sábado, 28 de abril de 2018

Trova 297 - Edy Soares (Vila Velha/ES)

Fonte: Facebook (Bonde Trova)

Antonio Florêncio Ferreira (Livro D’Ouro da Poesia Portuguesa vol.1) II

IX

Deixa-me num frágil barco
Nas vagas de iroso mar,
Uma vez que nelas ouça,
Mesmo ao longe, o teu cantar!

Lancem-me na horrenda chama
Da cratera d'um vulcão,
Uma vez que assim o indique
Tua nivea, linda mão!

O morrer por ti é vida;
Que importa viver sem ti?...
Nem sequer um ai sonhaste,
Quando em tantos me exaurí!

X

Qual viajante nos desertos,
Que nunca a sede perdeu,
Encontrar em vão procuro
Amor que se iguale ao meu!

XI

Dize que seja ao sol-posto
Que me devem enterrar,
Para do sol e das aves
A despedida aceitar.

Quero guardar bem guardados
Esses mimos de ternura,
E dar-t'os quando gelada
Baixares á sepultura.

XII

Em horas tristes minh'alma
Vai ao encontro da tua,
Qual noturno caminhante
Ansioso da luz da lua.

E fico não sei que tempos
A teu lado, sem saber
Se nessa vida é que existo,
Se na que torno a volver!

XIII

O que for da nossa índole
Não se pode aniquilar;
Digam às rolas que matem,
Aos lobos que vão rolar...

Consegue-se por semanas
Á inexperiência mentir,
Mas, ou mais cedo, ou mais tarde,
Bom, ou mau, tem de surgir.

XIV

Tlim, tlim, tlim, tlim, tlim! – Quem bate?
-«O Amor.» -Que pretende? -«Entrar.»
– Vá-se embora! – «Então é gelo
O que a tantos vai queimar?...»

XV

Ai Coimbra, ó minha terra,
Não me encantas! Salgueiral,
Estas veias do Mondego,
Tempos idos, nada val'...

Meu coração está longe,
Oh! muito longe d'aqui!
Ela, tão distante, vejo-a!
Olho, e sempre a vejo a si!

XVI

Meu Amor, estás dormindo,
Não te quero despertar...
Ha de ser devagarinho
Que trovas te vou soltar.

De musgo, lírios e rosas
Uma cama irei fazer;
De jasmins e de saudades
O travesseiro há de ser.

Quero que vejas nos sonhos,
Lindos, belos, perfumados,
Os meus olhos, da vigília,
Tristes, lânguidos, magoados...

XVII

Como são belos os campos
Com esta luz verde e ouro!
Que namorados gorjeios!
E de frutos, que tesouro!

O que me trouxe indeciso,
O que me faz vacilar,
É se do sol se douraram,
Se tu que os foste enfeitar!

XVIII

Sinto por vezes morderem-me
Remorsos...– visão pungente!
Ditoso de quem for justo!
Feliz do que não os sente!

Mas nunca tive nem ódios,
Nem invejas, nem rancores!
Remorso é de arrependidos,
Do inferno aqueles horrores!

XIX

Teus beijos são diferentes
Dos que costumo trocar:
Falam, suspiram, seduzem,
Querem minh'alma arrancar!

São demorados, contínuos;
Encerram tanta doçura,
Que me parece abrangerem
Dos anjos toda a ternura!

XX

Quando, saído o meu catre,
Fui contemplar o portal
Da residência que logras,
Supus ver lá um rival.

Antes das feras as garras,
Condenado, morto, emfim,
Que imaginar que te roubam,
Que te separam de mim!

XXI

A noite! a noite!... as estrelas!...
Foi o sol que se escondeu,
Ou teu corpo, exceto os olhos,
Que num manto se envolveu?

XXII

Afirmas ser meu amigo;
D'aquele, que não és tal...
Achas bem o que pratico,
Do que faz me dizes mal.

Reunidos, todos o bajulas,
Pelas mãos metes os pés...
Leve o "demo" tais amigos,
Amigos como tu és!

XXIII

Olha aquela pobrezinha;
Coitada! chorosa vem!
Pede esmola... dão-lh'a, alegra-se,
Talvez pensando n'alguém!

Se me faltasses, não via
Nenhuma esp'rança luzir!
Tinha inveja da mendiga,
Não mais tornava a sorrir!

XXIV

Leva o amor ao sacrifício,
Mas – firmeza – é de amizade;
Não gostava d'este acerto
No vigor da mocidade...

XXV

Já reparaste que entramos,
Todos, no mundo a chorar?
D'ele também não saimos
Sem um suspiro exalar!

Choramos o apartamento
Do ventre de nossa mãe...
Suspiramos pelas glórias
Que outra vida em si contem!

Fonte:
Antonio Florencio Ferreira. Trovas: canções de amor. 
Lisboa: Imprensa de Libanio Silva, 1906

Olivaldo Júnior (Três Microcontos sobre Ilusão Amorosa)

FLOR DE LARANJEIRA 

Maria tinha vinte e cinco anos de idade e morava na roça, num velho ranchinho, à beira de Deus. Seu destino era o altar. Não, não era ser santa, mas noiva. Sonhava com isso. 

José não sabia de nada a não ser capinar e sonhar com sua noiva, a Maria. Homem bom, mandava ver no trabalho, para ver se juntava o suficiente para começar a vida em paz. 

Faltavam três dias para o segundo grande dia na vida de Maria e José. A igreja, tomada de flor de laranjeira, não sabia de nada. José caiu no mundo com Rosa e sem Maria. 

A ESTRELA D'ALVA 

Cristiano era um fã incondicional de histórias de ficção científica. Sonhava em ser astronauta desde sempre. Hoje, em época de pré-vestibular, não sabe bem o que quer ser. 

Nosso amigo, na verdade, era mesmo um fã incondicional das estrelas. De uma delas, em especial, a primeira que vemos mal cai o sol e sobe a lua: a tão cantada estrela d'alva! 

Formar-se em Astronomia parecia um salto concreto demais para um amor tão abstrato quanto o seu pela estrela vésper. Decidiu-se por Letras. Da d'alva, ele fará poesia. 

O CRAVO E A ROSA 

Era um homem sem rosa que o quisesse afagar. Sabia que quase toda rosa tem espinhos, mas era homem e não se importava em quebrar o pote para ter o mel. Era firme. 

A rosa daquele homem não havia chegado. Talvez já tivesse nascido, mas ele não sabia onde. Olhava de esguelho pelas ruas enquanto fingia ter apenas um rumo: a solidão. 

Um dia, embaixo de uma velha laranjeira, já de noite, viu um pé de cravo solitário e triste como ele. Num átimo, roubou um pé de rosa do lado e o plantou juntinho do cravo!... 

Fonte:
O Autor 

Neida Rocha (Lançamento do Projeto Sacola Literária sobre Rodas 30 de Abril)

A Câmara Literária de Pomerode – CLiP lança mais um projeto de incentivo à leitura, seguindo um dos parâmetros do Plano Nacional do Livro, Leitura e Literatura (PNLL) que é a democratização de acesso aos livros.

Temos hoje uma árida realidade em termos de leitura no cenário nacional, pois segundo o PNLL, 2007, em 2007, a média anual de leitura do brasileiro era de 1,8 livro per capita.

Para que possamos mudar essa realidade, é necessário aproximar a literatura dos leitores em potencial.

O PROJETO SACOLA LITERÁRIA SOBRE RODAS propõe a exposição de livros dos Escritores Andrea Gustmann Gomes, Cícero Pedro de Melo e Neida Rocha, vinculados à Câmara Literária de Pomerode – CLiP e outros autores, para os usuários da Empresa Volkmann, através do empréstimo desses livros nos coletivos da linha Pomerode/Blumenau/Pomerode, para leitura durante o trajeto da viagem.

Os passageiros poderão levar emprestados os livros e após a leitura dos mesmos, devolverão à bolsa, para que outros leitores tenham acesso a eles.

O lançamento do projeto acontecerá dia 30 de abril, às 15:00 horas, no pátio da Empresa Volkmann, com a colocação das sacolas nos coletivos que fazem a linha Pomerode/Blumenau/Pomerode.

Ao todo serão 14 (quatorze) ônibus que fazem o trajeto cerca de 50 (cinquenta) vezes ao dia.

A viabilização do projeto realizou-se com a parceria de empresas privadas do município e com doação de livros por parte da comunidade, no espaço disponível no Supermercado Mocam, da Rede Top.

Câmara Literária de Pomerode - CLiP
Neida Rocha, IWA
(47)99227-2202  
Pomerode/SC
www.neidarocha.com.br

Fonte:
Neida Rocha

sexta-feira, 27 de abril de 2018

Trova 296 - Thalma Tavares (São Simão/SP)

Fonte: Facebook (Meus Irmãos Trovadores)

Gislaine Canales (Glosando Delcy Canalles) III


BOM DIA MANHÃ!

MOTE:
Quando a manhã vem surgindo,
no horizonte e diz: Bom-Dia,
minha alma fica sorrindo
e se desdobra em poesia!
(Delcy Canalles)

GLOSA:
Quando a manhã vem surgindo,
com aquele sol tão dourado,
a noite escura fugindo
vai se ocultar do outro lado!

E a manhã nasce triunfante
no horizonte e diz: Bom-Dia,
um Bom-Dia, tão galante
que nos enche de alegria!

Vejo um sorriso cobrindo
esta minha solidão,
minha alma fica sorrindo
toda cheia de emoção!

Nessa manhã deslumbrante
que acorda minha utopia,
minha alma explode radiante
e se desdobra em poesia!
__________________

BUENOS AIRES

MOTE:
Sinto os dias mais risonhos,
pois te vi, como queria,
Buenos Aires dos meus sonhos,
dos tangos e da poesia!
(Delcy Canalles)

GLOSA:
Sinto os dias mais risonhos.
Eu estou realizada!
Adeus, ó dias tristonhos,
vos tirei de minha estrada!

Buenos Aires, mais te adoro,
pois te vi, como queria,
qual um pássaro canoro
transbordante de alegria!

Vivi dias entressonhos
que marcaram minha vida,
Buenos Aires dos meus sonhos,
jamais serás esquecida!

A tua hospitalidade
recordarei, cada dia,
minha querida cidade
dos tangos e da poesia!
________________________

CALENDÁRIO...

MOTE:
Procura contar teus dias
só pelas horas douradas
e colherás alegrias,
em vez de nuvens pesadas!
(Delcy Canalles)

GLOSA:
Procura contar teus dias
pelos momentos de paz.
Esquecendo as nostalgias,
só ventura, encontrarás!

Faze, então, teu calendário
só pelas horas douradas
e comporás um rosário
de "continhas"encantadas!

Viver num mar de poesias
te dará muita emoção,
e colherás alegrias,
se plantares afeição!

E no teu céu multicor,
vivenciarás alvoradas.
Terás um ninho de amor
em vez de nuvens pesadas.
___________________________

CAVALGANDO A ILUSÃO ..

MOTE:
Cheguei tropeando a magia,
vim cavalgando a ilusão,
e "apeei" com galhardia,
nos campos do coração!
(Delcy Canalles)

GLOSA:
Cheguei tropeando a magia,
com laços de faz-de-conta
e enlacei minha alegria
a cada nova reponta!

No meu sonho incontrolado
vim cavalgando a ilusão;
tristezas, deixei de lado,
para viver de paixão!

Galopando noite e dia
eu cheguei ao paraíso
e "apeei" com galhardia,
entre muita festa e riso!

Feliz e realizada,
cheia de amor e emoção,
fiz minha nova morada
nos campos do coração!

Fonte:
Gislaine Canales glosando Delcy Canalles. In Carlos Leite Ribeiro 
(produtor) Biblioteca Virtual Cá Estamos Nós. Janeiro de 2004.

Artur de Azevedo (A "Não - me - Toques")

I

 Passavam-se os anos, e Antonieta ia ficando para tia, - não que lhe faltassem candidatos, mas - infeliz moça! - naquela capital de província não havia um homem, um só, que ela considerasse digno de ser seu marido.

Ao Comendador Costa começavam a inquietar seriamente as exigências da filha, que repelira, já, com desdenhosos muxoxos, uma boa dúzia de pretendentes cobiçados pelas principais donzelas da cidade. Nenhuma destas se casou com rapaz que não fosse primeiramente enjeitado pela altiva Antonieta.

- Que diabo! dizia o comendador à sua mulher, D. Guilhermina, - estou vendo que será preciso encomendar-lhe um príncipe!

- Ou então, acrescentava D. Guilhermina, esperar que algum estrangeiro ilustre, de passagem nesta cidade.

- Está você bem arranjada! Em quarenta anos que aqui estou, só dois estrangeiros ilustres cá têm vindo: o Agassiz e o Herman.

 Entretanto, eram os pais os culpados daquele orgulho indomável. Suficientemente ricos tinham dado à filha uma educação de fidalga, habituando-a desde pequenina a ver imediatamente satisfeitos os seus mais custosos e extravagantes caprichos.

 Bonita, rica, elegante, vestindo-se pelo último figurino, falando correntemente o francês e o inglês, tocando muito bem o piano, cantando que nem uma prima-dona, tinha Antonieta razões sobejas para se julgar um “avis” rara na sociedade em que vivia, e não encontrar em nenhuma classe homem que merecesse a honra insigne de acompanhá-la ao altar.

 Uma grande viagem à Europa, empreendida pelo comendador em companhia da esposa e da filha, completara a obra. Ter estado em Paris constituía, naquela boa terra, um título de superioridade.

 Ao cabo de algum tempo, ninguém mais se atrevia a erguer os olhos para a filha do Comendador Costa, contra a qual se estabeleceu pouco a pouco certa corrente de animadversão.

 Começaram todos a notar-lhe defeitos parecidos com os das uvas de La Fontaine, e, como a qualquer indivíduo, macho ou fêmea, que estivesse em tal ou qual evidência, era difícil escapar ali a uma alcunha, em breve Antonieta se tornou conhecida pela "Não-me-toques".

 II

 Teria sido realmente amada? Não, mas apenas desejada, - tanto assim que todos os seus namorados se esqueceram dela...

Todos, menos o mais discreto, o mais humilde, o único talvez, que jamais se atrevera a revelar os seus sentimentos.

 Chamava-se José Fernandes, e era o primeiro empregado da casa do Comendador Costa, onde entrara aos dez anos de idade, no mesmo dia em que chegara de Portugal.

 Por esse tempo veio ao mundo Antonieta. Ele vira-a nascer, crescer, instruir-se, fazer-se altiva e bela. Quantas vezes a trouxera ao colo, quantas vezes a acalentara nos braços ou a embalara no berço! E, alguns anos depois, era ainda ele quem todas as manhãs a levava e todas as tardes ia buscá-la no colégio.

 Quando Antonieta chegou aos quinze anos e ele aos vinte e cinco, "Seu José" (era assim que lhe chamavam) notou que a sua afeição por aquela menina se transformava, tomando um caráter estranho e indefinível; mas calou-se, e começou de então por diante a viver do seu sonho e do seu tormento Mais tarde, todas as vezes que aparecia um novo pretendente à mão da moça, ele assustava-se, tremia, tinha acessos de ciúmes, que lhe causavam febre, mas o pretendente era, como todos os outros, repelido, e ele exultava na solidão e no silêncio do seu platonismo.

 Materialmente, Seu José sacrificara-se pelo seu amor. Era ele, como se costuma dizer (não sei com que propriedade) o "tombo" da casa comercial do Comendador Costa; entretanto, depois de tantos anos de dedicação e amizade, a sua situação era ainda a de um simples empregado; o patrão, ingrato e egoísta, pagava-lhe em consideração e elogios o que lhe devia em fortuna. Mais de uma vez apareceram a Seu José ocasiões de trocar aquele emprego por uma situação mais vantajosa; ele, porém, não tinha ânimo de deixar a casa onde ao seu lado Antonieta nascera e crescera.

III

 Um dia, tudo mudou de repente.

 Sem dar ouvidos a Seu José, que lhe aconselhava o contrário, o Comendador Costa empenhou a sua casa numa grande especulação, cujos efeitos foram desastrosos, e, para não fechar a porta, viu-se obrigado a fazer uma concordata com os credores. Foi este o primeiro golpe atirado pelo destino contra a altivez da "Não-me-toques".

 A casa ia de novo se levantando, e já estava quase livre dos seus compromissos de honra, quando o Comendador Costa, adoecendo gravemente, faleceu, deixando a família numa situação embaraçosa.

Um verdadeiro deus “ex machina” apareceu então na figura de Seu José que, reunindo as suadas economias que ajuntara durante trinta anos, e associando-se a D. Guilhermina, fundou a firma Viúva Costa & Fernandes, e salvou de uma ruína iminente a casa do seu finado patrão.

 IV

 O estabelecimento prosperava a olhos vistos e era apontado como uma prova eloquente de quanto podem a inteligência, a boa fé e a força de vontade, quando o falecimento da viúva D. Guilhermina veio colocar a filha numa situação difícil...

 Sozinha, sem pai nem mãe, nem amigos, aos trinta e dois anos de idade, sempre bela e arrogante em que pesasse a todos os seus dissabores, aonde iria a "Não-me-toques"?

 Antonieta foi a primeira a pensar que o seu casamento com José Fernandes era um ato que as circunstâncias impunham...

 Antes da sua orfandade, jamais semelhante coisa lhe passaria pela cabeça. Não que Seu José lhe repugnasse: bem sabia quanto esse homem era digno e honrado; estimava-o, porém, como a um tio, ou a um irmão mais velho, - e ela, que recusara a mão de tantos doutores, não podia afazer-se a ideia de se casar com ele.

Entretanto, esse casamento era necessário, era fatal. Demais, a "Não-me-toques" lembrava-se de que o pai, irritado contra os seus contínuos e impertinentes muxoxos, um dia lhe dissera:

 - Não sei o que supões que tu és, ou o que nós somos! Culpa tive eu em dar-te a educação que te dei! Sabes qual é o marido que te convinha? Seu José! Seria um continuador da minha casa e da minha raça!

 Tratava-se por conseguinte, de homologar uma sentença paterna. A continuação da casa já estava confiada a Seu José: era preciso confiar-lhe também a continuação da raça.

 Assim, pois, uma noite ela chamou-o e, com muita gravidade, pesando as palavras, mas friamente, como se tratasse de uma simples operação comercial, lhe deu a entender que desejava ser sua mulher, e ele, que secretamente alimentava a esperança desse desenlace, confessou-lhe trêmulo, e com os olhos inundados de pranto, que esse tinha sido o sonho de toda a sua vida.

 V

 Casaram-se.

 Nunca um marido amou tão apaixonadamente a sua esposa. Seu José levou à Antonieta um coração virgem de outra mulher que não fosse ela; fora das suas obrigações materiais, amá-la, adorá-la, idolatrá-la, tinha sempre sido e continuava a ser a única preocupação do seu espírito...

Entretanto, não era feliz; sentia que ela o não amava, que se entregara a ele apenas para satisfazer a uma conveniência doméstica: era apática; sem querer, fazia-lhe sentir a cada instante a superioridade terrível das suas prendas. Ninguém melhor que ele, tendo sido, aliás, até então, o único homem que lhe tocara, se convenceu de quanto era bem aplicada aquela ridícula alcunha de "Não-me-toques".

O pobre diabo tinha agora saudades do tempo em que a amava em silêncio, sem que ninguém o soubesse, sem que ela própria o suspeitasse.

 VI

 Antonieta aborrecia-se mortalmente naquele casarão onde nascera, e onde ninguém a visitava, porque o seu caráter a incompatibilizara com toda a gente.

 O marido, avisado e solícito, bem o percebeu. Admitiu um bom sócio na sua casa comercial, que prosperava sempre, e levou Antonieta à Europa, atordoando-a com o bulício das primeiras capitais do Velho Mundo.

 De volta, ao cabo de um ano, construiu uma bela casa no bairro mais elegante da cidade, encheu-a de mobílias e adornos trazidos de Paris, e inaugurou-a com um baile para o qual convidou as famílias mais distintas.

 Começou então uma nova existência para Antonieta, que, não obstante aproximar-se da medonha casa dos quarenta, era sempre formosa, com o seu porte de rainha e o seu colo opulento, de uma brandura de cisne.

 As suas salas, profundamente iluminadas, abriam-se quase todas as noites para grandes e pequenas recepções: eram festas sobre festas.

 Agora já lhe não chamavam a "Não-me-toques"; ela tornara-se acessível, amável, insinuante, com um sorriso sempre novo e espontâneo para cada visita.

Fizeram-lhe a corte, e ela, outrora impassível diante dos galanteios, escutava-os agora com prazer.

 Um galã, mais atrevido que os outros, aproveitou o momento psicológico e conseguiu uma entrevista - Esse primeiro amante foi prontamente substituído. Seguiu-se outro, mais outro, seguiram-se muitos...

VII

E quando Seu José, desesperado, fez saltar os miolos com uma bala, deixou esta frase escrita num pedaço de papel:

"Enquanto foi solteira, achava minha mulher que nenhum homem era digno de ser seu marido; depois de casada (por conveniência) achou que todos eles eram dignos de ser seus amantes. Mato-me."

 Fonte:
Correio da Manhã, 12 de outubro de 1902.

Concurso de Trovas Cidade de Curitiba (Prazo: 30 de Junho de 2018)


1. Do Tema. - Trovas líricas ou filosóficas

- Âmbitos Nacional/Internacional/Estadual (Brasil e demais países de língua portuguesa)
Tema: “Bruma”

- Âmbito Regional/Estudantil: (Ensino Fundamental e Médio): 
“Paz” (Lírico-filosófica);

1.1. - A palavra tema não precisa constar do corpo da trova. 

1.2. - Nos âmbitos Nacional/internacional e Estadual, serão contemplados trovadores das categorias Novo Trovador e Veterano. 

1.2.1. - Será considerado Novo Trovador aquele trovador que não obteve até a divulgação deste regulamento 03 (três) classificações em concursos de trova oficiais da UBT em nível nacional. 

2 - Modo de Envio. –

As trovas deverão ser no máximo 02 (duas) por participante, inéditas, de autoria do próprio remetente e, enviadas:

– Por sistema de envelopes, ou

– Por e-mail.

2.1. - Pelo sistema de envelope, deverá constar no envelope pequeno a categoria pela qual concorre o trovador. As trovas deverão ser digitadas ou datilografadas. Não serão aceitas Trovas manuscritas, mesmo que sejam em letra de forma, tampouco envelopes coloridos.

2.2. - Por e-mail, devem ser encaminhadas aos cuidados da Fiel depositária do presente Concurso, as trovas, bem como, a categoria pela qual concorre o trovador deverão constar no corpo do e-mail.

2.3. – É obrigatória a informação pelo participante, sob pena de desclassificação, do nome e endereço postal completo (inclusive CEP e Telefones).

3. - Endereço para remessa:

3.1.: Todos os âmbitos e categorias - Sistema de envelopes:

Concurso de Trovas Cidade de Curitiba
A/C Centro de Letras do Paraná.
Rua Fernando Moreira, 370. Centro. 
CEP 80.410-120. Curitiba – Paraná.

3.1.1.: Para todas as categorias âmbito nacional/internacional/estadual e estudantil, deverá constar no envelope como remetente Luiz Otávio, e o mesmo endereço do destinatário.

3.2.: Todos os âmbitos e categorias - Por E-mail: As trovas deverão ser encaminhadas para: poesiaemtrovas@gmail.com

4. Do Prazo
Todos os Âmbitos: Serão consideradas as trovas que chegarem até 30/06/2018.

5 – Da Premiação
A premiação acontecerá no mês de setembro de 2018 em data, local e horário a ser definido.

5.1. - Será concedida – a Medalha Cidade de Curitiba aos classificados em Primeiro Lugar em cada categoria e Diploma para todos os classificados. 

5.2. - A UBT-Curitiba não se responsabilizará por quaisquer despesas de locomoção e/ou hospedagem dos classificados para o recebimento dos prêmios. 

5. - Da Comissão Organizadora

5.1 A Comissão Organizadora resolverá os casos omissos e suas decisões serão definitivas e irrecorríveis.

5.2 As trovas remetidas em desacordo com qualquer item, serão eliminadas automaticamente do concurso.

5.3 A simples remessa das trovas significa total conhecimento e completa aceitação deste Regulamento.

Maiores informações pelo e-mail: ubtctba@gmail.com

Ou pelo telefone (41) 99787-9485 (TIM)

quinta-feira, 26 de abril de 2018

P. de Petrus (59 Trovas Seletas)


1
A aurora, calma e silente,
áurea luz no céu espraia...
- Vitória do sol nascente
sobre a noite que desmaia…
2
Amiga, eu venho lembrar-te
o que mais nos mortifica:
é a saudade de quem parte,
na saudade de quem fica...
3
A mulher do meu vizinho,
que em amores não se aperta,
mesmo errando no caminho,
chega em casa na hora certa.
4
Ao mar, que as ondas balança,
meu viver se iguala tanto:
tem o verde da esperança
e o salgado do meu pranto!
5
As estrelinhas silentes,
compondo um painel bonito,
são ilhas fosforescentes
no mar azul do infinito.
6
As nossas vidas frustradas,
sem ter amor, sem carinhos,
são rios de águas passadas
que não movem mais moinhos.
7
A traça, ao macho grilado,
diz com censura e ironia:
– deixa esse livro, ó tarado,
que só tem pornografia!...
8
A vida humana é distância
em que há poente e arrebol:
a aurora é o clarão da infância,
e a velhice, - o pôr do sol.
9
Chuva não vem! O sertão
ressequido e na pobreza,
é a própria desolação
na paisagem da Tristeza.
10
Com teu beijo, que extasia,
nossos momentos repartes:
– chegas trazendo alegria,
e tristeza, quando partes!
11
Com todo o amor que requer,
sempre a alegrar corações,
o poeta em seu mister,
é um semeador de ilusões.
12
Cuidado com os que apregoam,
– hipocritamente - o Bem:
mãos amigas que abençoam,
nos apedrejam, também!
13
Dai-me perdão, ó Senhor,
porque eu tive, no passado,
em cada festa - um amor,
em cada amor - um pecado!
14
Deixa, o rio, a cabeceira,
penetrando em meio à bruma,
e ao tombar, em cachoeira,
chora lágrimas de espuma...
15
De modo infame e covarde,
quem roubar a coisa alheia,
encontrará, cedo ou tarde,
caminho certo - a Cadeia.
16
Desce à campa a sogra má,
e explica um verme sereno:
- Hoje, irmãos, jantar não há,
porque este prato é veneno!
17
Desde o nascer, doce amada,
une, o pranto, nossas vidas:
– Nós choramos na chegada,
choram por nós na partida...
18
Diz o frango, acabrunhado,
para a sua irmã franguinha:
– Eu me sinto envergonhado;
nossa mãe é uma  “galinha” ...
19
Diz o porcão à porquinha,
com malícia em sua trama:
– Vem comigo, gorduchinha,
repousar na mesma lama...
20
Do amor, em triste momento,
fomos nós dois à falência,
- não por falta de talento -
faltou a luz da experiência.
21
Do Calvário veio a glória,
cheia de paz e de luz,
onde a divina vitória
nasceu em forma de cruz.
22
Ergue a fronte! Olha adiante,
depois, enfrenta a subida...
Quem foge a luta constante,
não vence, nunca, na vida.
23
Eu busquei dias risonhos
num vendaval de paixões,
mas envolvi os meus sonhos
só de falsas ilusões...
24
Ilha triste é a minha vida,
depois que o amor feneceu:
ilha distante, esquecida,
onde o náufrago sou eu...
25
Lembrança! Creio que digo
o que ela seja, de fato:
– é rever um rosto amigo
na saudade de um retrato!
26
"Meu bem, se foste enganado,
que Deus me cegue sem dó...”
- E ele agora está casado
com mulher de um olho só!
27
Morre a sogra do coveiro!...
Este, vingando a agressão
e as chatices do ano inteiro,
com a pá, espanca o caixão.
28
Na espera mais angustiante,
sem teu amor, teus carinhos,
eu sou humilde integrante
da procissão dos sozinhos...
29
Não mostre, em sua jornada,
dinheiro, anéis e grandeza:
– vi muita gente afogada
no mar da própria riqueza!
30
Nas jornadas mais serenas,
ou mesmo em horas incalmas,
são as renúncias pequenas
que elevam mais nossas almas.
31
Nas noites doces e quietas,
em teu ninho, acolhedor,
nossos beijos de poetas
são acalantos de amor...
32
Nas pernas a "cola" é escrita!
E o professor, espreitando,
fica feliz quando a Rita
ergue a saia e vai “colando"!
33
Na tua boca ao pousar
a minha, com suavidade,
tive a impressão de beijar
a própria felicidade...
34
Na vida, de andanças loucas,
eu formulei meus conceitos:
– minhas virtudes são poucas,
e, sem conta, meus defeitos...
35
Neste mundo de chicanas,
podem, maldosos e ateus,
burlar sentenças humanas,
nunca as sentenças de Deus.
36
Neste mundo em turbulências,
onde é penosa a subida,
são as sofridas vivências
que valorizam a vida...
37
No cinema o filme estreia...
Bem juntinhos, ele e ela,
dão reprises, na plateia,
dos beijos vistos na tela!
38
"O ar da serra eu lhe receito",
- disse o doutor ao Santana.
E este, em casa, satisfeito,
pega um serrote e se abana!
39
Para um 'nu" de fino gosto,
ao posar, sem medo, a nora,
com vergonha cobre o rosto,
mas deixa o resto de fora…
40
Passo os dias em lamento,
meu amor, longe de ti,
lembrando, a todo momento,
os momentos que eu perdi.
41
Penso em ti! E na miragem
desse amor-encantamento,
vejo, feliz, tua imagem
nas ondas do pensamento.
42
Peregrino das jornadas,
nos meus caminhos risonhos,
conduzo, nas madrugadas,
a caravana dos sonhos...
43
Quando a Verdade descerra
o falso véu que a rodeia,
cai a Mentira por terra,
qual um castelo de areia.
44
Quando eu partir desta vida,
ninguém lamente o meu fim...
Mais triste do que a partida
é alguém chorando por mim.
45
Quantas horas de inquietude,
quanta esperança, também,
de alcançar o que não pude
e de esperar quem não vem!
46
Quanto bem o amor me faz!
Nunca vi saudade assim;
por mais longe que te vás,
mais perto ficas de mim!
47
Quase louco, sem carinho,
tão longe dos olhos teus,
vivo, no exílio, sozinho,
amargando os sonhos meus.
48
Que amarga e doce ventura
vive a flor nos dias seus:
– ela enfeita a sepultura
e, também, o altar de Deus.
49
Que me adianta a fibra estoica,
o estridor de tantas queixas,
a insistência quase heroica,
se quero amar-te, e não deixas?!
50
Saudade é doce fragrância
que aprisiona de paixão,
e marca a exata distância
do meu ao teu coração...
51
Sejam brotos ou coroas,
isto dispensa argumento,
são sempre as mulheres boas
que inspiram maus pensamentos!
52
Sem pudores, sem ressábios,
na mais terna das paixões,
quando unimos nossos lábios,
vão se unindo os corações...
53
Se uma pedra arremessada
chega a ferir fortemente,
fere menos a pedrada
que a língua de muita gente!
54
Tem calma, bom carreteiro,
não forces tanto a chegada:
– nem sempre chega primeiro,
quem muito corre na estrada.
55
Tem dez filhos o ceguinho...
E a cada filho que nasce,
explode sempre o vizinho:
- Calculem se ele enxergasse!
56
Toda criança é uma aurora,
– primavera e renascer!...
É a sementinha de agora
que amanhã vai florescer.
57
Torturei-me no abandono,
mas, vencendo a soledade,
meu coração já tem dono:
o dono dele é a saudade.
58
Vendo o edil baixar à lousa,
diz o verme em tom funesto:
– daqui não sai muita cousa,
e, além de tudo, é indigesto!
59
Viajando, triste e pacato,
pela estrada incerta e louca,
levo, em mãos, o teu retrato,
levo os teus beijos na boca.
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P. de Petrus, nome literário de Pedro Bandettini, nasceu na capital de São Paulo em 1920, e faleceu no Rio de Janeiro, em 1999. Diplomou-se pela Escola Técnica de Comércio de São Paulo em 1948. Em 1962, já no Rio de Janeiro, foi apresentado a Luiz Otávio por Zálkind Piatigorsky ingressando, assim nas lides trovadorescas. No Grêmio Brasileiro de Trovadores exerceu o cargo de Tesoureiro. Com a cisão do GBT em 1966, foi Bibliotecário da Diretoria Provisória da UBT até 31 de dezembro daquele ano.
A partir de janeiro de 1967, já consolidada a criação da União Brasileira de Trovadores, exerceu o cargo de Vice-Presidente de Finanças da UBT do Estado da Guanabara. Em 1981, a pedido da Tecnoprint – Edições de Ouro, junto com a colaboração do poeta e trovador Noel Bergamini preparou uma coletânea de trovas intitulada “1000 TROVAS DE AMOR E SAUDADE”. Colaborou semanalmente com uma coluna de trovas, durante três anos, no jornal Última Hora. 
P. de Petrus publicou três livros: “PAISAGENS POÉTICAS”, em 1970, “PENSAMENTOS POÉTICOS”, em 1975 e “MEU CANTEIRO DE TROVAS, em 1984.
Fontes:
– União Brasileira de Trovadores de Porto Alegre. Milton S. De Souza (editor). Livro de Trovas de Jessé Nascimento e P. de Petrus. Coleção Terra e Céu vol. XCV. Porto Alegre/RS: Textocerto, 2016.
- Boletins e Revistas de Trovas diversas