domingo, 29 de janeiro de 2023

Isabel Furini (Poema 39): Conjugação Verbal

 
Fonte: Isabel Furini. Flores e Quimeras. 2017. Ebook.


Cecy Barbosa Campos (Clara Luz)


Ao olhar para ela, não se podia dizer se era feia ou bonita. Não era alta nem baixa, nem gorda nem magra. Era algo indefinível. Entretanto, examinando-a com atenção, podia-se perceber um certo charme, alguma elegância em seu porte altivo, no modo de andar.

Embaixo dos andrajos que vestia, delineava-se um corpo bem feito e no rosto, emoldurado por cabelos desgrenhados, destacavam-se belos olhos verdes.

Estava sempre suja e não poderia ser de outra forma. Todas as manhãs, bem cedinho, antes do caminhão de lixo passar, lá estava ela, examinando os pacotes que haviam sido colocados nas calçadas das casas e as grandes latas de lixo apinhadas de detritos, vidros, pedaços de plástico e objetos velhos e desprezados, que ficavam em frente aos edifícios de luxuosos apartamentos.

Não gostava de falar. Quando se tentava puxar uma conversa, recebia-se em troca um leve balançar de cabeça ou um olhar indiferente.

A minha curiosidade a respeito dela se aguçava. Não parecia uma pessoa comum. Havia um certo quê de distinção, de orgulho, no seu silêncio insistente. Notei que, vez por outra, um homem a acompanhava — quieto, sem vontade, diferente dela. Parecia totalmente entregue às vicissitudes da vida, não demonstrando a decisão da mulher que sempre o precedia.

Enterrando as mãos, corajosamente, nas imundícies dos latões, ela selecionava as variedades encontradas e dava ordens ao homem, em tom baixo, orientando-o para a precária embalagem dos produtos tirados do lixo. Eu não ouvia o que dizia, mas conseguia entender o que estava acontecendo mediante curiosa observação.

Ela nunca falava alto e, mesmo com o seu companheiro, limitava as palavras. Sua contenção não era só em relação a mim e ao homem que a seguia submisso, mas também, em relação ao mundo que a cercava e que ela parecia ignorar.

Um dia, não me contive e perguntei o seu nome. Não me respondeu. Passado algum tempo, quando o homem estava a alguma distância dela, arrisquei-me, perguntando a ele e recebi a surpreendente resposta; Clara Luz.

Como era estranho! Uma mulher vivendo naquela situação, ter aquele nome — um nome que transmitia a ideia de importância, de brilho, de sucesso. Lembrava uma estrela, sugeria uma pessoa iluminada.

Quanta esperança deve ter depositado a mãe de Clara Luz no bebê que nascia. Quanto enlevo, quanta fé no futuro, ao escolher esse nome para a filha...

Ao passar minha primeira reação de surpresa, percebi que, afinal, aquele nome não era inadequado. Não condizia com a vida que Clara Luz levava aqui na Terra, mas estava de acordo com a altivez que ela demonstrava, com sua posição de guia, com o seu desligamento do mundo.

Fonte:
Cecy Barbosa Campos. Recortes de Vida. Varginha/MG: Ed. Alba, 2009.
Livro enviado pela autora.

Afrânio Peixoto (Trovas Populares Brasileiras) – 7


Duvidar de quem se adora
não é decerto viver,
vida assim tão desgraçada
é pior do que morrer.
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Se eu soubesse com certeza
que tu me querias bem,
eu te faria um carinho
que nunca te fez ninguém.
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As ondas brincam de amores,
correm à terra beijar...
Sê tu a terra, querida,
e deixa qu'eu seja o mar.
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Lá dentro desse teu peito
eu desejava morar,
não estorvando a quem mora,
dizei-me se tem lugar.
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Oh bela, porque me matas,
mas a vida me estás dando ?
Se tens de ser meu amor,
não andes vira-virando.
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Eu desejava saber
qual é a tua intenção,
com que fim, com que sentido,
pediste meu coração...
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Manjericão rajadinho,
rajadinho pelo pé,
o meu coração é teu,
0 seu não sei de quem é.
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Você diz que me quer bem,
eu também quero a você,
onde há fogo há fumaça,
quem quer bem logo se vê.
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Dizes que bem me queres,
que meu é teu coração;
Malmequeres que desfolho
dizem-me todos que não…
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Você diz que me quer bem,
que me traz dentro do peito,
Isso não, não acredito,
quem quer bem tem outro jeito.
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Estrela do céu brilhante,
raio de sol encarnado,
se tens amores com outro,
não me tragas enganado.
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Marília, se não me amas,
não me digas a verdade,
finge amor, tem compaixão,
mente, ingrata, por piedade.
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Se queres de mim que te ame,
como sempre já te amei,
bota fora do sentido
certa gentinha que eu sei…
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Papagaio come milho,
periquito leva a fama...
Vai fazer teu fingimento
com aquele que te ama.
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0 meu amor mais o teu
pesei na mesma balança,
o meu pesou direitinho,
só no teu achei mudança.
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A pitanga é fruta doce,
mais doce é jaboticaba;
Quem toma amores contigo,
começa, mas não acaba.
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Coração vai visitar
o mimo da formosura,
pergunta, quero saber,
se nosso amor ainda dura.
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0 marmelo é boa fruta,
enquanto não apodrece;
Assim são amores novos
enquanto não se aborrece.
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Fui à fonte ver Maria,
encontrei com Isabel.
Isto mesmo é qu'eu queria,
caiu-me a sopa no mel.
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0 vento que veio hoje
levou palha e deixou trigo.
Eu quero-te perguntar
se essa carranca é comigo.
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Menina, você que tem
que comigo se enfadou,
será porque seu escravo
a seus pés não se curvou?
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Abram-se as portas do céu,
quero ir ver meu benzinho
qu'ele  fugiu-me dos braços,
foi-se valer dos anjinhos.
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Não sei se vá ou se fique,
não sei se fique ou se vá,
quem ama não se decide
nem por aqui nem por lá.
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Eu era o que te dizia,
tu eras que duvidavas,
que no fim do nosso amor
tu eras, que me deixavas.
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Maria, não me desprezes
por eu ser pobre e não ter;
Pode o rico desprezar-te,
e o pobre te bem querer.

Fonte:
Afrânio Peixoto (seleção). Trovas populares brasileiras. RJ: Francisco Alves, 1919. 
Disponível no Portal de Domínio Público

Amadeu de Carvalho Júnior (Estudar, brincar ou comer?)


A escola Felicidade, como o próprio nome diz, era muito feliz. Os alunos amavam aquela escola, por isso a respeitavam (seu ambiente, seus professores) e se dedicavam aos estudos. Era muito bonita e cheia de flores. Tinha um jardim que era o lugar predileto dos alunos, onde eles ficavam no recreio: havia um balanço, borboletas, uma grande árvore no centro, e uma passarinha muito bonitinha chamada pelos alunos de Rosaninha, nome da professora predileta deles.

Essa escola distribuía uma cesta com comida por semana que continha: um pão com mortadela, um com presunto e mussarela, um com carne moída, um com margarina e manteiga, um com requeijão e um pão puro (sem nada, sem recheio), um pacote de salgadinho, 2 latas de refrigerante, 3 copos de suco, de sobremesa = 1 pedaço de bolo, 2 pedaços de pudim, 1 pedaço de torta, 1 pedaço de gelatina e 3 frutas. Dá para entender (também) porque os alunos gostavam tanto dessa escola.

Certo dia, uma sexta-feira, naquela escola tão calma e pacífica, houve um episódio entre os seus alunos de 4ª série...

No fim da aula da professora Iracema, bate o sinal para o recreio, ela os segura por mais um tempo e diz:

- Estudem o dia todo e todo dia! Não fiquem brincando, é perda de tempo! Aproveitem o recreio para estudar, durmam pouco, não sejam preguiçosos, comam pouco não demorem no almoço ou no jantar, estudem em vez de ficar assistindo televisão ou em vez de conversar com alguém, não visitem ninguém, nem saiam de casa, não fiquem na rua, não vão a nenhuma loja nem nada, estudem, estudem e estudem!

Os alunos vão para o recreio. Alberto, Amélia Cyz e Laura vão para o jardim e outros alunos para o pátio. Lá Alberto passa o recreio todo concentrado estudando com cadernos e lendo livros, não desgrudava seus olhos dos livros. Amélia Cyz passou o recreio inteiro brincando, ficou um tempinho brincando com Rosaninha e depois ficou correndo ou brincando no balanço, não parou, estava muito elétrica e agitada.

Alberto e Amélia Cyz até esqueceram-se de comer, na verdade, pouco ligavam para isso (comida). Já Laura tinha acabado com sua cesta na segunda-feira mesmo (comeu tudo no dia que recebeu!), na terça-feira ela pediu para Alberto a sua cesta e ele deu, ela comeu na terça-feira e na quarta-feira  na quinta-feira pegou sem pedir a maior parte da cesta da distraída Amélia Cyz, só deixou duas ou três coisinhas que ela comeu no dia seguinte, na sexta-feira, o dia atual, sem Amélia Cyz ver novamente, pois Amélia só queria saber de brincar e deixou a cesta largada.

Como Laura era muito faminta e comilona e só havia sobrado pouco na cesta de Amélia Cyz, ela comeu na hora e ainda permaneceu com fome. Foi pedir mais uma cesta parava merendeira Catarina que a repreendeu severamente:

– Laura, a cesta já tem o suficiente para uma semana. Você come demais, vai fazer mal para a sua saúde, e para você mesma, vai ficar gorda e obesa! Não vou dar mais não, é injusto com os outros, pode faltar para eles!

Laura sai tristonha e pensa: Imagine se ela soubesse que eu comi ainda da cesta dos meus colegas!

Laura volta ao jardim.

Logo depois, chegam: o professor Bernardo, de educação física, a inspetora e merendeira gordona (Neli), e a professora de Ciências, Iracema, a mais rígida e severa de todo o colégio (aquela, com que os alunos da 4ª série incluindo Alberto, Cyz e Laura, tiveram aula anteriormente, antes do recreio). Bernardo diz:

– Parabéns, Amélia! Brincar, além de ser uma atividade de lazer e entretenimento muito boa para a infância e para crianças como você, é muito saudável, pois exercita bem o corpo, fortalece, desenvolve suas partes, e queima calorias, emagrece.

 Já Iracema diz:

 - Que nada! Quem merece os parabéns é Alberto! Estudar desenvolve a lógica, o raciocínio e a mente. É só estudando que se pode ser alguém na vida! Olha como ele é dedicado e esforçado!

 Neli discorda:

 – Vocês estão doidos?! Laura que está certa, no recreio tem é que comer, só comer e mais nada, é proibido fazer outra coisa! Além de que comer é bom, é gostoso, e deixa a pessoa bem forte!

Bernardo exclama:

- Você fala isso porque é gorda! É um erro achar que comida é sinônimo de saúde como muitos pensam. Eu fiz faculdade na área nessa área, sei do que falo!

Iracema retruca:

– Estudar exercita o cérebro, que também faz parte do corpo!

E começa uma discussão sem fim. Graças a Deus, bate o sinal e cada um vai para sua classe.

Mas Alberto, Amélia Cyz e Laura ficaram pensando nisso tudo e se fizeram a pergunta: "O que é mais importante: estudar, brincar ou comer?" E fizeram uma aposta: na segunda-feira como iriam ter a 1ª aula com sua professora mais simpática, mais doce e inteligente, a predileta da escola, a Professora Rosana, eles iriam trazer R$ 5,00 cada um e perguntar para ela qual das três coisas era a mais importante. Alberto apostou em estudar, Amélia Cyz em brincar, e Laura em comer, quem ganhasse ficaria com os seus próprios 5 reais e com 10 reais dos outros dois colegas, ao todo 15 reais.

Tiveram as duas aulas posteriores ao recreio e depois foram embora para casa.

Em casa cada um segue sua rotina normal, no final de semana...

... Alberto estuda sem parar, mal chega da escola já vai lendo livros, jornais e revistas como Veja e Galileu, sua mãe fica irritada por ele chegar e ficar lendo, o manda almoçar, ele mal come, já se enfia no caderno, no meio dos livros, fazendo lições e tarefas de casa, trabalhos e estudando para a prova, etc. De noite, passa em claro fazendo trabalho de geografia até a madrugada, amanhece, dorme muito pouco...

... Amélia Cyz brinca o dia inteiro, joga videogame, fica no computador, e joga vários jogos. Pratica esportes como vôlei, vai à casa de colegas, sai na rua brincar com os amigos e não para em casa, muito falante...

... Laura almoça pra valer mesmo depois dos lanches da escola, come muita sobremesa, sorvete, doces, chupa balas, fica mascando chicletes, e outras guloseimas e porcarias, toma café da tarde, depois come um pouquinho disso mais um tanto daquilo, belisca de lá e belisca de cá, não tem jeito, ficou beliscando o dia todo, depois janta, e ceia, e em seguida, já na cama, leva um prato e fica comendo, depois que dorme, acorda de noite com fome e come muito sanduíche...

Finalmente chega a tão esperada e aguardada segunda-feira, ansiosos vão fazer a pergunta para sua professora:

- Professora, o que é mais importante: estudar, brincar ou comer?

– Tudo é importante igualmente. Todas essas coisas são boas e necessárias. O que acontece é que cada coisa tem a sua hora: tem a hora de estudar, o momento de brincar e o tempo de comer. Se todos gostassem de uma coisa só iria ser muito chato, e coitada da outra opção! Assim também temos que estudar, brincar e comer, fazer as três coisas, mas cada uma em seu momento devido e na hora certa.

Assim, nessa segunda-feira, os alunos da Felicidade aprenderam uma grande lição com a sabedoria inspirada e inspiradora da professora Rosana: "Todas as coisas são importantes em seu tempo correto e preciso".

Fonte:
Espaço Literário Sorocult. www.sorocult.com
acesso em 09.01.2016

III Concurso de Trovas Batista Soares – Fortaleza/CE (Prazo: 30 de abril)


A trova deve ser inédita e o tema constar na trova.

Âmbitos e temas:

NACIONAL/INTERNACIONAL:

Uma trova por tema

Novo Trovador: Emoção (L/F)
(Registrar Novo Trovador abaixo da trova);

Veteranos: Regresso (L/F)

Veteranos: Trovador (L/F)
[Em alusão ao centenário de nascimento do Trovador da UBT-Fortaleza Fernando Câncio, in memoriam.]

ESTADUAL (somente Ceará)

Duas trovas por tema

Liberdade (L/F)

Trovador (L/F)
[Em alusão ao centenário de nascimento do Trovador da UBT-Fortaleza Fernando Câncio, in memoriam.]

OBSERVAÇÕES:

Nacional/Internacional: Trovadores residentes nas Unidades da Federação e em outros países. Exclusive para os trovadores do Ceará.

Estadual:  residentes no Ceará.

Novo Trovador:  Considera-se novo trovador aquele que ainda não obteve classificação em 03 concursos de Trovas em âmbito nacional entre os cinco (5) primeiros colocados, de acordo com nova decisão da UBT Nacional.

envio por e-mail: ubt.mpe@gmail.com
para a fiel depositária – Larissa Lopes Filgueiras
nome e endereço completo do autor – Município e Estado.
Se estudante indicar também o nome da escola, série/turma.

As trovas devem ser enviados no corpo do e-mail. Não enviar anexos.

PRAZO: Até 30 de abril de 2023 às 23h59.

CLASSIFICAÇÕES: Serão classificados 20 trabalhos por tema. 5 Vencedores [1º ao 5º] / 5 menções honrosas [6º ao 10º], 5 menções especiais [11º ao 15º], 5 Destaques [16º ao 20º]

PRÊMIOS: Diploma para cada um dos vinte classificados no tema. Os resultados devem ser anunciados em maio, em data a ser confirmada. Todos os diplomas serão enviados por e-mail.

A simples remessa e participação no concurso autoriza automaticamente a publicação e divulgação dos trabalhos não eliminados pelas comissões julgadora e apuradora, em livros, jornais rádios, internet, redes sociais, informativos das Academias, nas escolas/faculdades, com indicação do autor. Os trabalhos não serão devolvidos.