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domingo, 23 de março de 2025

Vereda da Poesia = 230

Soneto de
EDY SOARES
Vila Velha/ES

INQUIETUDES

Vejo em meu rosto as marcas esculpidas.
O espelho mostra a face insatisfeita
nessas manhãs de noites mal dormidas,
que sua ausência junto a mim se deita...

prevalecendo em vão, em nossas vidas,
há sempre um fio de esperança à espreita,
e um “nunca mais” em nossas despedidas
que o esperançoso o coração rejeita!

E neste emaranhado de quimeras,
passam-se os sonhos, vão-se as primaveras,
os dias passam, tudo passa e enfim...

num misto de regressos e tristezas,
envolto no universo de incertezas…
só este amor incerto é certo em mim!
= = = = = = = = =  

Quadra Popular de
AUTOR ANÔNIMO

Fui na fonte apanhar água,
molhei a ponta do lenço;
o amor de muitos homens
da minha parte dispenso.
= = = = = = = = =  

Poema de
ANTERO JERÓNIMO
Lisboa/ Portugal

Da pele o inebriante apelo 
incita o chamamento dos lábios
num premente e ousado anelo
de beber da fonte o fogo.

Da pele rendidos à química reação
olhos em promessa reagente
deslumbradas mãos em tentação 
num afagar de sentidos sem remissão.

Da pele traça-se relevo mapeado
navegação ausente de pontos cardeais
conquista-se o desejo pela vontade
encanto que nega a breve saciedade.

Da pele essa audível sinfonia de afetos
corpos cegos pela iridescência da paixão
Náiade sulcando as margens do meu rio 
numa promessa de eterna inspiração.
= = = = = = = = =  

Haicai do
PROFESSOR GARCIA
Caicó/RN

A noite sem sono
e, a lua cheia de luz,
sozinha no abandono!
= = = = = = = = =

Poema de
DOMINGOS FREIRE CARDOSO
Ilhavo/ Portugal

ANTE A VERDADE PURA E SEM DISFARCE
(Maria Amélia de Carvalho e Almeida in "Ao Sabor das Marés", p. 192)

Ante a verdade pura e sem disfarce
Dos teus olhos interrogando os meus
O coração, nesse instante do adeus
Não logrou fazer mais do que entregar-se.

E vieram as lágrimas juntar-se
Nascidas dos meus olhos tão ateus
Ao enlace dos meus braços pigmeus
Onde o teu colo em dor veio aninhar-se.

O amor falou mais alto nessa hora
Em que tu desististe de ir embora
E voltaste a aquecer a nossa cama.

A lua deu lugar à luz do dia
Das trevas despontou uma alegria
E das cinzas nasceu uma outra chama.
= = = = = = = = = 

Soneto de
AMAURY NICOLINI
Rio de Janeiro/RJ

DANÇA DOS SIGNOS

Hoje bem cedo eu tive a curiosidade
de ler o horóscopo publicado no jornal,
e se o que está escrito ali for a verdade
o dia que começa vai ser sensacional.

Conhecerei muita gente interessante,
terei mil oportunidades de progresso,
viajarei com destino a um lugar distante
e provarei o sabor doce do sucesso.

Fico pensando se você também, feliz,
e lendo o mesmo horóscopo que eu
pede que ainda mais os astros contem.

E depois, sem conseguir nada que quis,
vai descobrir o que foi que errado deu:
o jornal que a gente leu era de ontem.
= = = = = = 

Poema de
FILEMON MARTINS
São Paulo/ SP

IPUPIARA

Cravada no Sertão, jardim de flores
nasceu uma cidade hospitaleira.
Seus campos coloridos, sedutores,
tornam a vida bela e corriqueira.

Berço de heróis, poetas, escritores,
produzem versos na cidade ordeira.
O clima é quente, bom e aviva as cores
da alegria que é sempre verdadeira.

Ipupiara é flor cheia de encanto,
cuja beleza inspira o bem, porquanto
as alegrias são puras e completas.

Há de brilhar no céu, mesmo à distância,
esta Terra de amor e de elegância,
pois tu és a cidade dos Poetas!
= = = = = = = = =  

Poeminha de
A. A. DE ASSIS
Maringá/PR

Serra-serra,
será dor.
Cessa a serra,
será flor.
= = = = = = = = =  

Poema de
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA
São Paulo/SP

A JANELA ENCANTADA

Se a luz do dia revela
que a noite de amor é finda,
fecho, depressa, a janela
e pensas que é noite ainda!
* * * *

A casa pobre e singela,
um dia se enriqueceu
e os pais, cheios de alegria,
a chamaram de Maria
quando a menina nasceu.

Um quarto, a sala, a cozinha,
uma porta e uma janela...
Nessa casa pequenina
cresceu, em graça, a menina
que, aos poucos, tornou-se bela!

À tarde sai à janela,
sempre no horário marcado
a olhara rua!... Risonha,
a menina pobre sonha
com seu príncipe encantado!

E é na janela o namoro...
Pede, o moço apaixonado,
ao pai a mão de Maria
e, para sua alegria,
o casamento é marcado.

O tempo passou ligeiro...
Sem a cortina de renda,
a casa em ruínas, fechada,
hoje, a janela encantada
ostenta uma placa: À VENDA.
= = = = = = = = =  

Soneto de
ERIGUTEMBERG MENESES
Blumenau/SC

PALETA DE SENTIMENTOS

Se a paleta de cores fosse o peito
E cada cor reflexo dos humores
Seriam os casais vistos nas cores
Dos sentimentos, cada um a seu jeito.

Somente o amor real seria aceito
E não havia ciúme ou rancores.
A vida era um universo de valores
Na arte de expor o par perfeito.

O casal de afeto fiel e franco
Com sentimentos puros era o branco,
A mistura das cores sem ter regra?

E o casal que engana, trai e mente
Teria do extrato reagente
Ao sulfato a cor que mais alegra?
= = = = = = = = =  

Poema de
JÉRSON BRITO
Porto Velho/ RO

RELICÁRIO
 
Do jardim retiraste a fragrância,
Lividez se alastrou, inclemente,
Não levaste, entretanto, a semente
Que me faz encurtar a distância.
 
Em mim mesmo encerrei tua essência,
Tua graça, teu jeito elegante,
Não me aparto sequer um instante
Desse alívio pra minha carência.
 
As delícias daquele cenário
Reuni numa doce memória…
Habitante do meu relicário
 
Apesar dos caminhos cinéreos,
Indelével no peito a história
Irradia sabores etéreos.
= = = = = = = = =  

Soneto de
MILTON S. SOUZA
Porto Alegre/RS, 1945 – 2018, Cachoeirinha/RS

Escravidão

Fazes de mim o que bem quer... mas não consigo
mudar o rumo desta história complicada.
Sufoco mágoas, resisto, brigo contigo...
mas volto sempre a caminhar na mesma estrada.

Na escravidão desta paixão desenfreada,
sinto morrendo uns tantos sonhos que persigo.
minha alma, às vezes, quase explode, revoltada
por ver que faço sempre o oposto do que digo.

Mas este amor, repleto de contradições,
é força imensa que inventa as próprias razões
e faz a mente parar de raciocinar.

A minha vida mais parece um labirinto:
ando sem rumo, bato portas, choro, minto...
por mais que tente, nunca deixo de te amar.
= = = = = = = = =  

Soneto de
LUIZ POETA
(Luiz Gilberto de Barros)
Rio de Janeiro/RJ

FLUTU...ÂNSIAS

Numa doce interferência do destino, 
nossos olhos... cristalinos...se encontraram
e o mundo se tornou tão  pequenino,
ante sonhos que os destinos  projetaram.

E havia tanto encanto em nosso olhar, 
tanto brilho em nosso mar de  poesia,
que nem mesmo a luz da Lua, a flutuar, 
conseguia ofuscar a fantasia.

Nosso amor, que  era tão  adolescente
e inocente em nossa linda ingenuidade,
transformou-se em lembrança... de repente.

repousando no brilho da mesma Lua, 
diluindo-nos, com  mansa  intensidade 
na  saudade que desperta... e que... flutua.
= = = = = = = = =  

sábado, 22 de março de 2025

Vereda da Poesia = 229


Soneto de
EDY SOARES
Vila Velha/ES

PARAFRASEANDO BILAC

Ouvem estrelas, falam com as flores,
e tantas vezes sofrem dores vãs;
dizem sentir o cheiro das manhãs... 
Haverá loucos, aonde quer que fores!

Fazem dos versos, sempre, os seus divãs,
falam de tédio, mortes, desamores...
e tantas vezes atribuem cores 
aos quadros de floradas temporãs.

São sensacionalistas desvairados
buscando, na poesia os verdes prados,
o bucolismo, a paz o, amor profundo...

Podem pensar que somos masoquistas
ou legião de loucos alquimistas...
Mas os poetas vão salvar o mundo!
= = = = = = = = =  

Quadra Popular de
AUTOR ANÔNIMO

O teu rosto de morena
levemente tem a cor;
para poder compará-lo
não encontro uma só flor.
= = = = = = = = =  

Poema de
ANTERO JERÓNIMO
Lisboa/ Portugal

MÁSCARA

Maquilha a preceito os traços do seu rosto invisível
para cada ocasião há sempre uma máscara disponível
Frente ao toucador ilude na displicência
sabe embelezar-se com finas vestes d'aparência
Surge em palco, glamorosa! Não tem hora marcada
dispensa convite e não precisa ser anunciada
Conhece de cartilha os dotes da insinuação
assemelha-se à verdade pela força da convicção
Bamboleando-se audaz observa os presentes
vai distribuindo vénias e olhares reluzentes
O sorriso é fácil, a confusão o seu sustento
é exímia a eleger o espectador mais desatento
Pompa, circunstância, a festa vai no seu apogeu
focam-se as atenções na realidade que se esqueceu
Continua a menear-se, coreografia mil vezes ensaiada
tropeça, cai a máscara, foge em debandada
Cessam os aplausos, pois a festa já terminou
falsas vestes em beco escuro alguém abandonou.
= = = = = = = = =  

Haicai do
PROFESSOR GARCIA
Caicó/RN

A luz do luar,
vejo arabescos na areia
de espumas do mar!
= = = = = = = = =

Poema de
DOMINGOS FREIRE CARDOSO
Ilhavo/ Portugal

QUE NEM UM RASTO FIQUE NO CAMINHO
(Manuel Lima Monteiro Andrade in "Mãos abertas" p. 122)

Que nem rasto fique no caminho
Por onde me perdi, errando os passos
E os meus pés possam ter deixado traços
Quando avançavam sós e em desalinho.

Por mim acompanhado andei sozinho
Com glória diminuta e bens escassos
Cingi os grandes nadas com meus braços
Plantei agrura e quis colher carinho.

Em vão tentei encher meu ser de bem
Degustar o melhor que a vida tem
Mas o meu peito a graça não achou.

Fugaz e pouca foi a rainha vida
Uma estrela cadente que, perdida
Riscou o céu e logo se esfumou...
= = = = = = = = = 

Poema de
ANDRÉ GRANJA CARNEIRO
Atibaia/SP, 1922 – 2014 , Curitiba/PR

QUÂNTICA REALIDADE

Na pequena morte
ressuscito o mundo estranho
da minha cabeça.
Sou o mandarim no sonho da borboleta.
Vivo a irrealidade dos fatos
sem a memória acordada.
Neste próximo milênio
faço 15 bilhões de anos.
Ainda tenho na ponta do dedo
um átomo girando do big-bang.
A cobra,
desesperada
com a falta dos braços,
abraça Eva com o corpo inteiro.
Os avós peixes não se lembram
quando saíram da água.
Não há mais opostos:
real e imaginário,
passado e futuro,
vida e morte.
As palavras caíram
no lago global do esquecimento,
a quântica relatividade dança conosco
no espaço curvo deste planeta redondo.
= = = = = = 

Poema de
FILEMON MARTINS
São Paulo/ SP

COISAS DE AMOR

É noite calma. A lua está brilhando,
namorados passeiam pela rua,
enquanto aqui a sós fico sonhando,
- como dói no meu peito a ausência tua.

Quisera, nesta noite, estar amando
tranquilo a contemplar a luz da lua
e seguirmos, unidos, procurando
novos sonhos, que a vida continua...

Meu coração, porém, desconfiado,
parece reviver triste passado,
— não acredita mais nesta emoção. '

Se a vida não perdeu o encantamento
desse sonho de amor, desse momento,
— coisas de amor não têm explicação.
= = = = = = = = =  

Poema de
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA
São Paulo/SP

A IDADE DO OLHAR

O teu olhar me convida
ao amor... e, ainda que evite,
no meu delírio, atrevida,
eu aceito o teu convite.

O olhar de espanto
diante do mundo.
O primeiro brinquedo, Papai Noel, a escola...
A vida correndo sem parar
e eu a brincar
indiferente...
Meu tempo é o presente.

O olhar sem medo
diante do mundo.
O primeiro amor, a faculdade, o emprego...
Em busca dos sonhos, o adeus, o desapego.
Vencendo distâncias, transpondo fronteiras
eu procuro...
Meu tempo é o futuro.

O olhar sereno
diante do mundo.
Os primeiros sonhos sendo refeitos...
Sobre o livro de orações, os óculos
e sobre a folha de papel, em branco, a caneta
à espera da inspiração para a poesia.
A visita, a carta, o telefone,
o enfado...
Meu tempo é o passado.
= = = = = = = = =  

Soneto de
MIGUEL RUSSOWSKY
Santa Maria/RS (1923 – 2009) Joaçaba/SC

JOIA MAIOR!…

Começo por supor, nos ares, o desenho
De um verso magistral procurando agasalho.
Cabe a mim (sou poeta) encontrar um atalho
Para vê-lo nascer nos recursos que tenho.

Com as rimas gentis nas estrofes, me empenho
Em ser original, (Poucas vezes eu falho),
Já nem ouso explicar se é prazer ou trabalho
Exibir ao leitor as farturas do engenho.

O esmeril dá-lhe o brilho e lhe poda as arestas…
Assim é que se faz um soneto bonito,
Para ser declamado em saraus ou em festas.

Ninguém pode dizer o valor de uma joia,
Se polida não foi pela mão do perito.
É na lapidação que a beleza se apoia.
= = = = = = = = =  

Poema de
SEBAS SUNDFELD
Pirassununga/SP, 1924 – 2015, Tambaú/SP

DEVANEIO

Sua imagem visita
a madrugada do meu sonho.
Recebo-a com a carícia da saudade,
A penumbra da sala
tem o aconchego do seu abraço
e as rosas ainda guardam
o perfume do seu corpo.
Reclino lembranças
sobre a almofada de veludo,
onde nossas mãos se encontraram
ainda há pouco,
no adeus das nossas esperanças.
Para brindar sua presença
retida em meus sentidos,
experimento o sabor de beijos
no vinho que você deixou
na taça de cristal.
E o silêncio dos meus lábios
recita a poesia do seu nome,
= = = = = = = = =  

Poema de
LUCIANA SOARES CHAGAS
Rio de Janeiro/RJ

O VENTO

O vento canta entre as árvores,
seu som desliza sobre as folhas,
o mar sereno, em ondas calmas,
enquanto a lua acende a noite.

A chuva cai sem pressa,
beija o chão em gotas frias,
desenha rios nos caminhos,
abraça o tempo sem destino.

O sol desperta em luz dourada,
veste o dia em fogo e sombra,
banha rostos, veste sonhos,
espalha vida pelo ar.

Um olhar faceiro brilha leve,
segue o vento em seus mistérios,
folhas dançam nos cabelos,
o silêncio esconde um susto breve.

No horizonte, o dia espera,
o tempo e o vento são passagem,
o vestido da moça esvoaça,
mostrando as curvas... da paisagem.
= = = = = = = = =  

POEMA DE
APARECIDO RAIMUNDO DE SOUZA
Vila Velha/ES

DECISÃO

Parei de correr atrás da saudade
que ficou de você...
Agora não me acho em mim
Acredite! É a mais pura verdade…
= = = = = = = = =  

 Poetrix de
REGINALDO COSTA DE ALBUQUERQUE
Campo Grande/ MS

Príncipe moderno

Na dúvida,
anunciou o sapatinho de cristal
nos classificados do jornal.
= = = = = = = = =  

quinta-feira, 20 de março de 2025

Vereda da Poesia = 228


Soneto de
EDY SOARES
Vila Velha/ES

O CONJUNTO DA OBRA

Não me verão sacrificar meu texto
somente em prol da rima ou da estrutura.
Nos vincos da melhor literatura 
versejo, sem alarde, sem pretexto.

Há quem compõe de forma audaz, segura,
buscando a perfeição de um anapesto
e ao se perder, contudo, no contexto
destina o seu poema à sepultura.

Há que se ater nas regras alfabéticas
e, salvo engano, as criações poéticas
exigem mais que forma e conteúdo…

Também, não se esquecer que a poesia
há de fluir com pompa e galhardia…
Formalidade é bom, mas não é tudo!
= = = = = = = = =  

Quadra Popular de
AUTOR ANÔNIMO

Ao ver-te fico perdido,
mulher – onça desalmada,
sinto dor, fico ferido
vai-se ver – não tenho nada.
= = = = = = = = =  

Poema de
ANTERO JERÓNIMO
Lisboa/ Portugal

A saudade
encontra sempre velhos trilhos
e deixa vestígios onde o amor
semeou  a paz das margaridas
a indicar o caminho.
O tempo, impávido matreiro
assistiu ao extinguir da chama
sem manifestar qualquer emoção;
para desespero da palavra 
tremendo na ausência do afago,
de um abraço sentenciado.
Que importa agora
tentar atrasar as horas?
Se os lençóis são testemunho
de que nada devolve a forma original
ao côncavo deixado na partida.
= = = = = = = = =  

Poema de
DOMINGOS FREIRE CARDOSO
Ilhavo/ Portugal

E OS TEUS OLHOS FICARAM MAIS DISTANTES
(Manuel Lima Monteiro Andrade in "Mãos abertas", p. 97)

E os teus olhos ficaram mais distantes
Quando na luz da tarde se perdeu
O aceno da partida que doeu
Como nunca me tinha ferido antes.

Fiquei parado, ali, por uns instantes
Naufragando no mar que, então, desceu
Do meu olhar que a noite ao mundo deu
Habitada por gritos suplicantes.

Tu partiste e eu fiquei de mim ausente
O tempo corre e apenas sei que sinto
Que na terra já nada mais me importa,

Errante vou seguindo inconsciente
Perdido nos sopés de um labirinto
Como se em mim já fosse a vida morta.
= = = = = = = = = 

Poema de
ANDRÉ GRANJA CARNEIRO
Atibaia/SP, 1922 – 2014 , Curitiba/PR

EU ESCAPO

Não tenho gravata,
o último bigode raspei em primeiro de abril
de sessenta e quatro.
Darcy menina, inventora da mini-saia
ficou com as crianças, eu fugi
na subversiva perua Volkswagem.
Tenho pudor de ser poeta,
prefiro escritor, cineasta, hipnotizador emérito,
palavras nem explicam
a economia doméstica,
amordaçam lágrimas ditas femininas,
derramadas pelo sexo másculo.
Há sempre um atrás nos versos
a libertar rostos, mostrar pegadas viscosas
em direção ao seu quarto.
Minhas balas nunca explodiram,
a navalhada espanhola é barbeador elétrico.
Tento ser eclético, abarcar o continente.
Fui Navajo no Arizona,
joguei poquer em cartas marcadas,
dou nó em pespontos,
lavo louça sem nenhum interesse.
De onde surgem estas formigas minúsculas?
Deus displicente, esmago-as sem pena,
almas sem micróbios e baratas são desprezíveis.
Do satélite, só avisto a muralha da China
e a floresta amazônica em chamas.
Meu carro tem pontos de ferrugem,
o aço se transforma em marrons abstratos,
alguns botões da camisa fecham ao contrário,
marca feminina do contraste.
Sigo cego o rumo coletivo deste ônibus.
Passam cenhos cerrados,
proíbem beijar de língua nas bibliotecas,
trocar roupas nos alpendres,
casar filhas com negros,
gargalhar no tribunal togado.
A morte vai batendo de porta em porta,
vendendo bilhetes irrecusáveis
aos guardiães da sociedade.
Eu me escondo no banheiro,
disfarço lendo histórias em quadrinhos
e escapo.
= = = = = = 

Poema de
FILEMON MARTINS
São Paulo/ SP

A JANGADA

Ei-la singrando a imensidão dos mares
tão frágil, tão veloz e independente,
deixando a praia, busca outros lugares
sem medo, sem temor, inconsequente...

Lançada ao mar... As ondas pelos ares...
Vai conquistando o mar azul, fremente,
não há tristezas, dores, nem pesares...
Só a jangada deslizando à frente.

As ondas vêm e vão... E chega a tarde,
aflora um sentimento de saudade
e ela retorna cheia de emoções...

Quantos sonhos viajam na jangada?
mas ao raiar da fresca madrugada
vai para o mar repleta de ilusões!
= = = = = = = = =  

Poema de
MARIA EFIGÊNIA MALLEMONT
Petrópolis/RJ

AMOR EM POESIA

Sobre a mesa,
livros, canções,
odes e sonetos,
onde me debruço,
aconchegando,
meus sonhos.
Na face da noite,
a voz do poeta,
murmurando sonhos
em meu coração deserto!
Aos seus devaneios,
me entrego invisível,
nua, sem resposta.
Deixa-me amar,
do mundo alheia,
nas frágeis torrentes
da tua poesia.
= = = = = = = = =  

Soneto de
MIGUEL RUSSOWSKY
Santa Maria/RS (1923 – 2009) Joaçaba/SC

RECEITA DE SAÚDE E FELICIDADE

Não antecipe nunca o sofrimento!...
Diga “Bom Dia!” ao sol que lhe saúda.
Seja qual um discípulo de Buda:
- É mister se gozar cada momento.

No “que será...será” que não se muda,
se abrigam primaveras...(mais de um cento!)
os “depois” nem podem ser tormento
se os “agoras” lhe derem boa ajuda.

“Cara feia” - sinal de enfermidade -
com certeza, costuma sobrepor
mais pesos aos obstáculos da idade.

"Alegre-se e sorria, por favor!
Um sorrisinho dá felicidade,
pois contagia e ativa o bom humor"
= = = = = = = = =  

Soneto de
PAULO VINHEIRO
Monteiro Lobato/SP

QUIMERA

Quimera, alguma esperança mantenho
Cantilena, monotônica toada trovoa
Do boi o carro carroçando vai cantando
À vera trocam letras tropeçando pedras
Escrevo sem sentidos, abstraio teus olhos
Perdoe o perverso que rabisco a toa
Enxugo lágrimas que não nasceram
Em vão de página… Quem sabe em vão
= = = = = = = = =  

Poema de
DANIEL MAURÍCIO
Curitiba/PR

Índios,
Ao longo
Dos séculos
Sambaquis
De almas...
Na natureza,
A vida
Clama
Em silêncio.
= = = = = = = = =  

sexta-feira, 14 de março de 2025

Vereda da Poesia = 226


Soneto de
EDY SOARES
Vila Velha/ES

MOINHOS DE VENTO

As invasões letais de ervas daninhas,
nossos rosais repletos de falenas;
saúvas temporãs cortando as vinhas...
não trazem tempos bons, eras serenas...

Poeta cônscio, em tantas entrelinhas,
versei, sem a influência dos mecenas,
e tantas vezes vi que são só minhas
as frases que aos demais são “cantilenas”.

Não quero mais falar dos caules tortos,
dos joios infestados nos trigais,
que a ação da “sarracênia” é covardia...

Melhor, talvez, que fossem todos mortos,
mas... vidas são premissas capitais...
E eu sempre fui contrário à eugenia!
= = = = = = = = =  

Poema de
CARLOS LÚCIO GONTIJO
Santo Antônio do Monte/MG

FALSA RETIDÃO

Tudo o que quis ser e não fui
Hoje se dilui sobre o que sou
Em meu passo o mar do destino flui
No que não sou o pedaço do que sou está
Esquecimento faz parte da lembrança
Esperança com a desesperança convive
A vida vive em meio a muita morte
O mais forte nem sempre é valente
Pode não ser contente a pessoa feliz 
Há muita presença cheia de ausência
Muita ausência que presença marca
Refletindo a fiel luz da transparência
Que reflete o ser humano em solidão
Pois que sob o pano solerte da multidão
Todos aparentam viver em retidão
= = = = = = = = =  

Poema de
DOMINGOS FREIRE CARDOSO
Ilhavo/ Portugal

SÓ SE CHORA POR QUEM PARTE
(Manuel Lima Monteiro Andrade in "Mãos abertas", p. 20)
 
Choremos por quem parte sem voltar
A ser presença viva à nossa mesa
E desse imenso reino da tristeza
Desça à terra num raio de luar.

Ausente, para sempre, em nosso olhar
Terá em nosso peito a fortaleza
Que guarda a delicada vela acesa
Da memória que brilha em seu altar.

De saudade será a sua imagem
Que se esvai como um barco na viagem
No denso nevoeiro, rumo ao norte.

Só quando a sua face tão inteira
Não nos assomar, sem que a gente queira
Só então foi levada pela morte.
= = = = = = = = = 

Poema de
LUCIANA SOARES CHAGAS
Rio de Janeiro/RJ

LUÍZA

Luíza, nome que soa como poesia,
Mulher de fé, sorriso que irradia,
Com batom suave, enfeita o dia,
Mãe, esposa, amiga, harmonia.

Tão terna e carinhosa no gesto,
Generosa alma, sempre manifesto,
Disponível ao amor, tão desmedida,
Tu és o melhor livro que já li na vida.

Avó que conta histórias com doçura,
Bisavó, um pilar de ternura,
Destemida, enfrenta cada jornada,
Com a força que só o amor embala.

Luíza, és essência, és beleza,
Um coração que vibra com pureza,
Tua luz é eterna, não se desfaz,
Um poema vivo, escrito na paz.
= = = = = = 

Poema de
FILEMON MARTINS
São Paulo/ SP

INSPIRAÇÃO

Busquei a inspiração a duras penas
para escrever, com fé, este soneto,
e quero que as palavras mais amenas
sejam a Paz e o Amor, como dueto.

Que vou dizer das provações terrenas,
se o ninho é construído com graveto?
– Será melhor curar dores pequenas
e confirmar aquilo que prometo.

Mas teimo em encontrar a inspiração
que se escondeu e foge com razão,
deixando amargurado este poeta…

Clamo de novo e então ela aparece
trazendo junto aos peito farta messe
e agora, sim, a noite está completa!
= = = = = = = = =  

Sextilha de
MILTON SOUZA
Porto Alegre/RS, 1945 – 2018, Cachoeirinha/RS

Ilusões, esta vida tantas deu
que eu bebi desta luz de tantas cores,
muitas delas, já mortas encontrei,
outras vivas, com brilhos multicores...
Ilusões, as mais lindas transformei
nas certezas totais dos meus amores…
= = = = = = = = =  

Soneto de
MIGUEL RUSSOWSKY
Santa Maria/RS (1923 – 2009) Joaçaba/SC

SONETO CLASSE MÉDIA, BAIXA

Quando eu me aposentar… Irei morar em Vênus!…
(O I.P.T.U. de lá, é menor que o da lua.
Há descontos de lei sem qualquer falcatrua
e sem taxas de lixo embutida em terrenos).

Aposentadoria é crime?…(Mais ou menos…
se for por doença não é, mas a verdade crua,
é que os espertalhões desfilam pela rua
cheios de “ME APOSENTEI”) — Que salários obscenos!

Quando eu me aposentar…(Se eu puder, o pijama,
o radinho de pilha, o travesseiro, a cama,
nenhum deles terá um minuto de folga).

Quando eu me aposentar… Urras e Vivas! Bingo!
Os dias de semana, o sábado… o domingo…
serão todos iguais. É isto que me empolga!
= = = = = = = = =  

Cantiga Infantil de Roda
SERENO DA MEIA-NOITE 

É uma roda de crianças, com uma no centro. Cantam as da roda:

Sereno da meia-noite }
Sereno da madrugada } bis

Eu caio, eu caio }
Eu caio. sereno, eu caio } bis

Responde a menina do centro:

Das filhas de minha mãe }
Sou eu a mais estimada } bis

Eu não m'importo, }
Que da amiguinha, }
Eu seja a mais desprezada } bis
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Quadra Popular de
AUTOR ANÔNIMO

Quanto a teteia abre o pico,
turva-se o tempo, meu bem;
quem tem sua dor, que gema,
que eu não sou pai de ninguém.
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Poema de
DANIEL MAURÍCIO
Curitiba/PR

Ecoam cantigas na memória...
À sombra da árvore
Brincam de roda as targets.
Crianças traquinas...
Em movimento, mesclam-se as cores
Entre os raios do sol.
Tontos com tanta beleza
Os olhos sorriem satisfeitos
Pois brincando de roda foi o jeito
Que encontrei pra segurar as tuas mãos.
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