literária Hoje: Impasses e Desafios

com Joan Ramon Resina (Estados Unidos), Josefina Ludmer (Argentina) e Luiz Costa Lima (Brasil) |
mediação Sérgio Alcides

Os equívocos em torno da palavra crítica: se não é um gênero literário, o que pode ser? O crítico é um "juiz da arte", um mediador que facilita o acesso do público ou alguém que exerce uma reflexão sistemática sobre a obra literária? Qual é a validade da crítica hoje? Quais são seus grandes desafios e impasses?

20h Crítica e Interdisciplinaridade

com Aurora Bernardini (Brasil) e Mario Perniola (Itália) |
mediação Ivan Marques

O entrecruzamento de diversos saberes e campos disciplinares tornou-se uma das linhas de força do cenário crítico contemporâneo. Como a crítica literária tem lidado com essa flexibilização de fronteiras, abrindo-se ao diálogo e às interseções com outras formas de conhecimento, como a filosofia, os estudos culturais, a sociologia e a política? E até que ponto a prática da interdisciplinaridade tem redimensionado o papel da crítica literária hoje?

Itaú Cultural – Sala Itaú Cultural (247 lugares) | Avenida Paulista 149 – Paraíso [próximo à Estação Brigadeiro do Metrô]

informações: 11 2168 1777

Fonte:
Itaú Cultural

Noite da Formiga Cultural em 8 de Dezembro


Caro (a) Amigo (a), “Noite da Formiga Cultural”

quando pretendemos realizar uma confraternização em meio a várias e riquíssimas atividades literárias e musicais (Confira no convite em anexo). Este evento que é uma realização conjunta do Clube Literário Marconi Montoli - CLMM, Academia Formiguense de Letras – AFL, Delegacia Formiguense da UBT e da Associação dos Amigos da Cultura da Cidade de Formiga – AACCF será realizada na Cervejaria Monte Cristo, no dia 08/12/11 a partir das 20h00min e os ingressos individuais estão sendo vendidos a R$ 10,00 (reserva de Mesa R$ 40,00) e na Portaria (no dia) a R$ 15,00. Convide também os amigos a participarem conosco. Ajude-nos a divulgar o evento.

Certos da especial atenção e participação, desde já agradecemos.

No aguardo,

Paulo José – Organização

José Carlos Dutra do Carmo (Manual de Técnicas de Redação) Parte V


CONHECIMENTO LINGÜÍSTICO.

Use todo o seu conhecimento gramatical. Faça um rascunho e ao passar o texto a limpo, observe se faltam acentos, sinais de pontuação, se há erros de grafia, termos de gíria, impropriedade vocabular.

CONJUNÇÃO.

Seja cauteloso ao utilizar as conjunções como, entretanto, no entanto, porém. Quase sempre são dispensáveis.

Evite o exagero de conectivos (conjunções e pronomes relativos) para evitar a repetição e para não alongar períodos.

Para mostrar hipóteses diferentes, as dúvidas e conflitos de reflexão da personagem, explore as conjunções alternativas e adversativas.

Sim, sou homem e deixei-me levar por meus instintos. Como a senhora deve saber, sou respeitador. Nada farei que desabone a minha conduta.

Elvira era simplesmente uma entre as outras empregadas domésticas da mansão. Tinha, no entanto, seus sonhos, alguns até mesmo ousados, e uma quase certeza de conseguir alcançá-los. Mas como? Decidiu, após muito pensar. Se ficasse mais algum tempo naquele trabalho, poderia conseguir uma promoção para chefe das serviçais ou, pelo menos, um aumento no ordenado, já que desempenhava com esmero suas funções. E, a partir dessa convicção, tornou-se exemplar.

CONJUNTO.

Quando quiser descrever um conjunto, empregue termos indicadores de lugar que revelem posição, aproximação ou afastamento de aspectos diferentes do conjunto.

Estavam todos os cavaleiros em volta da mesa. Nem todos, porém, tinham o mesmo prestígio na corte. Perto do rei estavam os mais destacados nobres: Marcelo, à esquerda; Eduardo, à direita. O primeiro trajava negro com as insígnias reais e o brasão de família. O segundo trajava azul e não trazia insígnias. Uma armadura reforçada cobria seu tórax.

CONSTRUÇÕES.

Não escreva construções como lá em Recife, aqui em Salvador mas, sim, em Recife, em Salvador.

CONTEÚDO.

Um bom texto não é apenas o texto correto, sem erros gramaticais. Ele deve ter conteúdo.

O conteúdo, que vale, no mínimo, 5 (cinco) pontos numa redação, não pode ser ridículo, nem infantil, mas deve ser simples.

Tome-se, como exemplo, o seguinte tema: O Acidente Nuclear de Chernobyl. Ao redigir sobre esse tema, não se pode esquecer, de forma alguma, de abordar os seguintes assuntos:

Nos próximos 30 (trinta) anos ainda vão morrer mais de 5 mil pessoas na Rússia e em países circunvizinhos, em conseqüência desse acidente.

A economia dos países vizinhos foi enormemente prejudicada, porque eles foram contaminados pela radioatividade.

Mais de 100 mil habitantes da cidade de Kiev foram evacuados, para que ela fosse despoluída, tornando-se uma cidade fantasma.

Os programas de energia nuclear foram quase totalmente paralisados, em todo o mundo, em razão dessa terrível tragédia.

Ficou comprovado, com esse acidente, que o homem ainda não está dominando, inteiramente, com segurança, a tecnologia da energia nuclear. A sua utilização e expansão, portanto, precisa ser repensada.

Faça sempre uma análise crítica do que escreveu, como, por exemplo, através das seguintes perguntas: Sua redação é interessante? A leitura do texto é agradável? Tem boas idéias? O texto dá uma boa idéia daquilo que foi descrito? O texto está bem organizado?

Presume-se que o candidato prestes a ingressar numa universidade tenha certa cultura. Assim sendo, não pode encarar o tema da redação de modo infantil ou rasteiro. É por meio do conteúdo, especialmente, que o professor irá aquilatar a capacidade ou o grau de conhecimento do aluno.

CONTO.

É a mais breve e simples narrativa, centrada em um episódio da vida.

CONTRADIÇÃO.

Para desenvolver a impressão de contradição, use conjunções adversativas. Se for o caso, varie as conjunções, observando as que se prestam a determinada situação.

Um homem gordo, bem vestido, porém sem pompa, saiu logo a seguir. Dirigiu-se ao carro, com passo leve e animado, mas não entrou.

O caso estava praticamente resolvido, mas alguma coisa ainda perturbava o Inspetor. A testemunha jurara ter dito a verdade, contudo sua voz não parecia firme como deveria estar naquela circunstância.

CONTRASTE.

Para manter a curiosidade do leitor com relação a personagens (ou cenário) contrastantes, oponha um a um os elementos em contraste.

Letícia, bonita, rica e cheia de preconceitos, olhava com desprezo a jovenzinha mirrada e pobremente vestida que tentava vender doces, aproveitando o sinal fechado.

A magreza e a palidez da jovem que se inspirava nas modelos de passarela, contrastava violentamente com as faces coradas e cheias de vida da amiga saudável, cujos padrões de estética divergiam frontalmente das de sua companheira.

COORDENAÇÃO.

Coordene suas idéias como se estivesse contanto uma história: o seu texto deve ter início (introdução), meio (desenvolvimento) e fim (conclusão).

CORREÇÃO GRAMATICAL.

A linguagem utilizada na redação precisa estar de acordo com a norma culta, ou seja, deve obedecer aos princípios estabelecidos pela gramática.

Tenha o máximo de cuidado para que sua redação não apresente, principalmente, nenhum erro de ortografia, acentuação, pontuação e concordância, seja ela verbal ou nominal.

Conhecer as normas que regem o uso da língua é fundamental para a produção de um texto correto. Em caso de dúvidas na redação, consulte sempre um bom livro de gramática.

CRIATIVIDADE.

É claro que uma abordagem original do tema valoriza seu texto. No entanto, o vestibulando deve ter cuidado para não confundir criatividade com idéias esdrúxulas. Na gíria estudantil, não viaje.

Lembre-se: Ninguém pode exigir que escreva bem, como um escritor, pois isto pressupõe talento; as faculdades querem que se escreva certo.

CRÍTICA.

É um tipo de redação que aprecia e avalia livros de caráter científico ou literário, além de manifestações artísticas ligadas ao cinema, ao teatro, à música, etc.

Habitue-se a criticar sua redação, procurando ver se todos os seus pormenores colaboram para criar a idéia que tem em mente.

Solicite a uma terceira pessoa, de bom conhecimento técnico ou nível escolar, para ler e fazer críticas sobre o seu texto, pois a leitura demasiada de nossos próprios trabalhos torna-nos cegos para determinados pontos.

CRÔNICA.

É uma narrativa curta que retrata, em geral, fatos do cotidiano, presenciados ou não pelo narrador, escrita numa linguagem leve, de caráter jornalístico.

Fonte:
http://www.sitenotadez.net