terça-feira, 29 de novembro de 2011

Reinaldo Pimenta (Origem das Palavras 13)


GARIBAR

Preparar um carro superfialmente para vender por bom preço. É uma lixadinha aqui, uma pinturinha ali, uma ajeitadinha no motor e um brilho no capricho. Aí é só esperar o comprador, de preferência míope e meio surdo.
A palavra veio de Guariba, um paulista cuja especialidade era transformar calhambeques em automóveis de boa aparência.

IMUNDO
Assim como incapaz é quem não é capaz e infiel é quem não é fiel, imundo é quem não é mundo. Mundo, como adjetivo (em desuso), significa limpo: "naquela casa há gente munda e imunda". Bonito, não? E está em "Os lusíadas": "Debaixo deste círculo, onde as mundas / Almas divinas gozam" (X, 85).
A palavra latina mundu sofreu praticamente a mesma evolução semântica do seu correspondente grego kásmos (origem de cosmos). Inicialmente mundu significava arca, mais especificamente a arca em que os casados levavam seu enxoval. Depois, mundu ganhou o sentido abrangente de toalete, adornos femininos que se harmonizam.
Mundu também virou adjetivo, com o sentido de elegante, próprio, limpo, e originou as seguintes palavras latinas:
(a) mundare, limpar, purificar, de onde veio o português mondar, limpar de ervas daninhas e, por extensão, rever e corrigir um texto;
(b) munditia, limpeza, asseio, que deu em português mundícia (ou mundície), limpeza, esmero; de munditia se formou, com o prefixo de negação in-, immunditia, de onde veio o português imundícia (também, mais comumente, grafado imundície);
(c) immundu (in-, não + mundu, limpo), origem do português imundo.
Finalmente, mundu chegou ao sentido de universo, mas, na terminologia religiosa, mundu indicava o mundo terrestre (em oposição ao céu), com a conotação pejorativa de profano. E, assim, com esse sentido restritivo, originou mundanu daí mundano. Os franceses chamam o diabo de "l"esprit immonde". Em português, imundo tem, além de sujo, o sentido moral de torpe, indecente. Voltando ao grego, kósmos significa não só universo, como também adorno, enfeite e originou kosmetikós, relativo ao adorno, origem do português cosmético.

IRMÃ- PAULA
E a pessoa extremamente generosa, desprendida. Sim, existiu de fato uma irmã Paula no Brasil. Era uma freira, de nacionalidade francesa, da Congregação das Irmãs de São Vicente de Paulo de Gysegem. Seu nome de batismo era Antoinette Vincent. Faleceu, no Rio de Janeiro, em 1945 e ficou famosa por suas inúmeras obras de caridade.

JOÃO -DE -BARRO
O nome científico da ave é furnarius rufus, forneiro ruivo, por sua cor e pelo seu ninho - uma obra maravilhosa -, que se parece com um forno de barro e, até hoje, é a última palavra na tecnologia da nidificação.
No Brasil, também se chama forneiro, assim como no espanhol (hornero) e no francês (fournier); em inglês, é ovenbird (de oven, forno + bird, pássaro).
O pássaro, além de sua justíssima fama de trabalhador, é o símbolo da fidelidade. Dizem que o joão-de-barro nunca se separa da sua amada e, se a ingrata foge com outro ou morre primeiro, ele tapa a abertura do ninho e fica solitário o resto da vida. O pássaro foi eleito a ave nacional da Argentina. Pela fidelidade?! - estranhará com razão o leitor; não, pela obra.
Em mais ou menos cinco dias, o casal, no período da reprodução, constrói sua casa, com barro úmido, palha e esterco, sempre com a abertura voltada para o lado contrário do vento (segundo alguns biólogos, é o resultado de uma informação herdada geneticamente). O local escolhido para a construção pode ser uma árvore ou, perigosamente, um poste de energia elétrica (como você já deve ter visto nas estradas). Perigosamente porque com freqüência o pássaro limpa o bico nos isoladores instalados nesses postes e é fulminado, provocando, além de uma viúva, o desligamento da rede (é a causa de mais de 10% dos desligamentos em algumas regiões do Brasil).
Por que joão-de-barro e não reinaldo-de-barro ou márcio-debarro? Porque João é um nome muito comum, tanto que a fêmea dele é chamada maria-de-barro e não irene-de-barro ou biancade-barro.

Fonte:
PIMENTA, Reinaldo. A casa da mãe Joana 2. RJ: Elsevier, 2004

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