sexta-feira, 1 de agosto de 2025

Renato Frata (Final de semana)

É sexta-feira, passa das cinco, minha vista se turva diante de um sol que tremelica enquanto pende a se esconder. Então, comparo-o com meu estado de resistência e vejo que sua aparência como a minha, é de cansaço.

Hora de arriar as velas, depor as tralhas e sossegar, afinal, nem o sol é de ferro. Ambos passamos o dia trabalhando.

Ele vagueando à potência máxima de iluminação e eu, por ter me atido às coisas da profissão e da família, em busca do necessário. A bem da verdade, admiro-o pela compostura séria, ereta, resistente, persistente, renhida com que tenta vencer todo o expediente sem demonstrar a indisposição do cansaço que sinto num fim de tarde, especialmente numa sexta.

Disfarça-se bem. Eu, já não consigo.

Porém, ao se enfiar no horizonte, noto que sua figura escurecida deixa a entender que o tremor da luz, ao se despedir, cobra-o de certa forma pelo esforço dispendido, o que torna, também, ao que parece, seu caminhar mais lento. Tal como o meu que a essa hora age como se eu tivesse acumulado gotinhas de chumbo nos pés, uma porção delas no arcar das costas e outras pela dificuldade de as venezianas dos olhos reterem o ardor emanado.

Olhos em brasa sem estar de fogo. Pode? A tela do computador fala que sim.

Olhando-o, porém, com esse enlevo pela visão displicentemente dirigida ao céu, noto que procura abrigo para se aninhar, e o faz sem pressa de indicar exatamente onde se encolherá, mas sabidamente num colo de montanha acinzentada, perdida pelo horizonte. E dali, como que em posição fetal, submergirá envolvido pelo vermelho enegrecido, a lhe servir de manto.

Magistralmente, nesse exato instante, a noite, a seu modo, assume o lugar espalhando raios lunares, e resplandece a paz que da lua brota.

 céu da sexta ganha um brilho especial porque ela, lua, na sua magnificência elementar, simplesmente clareia sem nos perguntar se estamos cansados ou não e, como tivesse mãos mágicas, põe em nossos pés vitalidade, nas costas o conforto, e congraçamento nos olhos a nos fazer de novo descansados para mais uma jornada, essa de lazer; afinal, sexta não é para se ficar em casa.

Não é sempre que aproveitamos a oportunidade de bisbilhotar o céu nesses tempos loucos em que o relógio obriga a que olhemos sem enxergar, sem distinguir contornos, saliências, reentrâncias e nuanças. Nesse caso, com ou sem lua, hibernamos, e não damos conta de que perdemos horas preciosas da vida que segue... sem que ocasiões retornem.

Perder a sexta é perder a semana.

A pressa que damos à vida, agindo como se disputássemos um lugar junto ao próprio sol procurando mais sombra, tira-nos a certeza de que teremos o sábado e o domingo para guardarmos nossa armadura, banhá-la, lustrá-la e deixá-la pronta até a próxima segunda quando poderemos, de novo, seguir o astro nas suas andanças livres, soltas e belas e fazer dos dias da semana a espera pela próxima sexta.
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Renato Benvindo Frata nasceu em Bauru/SP, radicou-se em Paranavaí/PR. Formado em Ciências Contábeis e Direito. Professor da rede pública, aposentado do magistério. Atua ainda, na área de Direito. Fundador da Academia de Letras e Artes de Paranavaí, em 2007, tendo sido seu primeiro presidente. Acadêmico da Confraria Brasileira de Letras. Seus trabalhos literários são editados pelo Diário do Noroeste, de Paranavaí e pelos blogs:  Taturana e Cafécomkibe, além de compartilhá-los pela rede social. Possui diversos livros publicados, a maioria direcionada ao público infantil.
Fontes:
Renato Benvindo Frata. Crepúsculos outonais: contos e crônicas.  Editora EGPACK Embalagens, 2024. Enviado pelo autor.
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing 

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