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sexta-feira, 26 de abril de 2024

Mensagem na Garrafa = 113 =

Antero Jerónimo
Lisboa/Portugal

Se um dia, sem opção, precisares fechar a porta
certifica-te que deixas um sorriso sereno nesse libertar.
Um cantinho na casa que ficará por ocupar
mas que de tão preenchido com o teu vazio, 
jamais caberá em um outro lugar.
Não terás habitado o espaço em vão
ocupas espaço em um outro coração 
almas gémeas bafejadas pela vida em feliz benção.
Certifica-te que fechas a porta devagar, de mansinho
antes de continuares a fazer o teu caminho. 
Sê apenas em essência, não menos que isso
sentirás esse momento em grato deslumbramento
mesmo que role uma furtiva lágrima de emoção. 
Não te diminui, só te vai acrescentar
sê apenas verdadeiro quando outra alma conseguires tocar.

Fonte> Facebook do poeta

quinta-feira, 25 de abril de 2024

Mensagem na Garrafa = 112 =

João Batista Leonardo
(Maringá/PR)

UMA ÁRVORE EM NÓS

Intrigante conotação da natureza, num mundo mutante onde a analogia se faz marcante, junto ao nascimento, vivência, morte e continuidade.

A terra é viva e todos nós vivos fazemos parte do seu ciclo, atendendo os seus desígnios e embrenhados numa correlação, certamente intrigante e interessante à análise.

O estudo da natureza me disse que somos iguais à árvore. Analisando com acuidade a afirmação, vejo analogia grande entre nós e a árvore. Temos um princípio no acaso, uma presente vivência e quase um mesmo fim. Vejamos:

As árvores têm raízes fincadas no chão, absorvendo, de acordo com a qualidade do solo, os nutrientes. Raízes que absorvem o sustento, tanto nas árvores resistentes, frondosas, como nas árvores franzinas. Semelhante a elas, temos raízes fincadas no solo da nossa abrangência, onde estão as obrigações, valores e fraquezas. Ali nos sustentamos e sugamos os nutrientes físicos e emocionais, forças mantenedoras da continuidade. Quanto mais rico for nosso solo e nosso conceito, tanto mais forte será nossa árvore.

O tronco da árvore a sustenta contra ventos e tempestades. Assim como ela, nosso tronco nos coloca de pé, resiste às quedas, às doenças e aos percalços. Como ela, nosso tronco, forma e sustenta os galhos.

Os nossos galhos são nossos dependentes familiares, profissionais e materiais. Podem ser mais ou menos fortes de acordo com a qualidade dos tempos vividos. Conceito firmado, na formação da família, no valor econômico conseguido, na reputação pessoal e profissional, primando o mérito na comunidade.

Dos nossos galhos vem a ramagem contendo flores, frutos, sementes e folhas.

As folhas nas árvores refletem sua higidez se verdes ou secas e têm função de relação com o mundo. Nossas folhas mostram nossa aparência física e o nosso mundo de relação, onde aparecem as pessoas, os conhecidos, os amigos e os profissionais. Como na árvore, nossas folhas podem ser pessoas novas, velhas, sadias, doentes, bonitas, feias, boas, más. Na árvore as folhas são benéficas, passam, envelhecem, caem, viram adubo e fortificam o solo. Assim também as pessoas passam, as amizades acabam, os conhecidos e profissionais desaparecem, porém, sempre deixam o adubo de algum ensinamento. É boa a firmação do escritor Mark Twain: “A vida seria muito mais produtiva se pudéssemos nascer com a idade de oitenta anos e gradativamente nos aproximar dos dezoito”.

As flores enfeitam as árvores e embelezam a natureza. Nossas flores representam nossas belezas, qualidades e o festejo da formação dos frutos. Tanto mais flores, tanto mais frutos. Os frutos nos qualificam como produtores, são os resultados da participação efetiva dentro das deliberações tomadas, são os resultados das determinações das opções, são o quinhão de julgamentos.

Como na árvore, nossas sementes produzirão descendentes, filhos e netos, firmando nossa continuidade genética.

Nem toda árvore floresce e frutifica e nem por isso perde méritos. Vale aqui o pensamento de Henfil: “Na árvore, se não houver frutos valeu a beleza das flores; se não houver flores valeu a sombra das folhas, se não houver folhas valeu a intenção da semente”. Analogamente, tantas pessoas não florescem, não frutificam, não colhem as oportunidades, são dependentes, pendurados na sociedade e carentes; no entanto, elas têm muito valor porque se prestam em oferecimento aos que desejam servir e atender o mandamento de Deus.

A árvore que propicia sombra, ar fresco, beleza e frutos, um dia morrerá e ficará por tempo de lembrança com sua carcaça, até que a terra a absorva como alimento. Como as árvores, também morreremos e ficaremos por algum tempo na mente daqueles componentes de nossas abrangências, que são nossos filhos parentes e amigos.

Diferente do homem, a árvore sempre viverá na constância da sua espécie e não mudará. Assim diz o poeta Abu Shakur: “A árvore que produz um fruto amargo, se for alimentada com guloseimas e doces, não mudará sua natureza; produzirá sempre o mesmo fruto amargo, e nele não saboreará nenhuma doçura”. O homem não, desde o mais amargo, o mais rude, quando lhe oferecido a compreensão, a esperança e a oportunidade, pode se transformar numa pessoa boa e aceitável.

Árvore e o homem, uma analogia intrigante. O âmago fisiológico dos seres vivos, a importância da vida de relação e a dependência entre si, glorificam a natureza.

A árvore é imutável, tem tempo e ciclo obrigatório. O homem é mutável, tem arbítrio e com ações transforma os tempos. Ele pode nascer num chão pobre, porém, no exercício do esforço e acatando as boas chances, enriquece o solo e vira árvore frondosa.

Ainda, a árvore nasce, vive, morre e acaba. O corpo humano também, porém a magnânima diferença está na presença da alma junto aos homens, que é eterna e perpetuará num outro tempo muito mais frutuoso e abrangente.

Fonte> Portal do Rigon. 16/07/2017 
https://angelorigon.com.br/2017/07/16/uma-arvore-em-nos/

domingo, 21 de abril de 2024

Mensagem na Garrafa = 111 =

Monsenhor Orivaldo Robles 
Poloni/SP, 1941 – 2019, Maringá/PR

QUERIDO GONZAGUINHA

Outro dia, me dei ao cuidado de conferir a letra de “O que é, o que é?”, imortal samba de Gonzaguinha, falecido há 22 anos (tudo isso já?) em acidente no Sudoeste do nosso Estado. Nunca o tinha feito. Que riqueza de inspiração! Ele bem que podia ter durado mais que os seus poucos 45 anos. Ainda estaria produzindo coisas belíssimas, de valor incontestável. Muito melhores que as tolices de pretensos compositores, que frequentemente nos obrigam a ouvir em altíssimo volume. Sem pedir licença, alguns “donos” das ruas enfiam essas porcarias em nossos ouvidos. Nós, pobres vítimas, que podemos fazer?

Há tempo, venho-me convencendo de que atravessamos a era da mediocridade feliz. Na minha pobríssima opinião – que ninguém pediu, eu sei, e a poucos interessa –, grande parcela da sociedade vai sendo tangida por uma crescente imbecilização feita de desprezo do belo, do bom e do verdadeiro. Aprecia-se tão só o que oferece desfrute imediato, satisfação no momento, ainda que com sacrifício de valores perenes. Importa é conseguir prazer, dinheiro, prestígio, fama, admiração…, numa palavra, gozar a vida. “Edamus et bibamus, cras enim moriemur” (“comamos e bebamos, porque amanhã morreremos”) – eis a proposta do consumismo moderno, que de moderno nada tem. Os romanos a herdaram dos filósofos hedonistas gregos. Até o profeta Isaías a conhecia (Is 22, 13).

Recordo que, em garoto, no seminário de São José Rio Preto, o holandês padre Alcuíno Derks levou mais de um mês ajudando-nos a refletir, um pouquinho por dia, sobre o tema: Vale a pena viver. Seu português canhestro tornou-o motivo de piada nos nossos recreios. Longe de seus ouvidos, fazíamos chacota da frase “Vale a pena de (sic) viver não só para comer doces e bolas” (sic), repetida por ele como um mantra para nos convencer do valor da vida.

Muitos anos mais tarde, o gênio de Gonzaguinha veio proclamar a excelência da vida. Que é ela? “Doce ilusão, maravilha, sofrimento, alegria, lamento, um nada, uma gota, menos que um segundo, um divino mistério, o sopro do criador numa atitude repleta de amor”? Tudo isso e mais ainda.

Num passado que há muito se perdeu, lá no sertão, cunharam o dito “matar para ver o tombo”. Traduzia o desprezo pela vida. Eram tempos de ignorância, de profundo atraso. Ainda não tinha chegado a civilização. Quando aportasse lá o progresso, tudo seria diferente. Haveria mudança para melhor. A vida seria apreciada no seu devido valor.

Vieram estradas, escolas, carros, aviões, computadores, celulares, ferramentas de comunicação ultramodernas… Em vez de melhorar, parece que piorou. Assassino hoje nem quer saber como a vítima caiu. Matam-se crianças, mulheres, índios, mendigos, homossexuais. Armas que a gente só via no cinema estão na mão de crianças no meio da rua, de dia. Gente, e a vida?

Antes de ter ceifada a sua, querido Gonzaguinha, você conseguiu brindar-nos com um luminoso hino à sublimidade desse divino dom, que nada fizemos por merecer. Quando dele tomamos consciência, já o vínhamos desfrutando há anos. Muito obrigado por advertir-nos de que precisamos parar um tempinho, toda manhã e toda noite, para nos perguntar: “A vida, o que ela é? Que estou fazendo da minha? Como trato a dos que vivem ao meu lado”?

Fonte> Portal do Rigon 15/11/2013

segunda-feira, 8 de abril de 2024

Mensagem na Garrafa = 110 =

Renato Frata 
(Paranavaí/PR)

Simples recados

Quando se dispuser a algo, esqueça o ontem e se repagine ao presente: o amanhã não saiu da prancheta, é projeto ainda que você construirá.

Procure surpreender a quem o espera, como faz surpresa a brisa fria no rosto, sentida ao abrir a janela. Seja suave como ela, e agradável como o bailar que a impulsiona, e exuberante como a pequena flor recém-aberta profusa ao sol que, mesmo simples, dá à vida o valor que tem. Dê-se por inteiro e venha.

Presenteie a quem o espera com a modéstia da areia varrida e deixe que o carinho de seu olhar tempere a chegada, regando-a com o fio gelado da água do ribeiro.

Cause, com o íntimo aberto, sem pretextos, profusões ou prosopopeias, e dê a essa chegada o caráter solene do ficar, eis que quem assim chega traz o todo consigo, a mala cheia de paixão vertida pelas beiradas a dizer quão boa é a vida. E fique. Bem. Só esse propósito valerá a chegada e o dia.

Para fazer do chão pedregoso o solo arável que aninha semente e faz dela árvore frondosa. Fique, não se ressinta com possíveis insetos ou calores, eles serão desconfortos passageiros que o ajudarão a se manter firme.

E sendo chão, procure ser macio a infinitas solas que possivelmente o pisarão. Não as maltrate, serão passos de caminhantes à procura do bem viver, assim como você. Ajude-as com sua maciez, massageie-as com brandura e esses passos sobre si nem serão sentidos. Enraíze-se em amores, muitos, infinitos e os trance com seus gestos de gratidão, ação e palavra, e lhes dê o conforto da meia-sombra, da umidade necessária e do sossego. Permita-lhes o belo, resplandecente e vigoroso crescimento e florescência. Só um chão fértil sabe o bem que tem dentro de si. E sabe da força interna que tem. 

E ficando, mostre-se por inteiro com seus defeitos e carências, feiura e beleza, com a sua humanidade e até com os desgastes que a vida na sua passagem proporcionou. Ninguém é imaculado como uma folha em branco. Aliás, o passado, como o ontem, mesmo belo ou fracassado, se foi, e o hoje merece ser bem vivido, por isso o amolde, modele-o com o canivete da franqueza.

Tire-lhe a aspereza, o enrugamento, as partes podres. O fraco só se torna forte com a persistência, com a resiliência. a confiança, não há outro remédio. Então, persista!

Deixe que seus olhos procurem o horizonte e suas pernas saiam em sua busca, mas volte. Sim, e transforme seu ficar em um extenso e intenso intervalo, em um presente contínuo talhado a cada minuto pela faca do agora compartilhando sentimentos e aprendizagem, dando e recebendo na reciprocidade que o amor afivela e, se amanhã tiver que partir em definitivo, que suas pegadas sejam seu testemunho, que seus rastros que o tempo não conseguirá apagar sejam sua história escrita minuto a minuto, em definitivo, e nunca apenas um rascunho, desses que rabiscamos para desprezar no cesto.

Fonte> Renato Benvindo Frata. Fragmentos. SP: Scortecci, 2022. Enviado pelo autor

segunda-feira, 1 de abril de 2024

Mensagem na Garrafa = 109 =

A. A. de Assis
(Maringá/PR)

Seguro eternidade

Ah que missão transcendente / a que ao corpo é atribuída: / levar a alma da gente / desde o ventre à eterna vida. - Penso que seja mais ou menos assim; que a vida do ser humano se realiza em duas etapas; a primeira com a alma associada a um corpo material; a segunda com a alma unida a um corpo espiritual. Mas fiquem tranquilos, porque não vou me meter em conversa de gente grande. O foco aqui será a necessidade de dispensar à saúde da alma um grau de cuidado pelo menos semelhante ao que dispensamos ao corpo físico.

Principalmente a partir das últimas décadas, os pais, professores e outros educadores têm ensinado as crianças e os jovens a cuidar melhor do corpo físico. Hábitos de higiene, vacinação, ginástica, boa alimentação, visitas frequentes ao médico e ao dentista, tudo isso vem ajudando as novas gerações a garantirem boa saúde, e é ótimo que assim seja.

Todavia é bom lembrar que a vida do corpo material é provisória (raras são as pessoas cuja existência terrena ultrapassa os cem anos), enquanto a vida da alma é eterna, não acaba nunca. E aí é que está o ponto: pouquíssima gente se preocupa em preparar-se para a etapa definitiva da existência. Pouquíssima gente pensa em "fazer um seguro eternidade".

Na medida em que vamos ficando mais velhos a gente até que começa a dar umas meditadas mais sérias sobre o que nos aguarda além do aqui. Mas os mais jovens nem querem saber de pensar em futuro da alma. Têm o tempo todo ocupado com estudo, trabalho, namoro, casamento, criação dos filhos, viagens de férias - essas urgências próprias da idade. Alma? Espírito? Transcendência? Não há lugar na agenda para tais cuidados.

Pois é, meninos. Mas o problema é que um dia todo mundo envelhece. Um dia todo mundo chega ao fim da jornada terrestre. E daí? Vocês estariam prontos para decolar?

Sabem como se faz o "seguro eternidade"? Tentando manter-se permanentemente preparados para partir a qualquer momento. Esse qualquer momento" poderá ser daqui a muitos anos, mas poderá também ser de repente. Então o seguro é assim: estar sempre com tudo em ordem: alma leve, coração limpo, consciência tranquila,

Talvez seja meio difícil para uma pessoa jovem renunciar a alguns gostosos abusos. Contudo vale a pena. A sensação de ficha limpa é uma delícia. Além da certeza de que sua vida será eternizada em estado de céu, sua própria permanência em nosso complicado planetinha será bem mais agradável. Você não terá medo de nada, dormirá sereno, livre de culpas e remorsos, e com isso a saúde física será também beleza.

Cuidar bem do corpo material é, sim, muito importante, porém cuidar bem da alma é mais importante ainda. Veja que maravilha: chegar ao final da etapa provisória com o corpo sadio e ao mesmo tempo com a alma limpinho e leve, pronta para transferir-se para o corpo espiritual e unida a ele viver feliz por toda a eternidade.

Fonte> A. A. de Assis. Histórias da história de Maringá. Maringá/PR: Zuli, 2024. 
Livro entregue pelo autor.

quarta-feira, 6 de março de 2024

Mensagem na Garrafa = 108 =

Arthur Thomaz 
Campinas/SP

FORÇAS

Que forças do Universo são essas que, inexplicavelmente, provocaram este insólito encontro entre nossas distraídas almas? 

Que forças são essas que as fundiram em uma só, acenando com a promessa de eterna cumplicidade?

Que forças do Universo são essas que demoliram, em um único sopro, todas as fortalezas que construí para não sofrer dores de amor?

Que forças são essas que ataram minhas mãos às tuas com laços de ternura, em uma conexão que vislumbramos ser eterna?

Que forças do Universo são essas que lhe dotaram da plenitude na arte do amor?

Que forças são essas que lhe habilitaram a enfeitiçar-me, e assim, da minha alma passaram a apoderar-se?

Que forças do Universo são essas que lhe brindaram com o poder de seduzir Chronos, para que ele lhe concedesse o dom de alterar o curso do tempo, fazendo com que longe de ti, as horas se arrastem, e quando ao teu lado, os segundos voem incontroláveis?

Que forças são essas que alteraram a órbita dos astros e que cruelmente separaram nossas almas inapelavelmente?

Que forças do Universo são essas que imobilizaram meus braços, que, inertes, assistiram tu ires embora?

Que forças são essas que desapareceram no exato momento em que eu mais necessitava tê-las para suportar a vida sem ti?

Fonte: Arthur Thomaz. Leves contos ao léu: imponderáveis. Volume 3. Santos/SP: Bueno Editora, 2022. Enviado pelo autor 

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2024

Mensagem na Garrafa = 107 =

Silmar Bohrer
Caçador/SC

"TUDO TE LEMBRA E LEMBRANDO CHORO"

agosto, 07, 2023.

Era madrugada da segunda quando a MALDITA levou do nosso convívio o amado Frederico, cãozinho "ente encantado de encantos", jovial, social, comunicativo, que viveu conosco por onze anos.  Assim mesmo! Nós, do signo de gêmeos, ele gostando de "falar", e eu entendia a língua dele, e ele compreendia a minha língua.

Nossa língua era universal. 

Comandante das horas dos dias, Frederico, você merece mais do que uma croniquinha, porque sua vida foi grandiosa, gloriosa, espetáculo de vida.  Tantos seres humanos não escrevem uma CRÔNICA linda e inesquecível como a de um cachorrinho doce, carinhoso, livre de maldades, injustiças, preconceitos. Alegria da nossa vida.

Nossa convivência tinha rituais, rumos e razões de ser.  O conversar estava no sangue, e a gente conversava a qualquer momento. Tinha um bordão especial.  Na alacridade de sempre, latia dizendo  -  eu e o papai somos nós.  E éramos nós ! 

Final de noite, dez e meia/onze horas eu no computador, ou lendo, ou escrevendo, olhava para o lado, ali o Negão sentadinho esperando silente para irmos deitar.

Manhãzinha, ele ao meu lado no colchonete, acordamos, conversamos, um abraço, vai para fora e logo volta, cutucando minha perna com o focinho como a dizer que estava ali, enquanto me lavo. Senta e espera para abrirmos a biblioteca.

Onze e meia me convida para a voltinha até o vizinho.  Vamos.  À tarde o soninho do vigia da casa.  Saio a caminhar e na volta encontro o "guri do pai" esperando no portão para nossa  caminhada na quadra. Seis e meia/ sete horas, escurinho, me chama para darmos quirerinha aos pássaros do bosco e nos fundos de casa. Sempre na frente.  A lista é longa...

Tantos lembrares, tantos viveres. As incursões. Banhos de mar, a busca do sirizinho na areia, viagens.  A empatia entre nós, a liberdade de viver leve e solto, como nós viventes também gostamos.

Fomos construtores. Construímos amigos. 

Você era o vanguardeiro, ia na frente abrindo sorrisos, jorrando alegria, carismático, criatura singular  -  fidalgo a ensinar o papai e a outros tantas lições de vida. 

Fez história, querido, e agora não há mais tempo para você.  Que lástima!  Mas vamos nos encontrar nalguma planura do universo.

Papai e mamãe choram a sua ausência, mas o LORDE FREDERICO estará sempre no nosso coração.  Papai e você seremos sempre nós, meu eterno Frederico. 

Fonte> enviado pelo autor. 

sábado, 17 de fevereiro de 2024

Manuscrito na Garrafa = 106 =

Renato Benvindo Frata 
Paranavaí/PR

DIFÍCIL DEFINIR, MAS NEM TANTO

Longe de mim contrariar o dicionário quando diz que 'felicidade' é uma sensação real de satisfação plena; estado latente de contentamento.

Está certíssimo, mas um tanto seco e de certa rudeza ao descrever o melhor dos sentimentos. Felicidade, tenho para mim, é a plenitude que concebe e abarca os segundos da nossa vida. Se formos buscar definições pela história, encontraremos milhares de opiniões dos mais importantes filósofos, poetas, escritores, cientistas; homens e mulheres que se debruçaram sobre o tema para defini-la, e que lhe deram — e lhe dão —, com palavras especiais, as melhores definições.

Se as trouxermos aqui, o espaço não as comportará, porque a felicidade que tanto buscamos parece agir como uma menina travessa que, ao brincar, se esconde pelos cantos dificultando ser encontrada.

Essa menina que falo, a Felicidade - acompanhe o raciocínio tem preferências especiais: escolhe o mais dissimulado canto dos lábios, ou a mais íntima esquina dos olhos para se esconder e se aquieta; e, alheia a tudo o que possa acontecer, aguarda a melhor hora para se mostrar.

Ao abrirmos um sorriso, por exemplo, desses que fazem pulsar mais forte o coração, ela se mostra cândida e bela e nos dá aparência deslumbrantemente boba, infantil, meiga, pura, que exprime dois sentimentos: na pessoa que sorri, a aceitação; e a quem o sorriso foi ofertado, a gratidão pelo gesto recebido.

Aceitação e gratidão, pois, são elementos nascidos do sorriso. Também, e na mesma intensidade, ela pode escorrer em gotas, quando nossos olhos brilham sob a resplandecência sublime do amor e nos dá, nesse instante, água especial que purifica nossa existência.

Para dizer que a lágrima não nasce apenas no choro, mas também na alegria.

Nesses dois momentos ela conseguirá se perenizar se assim o desejarmos, permanecendo em definitivo em nossos sorrisos, ou no brilhar dos nossos olhos, ou ser apenas uma passageira fugaz de alegria momentânea, quando se tornará meia felicidade. Por ser meia, nunca será completa.

Na segunda hipótese, desprezada e humilde, voltará a se esconder nos cantos que guardam a vida, como os da boca e dos olhos, até que decidamos ativá-la em definitivo.

Desse raciocínio um tanto pueril e de base somente de observação, mesmo não tendo qualquer pingo de cientificidade, ouso dizer que a felicidade está onde queiramos que esteja, com pouca
ou muita intensidade: escondida no mais profundo recôndito, enrustida no âmago das aflições, presa no egoísmo ou maldade; ou no mais aparente e singelo lugar, como um simples canto de boca ou de olhos, por exemplo. 

Digamos, com a beleza do piscar de um vagalume em noite escura.

(Fonte: Renato Benvindo Frata. Fragmentos. SP: Scortecci, 2022. Enviado pelo autor)

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2024

Mensagem na Garrafa = 105 =

Vanice Zimerman
Curitiba/PR

SUSSURROS DO PAPEL DE SEDA...

A crônica de hoje deixou-se envolver, saudosamente, pelas imagens da abertura da novela “Éramos Seis”, uma linda telenovela brasileira produzida pelo SBT, e exibida, em 1994, (baseada em um romance brasileiro, de Maria José Dupré, 1943). Imagens da família em porta-retratos apareciam, em preto e branco e coloridos, indicando a passagem do tempo...

Retratos de família são pausas no tempo; os sorrisos permanecem e as lágrimas contidas, disfarçadas, também. Gosto de rever os antigos álbuns de fotografias e sentir, inebriada, os suaves sussurros do papel de seda que antecede cada página de textura em tons de azul-cinza. As fotos, de certa forma, mostram histórias de vidas; nascimentos, aniversários, amigos em confraternização, formaturas, mudanças de casas, viagens ... Cada centímetro da imagem lembra uma etérea ampulheta, que pode ser acariciada, emoção ao alcance das mãos...

Há amizades que permanecem além dos porta-retratos, sejam familiares, ou amigos e amigas que conhecemos em Redes Sociais ou por intermédio do trabalho e da poesia – Antologias, Oficinas de Arte... Têm laços de amizades que continuam a fazer parte de nosso dia a dia, mesmo que estejamos distantes da vida social, literária ou num leito de hospital. Assim, as boas vibrações chegam através de um abraço presença física, ou virtual: nas trocas de mensagens e emojis.

segunda-feira, 12 de fevereiro de 2024

Mensagem na Garrafa = 104 =

Cristiane Emília Pasquini
Sorocaba/SP

COMO ANDA SEU TEMPO?

Ao observarmos o passado, há milhões de anos, o humano era pouco mais do que um macaco vivia em bandos – na época era necessário para a sobrevivência de cada um e da própria espécie.

Algum tempo depois, ainda há milênios atrás, o humano descobriu que podia controlar o fogo, diferentemente dos outros animais  a curiosidade humana superou o medo e com isso o fogo foi dominado, preservado e, depois usado sempre que desejasse.

Mais tarde aprendeu a usar o fogo para cozinhar, seguido da produção de utensílios, instrumentos e armas. Com as armas, aprendeu a caçar de forma mais eficiente assim, reduzindo seus esforços.

Com a agricultura, não precisou mais sair à busca de alimentos. Com essas facilidades o homem começou a ter tempo de sobra, o ócio.

Com esse espaço de tempo, a energia economizada nas atividades de sobrevivência passou a ser canalizada para a produção de bens, valores e atividades culturais. Vale salientar que a cultura em sua origem é filha do ócio, como a escrita, a pintura, a escultura, a música, a dança, a filosofia, as religiões, os jogos e etc.

Podemos concluir que desde as mais antigas civilizações o homem já vivia no ócio.

Ao avançarmos um pouco mais na história, grandes gênios criaram suas invenções durante seus momentos de ócio. Além de importantes invenções como as de Isaac Newton, que durante sua trajetória, descobriu várias leis da física, entre elas, a lei da gravidade, na passagem do século XIX para o XX, podemos citar o físico alemão Albert Einstein, o pintor espanhol Pablo Picasso, que contribuíram grandemente para a história com a teoria da relatividade e o cubismo, respectivamente.

Mais uma vez constatamos que a criatividade aflora durante o ócio.

Penso 99 vezes e nada descubro. “Deixo de pensar, mergulho no silêncio, e a verdade me é revelada”.( Albert Einstein) .

Pois bem. Com a evolução dos tempos, a escrita, a informática  as informações em fração de segundos “dão volta ao mundo”, com isso exige uma maior versatilidade do ser humano.

Atualmente para exercer uma profissão, qualquer que seja, há a necessidade de uma flexibilidade maior, principalmente no que se refere às atualizações, intensas e que se alteram numa velocidade incrível. É uma verdadeira “corrida contra o tempo”.

E por falar em tempo, e tempo para o ócio? Se para criarmos necessitamos dele, como realizar tantas atividades, das quais a cada dia são mais exigentes, se o tempo é escasso? Corremos feitos loucos, sem tempo pra nada, nem mesmo para usufruir de nossas próprias riquezas.

Segundo o professor e sociólogo italiano, Domenico De Masi devemos exercitar o “ócio criativo”. Ele afirma que “quando o trabalho, estudo e jogo (lazer) coincidem, estamos diante daquela síntese exaltante que chamo de ócio criativo”.

Imagine você fazendo o que gosta a durante a vida inteira? E então viveria do que?

Se imaginarmos o trabalho como um fardo, a situação realmente parece ser impossível. Mas, se o trabalho, o lazer e o estudo começassem a se misturar em nossas vidas de tal forma que não desse mais para diferenciar uma da outra, aí sim teríamos o possível.

De Masi defende um novo modelo social baseado nas premissas da simultaneidade entre o trabalho, estudo e lazer  militante pela redistribuição do tempo, do trabalho, da riqueza, do saber e do poder  no qual indivíduos e a sociedade são educados para privilegiar a satisfação de necessidades radicais, como a introspecção, o convívio, a amizade, o amor e as atividades lúdicas.

Ainda afirma o professor e sociólogo italiano que “o ócio pode transformar-se em violência, neurose, vício e preguiça, mas pode também elevar-se para a arte, a criatividade e a liberdade. É no tempo livre que passamos a maior parte de nossos dias e é nele que devemos concentrar nossas potencialidades”.

Diante disso, quem sabe em algum momento possamos parar e refletir: O que estamos fazendo com nosso tempo?

Pense nisso!

domingo, 11 de fevereiro de 2024

Mensagem na Garrafa = 103 =

Mia Couto
Beira/Moçambique

Antigamente, não havia senão noite. E Deus pastoreava as estrelas no céu. Quando lhes dava mais alimento elas engordavam e a sua pança abarrotava de luz. 

Nesse tempo, todas as estrelas comiam, todas luziam de igual alegria. Os dias ainda não haviam nascido e, por isso, o Tempo caminhava com uma perna só. E tudo era tão lento no infinito firmamento! Até que no rebanho do pastor, nasceu uma estrela com ganância de ser maior que todas as outras. 

Essa estrela chamava-se Sol e cedo se apropriou dos pastos celestiais, expulsando para longe as outras estrelas que começaram a definhar. 

Pela primeira vez houve estrelas que penaram e, magrinhas, foram engolidas pelo escuro. Mais e mais o Sol ostentava grandeza, vaidoso dos seus domínios e do seu nome tão masculino. Ele, então, se intitulou patrão de todos os astros, assumindo arrogâncias de centro do universo. 

Não tardou a proclamar que ele é que tinha criado Deus. O que aconteceu na verdade, é que, com o Sol, assim soberano e imenso, tinha nascido o Dia. 

A Noite só se atrevia a aproximar-se quando o Sol, já cansado, se ia deitar. Com o Dia, os homens esqueceram-se dos tempos infinitos em que todas as estrelas brilhavam de igual felicidade. E esqueceram a lição da Noite que sempre tinha sido rainha sem nunca ter que reinar. 
(Mia Couto. A Confissão da Leoa)

sábado, 10 de fevereiro de 2024

Mensagem na Garrafa = 102 =

Therezinha Dieguez Brisolla
São Paulo/SP

UM BRINDE À VIDA

A pergunta me pegou de surpresa: — Bisa, você é velha ou idosa? Sorri... e, com a mesma paciência com que respondi a centenas de alunos, em trinta anos de magistério, expliquei ao bisneto que as duas palavras têm o mesmo significado, porém para sermos educados com as pessoas em idade avançada, as chamamos de idosas. A explicação o convenceu... deu-me um beijo e voltou ao jogo de videogame. Mas, a mim não convenceu!...

Um estudo recente que causou polêmicas, concluiu que: Velho é aquele que não tem mais planos futuros e, com resignação, espera o seu fim. Idoso é aquele que, apesar da idade, é ativo, sente prazer na leitura, ouve e lê notícias para manter-se atualizado, tenta adaptar-se à tecnologia moderna, acredita no amor e ainda sonha!

A conversa levou-me a vigiar meu comportamento no convívio com os quatro filhos, sete netos, seis bisnetos, dois genros, a nora e dezenas de amigos.

Tenho a idade da Revolução Constitucionalista de 1932. É claro que pela idade – 89 anos – eu sou de ontem!... Sou do tempo em que o meio de transporte era o trole. Acomodei-me nos bancos das jardineiras, em estradas poeirentas, experimentei a emoção do bonde elétrico, em trilhos nas ruas calçadas com paralelepípedos e encantei-me com a magia do trem, em vagões puxados pela máquina a vapor, a Maria Fumaça.

Vivi o tempo do rádio, as notícias dadas pelo Repórter Esso “o primeiro a dar as últimas” e ouvindo e cantando as músicas cujas letras sabia de cor.

Sou do tempo do telefone preso à parede e da vitrola, com discos de vinil – Long Plays e Compactos... ambos os aparelhos movidos a manivelas. Do circo mambembe, que alegrava nossos finais de semana. Do fotógrafo de rua, o Lambe-lambe e das idas aos estúdios fotográficos, para as fotos em preto e branco, registrarem os eventos sociais.

Dancei as cirandas, na praça da cidade, com a banda militar tocando dobrados, no coreto e, depois, as valsas e os boleros, em clubes, ao som de conjuntos musicais. Frequentei quermesses, à espera do “correio elegante” (uma declaração de amor, velada), alegrei-me com a Dança da Quadrilha, em festas juninas... Vesti a roupa da moda para fazer o “footing”, viver a emoção do flerte, do primeiro amor, do namoro de mãos dadas...

Morei em casas térreas, com portas e janelas abertas para a rua, em um tempo em que o contrato de locação era a palavra dada.

À noite, após o trabalho, os vizinhos se reuniam na calçada – as cadeiras em roda – e comentavam os acontecimentos do dia. As crianças corriam pelas ruas brincando de esconde-esconde, de boca de forno, de roda... Os brinquedos eram feitos por nós: a peteca, a boneca de pano, a bola de meia, as pipas coloridas...

E a alegria para se preparar para fazer ou receber visitas! O lanche feito com carinho, o pão quentinho, assado no forno de pedra construído no quintal, os bolinhos de chuva, o suco para as crianças e o café para os adultos, feito no fogão a lenha e servido no bule de ágata.

Ah, nossos Natais! O presépio com as figuras principais, os patinhos de celuloide sobre os cacos de um espelho, imitando lagos, montado na sala de visitas, onde nos reuníamos com os vizinhos para a novena do Advento. A inocência de acreditar em Papai Noel...

A chegada do Carnaval era uma festa! Os pais levavam as crianças para apreciar os corsos carnavalescos, com Pierrôs e Colombinas, em carros abertos, as marchinhas “na ponta da língua”.

Sou de um tempo em que se pedia a bênção aos pais, tios, avós e padrinhos. Em que os alunos se levantavam quando o professor entrava na sala de aula e em que a professora era “a segunda mãe”.

A chegada da televisão já havia revolucionado o mundo, quando assistimos emocionados o homem pisar no solo da Lua, em 1969. Anos depois, a televisão em cores e o programa do Chacrinha, com suas chacretes, era líder de audiência e usava e abusava do meu nome: Alô, alô Terezinha...

O rádio foi desligado e esquecido. Em compensação, a minha máquina Remington trabalhava sem parar, quando datilografava meus escritos para os concursos de trovas, crônicas, contos e haicais.

Um dia, ouvi falar que o computador viera para agilizar esse trabalho mas, não me interessei... Até o momento em que recebi da filha e genro um presente que foi ligado à tomada e me explicaram que as mensagens chegariam em meu e-mail.

Pediram que eu lesse um que já havia sido enviado e que dizia: “Agora vai ter que aprender”.

E aprendi: por telefone fixo, com o monitor ligado e ouvindo as explicações: — Mãe, está vendo aquele botão lá no alto, à direita? Aperte e me diga o que apareceu na tela... Pouco tempo depois já sabia o que chamo de “o básico do básico”.

Meus trabalhos, agora, são digitados. Assim editei meu livro de trovas e sonetos “À Procura de Estrelas”, aos 80 anos.

Hoje tenho uma senha, um e-mail, recebo e envio textos... E quando tenho dúvidas, as pesquisas são feitas no Google.

A máquina Remington foi guardada, com o carinho que merece e ainda a uso quando a Internet falha.

Não satisfeitos, a filha e o genro, me “presentearam” com um celular e que trabalho me deu! Guardei, ao lado da Remington, as três máquinas fotográficas, desliguei o telefone fixo e empilhei meus álbuns de fotografias na estante – as fotos agora ficam “armazenadas” no computador e quando quero vê-las basta abrir a pasta onde estão. E aqui estou eu tentando adaptar-me a um mundo completamente diferente para poder dialogar, principalmente, com netos e bisnetos.

O ritual começa logo cedo, antes das 6 horas da manhã. Coloco água para o café, no fogão a gás e ligo o celular na tomada. Pronto, já estou on-line... Mando e respondo as mensagens mais urgentes pois, de manhã, sou “dona de casa. Após o almoço, ligo a TV para as notícias e fico a par do que acontece lá fora. Ouvi falar que alguns idosos fazem a sesta – um cochilo após o almoço – mas não faz parte da minha agenda. À tarde quem trabalha é a mente: leio, escrevo, faço trovas, navego na Internet...

Faço parte de quatro grupos que se comunicam, diariamente, pelo WhatsApp: dois de Recife e dois da UBT porque sou a Secretária Nacional da entidade. Da memória não me queixo e lembro-me, com facilidade, de datas históricas, números de telefones e aniversários.

Ao completar 89 anos concluí que, apesar de “ser de ontem” eu não sou velha, e sim, idosa: amo a vida, tenho sonhos e vivo com alegria o momento presente, porque como disse Mia Couto: “A vida passa tão depressa que, às vezes, a alma não tem tempo de envelhecer”.

Fonte: Flávia Suassuna (coord.).Rede Solidária. Coletânea de textos. Recife/PE: 2021. Enviado pela Therezinha.

sexta-feira, 9 de fevereiro de 2024

Mensagem na Garrafa = 101 =

Ialmar Pio Schneider
Porto Alegre/RS

CIGARRAS E FORMIGAS

Nos primeiros anos de escola primária, se não me falha a memória, no terceiro, aprendíamos a fábula “A cigarra e a formiga”, de La Fontaine, traduzida pelo poeta português Belchior M. Curvo Semedo, expressa com as seguintes estrofes: 

Tendo a cigarra em cantigas 
Folgado todo o verão, 
Achou-se em penúria extrema 
Na tormentosa estação. 

Não lhe restando migalha 
Que trincasse, a tagarela 
Foi valer-se da formiga, 
Que morava perto dela. 

Rogou-lhe que lhe emprestasse, 
Pois tinha riqueza e brio, 
Algum grão com que manter-se 
Té voltar o aceso estio. 

“Amiga, (diz a cigarra) 
Prometo, a fé d’animal, 
Pagar-vos antes de agosto 
Os juros e o principal.” 

A formiga nunca empresta, 
Nunca dá, por isso ajunta... 
“- No verão em que lidavas? “
À pedinte ela pergunta.

Responde a outra: “Eu cantava 
Noite e dia, a toda a hora.” 
“Oh! Bravo! (torna a formiga) 
Cantavas? pois dança agora!”

Ensinavam-nos que se não fizéssemos nosso pé de meia no verão, quando chegasse o inverno iríamos ter dificuldades insuperáveis para nossa sobrevivência. De fato, aquela filosofia ficou impregnada em meu subconsciente por diversos anos até que, bem mais tarde, conheci os sonetos de Olegário Mariano, entre os quais o “Conselho de amigo”, que assim se expressa: 

Cigarra! Levo a ouvir-te o dia inteiro, 
Gosto da tua frívola cantiga, 
Mas vou dar-te um conselho, rapariga: 
Trata de abastecer o teu celeiro. 

Trabalha, segue o exemplo da formiga, 
Aí vem o inverno, as chuvas, o nevoeiro, 
E tu, não tendo um pouso hospitaleiro, 
Pedirás... e é bem triste ser mendiga! 

E ela, ouvindo os conselhos que eu lhe dava 
(Quem dá conselhos sempre se consome...) 
 Continuava cantando... continuava…
Parece que no canto ela dizia: 
- Se eu deixar de cantar morro de fome... 
Que a cantiga é o meu pão de cada dia.

Foi deste modo que a literatura explicava-me por dois prismas como deveria ser encarada a existência das cigarras e das formigas. Comecei a aceitar que Deus as fez para que cumprissem seus destinos já traçados. Nem por isso julguei transpor ao homem esta fatalidade, pois este é dono do livre-arbítrio, o que o leva a diferenciar o certo de o errado, ou melhor dizendo, escolher o caminho que deverá trilhar para seu bem-estar e o de sua família. Estamos aqui de passagem, mas podemos discernir as coisas existentes ao nosso redor, sem fugir da responsabilidade que nos pesa.

Se não conseguir realizar tudo o que desejava, por que me frustrar? Posso, contudo, desenvolver as atividades por mim exequíveis de acordo com as minhas forças. Dizem por aí que, nos dias atuais, empatando já é a conta.; outros falam em não deixar cair a peteca; e assim por diante. São expressões populares que despertam um sentimento de aceitação. Quero crer que é a maneira mais adequada de enfrentar a vida.

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2024

Mensagem na garrafa = 100 =

Odenir Follador
Palmeira/PR, 1948 – 2021, Ponta Grossa/PR

CRIANÇAS DE HOJE

Vivemos hoje um momento, em que a tecnologia se faz presente, através de seus infinitos aparelhos eletrônicos, novidades essas que se alterna quase que diuturnamente, levando ao desejo premente de conquista, de tão sonhados frutos, da atual era da explosão digital; e com isso, prendendo a atenção de crianças e adolescentes, principalmente das crianças, que hoje, muitas vezes ociosas, já não brincam da mesma forma como as crianças do passado: Se perguntarmos às crianças de hoje, sobre suas brincadeiras preferidas... Com certeza a maioria responderia que seriam os celulares e computadores. Sem sequer imaginarem do perigo existente nas redes sociais, formado por pessoas malévolas e sem escrúpulos, exigindo por parte dos pais maior atenção e vigilância.

Em pleno século atual, a maioria das crianças desconhece o real significado de “brincar”. Palavra pequena e ao mesmo tempo grandiosa e prazerosa. Podemos afirmar que as brincadeiras sofreram evoluções, mas a essência “criança” permanece. Voltando um pouco no tempo, vejamos como eram as brincadeiras tão inocentes, que faziam parte do dia a dia das crianças àquela época: brincadeiras de roda, cirandinha, pular amarelinha, pular elástico, pular corda, pião, bolinhas-de-gude, carrinho de rolimã, perna-de-pau, bete ombro, etc. 

Brincar é acima de tudo, produzir prazer, vivenciar momentos e lugares aprazíveis com seus amigos, onde se busca nas brincadeiras uma forma de extravasarem suas energias; unindo-as numa forma de criatividade, integração, companheirismo, socialização e autoestima. É também através das brincadeiras que eles aprendem a seguir, respeitar e criar regras, se conscientizando que todos são iguais em cor, raça e religião. O ato de brincar é indispensável à saúde física, mental e ao aprendizado em geral.
(Texto enviado pelo autor)