São 4:30 horas...o sol bocejando se espreguiça com um ar de quem está indisposto para a lida. O mar do Mucuripe espelha aquele parto divino.
Sob sinais de cruz e Ave-Marias mal recitadas, após uma última cusparada em terra, que traz o ranço do fumo mastigado, sai o jangadeiro a peitar pequenas ondas que teimam uma após outra roçar-se nas areias mornas daquela praia já cantada e encantada em prosa e verso.
O destino, como todo destino que se preza, só Deus sabe...
Na proa viaja a incerteza da volta, quando o pensamento do caboclo de tez queimada se volta para a terra e vê o acenamento do filho único escanchado no colo da mãe que ora em silencio, entregando a Deus o leme daquela teimosa e valente embarcação.
Acompanhando o caminhar do sol, sentindo-o no mudar da própria sombra que se desenha no terreiro do quintal de casa, a mulher do jangadeiro rastreia entre pensamentos sãos e orações a frágil jangada domada por um braço forte.
Depois que o sol se põe a pino e inicia seu caminho de descanso pro lado de cá da terra, a mulher esperançosa espera o marido que cedo partiu, apruma o olhar pra risca, e o pensar pra bem longe... lá pra trás dela.
Tinge-se o céu de vermelho pálido. O sol, acanhado, com cara de sono, deixa uns poucos rastros de sua luz como para que alumiar o caminho daquela jangada teimosa que, de volta, roça o peito na areia da praia encantada trazendo consigo o destino incerto da partida.
Corpos se entrelaçam à beira-mar. O chapéu do pescador sai-lhe da cabeça num respeitoso agradecimento a Deus. A pescaria rendeu e o pirão escaldado espera o cangulo para a alegria dos dois.
De braços dados, o casal segue no rumo da tapera onde o filho dorme a sono solto. A espera foi cansativa.
Fontes:
Texto enviado pelo autor
Imagem = http://www.arantur.com.br
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