sábado, 27 de outubro de 2018

Olivaldo Júnior (Dois microcontos sobre trovador)


SETE SONS

Ainda moço, descobriu os sete sons e, desde então, redondilha pelo mundo e faz da vida o seu trovar. Não se saiu bem logo de cara, mas tentou, perseverou e é poeta.

Sendo poeta, é trovador. Escolhe o mote, a razão de sua trova e, qual Quixote, com ou sem cavalo, com um Sacho Pança imaginário, cavalga seu destino e vai firme.

Já escreveu bastante, até já fez seu epitáfio (sabe o que é?). Só lhe falta achar seu par, alguém que o perpetue em quatro versos e o ressuscite em sete sons, à luz da lua.

A UBT

Era um homem aparentemente igual aos outros. Mas não era. Era um jovem trovador, um velho sonhador. A UBT (União Brasileira de Trovadores) o descobrira.

Foram dias, tardes e noites pensando nela, nessa associação de quem faz trova e vê seu sonho içar as velas e partir. Luiz Otávio, Príncipe dos Trovadores, que o diga!

Depois de um tempo, distanciou-se de seus pares, e o barquinho da poesia foi ao fundo e viu Netuno, nosso rei. Hoje, à beira-mar, na praia outra vez, parece Anchieta.

Microcontos escritos para 18 de julho: Dia Nacional do Trovador

Fonte: Textos enviados pelo autor

Amilton Maciel Monteiro (Poemas Recolhidos) III


AREIAS

Areias do meu tempo de criança
é mais do que saudade.., é só doçura..., 
é algo que me alegra com lembrança 
que não se apaga mais, nem desfigura!

Os casarões por toda a vizinhança, 
recordavam os tempos de fartura... 
Seu povo, apesar da vida mansa, 
sonhava com evolução futura...

E foi assim, que após setenta anos 
de a ter deixado, com meus desenganos, 
fui revê-la e... qual minha surpresa!

Enquanto fiquei velho e já alquebrado... 
Areias remoçou por todo lado 
e está quase vibrante. E uma beleza!

ARTESÃO

Quisera ser poeta... Sou apenas 
um humilde artesão da poesia, 
que lida com palavra, a duras penas, 
para louvar o amor com alegria.

Trabalho quando as noites são amenas 
e tenho a alma cheia de estesia; 
tal qual oleiro que produz dezenas 
de vasos até ver o que queria...

O artífice de si só dá o melhor, 
na busca de alegrar seu bem maior, 
que é uma das razões de seu viver.

Se não tem perfeição de um bom poeta, 
coloca o coração no que arquiteta...
Por seu amor..., não importa se morrer!


Eu tenho muito dó de quem não crê, 
porque sofre demais no mundo, à toa; 
pois quem tem fé, recebe por mercê 
de Deus a graça de uma vida boa. 

Com fé e confiança a gente vê 
claramente que o Pai nos abençoa; 
e não nos abandona, até por que 
mesmo se erramos Ele nos perdoa!

Se não crês no que falo, experimente 
pedir a Deus que te conceda a fé: 
verás a tua vida transformar.

Passarás a viver alegremente, 
sem mágoa, sem rancor, e creio até 
que muitos vão querer te acompanhar!

SENTIDO DA VIDA

Em busca do sentido desta vida, 
notei que cada qual pensa o que quer... 
Ao pobre é jamais faltar comida; 
ao rico é gozar quanto puder...

Filósofos se atritam de saída... 
Mas aos cristãos, buscá-lo é mister; 
longe da raça humana dividida, 
sonham todos irmãos, se Deus quiser! 

O Onipotente quis assim, por certo, 
mantendo o livre-arbítrio sempre aberto 
a todos, com escolha ao seu dispor... 

O sentido da vida para mim 
é buscar o meu Deus até o fim, 
pois quem O indaga, sempre encontra Amor!

SONHO

Meu sonho desta noite foi incrível;
só mesmo um Freud  para o destrinchar;
olhei no espelho e me senti horrível...
Parecia um duende tumular!

 Não foi um pesadelo desprezível,
dos que nos envergonham de contar;
pelo contrário, até foi susceptível
de reverter a história e me alegrar!

No sonho você disse para mim,
que eu não ficasse triste, tanto assim,
pois não a importava a fealdade minha...

O que valia, disse a minha amada,
com um  sorriso encantador, de fada,
que ela ao meu lado era... uma rainha!

Fonte: Poemas enviados pelo autor

Oscar Wilde (A Esfinge sem Segredos)


Numa tarde, eu estava sentado no terraço do Café de Paix, observando o esplendor e a decadência da vida parisiense, meditando com meu vermute a respeito do estranho panorama de orgulho e miséria que passava diante de mim, quando ouvi alguém chamar meu nome. Virei-me e avistei Lorde Murchison. Nós não nos encontrávamos desde que estiveramos juntos na faculdade, há quase dez anos, por isso fiquei encantado em cruzar com ele de novo, e apertamos as mãos calorosamente. Em Oxford, tínhamos sido grandes amigos. Gostava dele imensamente. Era tão belo, tão bem-humorado, tão nobre.

Costumávamos dizer a seu respeito que seria o melhor dos companheiros se não insistisse em falar sempre a verdade, mas acho que nós realmente o admiravamos, acima de tudo, pela franqueza. Eu o encontrei bastante mudado. Aparentava estar ansioso e confuso, parecendo em dúvida a respeito de alguma coisa. Tive a impressão que de não se tratava do moderno ceticismo, pois Murchison era o mais resistente dos tóris (membro do partido conservador, no Reino Unido da Grã-Bretanha) acreditava no Pentateuco (os cinco primeiros livros do Antigo Testamento, atribuídos a Moisés) tão firmemente quanto acreditava na Câmara dos Lordes. Assim, concluí que deveria tratar-se de uma mulher, e perguntei-lhe se já havia se casado.

“Eu não compreendo as mulheres o suficiente”, respondeu.

“Meu querido Gerald”, disse eu, “mulheres existem para serem amadas, não para serem compreendidas”.

“Se não posso confiar, não poderei amar”, replicou.

“Creio que você tem um mistério em sua vida, Gerald”, exclamei, “conte-me a respeito”.

“Vamos dar uma volta”, ele respondeu, “aqui está muito lotado. Não, não uma carruagem amarela, qualquer outra cor... aquela, a verde escura serve”. E em poucos minutos estávamos trotando para o bulevar, na direção de Madeleine.

“Aonde iremos?”, eu perguntei.

“Ah, aonde você quiser!”, ele respondeu, “ao restaurante de Bois. Jantaremos lá e você me contará tudo a seu respeito”.

“Primeiro gostaria de ouvir sobre você”, disse. “Conte-me seu mistério”.

Ele tirou do bolso uma caixinha de marroquim com feixe de prata e me entregou. Eu a abri. Dentro, estava a fotografia de uma mulher. Era alta e esbelta, estranhamente pitoresca com grandes olhos vagos e cabelos soltos. Parecia-se com uma clarividente, envolta em peles caras.

“O que você acha desse rosto?”, ele disse, “é confiável?”.

Examinei cuidadosamente. Pareceu-me o rosto de alguém que possuía um segredo, mas se o segredo era bom ou mau, não poderia dizer. Sua beleza era uma beleza moldada com muito mistérios – a beleza, na verdade, era psicológica, não plástica – e o sorriso lânguido, que apenas brincava por entre os lábios, era muito mais misterioso que propriamente encantador.

“Bem”, ele exclamou, impaciente, “o que você diz?”.

“É a Gioconda em peles de zibelina”, respondi. “Conte-me tudo a respeito dela”.

“Agora não”, disse ele; “depois do jantar”, e começou a falar sobre outras coisas.

Quando o garçom nos trouxe café e cigarros, lembrei a Gerald sobre a promessa. Ele se levantou de onde estava, caminhou duas ou três vezes de um lado a outro e, afundando em uma poltrona, contou-me a seguinte história:

“Num fim de tarde” estava caminhando pela Bond Street, por volta das cinco horas. Havia um congestionamento terrível de carruagens e o tráfego estava quase parado. Perto da calçada encontrava-se um pequeno coche amarelo, que por uma razão ou outra, atraiu minha atenção. Ao passar por ele, um rosto olhou para fora, o mesmo que eu lhe mostrei hoje à tarde. Fiquei imediatamente fascinado. Passei aquela noite inteira pensando nisso, e por todo o dia seguinte também. Perambulei para cima e para baixo por aquela travessa infame, perscrutando o interior de todas as carruagens, esperando pelo coche amarelo, mas não consegui encontrar minha bela desconhecida, por fim, comecei a achar que ela era meramente um sonho.

Cerca de uma semana mais tarde, fui jantar com Madame Rastail. O jantar estava marcado para as oito horas, mas às oito e meia eu ainda esperava na sala de visitas. Finalmente o criado abriu a porta, anunciando Lady Alroy. Era a mulher por quem procurava. Ela entrou devagar, parecendo um raio de luar em renda cinza, e, para meu absoluto deleite, pediram-me que a acompanhasse até a mesa. Depois de termos sentado, comentei, com perfeita inocência:

‘Penso tê-la visto de relance na Bond Street há pouco tempo atrás, Lady Alroy’.

Ela ficou muito pálida e disse-me, em voz baixa:

‘Peço-lhe que não fale tão alto. Alguém pode escutá-lo’.

Senti-me péssimo por ter começado tão mal e me apressei a comentar as peças francesas. Ela falou muito pouco, sempre na mesma voz melodiosa, e me pareceu que estar com medo de que alguém a ouvisse. Fiquei apaixonado, estupidamente enamorado, e a indefinível atmosfera de mistério que a cercava aumentou ainda mais minha ardente curiosidade. Quando ela já estava indo embora, o que fez logo depois do jantar, perguntei-lhe se podia vê-la novamente. Ela hesitou por um momento, olhando de relance ao redor para ver se tinha alguém por perto, e então disse:

‘Sim! Amanhã, às quinze para as cinco’.

Implorei à Madame de Restail que me falasse a respeito daquela mulher, mas tudo o que pude saber era que se tratava de uma viúva, com uma bela casa em Park Lane. Então como um tedioso especialista começasse a falar a respeito de viúvas, exemplificando a sobrevivência matrimonialmente mais aptos, saí e fui para casa. No dia seguinte, cheguei em Park Lane pontualmente na hora marcada, mas fui informado pelo mordomo de que Lady Alroy tinha acabado de sair. Fui para o clube completamente infeliz e muito confuso. Após longa consideração, escrevi-lhe uma carta
perguntando se me era permitido tentar a sorte noutra tarde. Por fim, recebi um bilhetinho dizendo que ela estaria em casa no domingo, às quatro, e acrescentava este inusitado pós-escrito:
‘Por favor, não me escreva novamente; explicarei quando nos vermos’.

No domingo ela me recebeu e estava plenamente encantadora, mas quando eu já ia embora, me implorou dizendo que, caso tornasse a lhe escrever, endereçasse a carta para ‘Sra. Knox, aos cuidados da Biblioteca Whitacker, Green Street’.

‘Há motivos’, disse ela, ‘pelos quais não posso receber cartas em minha própria casa’.

Durante toda a estação eu a vi com frequência, e a atmosfera de mistério nunca a abandonou. Por vezes pensei que ela estivesse sob o domínio de algum homem, mas parecia tão inacessível que foi verdadeiramente muito difícil para mim chegar a alguma conclusão, pois
ela era como um daqueles estranhos cristais que vemos nos museus: num instante estão claros, no outro, nublados. Por fim decidi pedi-la em casamento. Estava cansado e aborrecido pelo incessante sigilo que ela impunha a todas as minhas visitas e às poucas cartas que lhe enviava. Escrevi-lhe, para o endereço da biblioteca, perguntando se poderia vê-la na segunda-feira seguinte, às seis horas. Ela respondeu que sim, e fui transportado para o sétimo céu das delícias. Estava enfeitiçado por ela. Apesar do mistério, pensei na ocasião, em consequência dele, percebo agora. Não! Era à mulher quem eu amava. O mistério me aborrecia, me enfurecia. Por que o destino me pôs nesse caminho?”.

“Você descobriu, então”, exclamei.

“Temo que sim”, ele respondeu. “Você pode julgar por si mesmo”.

“Na segunda-feira fui almoçar com meu tio e, por volta das quatro horas, me encontrava em Marylebone Road. Meu tio, você sabe, mora em Pengent´s Park. Eu queria chegar a Piccadillty, então peguei um atalho através de várias ruazinhas desgastadas. De repente, vi diante de mim Lady Alroy, com o rosto coberto por um véu grosso, caminhando muito rápido. Chegando à última casa da rua, ela subiu os degraus, tirou a chave de trinco e entrou.

‘Esse é o mistério’, disse a mim mesmo, e corri a examinar a casa. Parecia uma dessas casas em que alugam quartos. No degrau da porta estava um lenço que ela deixara cair. Eu o recolhi e guardei-o no bolso. Em seguida, refleti sobre o que deveria fazer. Cheguei à conclusão de que não tinha o direito de espioná-la, e dirigi-me ao clube. Às seis, fui vê-la. Estava recostada em um sofá, com um robe de tecido prateado preso por algumas estranhas pedras da lua, que ela usava sempre. Parecia perfeitamente bela.

‘Estou tão feliz em vê-lo’, disse, ‘não me ausentei o dia todo’.

Eu a encarei, surpreso, e puxando o lenço do bolso, dei-o a ela.

‘Você deixou cair isto na Cumnor Street esta tarde, Lady Aboy’, disse, muito calmamente.

Ela me olhou aterrorizada, mas não fez nenhuma tentativa para pegar o lenço.

“O que você estava fazendo lá?”, perguntei.

“Que direito você tem de me questionar?”, respondeu.

“O direito de um homem que a ama”, repliquei. “Vim aqui para pedir que se case comigo”.

Ela escondeu o rosto entre as mãos e rompeu num mar de lágrimas.

“Você deve me dizer”, prossegui.

Ela levantou-se e, olhando-me diretamente, disse:

“Lorde Murchison, não há nada para lhe dizer”.

“Você foi se encontrar com alguém!” exclamei, “Esse é seu mistério”.

Ela ficou mortalmente pálida, e bradou:

“Não fui me encontrar com ninguém”.

“Não pode me dizer a verdade?”, exclamei.

“Eu a disse”, replicou.

Estava exasperado e furioso. Não lembro o que disse, mas falei coisas terríveis a ela. Por fim, saí correndo da casa. Ela me escreveu uma carta no dia seguinte; eu a devolvi ainda fechada e parti para Norway, com Alan Colville. Após um mês, retornei, e a primeira coisa que vi no Morning Post foi a notícia da morte de Lady Alroy. Tinha pego uma friagem na Ópera e morrido cinco dias mais tarde de congestão pulmonar. Eu me recolhi, não queria ver ninguém. Eu a amara tanto, eu a amara tão loucamente. Bom Deus! Como amei aquela mulher!”.

“Você voltou àquela rua, à casa em que fica lá?”, perguntei.

“Sim”, ele respondeu.

“Um dia retornei a Cumnor Street. Não pude evitar. Estava torturado pela dúvida. Bati à porta e uma mulher de aparência respeitável atendeu. Perguntei se tinha quartos para alugar.

‘Bem, sir’, ela replicou, ‘as salas de visitas estão supostamente alugadas, mas há três meses que não vejo a senhora, e como o aluguel ainda é devido, pode ficar com elas’.

‘É esta a senhora?’, disse-lhe, mostrando a fotografia.

‘É ela, tenho absoluta certeza’, ela exclamou, ‘e quando ela retornará, sir?’.

‘Esta senhora está morta’, repliquei.

‘Ah, sir! Espero que não!’, disse a mulher. ‘Ela era minha melhor inquilina. Pagava-me três guinéus por semana apenas para sentar-se em minhas salas de visitas de vez em quando’.

‘Ela encontrava-se com alguém aqui?’, eu perguntei, mas a mulher assegurou-me que isso não acontecia, que a senhora sempre vinha sozinha e não se encontrava com ninguém.

‘E o que, afinal, ela fazia aqui?’, bradei.

‘Simplesmente sentava-se na sala de visitas, sir, e lia algum livro. Algumas vezes, tomava chá’, respondeu a mulher.

Eu não sabia o que dizer, então dei a ela uma moeda e fui embora. Então, o que você acha que significa isso tudo? Você acredita que a mulher esteja dizendo a verdade?

“Acredito”.

“Então por que Lady Alroy ia até lá?”.

“Meu querido Gerald”, respondi, “Lady Alroy era simplesmente uma mulher com mania por mistérios. Alugava aquelas salas pelo prazer de ir até lá coberta por véus, imaginando-se uma heroína. Tinha paixão pelo segredo, mas ela própria era meramente uma esfinge sem segredo”.

“Acha mesmo isso?”.

“Tenho certeza disso”, repliquei.

Ele apanhou a caixa de marroquim, abriu-a, e olhou a fotografia.

“Será?”, disse ele, por fim.

Fonte: 
Oscar Wilde. Contos Completos.

sexta-feira, 26 de outubro de 2018

Trova 325 - José Feldman (Maringá/PR)


Concurso de Trovas da UBT São Paulo/SP (Classificação Final)


NACIONAL/INTERNACIONAL
Veteranos
Tema: Certeza

Cézar Augusto Defilippo (Astolfo Dutra/MG)
Dodora Galinari (Belo Horizonte/MG)
Edweine Loureiro da Silva (Saitama/Japão)
Francisco Gabriel (Natal/RN)
Prof. Garcia (Caicó/RN)
José Henrique da Costa (Magé/RJ)
Márcia Jaber (Juiz de Fora/MG)

NACIONAL/INTERNACIONAL
Novos Trovadores
Tema: Certeza

Carlos Henrique S. dos Santos (Juventrova/SP)
Helena Groh (2 trovas) (Pindamonhangaba/SP)
Ingrid de Melo Nambu (Juventrova/SP)
Luca Catherine Ferreira dos Santos (Juventrova/SP)
Luiz Parellada Ruiz (Londrina/PR)
Nicolly Fabianny T. K. Sato(2 trovas) (Juventrova/SP)
Roque Aloisio Weschenfelder (Santa Rosa/RS)

ASSINANTES DO INFORMATIVO 
Tema: Herança

A. A. de Assis (Maringá/PR)
Arlindo Tadeu Hagen (Juiz de Fora/MG)
Élbea Priscila de S. e Silva (Caçapava/SP)
Ercy Maria M.de Faria (2 trovas) (Bauru/SP)
Gilvan Carneiro da Silva (2 trovas) (São Gonçalo/RJ)
José Ouverney (Pindamonhangaba/SP)
Rita Marciano Mourão (Ribeirão Preto/SP)
Roberto Resende Vilela (Pouso Alegre/MG)
Vanda Fagundes Queiroz (Curitiba/PR)
Wanda de Paula Mourthé (Belo Horizonte/MG)

ASSOCIADOS DA UBT SEÇÃO SÃO PAULO/SP  
Tema: Desafio

Ana Cristina de Souza
Débora Novaes de Castro
Domitilla Beltrame (2 trovas)
Hélio Castro
José Manuel Veloso Galvão
Marta Maria de O. Paes de Barros
Renata Paccola (2 trovas)
Roberto Tchepelentyky
Selma Patti Spinelli
Therezinha Dieguez Brisolla (2 trovas)

ASSINANTES DO INFORMATIVO
Troféu Izo Goldman
Tema: Sorte

Élbea Priscila de S. e Silva (Caçapava/SP)
José Ouverney (Pindamonhangaba/SP)
Maria Helena O. Costa (Ponta Grossa/PR)
Maria Madalena Ferreira (Magé/RJ)
Relva do Egypto R. Silveira (Belo Horizonte/MG)

ASSOCIADOS DA UBT SEÇÃO SÃO PAULO/SP
Troféu Izo Goldman
Tema: Sorte

Alba Christina Campos Netto 
Ana Cristina de Souza
José Manuel V. Galvão
Renata Paccola (2 Trovas) 
Roberto Tchepelentyky

ASSINANTES DO INFORMATIVO
Trova Humorística   
Tema: Trapaça

Arlindo Tadeu Hagen (Juiz de Fora/MG)
Élbea Priscila de S. e Silva (Caçapava/SP)
Ercy Maria M. de Faria (Bauru/SP)
Gilvan Carneiro da Silva (São Gonçalo/RJ)
José Ouverney (Pindamonhangaba/SP)
Maria Madalena Ferreira (Magé/RJ)
Relva do Egypto R. Silveira (Belo Horizonte/MG)

ASSOCIADOS DA UBT SÃO PAULO/SP
Trova Humorística   
Tema: Trapaça

Ana Cristina de Souza (2 trovas)
Débora Novaes de Castro
Elias Pescador
Giva da Rocha 
Jaime Pina da Silveira (2 trovas)
Marta M. Paes de Barros
Renata Paccola (2 trovas)
Roberto Tchepelentyky (2 trovas)
Selma Patti Spinelli

Fonte:
A. A. de Assis 

quinta-feira, 25 de outubro de 2018

Janske Niemann Schlenker (Essa...)

Pintura de Thomas Kinkade (Califórnia/EUA, 1958 - 2012)

Irmãos Grimm (Tamborzinho)


Uma noite, um jovem tocador de tambor, Tamborzinho, ia indo pelos campos e passou à margem de um grande lago. Na beira do lago, viu três pequenas peças de linho muito alvo e fino.

– Que fino linho - disse ele e guardou uma no bolso.

Foi para casa e não pensou mais no achado. Deitou-se para dormir e já estava quase adormecendo, quando teve a impressão de que alguém o chamava pelo nome. Sentou-se na cama e prestou atenção. Uma vozinha delicada chamava-o de mansinho:

– Tamborzinho, Tamborzinho, acorda!

Não conseguiu distinguir nada em meio àquelas trevas mas, subitamente, pareceu-lhe ver um vulto pairando no espaço, como se estivesse voando de um lado para outro da cama. Então perguntou:

– Que desejas?

– Devolve-me a minha camisinha, - respondeu a voz – que ontem à tarde apanhaste à beira do lago.

– Tê-la-a, - respondeu ele - se me disseres quem és.

– Eu sou a filha de um poderoso rei - responde a vozinha - tive a infelicidade de cair nas garras de uma terrível bruxa e agora vivo encerrada na montanha de vidro. Todos os dias devo banhar-me no lago junto com minhas irmãs mas, sem a minha camisinha, não poderei voar para a montanha. Minhas irmãs já se foram e eu tive de ficar. Suplico-te, Tamborzinho, restitui-me a minha camisinha!

– Tranquiliza-te, pobre menina, - disse o Tamborzinho - eu a restituo com a maior boa vontade!

Tirou a camisinha do bolso e entregou-lha. Apanhando-a rapidamente, ela tratou de sair correndo, mas ele a deteve:

– Espera um momento, quem sabe se te poderei ajudar!

– Só me poderás ajudar se conseguires subir na montanha de vidro e libertar-me do jugo da bruxa. Mas na montanha não chegarás, mesmo que chegasses ao pé dela, não poderias subir até no alto.

– O que eu quero, sempre posso, - disse o Tamborzinho - tenho muita pena de ti e não receio coisa alguma. Só que não conheço o caminho que conduz até lá.

– A estrada passa através da grande floresta, onde habitam os papões, - respondeu ela - e mais não posso dizer-te.

O rapaz ouviu como que um adejar de asas e o vulto desapareceu. Ao despontar a aurora, ele se pôs a caminho, com o tamborzinho a tiracolo e, sem sombra de medo, meteu-se pela floresta a dentro. Após ter caminhado bastante tempo sem avistar gigante algum, ele pensou consigo mesmo: "tenho que despertar esses dorminhocos!" e, ajeitando o tambor, pôs-se a tocar tão fortemente que os pássaros fugiram voando das árvores, soltando gritos espavoridos. Daí a pouco, levantou-se, também, um gigante que estava dormindo, deitado no chão, o qual era tão alto como o maior pinheiro.

– Olá, anãozinho! - gritou - que é que vens tamborilar aqui e despertar-me no melhor do sono?

– Estou rufando o tambor, - respondeu o rapaz – porque atrás de mim vêm vindo milhares de companheiros e devo ensinar-lhes o caminho.

– E que vêm fazer teus companheiros aqui na minha floresta? - indagou o gigante.

– Querem liquidar-te a fim de limpar a floresta de um monstro como tu!

– Oh, - disse o gigante - pois eu vos esmigalharei todos como formigas.

– Acreditas que podes fazer alguma coisa contra eles? – disse zombeteiro o rapaz - Quando te inclinares para pegar um deles, este te escorregará por entre os dedos e irá esconder-se, e se voltares a te deitar para dormir, todos eles pularão do meio das moitas e treparão no teu corpo. Cada qual traz um martelo de aço preso ao cinto e com ele te farão mil rombos na cabeça!

O gigante ficou preocupado e matutou: "Se me meto com estes danados, poderei sair-me mal. Lobos e ursos posso estrangular facilmente, mas contra vermes desta espécie não sei como me defender!"

– Escuta aqui, amostra de gente, - disse o gigante – volta para tua casa. Prometo-te que daqui por diante te deixarei em paz e, também, a teus companheiros. Agora, se desejas alguma coisa, podes pedir. Por ti farei tudo o que estiver ao meu alcance.

Tamborzinho não hesitou, foi logo dizendo:

– Tu tens as pernas bem mais compridas que as minhas e podes correr mais depressa do que eu. Leva-me sobre a montanha de vidro, assim poderei dar aos meus companheiros o sinal de retirada e, por esta vez, ficarás em paz.

– Então sobe aqui, vermículo, - disse o gigante – senta-te no meu ombro, eu te levarei aonde quiseres.

Assim dizendo, pegou o Tamborzinho e sentou-o no ombro. De lá de cima, o rapaz começou a tocar o tambor com quantas forças tinha. O gigante deduziu: "Deve ser o toque de retirar para os companheiros."

Depois de andar um bom trecho, encontraram no caminho outro gigante. Este pegou o rapaz no ombro do companheiro e colocou-o na lapela do paletó. Tamborzinho agarrou o botão da lapela, que era do tamanho de uma bacia, e segurando-se firmemente nele, divertia-se a olhar para todos os lados. Pouco mais adiante, encontraram um terceiro gigante, o qual tirou o rapaz da lapela do segundo e colocou-o na aba do chapéu. Lá em cima, o rapazinho divertia-se ainda mais. Andava para diante e para trás, espiando por sobre as copas dos arvoredos. De repente, avistou além das árvores uma alta montanha. Alegrou-se pensando: "Deve ser a montanha de vidro." E era mesmo.

O gigante só teve que dar mais dois passos para chegar até ela. Pegou o rapaz e depositou-o no chão. Este, então, pediu-lhe que o levasse até ao cume da montanha, mas o gigante meneou a cabeça, resmungou qualquer coisa entre dentes e voltou a embrenhar-se na floresta. O pobre do Tamborzinho ficou a olhar para a montanha, tão alta quanto três montanhas sobrepostas e, além do mais, lisa como um espelho, sem saber como pudesse subir lá no topo. Tentou escalá-la, mas em vão. Cada vez que o tentava, escorregava para baixo. "Ah, se eu fosse um passarinho!" - murmurava ele. Mas nada adiantava esse desejo, as asas não lhe nasciam nas costas!

Estava ele assim, sem saber o que fazer e nem para que santo apelar, quando viu a certa distância dois homens lutando ferozmente. Aproximou-se-lhes e ficou sabendo que brigavam por causa de uma sela que estava no chão, perto deles, e a razão por que cada qual a desejava para si.

– Mas que grande tolice, - disse-lhes - brigar por causa de uma sela quando não tendes sequer o cavalo para usá-la!

– A sela vale bem esta briga! - respondeu um dos contendores - pois quem sentar nela e desejar ir a qualquer lugar, mesmo que seja ao fim do mundo, chegará no instante que acabar de expressar o desejo. A sela pertence aos dois igualmente e agora chegou a minha vez de montar nela, porém o meu companheiro não quer admitir.

– Pois bem, - disse o rapaz - vou decidir essa questão.

Andou algumas dezenas de passos, fincou uma estaca branca no chão, voltou sobre os passos e disse:

-Agora correi até aquela estaca. Quem chegar primeiro montará na sela.

Os dois saíram a toda velocidade, porém, mal se haviam distanciado um pouco, Tamborzinho, mais que depressa montou na sela e desejou ser levado ao cume da montanha de vidro. Num abrir e fechar de olhos, achou-se lá em cima.

No cume da montanha, havia um planalto e no centro dele uma velha casa de pedra, diante da qual se via um enorme tanque e, do lado oposto, uma floresta gigantesca. Mas não viu homens nem animais. Por toda parte, reinava um pesado silêncio, somente o vento gemia por entre o arvoredo e as nuvens desfilavam tão baixo que quase lhe roçavam a cabeça. O rapaz foi até à porta e bateu. Na terceira vez que bateu, veio abrir uma velha de rosto escuro e olhos vermelhos. Trazia os óculos encarapitados sobre o nariz adunco e, através das lentes, fitou-o agressivamente, de alto abaixo, e por fim perguntou o que desejava.

– Quero entrar, comer e dormir esta noite, - respondeu o rapaz.

– Terás tudo isso, - disse a velha - se em troca fizeres três coisas.

– Como não? - respondeu o rapaz - trabalho nenhum me assusta, por mais árduo que seja!

A velha deixou-o entrar, serviu-lhe comida e à noite deu-lhe uma boa cama para dormir. Pela manhã, ao despertar, a velha tirou um dedal que usava no dedo ressequido e disse-lhe:

– Agora vai trabalhar! Aqui tens este dedal, com ele deves esvaziar o tanque e precisas terminar antes do anoitecer. Todos os peixes que estão dentro devem ser retirados, selecionados e colocados um ao lado do outro, de acordo com a própria espécie e tamanho.

– É uma tarefa muito esquisita! - disse o rapaz, mas foi ao tanque e começou a tirar a água. 

Passou a manhã toda nesse trabalho, mas que é que se pode fazer com um pequeno dedal diante de tanta água? Nem mesmo no espaço de mil anos conseguiria levar a termo a empreitada! Ao soar meio-dia, ele pensou: "É inteiramente inútil o meu esforço, tanto faz que trabalhe ou não!" Desanimado, desistiu de trabalhar e sentou-se aí ao lado. Nisso, da casa veio uma jovem trazendo-lhe o almoço num cestinho e lhe disse:

– Parece que estás muito triste; que tens?

Ele ergueu os olhos e viu que a moça era belíssima.

– Ah! - suspirou - A primeira das três tarefas que me foram impostas não consigo levar a termo. Que será das outras? Ando à procura de uma princesa que, suponho, deve encontra-se nesta casa, mas não a encontrei. Acho melhor, portanto, continuar a minha viagem até encontrá-la.

– Não te vás, não! Fica aqui, eu te ajudarei a executares a tua tarefa. Vejo que estás fatigado. Deita a tua cabeça no meu regaço e dorme um pouco! Ao acordar, verás o trabalho terminado.

Tamborzinho não esperou que lhe dissesse duas vezes, deitou-se e dormiu placidamente. Quando viu que estava com os olhos fechados, a moça girou um anel mágico que tinha no dedo e ordenou:

– Água para cima, peixes para fora!

Imediatamente a água começou a evaporar-se e, como uma névoa branca, foi juntar-se às nuvens, e os peixes, de um salto pularam para a beirada, colocando-se um ao lado do outro, de acordo com a própria espécie e tamanho.

Ao despertar, o rapaz viu com assombro a tarefa terminada. A jovem disse-lhe:

– Um dos peixes não se juntou aos seus semelhantes e ficou de lado, sozinho. À tarde, quando chegar a velha e vir que tudo foi feito conforme as suas ordens, ela te perguntará: - Que significa esse peixe aí sozinho? - Tu, então, atira-lho no rosto e dize: "Este é para ti, velha bruxa!"

E assim foi. À tarde, a velha chegou e fez a tal pergunta, então o rapaz atirou-lhe o peixe no rosto. Ela fingiu não dar por isso, calou-se, lançando-lhe apenas um olhar ameaçador. Na manhã seguinte, chamou-o e disse-lhe:

– Ontem te arranjaste mui facilmente, hoje vou dar-te uma tarefa mais difícil. Tens que cortar todas as árvores da floresta, picar a lenha e arranjá-la em pilhas. Tudo deve ficar pronto antes do anoitecer. 

E entregou-lhe um machado, um malho e uma cunha, mas o machado era de chumbo, o malho e a cunha eram de lata. Portanto, ao dar a primeira machadada, o machado ficou amassado, o malho e a cunha entortaram-se. O rapaz não sabia onde dar com a cabeça. Entretanto, ao meio-dia, chegou a jovem com o almoço e animou-o dizendo:

– Repousa a tua cabeça no meu regaço e dorme, quando acordares, teu trabalho estará pronto.

Quando ele fechou os olhos, ela deu uma volta no anel mágico e eis que a floresta inteira ruiu por terra fragorosamente, a lenha partiu-se por si mesma e empilhou-se sozinha. Parecia que numerosos gigantes invisíveis estivessem realizando aquilo tudo. Quando o rapaz despertou, ela lhe disse:

– Estás vendo? A lenha já está toda empilhada em boa ordem, salvo aquele galho. Hoje à tarde, quando a velha chegar e perguntar a razão disso, tu deves pegar o galho e fustigá-la bem, dizendo: – Isto é para ti, velha bruxa!

De fato, ao entardecer, chegou a velha e foi dizendo: – Viste como era fácil o trabalho? Mas para quem ficou esse galho aí solto?

– É para ti, velha bruxa! - respondeu o rapaz e fustigou-a em cheio no rosto.

A bruxa fez de conta que nada sentira. Sorriu sarcasticamente e disse:

– Amanhã bem cedo, tens de fazer uma só pilha, com toda esta lenha, depois tens de atear-lhe fogo e queimá-las antes do anoitecer.

Assim que raiou o dia, o rapaz levantou-se da cama e foi juntar a lenha na floresta. Mas quem consegue, sozinho, empilhar a lenha de uma floresta inteira? O trabalho não progredia nada. A jovem, porém, não o abandonou naquela angústia. Ao meio-dia, levou- lhe o almoço. Depois de ter almoçado, ele deitou a cabeça no seu regaço e adormeceu. Ao despertar, um pouco mais tarde, a imensa pilha de lenha, toda a lenha da floresta, ardia numa vertiginosa labareda que elevava línguas rubras até ao céu.

– Escuta, - disse-lhe a jovem - quando a bruxa vier, vai exigir de ti as coisas mais absurdas. Não tenhas medo e faze tudo o que ela te ordenar, pois nada de mal poderá fazer-te! Se, porém, ficares com medo, então o fogo te destruirá. Depois de feito tudo o que ela ordenou, agarra-a com as duas mãos e atira-a no meio das chamas.

A jovem foi-se embora e, pouco depois, chegou cautelosamente a velha.

– Uh, que frio! Mas temos aqui um belo fogo. Vou aquecer meus velhos ossos ao calor destas chamas. Como me sinto bem aqui! Vejo lá um tronco que não está ardendo, vai buscá-lo e traze-me! Se conseguires tirá-lo de dentro do fogo, ficarás livre e poderás ir para onde te aprouver. Anda, pula depressa na fogueira!

Sem hesitar, Tamborzinho deu um pulo no meio das chamas e estas não lhe fizeram o menor mal, nem mesmo lhe sapecaram o cabelo, pegou rapidamente o tronco e colocou-o no chão, no lugar indicado por ela. Mal tocou o chão, o tronco, que não se queimara, transformou-se instantaneamente na bela jovem que o vinha auxiliando nas mais difíceis conjunturas. O rapaz não teve dificuldade em reconhecer nela, pelos ricos trajes bordados a outro e cintilantes de pedrarias, a princesa encantada. A velha, porém, riu-se escarninha mente e disse:

– Tu pensas que ela já é tua! Mas não é ainda!

Ia avançar para a moça, a fim de levá-la dali, mas o rapaz agarrou-a com as duas mãos e atirou-a no meio das chamas, que a envolveram completamente, e pareciam felizes de poderem, enfim, devorar a bruxa.

A princesa contemplou Tamborzinho e achou-o bem bonito. Lembrou-se, também, que ele estivera todo o tempo arriscando a própria vida para libertá-la da bruxa, então estendeu-lhe a mão e disse:

– Tu ousaste tudo por mim. Eu também quero fazer por ti tudo o que me for possível. Se juras manter-te fiel ao meu amor, serás meu esposo. Riquezas não nos faltam. Teremos muitíssimo com o que a velha acumulou aqui.

Depois levou-o para casa e mostrou-lhe a enorme quantidade de arcas onde a velha guardava os tesouros. Desprezando o ouro, os dois encheram os bolsos de pedras preciosas e não quiseram demorar-se mais naquela montanha de vidro. Tamborzinho disse à princesa:

– Senta-te comigo na sela e juntos voaremos para a planície como dois pássaros.

– Não me agrada montar nessa velha sela! - disse a jovem - é bastante que eu dê uma volta no meu anel mágico para chegarmos felizmente em casa.

– Está bem, - respondeu o rapaz - então formula o desejo de chegarmos até a porta da cidade.

Num bater de olhos, acharam-se lá. Aí Tamborzinho disse:

– Antes de mais nada, preciso ver meus pais e dar-lhes minhas notícias. Espera-me aqui no campo, voltarei em poucas horas.

– Por favor, - disse a princesa - peço-te que tomes cuidado e não beijes teus pais na face direita, quando lá chegares, senão esquecerás tudo o que se passou e me deixarás abandonada aqui no campo.

– Como poderei esquecer-te? - respondeu o rapaz, e jurou que estaria de volta o mais cedo possível.

Entretanto, chegando em casa ninguém o reconheceu e não sabiam quem era, porque o tempo passado na montanha de vidro, que a ele pareceu terem sido apenas três dias, foram na verdade três anos e, nesse período, ele havia mudado bastante. Deu-se a conhecer aos velhos pais e estes, no auge da alegria, abraçaram-no e beijaram-no nas duas faces. O rapaz estava tão feliz que esqueceu, completamente, a promessa feita à princesa e beijou todo mundo nas duas faces. Mal beijou os pais na face direita, de sua mente apagou-se tudo o que se passara e, também, a princesa.

Sem pensar em nada mais, despejou sobre a mesa as pedras que lhe enchiam os bolsos. Os pais ficaram tão boquiabertos que não sabiam o que fazer com tamanha riqueza. Então o velho construiu um esplêndido palácio, cercado de belos jardins, bosques e prados, exatamente como se nele tivesse que habitar um rei. Uma vez concluído o palácio, a mãe disse:

– Escolhi uma noiva para ti. Daqui a três dias festejaremos as bodas.

O filho concordou e achou certo tudo o que decidiam os pais. Enquanto isso, a pobre princesa esperara um tempo enorme, junto da porta da cidade, que seu noivo regressasse. E quando anoiteceu, logo imaginou: – Com certeza Tamborzinho beijou os pais na face direita e me esqueceu.

Seu coração encheu-se de tristeza. Desejou estar numa casinha solitária no meio da floresta, não querendo voltar à casa do pai, o anel realizou o seu desejo. Mas dirigia-se, diariamente, à cidade e passava diante da casa do rapaz. Ele a viu algumas vezes passando por lá, mas não a reconheceu. Até que um dia, ela ouviu o povo comentar:

– Amanhã, casa-se Tamborzinho.

Seu desespero aumentou e decidiu consigo mesma: "Quero tentar, ainda uma vez, reconquistar seu coração!"

Assim pois, no primeiro dia da festa nupcial, ela deu uma volta no anel mágico e pediu um vestido brilhante como o sol. No mesmo instante, o vestido estava diante de seus olhos, era tão brilhante que parecia tecido com puros raios de sol. Ela se vestiu e foi à festa. Quando entrou na sala, os convidados lá reunidos ficaram deslumbrados com aquele magnífico vestido, especialmente a noiva que, tendo grande paixão pelos trajes suntuosos, dirigiu-se à desconhecida para que lhe vendesse aquele lindo vestido.

– Não o venderei por dinheiro algum! - respondeu a princesa - mas, se me permitires passar a primeira noite junto da porta do quarto de teu noivo, o vestido será teu.

A noiva, não podendo dominar o seu desejo, concordou, mas teve o cuidado de deitar narcótico no vinho do noivo e assim ele dormiu pesadamente. Quando reinou o silêncio na casa, a princesa acocorou-se diante da porta, abriu uma pequena fresta e chamou:

-Tamborzinho, escuta, escuta:
Já de todo me olvidaste? Na montanha não estiveste comigo? Da perversa bruxa não te dei abrigo? Apertando-me a mão, fidelidade não juraste? Tamborzinho escuta, escuta!

Mas o lamento foi inútil. O rapaz não acordou e nada ouviu. Ao romper do dia, a princesa teve que retirar-se sem nada ter conseguido.

Na segunda noite, ela deu uma volta no anel e pediu: "Quero um vestido prateado como o luar," e o vestido lhe foi entregue.

Desta vez, também, ao entrar no salão da festa com o maravilhoso vestido delicado como o luar, despertou a cobiça da noiva, que o obteve em troca da permissão dada à princesa de passar à noite na soleira do quarto do noivo. E, na quietude da noite, seu lamento foi o mesmo da noite anterior:

- Tamborzinho, escuta, escuta:
Já de todo me olvidaste? Na montanha não estiveste comigo? Da perversa bruxa não te dei abrigo? Apertando-me a mão, fidelidade não juraste? Tamborzinho escuta, escuta!

Mas Tamborzinho, entorpecido pelo narcótico, não acordou do profundo sono. Muito triste, assim que rompeu a manhã, ela teve que partir sem ter conseguido nada, indo chorar as mágoas na casinha da floresta.

Alguns criados, porém, tinham ouvido as palavras da jovem desconhecida e foram comunicá-las ao noivo, dizendo que ele nada ouvira porque lhe fora ministrado um narcótico no vinho.

Na terceira noite, a princesa girou mais uma vez o anel e pediu: "Quero um vestido rutilante como as estrelas." E, quando ela surgiu na festa, com esse vestido esplendoroso, a noiva ficou fora de si pelo desejo de
possui-lo, e murmurou:

– Hei de possuí-lo, custe o que custar!

De fato, deu a permissão solicitada pela princesa e obteve o cobiçado vestido. Nessa noite, porém, o noivo não bebeu o vinho que lhe foi oferecido antes de deitar, disfarçadamente jogou-o fora, e assim, quando reinou silêncio na casa, ele ouviu uma voz meiga e delicada dizer:

-Tamborzinho, escuta, escuta:
Já de todo me olvidaste? Na montanha não estiveste comigo? Da perversa bruxa não te dei abrigo? Apertando-me a mão, fidelidade não juraste? Tamborzinho escuta, escuta!

No mesmo instante, Tamborzinho sentiu reavivar-se-lhe a memória.

- Ah, - exclamou - como pude agir tão perversamente? A culpa foi do beijo que, sem pensar, dei na face direita de meus pais, foi ele quem me fez esquecer tudo! 

Pulou da cama, correu para a princesa e tomando-lhe a mão, conduziu-a ao quarto de seus pais.

– Esta é a minha verdadeira noiva, - disse - se me casar com outra, cometerei a mais atroz das injustiças.

Após tomarem conhecimento de tudo quanto ocorrera, os pais acharam justo o casamento, então mandaram iluminar novamente a casa, chamaram os tocadores de tímpanos e alaúdes, convidaram todos os parentes e amigos e as núpcias verdadeiras foram realizadas entre festas e grande alegria.

A outra noiva, como compensação, ficou com os maravilhosos vestidos e deu-se por satisfeita.

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