domingo, 21 de dezembro de 2025

Asas da Poesia * 144 *


Poema de
DJALMA PASSOS
Boca do Acre/AC 1923 – 1989, Rio de Janeiro/RJ

Procedência

Venho do mundo dos desiludidos,
De onde a vida se tornou amarga e inconcebível,
De onde a tristeza estendeu suas asas negras
Como um pássaro agoureiro e cruel
Sobre os homens e as cousas...
Venho de um submundo abandonado
Onde não há Deus nem manhãs de sol,
Nem noites de luar nem dias sem crepúsculos,
Onde tudo vaga sem destino,
Sem finalidade e sem conforto...
Trago na garganta o gemido dos aflitos,
No peito a tortura dos injustiçados
E no olhar a mensagem dos eternamente perdidos...

É por isso que a minha alma tem essa vontade estranha
De pairar acima do infinito
E de viver no fundo dos abismos...
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Soneto de
CECÍLIA UGALDE
Rio Branco/AC

Urgência de você

Tenho fome de tua boca, da tua pele,
De sentir no meu corpo tua ousada mão
Ando com fastio de outros alimentos
Já não me sustenta o sagrado pão.

Estou faminta do teu sorriso inebriante,
Dos teus cabelos feitos de raios de sol
Caminho pelas ruas como um vigilante
Farejando o som distinto dos teus pés.

Busco teus traços na manhã que chega
Quero me alimentar da tua mente atrevida,
Da tua fúria no meu corpo confidente e solto

Quero respirar o sabor que me adoça a vida
Vestir o segredo do teu corpo soberbo e nu
Até saciar a fome que existe em mim.
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Poema de
EDMILSON FIGUEIREDO
Xapuri/AC

Bicicleta

Da primeira bicicleta
tive medo,
era enorme para mim.
Maior que o mundo,
não alcançava a sela.
Mas foi com ela
que percorri a rua,
dobrei esquina,
rompi fronteira,
senti o vento,
a sombra do sol...
Na chuva,
cheguei nas nuvens.
                Visitei estrelas,
                pus os pés no céu,
só porque
venci o medo!
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Trova Popular

Essas meninas de agora,
todas querem se casar;
põe a panela no fogo,
e não sabem cozinhar.
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Soneto de
DALMIR FERREIRA
Rio Branco/AC

Soneto

Um soneto como qualquer poema
Pouco representa para um ouvido
Que sem a sensibilidade ao tema,
Não é de separara música de ruído.

A indiferença que pro saber acena
Insensível a mente do ser instruído
Sempre incorrerá na terrível pena
De não discernir a fala de um latido

Qualquer arte, só entrará em cena,
Quando em pé, liberto do grunhido,
Capaz de fala, de decifrar o fonema,

O homem, já sapiens tenha banido,
Dele a fera ou a tenha feito amena,
E em si um espírito haja reconhecido.
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Trova do
LUIZ POETA
(Luiz Gilberto de Barros)
Rio de Janeiro/RJ

Bem no centro da moldura,
tua foto me sorria;
nunca vi tanta ternura
numa só fotografia.
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Poema de
GLÓRIA PEREZ
Rio Branco/AC

Limbo

nem sabia o nome dela
Gostei dos seus olhos vagos
das bobagens que fazia
pensando que impressionava

       um dia assim de repente
sorriu com jeito de amante
eu o beijei como amada
pediu com fome de um dia
lhe dei com a de toda a vida

       ele ficou mais calado
e tem andado arredio
coma medo que eu me apaixone
e venha a lhe criar caso

       é tão menino, tão verde
nada sabe da paixão
— apenas me rói entranhas
sem tocar no coração
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Soneto de
RICARDO CAMACHO
Rio de Janeiro/RJ

Destemido 

Nada há que me machuque ou que me vença,
Que me enclausure num caixote preto,
Que me proíba de fazer soneto
Ou que me faça sucumbir à crença

De ser um mal a perfeição pretensa,
Muito maior que o fútil e obsoleto...
Portanto, nestes versos, pois, prometo
Não desistir da evolução intensa!

Sou eu o autor do próprio desempenho,
Eu organizo as letras... vou e venho
Feito um soldado da arte nas estradas...

Concedo ao meu leitor o acolhimento,
Tirando-o da tristura ao dar o alento
Na porta das saudáveis madrugadas!
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Poema de
HELOY DE CASTRO
Rio Branco/AC

Ah... você calou meu canto,
vestiu de pranto o meu olhar,
eu era o mundo a lhe abraçar
um peito amigo a quem buscar
minha saudade é ímpar
meu organismo é meio
meu complemento é você...
seu lindo corpo é arma
meu ego me desarmou,
vai amante, fica amada
na luta sou perdedor
você, amor precoce
você, questão de sexo...
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Soneto de
GILLIARD SANTOS
Fortaleza/CE

Ampulheta

A areia ali se move lentamente
Neste artefato frágil e incolor...
E em sua ação mecânica e silente,
Vai alcançando o bojo inferior.

Os grãos de areia nunca irão se opor
À lei da gravidade contundente...
Transcorrem, exercendo seu labor,
Cumprindo sua sina, tão somente.

Naquele artigo que hoje adorna a sala
A areia nunca volta, nunca entala
E vai, por ele, sendo consumida.

O tempo, em categórica faceta,
Trabalha assim, conforme essa ampulheta,
Levando, pouco a pouco, nossa vida.
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Poema de
JOÃO PAULO SALES DA SILVA
Rio Branco/AC

Sinceridade e paixão

Mesmo parecendo ilusão
O que eu sinto é paixão
Deixaria tudo por você

O que quiseres de mim te darei
O que pedir para mim eu farei

Sinto ciúmes porque te amo
Suas beldades, seu jeito
Tudo em você é perfeito
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Trova de
A. A. DE ASSIS
Maringá/PR

Aos bons sonhos agradeço, 
mas às insônias também... 
– Ah, quantos versos eu teço 
enquanto o sono não vem! 
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Galope à Beira-mar de
JOSÉ LUCAS DE BARROS
Serra Negra do Norte/RN, 1934 – 2015, Natal/RN

Eu fiz bons estudos à luz da candeia,
andei muitas léguas com os pés no chinelo,
fiz carros de tábuas batendo martelo
e cintos de couro torcendo correia;
enchi as veredas de açudes de areia,
sonhando que um dia pudesse pescar
com redes de linhas que voam no ar
ou grandes tarrafas jogadas no rio,
até que enfrentasse maior desafio
em cima de um barco nas águas do mar.
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Hino de 
Campos do Jordão/SP

Campos do Jordão
Maravilha da minha terra
Campos do Jordão
Joia do Alto da Serra
Campos do Jordão
Obra suprema do divino mestre
Que fez de ti um paraíso terrestre!

Entre as matas verdejantes
E os pinheirais gigantes
Correm rios murmurantes
Sob o céu primaveril
És o meu rincão paulista
O encanto do turista
E o orgulho do Brasil!

Campos do Jordão
Maravilha da minha terra
Campos do Jordão
Joia do alto da serra
Campos do Jordão
Obra suprema do Divino Mestre
Que fez de ti um paraíso terrestre!

Há no alvor das floradas
Poesias imortais
E no tempo das geadas
Lindas manhãs hibernais
Pôs em ti a natureza
Reuniu tanta beleza
Que ninguém esquece mais!
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Poema de
NAYLOR GEORGE
Rio Branco/AC 1956 – 2019

Atração Fatal

Não foi um beijo no sol
Que me fez arder na lua
E te amava andando numa rua
Onde não morava o ódio

Nem foram teus olhos de fera
Me fotografando inteiro
Nem os gestos verdadeiros
Que habitam os vultos raros

Foi o teu esgar, teu gemido de fera, teu cheiro moreno
Exalando ao vento norte
Tangendo as sombras da morte
Trazendo de volta o sossego...
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Fábula em Versos de
JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry/França, 1621 – 1695, Paris/França

O velho, o rapaz e o burro

O mundo ralha de tudo,
Tenha ou não tenha razão,
Quero contar uma história
Em prova desta asserção.

Partia um velho campônio
Do seu monte ao povoado;
Levava um neto que tinha,
No seu burrinho montado.

Encontra uns homens que dizem:
«Olha aquela que tal é!
Montado o rapaz, que é forte,
E o velho trôpego a pé!

— Tapemos a boca ao mundo,
O velho disse: — rapaz,
Desce do burro, que eu monto,
E vem caminhando atrás.»

Monta-se, mas dizer ouve.
«Que patetice tão rata!
O tamanhão, de burrinho,
E o pobre pequeno à pata!

— Eu me apeio, diz, prudente,
O velho de boa fé;
Vá o burro sem carrego,
E vamos ambos a pé.»

Apeiam-se, e outros lhes dizem:
«Toleirões, calcando a lama!
De que lhes serve o burrinho?
Dormem com ele na cama?

— Rapaz, diz o bom do velho,
Se de irmos a pé murmuram,
Ambos no burro montemos,
A ver se ainda nos censuram.»

Montam, mas ouvem de um lado:
«Apeiem-se, almas de breu,
Querem matar o burrinho?
Aposto que não é seu!

— Vamos ao chão, diz o velho,
Já não sei que hei de fazer!
O mundo está de tal sorte,
Que se não pode entender.

É mau se monto no burro,
Se o rapaz monta, mau é;
Se ambos montamos, é mau,
E é mau se vamos a pé!

De tudo me têm ralhado;
Agora que mais me resta?
Peguemos no burro às costas,
Façamos ainda mais esta!

Pegam no burro; o bom velho
Pelas mãos o ergue do chão,
Pega-lhe o rapaz nas pernas,
E assim caminhando vão.

«Olhem dois loucos varridos!
Ouvem com grande sussurro, —
Fazendo mundo às avessas,
Tornados burros do burro!»

O velho então para, e exclama:
«Do que observo me confundo!
Por mais que a gente se mate,
Nunca tapa a boca ao mundo.

Rapaz, vamos como dantes,
Sirvam-nos estas lições:
É mais que tolo quem dá
Ao mundo satisfações.»
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