sábado, 2 de setembro de 2023

Therezinha D. Brisolla (Trov" Humor) 15

 

Artur de Azevedo (Coisas de Anselmo)

A cena passa-se na atualidade, no interior de uma taverna. Um bico de gás alumia escassamente um grupo de habitues. Os cérebros e os copos estão cheios de cerveja!

Anselmo, no meio dos rapazes — como Cristo entre os doutores, discute largamente sobre a sua própria individualidade.

Sejamos indiscretos como a lira do poeta, como as lufadas da ventania, como um suspiro apaixonado, e ouçamo-lo:

– Em Paris, para onde fugi das perseguições que me faziam por causa de uma dançarina andaluza que, em Lisboa, teve a fraqueza de se apaixonar por mim, cresceu o número das minhas aventuras amorosas...

– Este Anselmo!

– Vou contar-vos um dos meus menos interessantes bamboches (patuscadas): — Uma noite, aborrecido de tudo: - dos espetáculos, dos bailes e das corridas, eu passeava distraído no boulevard dos italianos e vi uma mão alva e pequena pendida de um parapeito de janela baixa — Uma mão! disse eu comigo, parando maquinalmente e contemplando extasiado aquela partícula anônima de um corpo de mulher! — Uma mão, repeti, que deve por força pertencer à mais linda madame de Paris! — E levando-a maquinalmente aos lábios, beijei-a amorosamente.

– Em Paris, Anselmo, na terra da multidão ninguém te viu praticar semelhan...

– Bem mostras que ainda não saíste do Maranhão, meu amigo. Na grande capital, quem repara nisso? Quem se importa com um beijo?...

– Continua.

– A minha mão que, para que meus lábios se colassem nas veias azuis da mão da moça, havia apertado-lhe os dedos entre os seus, sentiu-se de súbito apertada também! O meu sangue gelou-se nas veias, todo inteiro — ossos — carnes — tremi! Ergui os olhos: a pessoa conservava a mesma misteriosa posição: nada mais via que essa nevada mão que, por tão pouco, soube se apoderar de uma existência…

E eu disse: — Ange ou femme, montre—moi ton visage, regarde—moi.

— É' melhor, interrompeu um do grupo, que nos contes isso em português.

— Anjo ou mulher, traduziu Anselmo, mostra-me o teu rosto, olha-me: vê a impressão que me causou a tua mão... — Não, respondeu-me uma voz argentina e melíflua. — Ouí, redargui — Non, repetiu-se-me. E a mão desapareceu. Eu, vivamente impressionado pela esquisitice romântica da aventura, deixei a janela e prossegui o meu caminho. No hotel não pude conciliar o sono: aquela mão me aparecia por todos os lados; a minha fantasia desenhava-me um rosto angélico e sedutor, que forçosamente havia de ser o da moça do boulevard. No dia seguinte, às mesmas horas, na mesmíssima janela, a mesma mão causou-me as mesmíssimas impressões. Renovou-se diariamente, durante muito tempo, aquela excêntrica entrevista, sem nunca conseguir descobrir o rosto da minha clandestina Dulcinéa; quando afinal — um dia —, transferindo comigo mesmo as horas do meu passeio, encontrei-a debruçada à janela. Era linda como a supunha. Informei-me a seu respeito: soube que se chamava Finette, e era modista. Aproximei-me timidamente, e timidamente entreguei-lhe esta quadra que escrevi às pressas na esquina, em uma das folhas da minha carteira:

Para você, minha querida Finette,
Meu amor é muito forte;
Você se torna minha conquista,
E você é meu único tesouro!…


—Muito bem! E ela? o que te disse ela?...

— Ela, respondeu Anselmo, tomou o papel, leu, releu, refletiu e, pedindo-me o lápis, escreveu por baixo:

Eu não sou sua conquista,
Eu não sou seu tesouro.
Mas você foi estúpido,
Porque você é estúpido de novo!


Os que sabiam francês acolheram com uma gargalhada geral o remate da aventura do nosso Anselmo: este, tirando da algibeira uma caixa de colarinhos de papel, para substituir o que já se havia rasgado no pescoço —
pelo suor, preparou-se, levantou a sessão e sábio entre os seus companheiros, que o debicavam, ao ouvir-lhe as aventuras de amor.

Fonte:
Artur de Azevedo. O Domingo: Semanário crítico e literário. São Luís, MA: Tipografia do Liberal, Ano I. n. 40. 10 nov 1872.
Disponível em Domínio Público
Versado para o Português atual e traduções das quadras do francês para o português por J.Feldman 

Professor Garcia (Trovas que sonhei cantar) XIII


Se a ausência não te tortura,
a mim, causa espanto e dor;
a ausência rouba a ternura
da graça de um grande amor!
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Planos, ilusões, quimeras,
viraram cinzas pagãs,
no forno das primaveras
dos sóis de minhas manhãs!
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Quando o silêncio me acalma,
eu sinto um desejo imenso,
de ouvir a voz de minha alma
na voz de tudo que eu penso!
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No outono, é que se descobre
que a vida é rota sem fugas,
pela presença mais nobre
do olhar, das primeiras rugas!
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Da rua de minha infância,
a saudade perpetua...
Meus passos, na ressonância
das pegadas pela rua!
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Chove!... e essa chuva, no entanto,
são lágrimas dos desejos
dos céus, acabando o pranto
dos olhos dos sertanejos!
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Quem ao outro, o amor não nega
esse amor, que ao bem conduz...
Se aceita a cruz que carrega,
não sente o peso da cruz!
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A planta, de olhar atento,
sabe que as folhas no chão,
serão adubo e alimento
de outras folhas que virão!
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Num berço, entre os mais singelos,
brilha uma luz que se lança
sobre os mais cruéis libelos,
dando aos mortais, a esperança!
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De ouro e de prata, eu sou pobre,
nunca ostentei vaidade;
não há riqueza mais nobre
que a nobreza da humildade!
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Saudade - eterna moldura,
que em todos nós, perpetua...
Passos da doce ternura
da infância de nossa rua!
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Não te esqueças que esse orgulho
que te deixa tão nervoso,
é a resposta desse entulho
do coração do orgulhoso!
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Meus versos cheios de enredos,
lutam contra o tempo atroz,
guardando os nossos segredos,
tão segredados por nós!
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Quando a tarde se aproxima,
e o sol, se despede ao léu,
põe versos cheios de rima,
nas nuvens que estão no céu!
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Sinto-me um velho andarilho,
na trilha dos rastros teus,
para entregar-te meu filho
o resto dos versos meus!
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Quando o espelho se aproxima,
num rosto velho enublado,
parece que falta a rima
que já sobrou no passado!
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Ah! se voltasse e, se eu visse
risos de amor e empatia,
talvez, a paz existisse
e afastasse a pandemia!
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O bilhete que te escrevo,
com mãos trêmulas, parece
que escrever mais não me atrevo,
sem teu calor que me aquece!
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A tarde de olhar sombrio,
nunca diz adeus, era vão...
Põe no olhar triste e vazio,
os olhos da solidão!
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Ante o beijo, me apequeno,
não sem motivo qualquer;
Quem prova desse veneno,
se rende a qualquer mulher!
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O filho embarca cantando,
mas, finge a dor dos seus ais,
com o lenço branco acenando
à mãe, que acena no cais!
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Se o orgulho, a ninguém socorre,
então, por que se orgulhar?...
Rio orgulhoso que corre,
perde o orgulho ao ver o mar!
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Quem faz guerra e busca a paz,
dá-me a resposta mais breve:
nem sabe aquilo que faz
nem faz aquilo que deve!
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Parte a jangada e, no entanto,
saudosos sonhos intensos
acenam cheios de pranto
ao cais, coberto de lenços!
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Quem faz promessas e juras,
ouvindo a voz do perdão,
percebe que as amarguras
e os desenganos se vão!
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Àquele que estende a mão,
para qualquer "Zé ninguém",
Jesus multiplica o pão
de quem dá pão, para alguém!

Fonte:
Professor Garcia. Trovas que sonhei cantar. vol.2. Caicó: Ed. do Autor, 2018.  
Enviado pelo trovador.

Graciliano Ramos (O marquesão de jaqueira)

Espiando a lua que branqueava o pátio, seu Libório pinicava a prima da viola, gemendo baixinho uns versos de embolada. Alexandre, com ar de entendido, aprovava a cantoria. Mestre Gaudêncio curandeiro gingava, como se quisesse dançar. Os bilros da almofada de Cesária tocavam castanholas na esteira. Um cajado bateu no copiar:

— Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo.

O cego preto Firmino entrou e, tateando, ladeando a parede, foi acocorar-se. Os bilros emudeceram e a voz de Cesária ergueu-se lenta:

— Conte a história do marquesão, Alexandre.

— É o que eu estava com vontade de pedir, meu padrinho, o marquesão, gritou Das Dores.

— Bobagem, resmungou Alexandre enrugando a cara. Seu Libório está desovando uma cantiga bonita, e seu Libório é o cantador mais famoso desta ribeira. Quando seu Libório abre o bico, até os passarinhos do mato se escondem.

O violeiro, modesto, interrompeu o canto e abafou com as mãos o rumor das cordas.

— Não senhor. Isso é bondade. Estava aqui dizendo umas besteiras, para matar tempo. Agora se seu Alexandre tem um marquesão na cabeça, eu me calo. Quando seu Alexandre move um dedo, quem se atreve a piar? Hem? Puxe o marquesão, seu Alexandre.

— Não senhor, não puxo, resistiu o dono da casa. Faço lá semelhante desfeita a uma criatura do seu tope? Continue, seu Libório.

— Continuo não. Quem sou eu? Vim escutar. Fale seu Alexandre, que é homem de merecimento.

Passaram quinze minutos nesse jogo, cada um tentando encolher-se e elevar o outro. Enfim Alexandre se deu por vencido:

— Vossemecês mandam. Eu estava quieto, mas seu Libório decide, e não tenho remédio senão obedecer. A culpada foi Cesária, que atirou em cima da gente um marquesão da jaqueira, um traste velho sem importância. Não valia a pena tocar nele. Para quê? Cesária tem cada lembrança! Eu começo, meus amigos. Não sou de gabolices. Reconheço que possuo algumas habilidades: enxergo no escuro, aguento-me numa sela e atiro regularmente. Mas em muitos casos espichados aqui para os senhores não mostrei valor. Comprei um papagaio que tinha astúcias de cristão e vi uma guariba diferente das outras. Qualquer um podia comprar o papagaio e ver a guariba, não é verdade? Na história de hoje também não pratiquei ação: recebi foi um susto dos demônios. Bem, vou principiar do princípio. Quando meu pai entregou a alma a Deus, deixou tantos possuídos que os oficiais de justiça arregalaram o olho: terra, muito patacão de ouro, um despotismo de gado. Meu irmão mais novo queria correr mundo e no inventário recebeu o quinhão dele em dinheiro; eu aceitei a fazenda, os animais e uma casa na rua, uma tapera que mandei reformar, caiar, pintar e enfeitar. Encomendei para ela móveis caros de lorde: mesas com embutidos, cadeiras fofas, camas de molas, armários, trocinhos miúdos sem nome e sem préstimo, cortinas, penduricalhos, um marquesão de jaqueira, enorme, coberto de couro lavrado, uma peça que me saiu por seiscentos e vinte mil réis. Pronta a casa, vivemos nela uns dias, na grandeza, recebendo visitas do prefeito, do juiz, do vigário, do chefe político, de todas as autoridades do lugar.

“Voltamos para a fazenda, mas aí Cesária apanhou um resfriado, cuspiu sangue, esteve uns meses bamba, entre a vida e a morte. Quando pisou no chão, só tinha osso, coitada. Magra como um casaco, amarela como gema de ovo. Deixei a nossa terra e andei tempo sem fim para cima e para baixo, procurando um doutor que botasse a mulher nos trilhos. Depois de muito xarope e muita garrafada, ela endureceu o espinhaço, tomou carne e endireitou a figura. Mas eu tinha gasto uma fortuna, tinha esbagaçado a herança quase toda em médico e botica para remendar o interior da patroa. Dinheiro nenhum, os bois desaparecendo, a miunça acabando na morrinha.”

— Exatamente, Alexandre, murmurou Cesária triste, o cachimbo apagado, o olho distante, o cotovelo pregado na almofada. Aquela macacoa estragou o nosso cabedal. É verdade que me aprumei, mas ficamos na tira e você precisou começar a vida de novo.

Alexandre amarrou a conversa na palavra da companheira:

— Isso, começar a vida de novo, deitar os bofes pela boca varando caminho, num desespero, do sertão para a mata e da mata para o sertão, comprando e vendendo. Felizmente eu dispunha de consideração, graças a Deus não me faltava crédito. Consegui levantar-me: os currais encheram-se, a cabroeira valente espalhou-se nos arredores, contando lambança, e rolos de notas graúdas forraram os fundos das arcas. Mas tive um trabalhão infeliz, espremendo os miolos e consumindo o corpo. Um dia Cesária chegou junto de mim e saiu-se com esta proposta: — “Xandu, vamos passar na rua a festa da Senhora Sant’Ana?” Não respondi que sim nem que não, e Cesária, renitente, pegou a amolar-me: — “Vamos, Xandu. Você, numa labuta dos diabos, se esquece do mundo. Faz um bando de anos que não saímos deste buraco, nem para ouvir missa. Vivemos em pecado, isto aqui fede a heresia, Xandu. E aquela casa fechada está se desgraçando com certeza no cupim e na goteira. Vamos passar na rua a festa da Senhora Sant’Ana.” Foram as suas palavras, Cesária.

— Foram as minhas palavras, Alexandre. Você tem memória.

— Tenho, prosseguiu o narrador. Fizemos os preparativos e no dia da Santa lá nos largamos para a cidade, eu no cavalo esquipador arreado com arreios de prata, Cesária vistosa na saia de montaria, composta no silhão, de banda, que naquele tempo havia decência e mulher não se escanchava em sela, como hoje. Entrando na rua, dei de cara com o Silva, homem de leitura, sabido como um tabelião. Nunca vi ninguém que soubesse tanto. Esse moço tinha andado nos estudos, defendia presos no júri, conhecia todos os livros do mundo e escrevia por baixo da água.

— “Como tem passado, major Alexandre?” —“Na graça de Deus, dr. Silva. Como vai a obrigação?” Conversa puxa conversa, estive ali um pedaço de tempo admirando a cadência do Silva. Quando nos despedimos, ele me perguntou: — “O senhor não está sentindo um cheiro esquisito, major Alexandre?” Abri as ventas, funguei e balancei a cabeça espantado: — “Não estou sentindo nada não, dr. Silva. Cheiro de quê?” Silva respondeu com um nome difícil, dos que vêm nos livros; eu fiquei jejuando, pedi que ele trocasse aquilo em miúdo, fui atendido e saí na mesma, um tanto ou quanto encabulado, dizendo cá por dentro que o rapaz tinha inventado uma pilhéria sem graça para me empulhar. Botei o cavalo na pisada baixa. Em frente da igreja, mal acabado o padre -nosso que rezo quando passo diante de imagens sagradas, desejei torcer a rédea, voltar, saber do Silva se ele tinha tido a intenção de mangar de mim. Não admito brincadeiras: comigo tudo é sério, ali no duro. Nesse ponto entrou-me nos gorgomilos um cheirinho adocicado, com jeito de mel de abelha. Ora sim senhores. Estivera a pique de fazer uma asneira, despropositar com o Silva, pessoa direita e entendida. Que faro o dele! Um faro de bicho. Tinha percebido longe, muito longe, o que eu só ali começava a sentir. Bem. Segui o meu caminho. E, enquanto andava, um arzinho açucarado, cada vez mais forte, me escorregava pelo nariz e pelas goelas. Chegamos a casa, desapeamos, meti a chave enferrujada na fechadura perra, que ninguém tinha mexido no correr de muitos anos. Abri a porta com dificuldade, entramos na sala. E vimos uma parte das coisas aproveitadas depois pelo Silva e desenvolvidas num escrito que se vendeu muito nas feiras e agradou. Fiquei de boca aberta, assombrado, Cesária deu um grito e pôs-se a tremer.

“Vossemecês não adivinham o motivo. Pois explico tudo em duas palhetadas. O marquesão tinha levado sumiço, ou, para melhor dizer, estava transformado completamente. Reparando bem, notei as pernas dele enterradas no chão, cobertas de cascas, tortas e grossas, quatro pés de pau. Sim senhores, quatro jaqueiras carregadas de frutas que se rachavam de tão maduras e cheiravam em demasia. O resto do marquesão tinha-se espatifado, e o couro do assento balançava, pendurado no meio da folhagem. Mandei cortar as plantas e pôr em ordem a sala, que estava num estrago feio, naturalmente, com o tijolo partido e a telha rebentada em vários lugares. Este caso teve numerosas testemunhas, que não me deixam mentir, entre elas Cesária, aqui presente, e o Silva, tipo de muito respeito, sisudo como o diabo. Mas confesso a vossemecês que no folheto dele, publicado em letras de fôrma, há algum exagero. Silva não se refere ao marquesão nem fala em jaqueiras: afirma que toda a mobília tinha criado raízes, que o corredor e as camarinhas se atochavam de laranjeiras e paus d’arco. Até acrescenta que as gavetas da cômoda tinham virado cortiços de abelhas, coisa que não vi, francamente, não vi. Nem eu nem Cesária. Ficam, portanto, os amigos avisados de que na história do Silva há uns floreios. Acho que ele procedeu com acerto: quando um cidadão escreve, estira o negócio, inventa, precisa encher o papel. Natural. Conversando, como agora, a gente só diz o que aconteceu. É o que eu faço. Na sala havia quatro jaqueiras. Apenas.”

Fonte:
Graciliano Ramos. Histórias de Alexandre. Publicado originalmente em 1944.
Disponível em Domínio Público.

sexta-feira, 1 de setembro de 2023

Versejando 121

 

Sílvio Romero (A Madrasta)

(Folclore do Sergipe)


Havia um homem viúvo que tinha duas filhas pequenas, e casou-se pela segunda vez. A mulher era muito má para as meninas; mandava-as como escravas fazer todo o serviço e dava-lhes muito.

Perto de casa havia uma figueira que estava dando figos, e a madrasta mandava as enteadas cuidar dos figos por causa dos passarinhos.

Ali passavam as crianças dias inteiros, espantando-os e cantando:

“Xô, xô, passarinho,
Aí não toques teu biquinho,
Vai-te embora pra teu ninho…”


Quando acontecia aparecer qualquer figo picado, a madrasta castigava as meninas. Assim foram passando sempre maltratadas.

Quando uma vez, o pai das meninas fez uma viagem, a mulher enterrou-as vivas. Quando o homem chegou a mulher lhe disse que as suas filhas tinham caído doentes e lhe tinham dado grande trabalho, e tomado muitas mézinhas (remédio caseiro), mas tinham morrido. O pai ficou muito desgostoso.

Aconteceu que nas covas das duas meninas, e dos cabelos delas, nasceu um capinzal muito verde e bonito, e quando dava o vento o capinzal dizia:

“Xô, xô, passarinho,
Aí não toques teu biquinho,
Vai-te embora pra teu ninho…”

Andando o capineiro da casa a cortar capim para os cavalos, deu com aquele capinzal muito bonito, mas teve medo de o cortar, por ouvir aquelas palavras. Correndo foi contar ao senhor.

O senhor não o quis acreditar, e mandou-o cortar aquele mesmo capim, porque estava muito grande e verde. O capineiro foi cortar o capim, e quando meteu a foice ouviu aquela voz sair de baixo da terra e cantando:

«Capineiro de meu pai,
Não me cortes os cabelos;
Minha mãe me penteava,
Minha madrasta me enterrou
Pelo figo da figueira
Que o passarinho picou.»


O capineiro, ouvindo isto, correu para casa assombrado, e foi contar ao senhor que o não quis acreditar, até que o negro insistiu tanto que ele mesmo foi, e mandando o negro meter a foice, também ouviu a cantiga do fundo da terra.

Então mandou cavar naquele lugar e encontrou as suas duas filhas ainda vivas por milagre de Nossa Senhora, que era madrinha delas.

Quando chegaram em casa acharam a mulher, morta por castigo.

Fonte:
Sílvio Romero. Contos populares do Brasil. Lisboa/Portugal: Nova Livraria Internacional, 1885.
Disponível em Domínio Público.
Atualização do português por J.Feldman

Daniel Maurício (Poemininos) – 1


Amizade...


Na procura
De aconchego,
O abacateiro
Encontrou
No amigo,
Bem mais
Que abrigo
E proteção.
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A paineira
Dobra-se
Em flor
Alegrando
A fachada
Da
Casa
Do
Senhor.
= = = = = = = = =

Cansado
Da rua
O cachorrinho
Inocente
Igual a Bandeira
Sonhou que
Em Pasárgada
Era amigo
Do rei.
= = = = = = = = =

Com
A chuva de prata,
O cinza escorrega
Dos meus olhos...
Dorzinha
De saudade
Vontade
Que saliva
Asas prontas
Pra te encontrar.
= = = = = = = = =

Com
Delicadeza,
A borboleta
massageia
As pétalas
Com
Seus
Pezinhos.
= = = = = = = = =

Com olhar
De admiração
É tão feminina,
A    açucena
Deixa à mostra
Seus longos
E perfeitos
Cílios.
= = = = = = = = =

Elegância...
No
Balé
Solitário
Com graça
A garça
Baila
Contra
O vento.
= = = = = = = = =

Feito
Fogos de artifício
Na noite escura,
Explodem
Margaridas
Sob a réstia
Do luar.
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Indiferente aos reflexos
Da passagem do tempo
A coruja
Feito uma vó coruja
Com aquele ar de respeito
Protege na raça e no peito
O lugar destinado ao idoso
Aquele ser tão precioso
Do qual a vida
Não se cansa de gostar.
= = = = = = = = =

Mar
De
Março.
Nuvem
Baleia
Flutuante
Esguichando
Água
Rios
Telhados.
= = = = = = = = =

Minhas lágrimas
Por ti foram tantas
Que ao sol
Dos teus olhos
Da tua chegada
Um arco íris
Em meus cílios
Formou.
= = = = = = = = =

Na despedida
Sem ter
A Calçada da Fama
A folha
De plátano
Fica cravada
Na poça
De lama.
= = = = = = = = =

Na poça d' água
À beira do caminho,
Um pedaço de céu,
Lágrimas...
Na pressa
Da despedida
Deixo mais
Que um rastro...
Fica
Um pouco
De mim.
= = = = = = = = =

Nas areias áridas
E quentes
Do meu peito,
Teu beijo
Regou
A semente
Que julgava
Morta...
Amei
De novo!
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Nas grossas pétalas
Da
Magnólia,
Suave
Perfume
Dos
Guardanapos
Da vovó.
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No
Brilho
Do
Olhar
do
Outro
Vejo meus
Olhos
Espelhados.
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  Quase fiquei vesgo
De tanto namorar
Uma palavra.
Arredia, me olhou
Com olhos bem arregalados.
De certo estava com medo
De compor comigo.
É...
As palavras são dengosas,
Precisam de carinho.
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Reflexo...

As
Escamas
Dos peixes invisíveis,
Calçam
Os caminhos
Da lua
No mar.
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Sabores...
As delicadas
Rendas do jardim,
Lembram
As toalhinhas
Caprichosas
Nos cafés
Da tarde.
Que minha avó
Fazia
pra mim.

Fonte:
Daniel Maurício. Poemininos. Curitiba: Ed. do Autor, 2021.
Enviado pelo poeta.

Jaqueline Machado (Isadora de Pampa e Bahia) – Capitulo 11: A verdade aparece

Senhor Antônio, não contou nada a respeito dos novos negócios à esposa e à filha. Mas suas expressões de preocupação, repentinamente transformaram-se em cantarolados, assobios e até gargalhadas, ao trocar qualquer ideia com os peões. Além disso, andava caseiro e, pelo menos uma vez ao dia, entrava no quarto para saber da mulher.

‘O que deu nele?’ Pensou Isadora.

Os dias foram passando e nada do fazendeiro voltar ao seu estado “normal”. Claro, ainda era grosseiro e cheio de ideias machistas.

-   Teu vestido tá muito decotado, “fia” - reclamou ao ver a guria com um vestido de chita, florido, com o tecido em fundo vermelho. Aliás, vermelho não, encarnado. Era assim que ele denominava o tom avermelhado das coisas e afirmava ser essa a cor favorita das “mulheres da vida”.

Com receio de estragar o bom humor do pai, a filha, imediatamente trocou o vestido por um em tom azulado, delicado e sóbrio.

Ainda assim, o velho estava diferente. Não parecia ser a mesma pessoa. Todas as manhãs, sentava na varanda para matear em frente ao fogão à lenha e brincar com o amigável cusco da casa.

Tal mudança acalmava o coração de Isadora, mas não a convencia por completo.

Da janela do seu quarto, perdida em seus pensamentos, por várias noites seguidas se perguntou: - será possível alguém em idade avançada e costumes tão medonhos, mudar da noite para o dia?...

No decorrer desse inusitado período de paz, a moça cuidava dos afazeres domésticos e aplicava-se ao máximo para ver a mãe plena em sua saúde.

- Mãezinha, preparei uma sopa deliciosa para a senhora. - disse ela ao entrar no quarto num dia de extremo frio.

-   Teu pai nem parece ser o mesmo homem de antes. Ele está mudado. - disse a esposa, cheia de esperança.

- Espero que essa mudança seja real e venha para o bem de todos, minha mãe.

- Sempre te alertei sobre o lado bom do teu pai.

- A aparente mudança não apaga tudo o que ele fez a senhora sofrer. És uma mulher incrível, merecia um marido mais presente e carinhoso. Mas não vamos discutir sobre isso. Coma. Quero vê-la forte.

- Estou sem fome.

- Ainda sem apetite. Precisas se alimentar.

- Está bem, meu anjo. Tenho que exercitar a minha força de vontade.

- Gostei de ver. É assim que se fala!

Logo após o almoço, enquanto Isadora lavava a louça, dona Ana sentiu enjoos e desmaiou.

Meia hora depois, ao entrar no quarto, Isadora tentou reanimá-la.

- Mãe, acorda, pelo amor de Deus. Socorro! – gritou, desesperada.

Ao entrar, o senhor Antônio deu-se conta do estado lamentável da esposa e, às pressas, correu atrás do Juca.  

- Tua patroa tá passando mal. Precisa ser levada para o “hospitar”. - disse o patrão, já quase sem ar com a correria.

Com o peão no comando da direção do jipe da família, eles partiram até a cidade na fé de que dona Ana chegasse ainda com vida ao pronto-socorro.

Após ser internada novamente, o médico confirmou o estado gravíssimo de saúde da mulher.

- O coração dela está muito fraco. Precisamos conduzi-la a São Paulo para que se realize uma cirurgia. Mas vou logo avisando: a operação custará um alto valor financeiro. - explicou o cardiologista sem fazer rodeios.

- Quanto? - indagou o marido, sentindo-se apreensivo.

- Alguns mil cruzeiros.

O senhor Antônio levou as mãos ao peito. E acometido por uma vertigem, foi amparado pelo doutor que verificou a sua pressão.

- Pai. O senhor está se sentindo melhor? - perguntou Isa, minutos depois.

-  Parece que me “farta” o ar, “fia”.

- Mas sua pressão está ótima. Respire fundo e tudo ficará bem. Precisamos tratar logo sobre a transferência da mãe.

- Ela não pode ser tratada aqui, doutor?

- Pai. Não ouviste o que o médico disse?

- Sabe o que é minha “fia”, não tenho como pagar essa despesa. É uma operação cara. - disse Antônio, gaguejando.

- Pai, precisamos ter uma conversa em particular.

- Vou deixá-los a sós. Quando decidirem o que devemos fazer, é só chamar. - disse o plantonista.  
 
- Pai, que história é essa de não ter dinheiro para pagar a operação?

- Tô falido.

- O momento é totalmente impróprio para pensar em economizar.

- Tô falido. Sem dinheiro pra comprar um mísero bezerro.

- Mas o senhor é dono de uma grande fazenda e de outras fazendas menores. E, ao que parece, os peões estão com os seus salários em dia. Esclareça o que está acontecendo.

- Nesse mês os “peão” não vão receber nada.

Isadora, sem saber o que fazer, levou as mãos à cabeça, girou em torno de si e, chorando, desabafou.

- Gastou todo o dinheiro da família com mulheres e jogos.

- Nenhum “fio” ou “fia” tem o direito de acusar pai e mãe.

- Tem, sim. E eu estou lhe acusando de torrar o dinheiro da família na rua, enquanto a sua esposa ficava em casa, limpando, cozinhando e fazendo doces para vender. Trabalhou tanto que perdeu o seu maior bem: a saúde. Aliás, o trabalho é apenas uma parte do problema. A sua ausência, a sua falta de amor para com ela, a vinha matando aos poucos desde sempre.

- Cala a boca, guria. Senão o “reio”  (relho) te acha!

- Fica o senhor sabendo que não sinto medo das suas ameaças.

- Eu ergui aquela fazenda. Ela é minha.

- Sendo assim, por que batizou as terras prestando homenagem a mim?

- Porque tu também é minha! - bradou o pai, cheio de ira.

- Se a mãe morrer a culpa é sua.

-  Mas se ela se “sarvar”, a “curpa” é todinha tua.

- O que queres dizer?

- Caso aceite uma proposta, tua mãe sai dessa, viva.

- Que proposta?

- O “fio” do xiru Pafúncio tá querendo casar contigo.

- Casar comigo? Mal me conhece.

- Tá enfeitiçado por tua beleza. A “famía” é muito rica. Pode “sarvá” tua mãe e a fazenda.

- Agora estou entendendo ... Eu já estava envolvida entre os negócios de vocês ... Por isso o senhor estava diferente, cantarolando pela casa. Estava sentindo-se desapertado por teres encontrado uma forma de salvar a fazenda, me sacrificando.

- Agora tá tudo entregue nas tuas mãos.

- Covarde. O senhor é um covarde! - gritou Isadora, chorando copiosamente.

- Gente, estamos dentro de um hospital. Que gritaria é essa? -perguntou o médico ao passar pelo corredor.

- Tô fa...

- Pode preparar a transferência. A mãe será operada. - disse a filha, interrompendo a fala do pai que já se preparava para contar da sua falência financeira ao médico.

Ao ouvir as palavras de Isadora, o senhor Antônio sorriu e suspirou aliviado.
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Nota de ropdapé:
Relho: Chicote feito com couro; fita de couro cru usada para chicotear animais.

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continua…

Fonte:
Enviado pela autora

Concurso de Trovas Memorial "Cláudio de Cápua" (Prazo: 31 de outubro de 2023)

 

Realização:
Blog Pavilhão Literário Cultural Singrando Horizontes
Coordenação: J. Feldman (editor do blog)
 
Entidades Parceiras:
Academia Brasileira de Trova/RJ
Academia Internacional União Cultural/SP
Academia de Letras e Artes de Paranapuã/RJ
Academia Mourãense de Letras/PR
Academia Virtual Internacional de Poesia, Arte e Filosofia/PR
Confraria Brasileira de Letras
Falando de Trova (https://falandodetrova.com.br) /SP

O Blog Singrando Horizontes, comemorando 16 anos de existência, com quase 18 mil publicações e cerca de 3 milhões de leitores, realiza o Concurso de Trovas homenageando o trovador Cláudio de Cápua.

Cláudio de Cápua, aviador, jornalista profissional. Especialista em jornalismo cultural, nas áreas de Artes Plásticas e Literatura, com publicações em diversos veículos de Comunicação da Pauliceia e Litoral paulista. Lato Sensu em História da Arte (Universidade Mackenzie), graduado em Filosofia pela Universidade Católica de Santos. Nasceu em 8 de março de 1945, São Paulo/SP. Iniciou na TV Tupi em um grupo que adapta obras literárias para novelas, na década de 70. Produtor e diretor de jornalismo especializado (arte, cultura e lazer) na TV Gazeta, entre 1978 e 1980. Editou a Revista Santos Arte e Cultura, da qual foi editor e articulista. Biógrafo, prosador e poeta, foi um dos fundadores da “União Brasileira de Trovadores”, Seção de São Paulo e, desde 1980, parte do quadro associativo da Seção de Santos. Conquistou vários prêmios em Concursos de Trovas em território nacional. Cláudio de Cápua, que era casado com Carolina Ramos,  faleceu em Santos/SP,  onde se radicou definitivamente, de aneurisma, a 5 de dezembro de 2021, aos 76 anos.

ÂMBITO NACIONAL/INTERNACIONAL

Categoria Veteranos: 
 
Tema: SEGREDO/S (lírica/filosófica)

Em noite alta... madrugada,
contemplo a lua contrito
- Barca de prata aportada
nos segredos do infinito.
Cláudio de Cápua

Categoria Novo Trovador: 
 
Tema: SEMENTE/S (lírica/filosófica)

Com mensagem sempre nova,
transpondo mágoas e dor,
pelos caminhos da trova
planto sementes de amor.
Cláudio de Cápua

Novo Trovador é aquele que não obteve até a divulgação deste regulamento 3 (três) classificações em concursos de trovas oficiais da UBT, a nível nacional, independente de ser associado ou não à UBT.

A palavra tema deve estar na trova.

Máximo de 2 (DUAS) Trovas por concorrente.

Apesar do concurso seguir as normas da UBT, mas por não ser promovido por ela, não se enquadra como concurso oficial da entidade. Este é, como os concursos anteriores, independente.

ENVIO DAS TROVAS POR EMAIL (Prazo: 31 de outubro)

para o Fiel Depositário:
Prof. Giuseppe Paolo Dell’Orso

E-mail:    gpdellorso@gmail.com

Como enviar trovas por e-mail (no corpo do e-mail):

Assunto: Concurso de Trovas Memorial “Cláudio de Cápua”

Acima da Trova:
Categoria (Novo Trovador ou Veterano)

Abaixo da trova:
Nome inteiro, cidade/estado (país se não for do Brasil), e-mail para contato (obrigatório).

Caso o trovador use pseudônimo ou abreviatura do nome, favor enviar o nome completo, caso venha a ser premiado, a não ser que opte por manter a abreviatura ou pseudônimo.

Anexos não serão aceitos.
 
Após o encerramento haverá uma espera de mais 5 dias para os envelopes que podem estar atrasados nos correios, e ao final do quinto dia as trovas serão enviadas para julgamento.

As Trovas devem ser inéditas, isto é, que não tenham sido premiadas em outros concursos ou divulgadas pela Internet ou outros meios de divulgação até a data da publicação do resultado.

Serão eliminadas as trovas que contenham erros como: não colocar pontuações; não seguir o sistema ABAB (rimar 1. com 3. verso e 2. com o 4. verso); erros gramaticais; não tiver a palavra tema na trova; de conteúdo racista, pornográfico, político, etc.

O Prazo se encerra à meia-noite de 31 DE OUTUBRO DE 2023.

Os resultados serão divulgados em blogs, sites, facebook, emails enviados aos premiados, revistas virtuais, academias e blogs.

As decisões das comissões julgadoras serão definitivas.

A premiação, composta de certificado e ebook com as trovas premiadas, serão enviados diretamente aos premiados via e-mail.

Será premiado também, o trovador veterano melhor colocado em seu estado e que tenha obtido pelo menos a média mínima (e não tenha sido premiado na classificação geral do Nacional/Internacional).

Os membros da comissão julgadora, o coordenador e os fiéis depositários não poderão participar do concurso.

A participação no concurso significa aceitação plena das normas aqui relacionadas.

Maringá ,  08 julho de 2023.
J. Feldman – coordenador geral
Contatos, dúvidas: gralha1954@gmail.com

IV Concurso de Trovas da Seção Recife/PE (Prazo: 31 de outubro)


TEMAS: 
Não há temas diferentes para as categorias Veterano ou Novo Trovador. 

Nacional / Internacional (L/F) = OLINDA

Humorística – CARNAVAL

Enviar para a Fiel Depositária – Aline Sales 
E-mail – alines.1@outlook.com 

Assunto do e-mail - Colocar "IV Concurso de Trovas da UBT Recife" 
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ESTADUAL (L/F) = OLINDA

Humorística – CARNAVAL
 
Enviar para Fiel Depositária –Regina Rinaldi
E-mail -  ubtpariqueraacu@gmail.com

Assunto do e-mail - Colocar "IV Concurso de Trovas da UBT Recife"
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O tema, a trova, categoria, nome, endereço completo, e-mail e telefone, deverão constar no corpo do email. NÃO ANEXAR ARQUIVO. 

Todas as trovas líricas ou filosóficas, em um e-mail e todas as trovas humorísticas, em outro. 

Digitar todas as trovas  e logo abaixo, colocar NOME, ENDEREÇO COMPLETO, E-MAIL e TELEFONE COM O DDD. 

Permite-se até 02 (duas) Trovas inéditas por tema para todas as modalidades.

A palavra-tema do Concurso deve constar no corpo da Trova. 

LXV Jogos Florais de Nova Friburgo (Prazo: 31 De Dezembro)


Concurso Nacional / Internacional 
(Máximo: 3 Trovas por tema)

Tema – “Retorno” - (L/F) / Veteranos e Novatos

E-mail – trovasliricas.friburgo@gmail.com  
(Fiel Depositário: Pedro Melo)
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Tema: “Corrida” (Humor) – Veteranos e Novatos

E-mail –  humorfriburgo@outlook.com 
(Fiel Depositário: Sérgio Ferreira da Silva)
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Concurso Local – (Somente para moradores em Nova Friburgo)
(Máximo: 3 trovas por tema)

Tema: “Viagem” (L/F) - Tema: “Confusão” (Humor)

E-mail - trovasliricas.friburgo@gmail.com  
(Fiel Depositário: Pedro Melo)
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Concurso Magníficos Trovadores   

Conjunto L/F – Tema: “Censura” 

Conjunto Humor – Tema: “Trabalho”

E-mail: ra.renatoalves@gmail.com 
Fiel Depositário: Renato Alves/RJ

quinta-feira, 31 de agosto de 2023

Izo Goldman (Buquê de Trovas) – 7 –

 

Coelho Neto (O talismã)

Em escusa e sórdida viela, tremedal (brejo) nauseante entre arruinados casebres, na baiúca mais acaçapada e tão velha que os muros fendidos abriam-se em largas brechas por onde, ao cair da noite, saiam, aos trissos, revoadas de morcegos, em companhia de escaveirada bruxa, vivia velho mouro; tido por feiticeiro por ser muito sabido em curas e profundamente versado na ciência dos augúrios.

Os seus filtros operavam como se fossem o próprio elixir da vida, cuja fórmula os alquimistas procuravam.

Enfermo à cuja cabeceira se sentasse, ainda que houvesse sido desenganado por todos os físicos da cidade, logo readquiria o espírito e sarava. Horóscopo que tirasse consultando os astros cumpria-se com a precisão com que o sol faz o seu curso no céu.

Era tão celebrado o poder do homem mágico que os cristãos, sempre acirrados contra os marrados da sua laia, gente aleivosa e má, aparceirada com o demônio, indigna do ar e da luz, temiam-no e respeitavam-no e os fidalgos de maior entono (majestade), depois do toque de correr, quando as ruas escuras ficavam a discrição dos volteiros (desordeiros) temidos, cuidadosamente embuçados, renteando os muros eriçados de ervas, onde piavam corujas lúgubres, iam pela viela em passos ligeiros e, com o punho da espada, batiam rijamente à porta do muro desaparecendo de repelão nas trevas do corredor.

Uns, dados a amores, iam buscar amavios (elixires); outros, achacados (enfermos), iam a remédios. Ainda os havia crentes que confiavam nos grandes livros cabalísticos nos quais o mouro decifrava presságios sempre venturosos: anúncios de riquezas e honrarias, vitórias em expedições, sorte em amores, tal fosse o consultante: namorado, ambicioso ou cavaleiro.

Um dia correu a cidade a notícia de uma grande e maravilhosa descoberta do mouro — que ele conseguira compor, com o prestígio de um signo, um talismã de ventura. Quem o possuísse, teria o que desejasse.

Senhor de terras, deixava a sua lavoura medrar com abundância, multiplicar-se o armentio, reenxamearem-se as colmeias abandonadas, reviçarem os vageiros (terras estéreis). Fontes, desde muito estancadas, borbotoariam aos golfões; árvores sem ceira brotariam de novo.

Pastores descobririam minas, mesteirais (obreiros) achariam tesouros, guerreiros teriam os melhores despojos, enfermos ficariam sãos e só com uma volta de canto e um trêmulo nos alaúdes os namorados veriam aparecer na adufa (parte externa da janela) o rosto amado, logo ouviriam ranger de quícios (dobradiças)e um braço branco, estendendo-se na sombra, recebe-los-ia à porta guiando-os através de corredores silentes à câmara tão ardentemente desejada.

Com tal notícia foi imenso o alvoroço entre os homens e todos afluíram à baiuca do mouro e as escancelas de veludo, as bolsas de couro despejavam moedas na banca do descobridor do talismã da ventura.

A viela, dantes sossegada e deserta, mais silenciosa que almocóvar (cemitério judeu) maldito, onde nem aves cantam, encheu-se de gente; fidalgos e vilões, burgueses e campônios, todos aldrabando à porta do mouro, desaparecendo, com pressa ansiosa, na sombra fria do corredor.

A todos o homem mágico, em cujos lábios pairava irônico sorriso, entregando o talismã da ventura, repetia as mesmas palavras:

— Tendes na mão a chave de toda a fortuna e tudo obtereis, dentro em um ano, se não cederdes à curiosidade. No breve que vos entrego encerrei misterioso segredo. Tive a sua revelação em uma noite de Agosto, à hora em que nos vales e nos desfiladeiros os espíritos bailam à luz funérea do luar.

“Para que se realize o prodígio é necessário que conserveis o breve tal como lhe entrego, sem vos preocupardes com o que nele existe. Se tal cumprirdes vereis mudar-se a vossa sorte. Tereis na riquezas maiores, todos os amores; não haverá bravura que prevaleça contra vós e ainda que as pestes assolem a terra, dizimando os seus habitantes, passareis refratários a todo o mal, sem que o próprio Anjo sinistro possa alcançar-vos com o seu flagelo.

“Onde os outros virem arca e arro (lama) descobrireis ouro e gemas. A sorte está em vossas mãos. Se abrirdes, porém, o breve, o talismã imediatamente perderá toda a virtude. Assim, é preciso que observeis a condição do mistério. Se tal fizerdes, voltai dentro de um ano à casa do vosso servo, que muito se alegrará em ver-vos, ouvindo da vossa boca a confirmação do que lhe foi dito pelo gênio quando lhe comunicou os sete arcanos do talismã que levais.”

Foram-se os vários homens contentes, jurando que nunca procurariam ver o que havia nas suas nôminas, tanto, porém, que deixaram a viela, logo, em todos, começou a curiosidade a pruir: “Que será? Sete arcanos!” E apalpavam, cheiravam, viravam, reviravam entre os dedos o breve de couro. “Que haveria ali dentro?”

Alguns afirmavam haver sentido estranho, deliciosíssimo perfume; outros garantiam ter percebido movimentos, como de animal. “É uma pedra, talvez da lua”; dizia este. “É uma esquírola (fragmento) de osso”; asseverava aquele. Um: — “É frio, mais frio que a neve”. Outro: —“Abrasa que nem fogo vivo”. E discutindo, com as mais desencontradas opiniões, lá iam.

Sós, na baiuca: o mouro e a bruxa, puseram-se a contar as moedas. Ao fim, disse a mulher, que conhecia o segredo do talismã:

— Que pensas fazer agora? É prudente que, quanto antes, passemos a lugar seguro, porque os homens, ao fim do tempo, vendo que nada obtêm do talismã, darão pelo embuste e... ai! de nós.

Mas o mouro, que era atilado, ajuntando, uma a uma, as moedas luzentes, retorquiu com serenidade:

— E esperas que voltem? Bem mostras que não conheces a alma humana. Nem um só aqui tomará, porque a condição que impus será a minha garantia. Dei o prazo de um ano e estou em afirmar que, antes da noite, todos os breves estarão abertos, expondo os seixos que encerram. Satisfeita a curiosidade, ficarão os homens arrependidos, mas será tarde e cumprir-se-á o que eu disse: o talismã perderá a sua virtude. Descansa — nem um só tornará.

O homem, por curiosidade, desceria ao fundo do inferno, se lhe descobrisse o caminho, ainda que todo ele fosse assoalhado de pez (piche) ardente. Não te dê cuidado o amanhã.

Efetivamente o prazo escoou sem que um só dos possuidores do talismã aparecesse.

Fonte:
Disponível em domínio público.
Coelho Neto. Fabulário. Porto/Portugal: Livraria Chardron, de Ceio & Irmão, 1924.

I Concurso de Trovas de São Luís do Maranhão (Trovas Pemiadas)


NACIONAL / INTERNACIONAL

NOVOS TROVADORES

Tema: GONÇALVES DIAS
 
VENCEDORES:

1º Lugar
João Rodrigues Ferreirra
Reriutaba - CE
Saudades, noites sombrias...
Foram tantos meus degredos!
Mas lendo Gonçalves Dias,
afugentava meus medos.
 
2º Lugar
Rosinéa Siqueira
Campos dos Goytacazes - RJ
Antônio Gonçalves Dias
é eterno em nossa memória:
merecidas honrarias
compuseram sua história!
 
3º Lugar
Maria Stella
Taubaté – SP
Com elegância em seus versos,
o grande Gonçalves Dias
descreveu feitos diversos,
em formatos de poesias.
 
4º Lugar
Carlos Alberto Campos
Juiz de Fora - MG
Além de escrever a história,
inspirando o destemor,
Gonçalves Dias é glória
em lindos versos de amor.
 
5º Lugar
Pedro Neto
São José de Ribamar - MA
Nasceu na velha Caxias,
do mundo foi cidadão...
Teus versos, Gonçalves Dias,
nosso maior galardão!

MENÇÕES HONROSAS

6º Lugar
Maria Stella
Taubaté - SP
Gonçalves Dias além
do seu tempo, nos permite,
ver o valor que o índio tem...
E a cultura que transmite!
 
7º Lugar
Maria Teresinha Cirilo dos Santos
Taubaté - SP
Com muito amor escreveu
as mais lindas poesias!
O Brasil enalteceu,
e eu louvo Gonçalves Dias!
 
8º Lugar
José Carlos Castro Sanches
São Luís - MA
Antônio Gonçalves Dias
fez do Exílio uma Canção.
Filho ilustre de Caxias,
orgulho do Maranhão.
 
9º Lugar
Heloyna de Oliveira
Taubaté - SP
Gonçalves Dias, o culto
poeta da natureza,
fez da poesia um culto
ao Brasil, com singeleza!
 
10º Lugar
Déa Lúcia Araújo de Castro
Juiz de Fora - MG
Um salve a Gonçalves Dias!
Maior poeta não há!
Exaltou as alegrias
da terra do sabiá.

MENÇÕES ESPECIAIS

11º Lugar
Marcelo Marques
São Paulo - SP
És ícone cultural,
talentoso em poesias;
és nobre e fenomenal,
poeta Gonçalves Dias.
 
12º Lugar
Mírian Menezes de Oliveira
Taubaté - SP
Com seu sentimentalismo,
o grande Gonçalves Dias,
poeta do romantismo,
plantou: rimas, melodias...
 
13º Lugar
Jonathan Leandro Martins Reis
Congonhas - MG
Antônio Gonçalves Dias,
um poeta do indianismo,
valorizou tais etnias,
por meio de seu lirismo.
 
14º Lugar
Rosinéa Siqueira
Campos dos Goytacazes - RJ
Antônio Gonçalves Dias
foi poeta brasileiro,
que recebeu honrarias
justas, no país inteiro.
 
15º Lugar
Jonathan Leandro Martins Reis
Congonhas - MG
A saudade das palmeiras
inspirou Gonçalves Dias,
canto das aves matreiras,
Juca... Timbiras... baías..
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  =

NACIONAL / INTERNACIONAL

VETERANOS

Tema: TIMBIRAS

VENCEDORES

1º Lugar:
José Ouverney
Pindamonhangaba - SP
Gonçalves Dias, a história
se retrata em tuas liras:
todos nós, na somatória,
somos um pouco Timbiras!
 
2º Lugar
Roberto Tchepelentyky
São Paulo - SP
Louvo "Os Timbiras" na história,
por ser um poema fecundo:
São quatro cantos de glória
nos quatro cantos do mundo!...
 
3º Lugar
Professor Garcia
Caicó - RN
“Os Timbiras”, rica ideia
do indianismo mais profundo,
compõe a linda epopeia
que Gonçalves deu ao mundo!
 
4º Lugar
José Ouverney
Pindamonhangaba - SP
 São meus heróis de verdade
esses Timbiras valentes:
lutar pela liberdade
enaltece os combatentes!
 
5º Lugar
Cléber Leandro Nardeli
Iturama - MG
Luta, ó tribo de “Os Timbiras”,
contra as flechas de Akari!
Não há nas terras safiras -
mas há a luz de Arapari!
 
MENÇÕES HONROSAS

6º Lugar
Marina Caraline de Almeida Carvalhal

Itaperuna - RJ
Timbiras remanescentes
fazem parte de “gigantes”
que hoje são os combatentes,
por direitos tão distantes.
 
7º Lugar
A. A. de Assis
Maringá - PR
Todo o povo maranhense
tem dos Timbiras um traço:
acredita que o que vence,
mais que a flecha, é um forte abraço.
 
8º Lugar
Lucrécia Welter Ribeiro
Toledo - PR
Ilíada Brasileira
é assim chamada “Os Timbiras”.
É em versos de além fronteira,
que tu, poeta, te inspiras.
 
9º Lugar
Elizabeth A. C. Fontes
Joinville - SC
“Os Timbiras” – obra prima –
“Ilíada” brasileira;
história indígena em rima:
a epopeia pioneira.
 
10º Lugar
Sérgio Bernardo

Nova Friburgo - RJ
 Seus versos geniais são tantos,
que, apesar de obra incompleta,
Os Timbiras, nos seus Cantos,
guarda a alma de um poeta.
 
MENÇÕES ESPECIAIS

11º Lugar
Célia M. G. Mendonça de Melo
Juiz de Fora - MG
 Timbiras, povo valente
que preserva a tradição.
Seu legado está presente
na história do Maranhão.
 
12º Lugar
José Manuel Veloso Galvão
São Paulo - SP
 Ah, Poeta, em quatro cantos,
tu cantaste o que sentiras
de um mundo cheio de prantos
desaguando...  n'Os Timbiras!
 
13º Lugar
Edson de Paiva
Rafael Godeiro - RN
 Gonçalves Dias fez glória,
embalando, em belas liras,
toda a vida e trajetória
dos intrépidos Timbiras.
 
14º Lugar
 Professor Garcia
Caicó - RN
 Gonçalves, seu romantismo,
em “Os Timbiras”, o expõe...
Mostrando que o indianismo
tem a força que o compõe!
 
15º Lugar
Relva do Egypto Rezende Silveira
Belo Horizonte - MG
 São povos originários,
que habitam esta Nação,
os Timbiras, relicários
da cultura e tradição.
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NACIONAL / INTERNACIONAL

HUMORÍSTICA

Tema: SABIÁ

VENCEDORES

1º Lugar
José Maria Luz e Silva
Maceió - AL

 O pardal desconfiou
do sabiá, seu vizinho;
só depois que ele notou
um ovo estranho no ninho.
 
2º Lugar
Massilon Ferreira da Silva
Poço Redondo - SE

O gato muito enxerido
pensou que tinha abafado,
pegou na loja, escondido,
um sabiá empalhado.
 
3º Lugar
Francisco Gabriel
Natal - RN

O meu sabiá gongá,
teve uns cinco faniquitos,
ao ver sua sabiá,
chocando dois periquitos.
 
4º Lugar
A. A. de Assis
Maringá - PR

Tem cara que fica rico,
mas disso não passará.
Vira um gordo tico-tico,
porém nunca um sabiá...
 
5º Lugar
José Maria Luz e Silva
Maceió - AL

Disse o gato:  "venha cá,
vamos sambar lá no morro?"
Respondeu a sabiá:
"que tal chamar o cachorro?"

MENÇÕES HONROSAS
 
6º Lugar
Roberto Tchepelentyky
São Paulo - SP

Sabiá malandro insiste,
já de rotina, à noitinha,
em bicar o "seu" alpiste
na arapuca da vizinha...
 
7º Lugar
Sérgio Bernardo
Nova Friburgo - RJ

Que o sabiá, entre as penas,
abrigava a cotovia
todos sabiam, apenas
a sabiá não sabia...
 
8º Lugar
Dulcídio de Barros Moreira Sobrinho
Juiz de Fora - MG

Para a tristeza ir embora
e evitando a solteirice,
o meu sabiá namora
a periquita da Alice.
 
9º Lugar
A. A.  de Assis  
Maringá - PR

Meu quintal não tem palmeira
nem tampouco sabiá.
E se acaso eu der bobeira,
logo nem quintal terá.
 
10º Lugar
Márcia Jaber
Juiz de Fora - MG

O Sabiá não sabia
se sabia assobiar,
mas quando viu a Maria,
fez fiu-fiu sem nem notar.

MENÇÕES ESPECIAIS

11º Lugar
Paulo Roberto de Oliveira Caruso
Niterói - RJ

Viu o filhote crescer
falante e verde encardido,
e foi o último a saber
o sabiá, pai sabido...

12º Lugar
Elizabeth A. C. M. Fontes
Joinville - SC

Qual sabiá que fascina
com o peito todo aprumado,
foi cantar para a menina...
mas... gritou, desafinado!
 
13º Lugar
Edweine Loureiro da Silva
Saitama - Japão

Ó sabiá-laranjeira,
por que você não se toca?
Troca o disco que a palmeira
prefere um funk carioca!
 
14º Lugar
Rosinéa Siqueira
Campos dos Goytacazes - RJ

Sabiá, sempre fiel,
cantava ao entardecer,
avisando ao nhô Miguel:
o seu galho vai crescer!
 
15º Lugar
Albano Bracht
Toledo - PR

Sabiá longe do bando.
Eu me aproximo e arrisco:
que lindo, você cantando!
- Não, estou ouvindo um disco.

16º Lugar
Renata Paccola
São Paulo - SP

Eu me divirto sozinha
numa cena que me assanha:
o sabiá e a rolinha
disputando a mesma aranha!
==========================================

ESTADUAL- ESTUDANTIL

Tema: CANÇÃO DO EXÍLIO

VENCEDORES


1º Lugar
Sérgio Murillo Rodrigues Costa
8º ano (Unidade Escolar Maria da Conceiçao Soares)
Santa Luzia - MA

Canção do Exílio é o tema
que me traz tanta saudade!...
E eu fico nesse dilema:
entre a cruz e a liberdade.
 
2º Lugar
Paulo Roberto Moraes Alves Neto
7º ano (Escola Adventista da Cohab - SL - MA)
São José de Ribamar - MA

Eu irei cantarolando
a linda Canção do Exílio;       
os seus versos recitando;     
à poesia peço auxílio.
 
3º Lugar
Paulo Roberto Moraes Alves Neto
7º ano (Escola Adventista da Cohab - SL - MA)
São José de Ribamar - MA

A Canção do Exílio é bela.
Uso-a com inspiração;
igual à tinta aquarela,              
ela pinta o coração.

Nilto Maciel (Da noite para o dia)

Como a vida da gente muda da noite para o dia! Ainda ontem tudo ao meu redor parecia sem vida, tudo monotonamente normal, quando me assaltou novamente a ideia de remexer papéis velhos, um dos meus passatempos prediletos. Assim consigo também trazer de volta o passado. Às vezes é uma foto, outras uma carta, outras ainda uma poesia que rabisquei na adolescência. Mas desta vez não foi nada disso. Encontrei uma novela. Datilografada, ilustrada, com capa e tudo. Como um livro impresso. No fundo de uma gaveta, enrolada noutras folhas de papel. Retirei o invólucro e fui me lembrando da história daquela história. Era uma novela amorosa escrita por César e ilustrada por mim. Datilografamos, fizemos uma bonita capa,  grampeamos as folhas. Nesse tempo vivíamos de sonhar. Éramos estudantes do mesmo colégio, colegas de grêmio literário, de leituras, discussões acaloradas. Líamos Dumas, Camilo, Herculano, Alencar.

César sonhava com a glória literária. Ser membro da Academia, escritor de fama, ganhador do Nobel. Já meu sonho se contentava com as migalhas da simples publicação. Eu não tinha vocação literária, embora rabiscasse versos vez por outra. Aprazia-me mesmo era desenhar. Daí a capa do futuro livro de César e algumas ilustrações ao texto.

Iríamos trabalhar juntos sempre: ele como escritor de novelas, eu como ilustrador de seus livros. E nunca ele aceitaria outro ilustrador, nem eu ilustraria livro de outro escritor. Pacto de sangue, de morte, de amizade eterna.

Planejamos publicar a primeira novela. Cinquenta mil exemplares na primeira edição. Ele havia sonhado com cem mil, até que o convenci a ser mais modesto. Iríamos ficar famosos da noite para o dia: ele como escritor, eu como ilustrador. Lidos e vistos em todo o Brasil. E depois em todo o mundo. Inclusive na China. Falaríamos com Mao Tse-tung. A juventude chinesa precisava de ler textos mais do coração e não só o livrinho vermelho.

Enviamos cópias para algumas editoras. As respostas vieram desalentadoras: “livro pouco comercial”, dizia uma; “muitas obras no prelo nos impedem de dar publicação à sua novela”, esclarecia outra; “não estamos no momento publicando novelas”, explicava uma terceira; “livro não aprovado pelo nosso Conselho de Leitores”, resumia uma quarta. E outras do mesmo teor.

Algumas editoras nem sequer deram resposta. Fizemos então novos planos maravilhosos. Não iríamos precisar das editoras. Pouparíamos. Deixaríamos de fumar, beber, merendar, ir ao cinema, etc. César iria trabalhar e depositaria a maior parte do ordenado na caderneta. Meu pai não me deixava trabalhar, mas, em compensação, eu exigiria mesada mais gorda. Dela tiraria apenas o suficiente para os gastos mais necessários e depositaria o restante na poupança. Quando já tivéssemos alguns milhões, mandaríamos publicar a novela numa gráfica qualquer. Venderíamos os livros nas escolas, nos cinemas, nas ruas, lojas, repartições públicas, nos bares. Viajaríamos pelo interior. Com o dinheiro da venda mandaríamos publicar o segundo livro. Mas quando teríamos os milhões suficientes para pagar a primeira impressão? A esta pergunta perdemos o entusiasmo.

Concluídos os estudos secundários, César deixou de estudar e arranjou emprego. Não para juntar dinheiro, mas para sobreviver. Seu pai mergulhava cada vez mais na pobreza. E não falamos mais na novela. Nossas relações pouco a pouco iam perdendo o calor, nossos encontros se distanciando no tempo. E, quando nos víamos por acaso, apenas nos cumprimentávamos.

Esqueci logo os desenhos, as ilustrações, os sonhos. E fui estudar Direito.

Um ano depois meu pai morreu. Estranhamente assassinado. Crime horrível – latrocínio. Morto e roubado. Encontraram seu corpo numa valeta a poucos quilômetros do centro da cidade. Um tiro no crânio. E o carro estacionado à margem da estrada. Nenhum vestígio do assassino.

Meu pai nunca teve inimigos, dava-se bem com todo mundo e quase toda a cidade o conhecia. Nós, os filhos, estudávamos nos melhores colégios. Minha mãe o adorava. A polícia ficou tonta. Não sabia a quem atribuir o crime. Nenhum indício, nenhum suspeito.

No dia de sua morte havia sacado uma grande soma em dinheiro ao banco, como sempre fazia. E seus negócios ele mesmo os resolvia. Deixava o carro estacionado nas proximidades do banco, levava uma pasta, um revólver e só. Não queria guarda-costas.

A polícia concluiu finalmente que o assassino só podia ser um assaltante comum. Foram então presos todos os ladrões e suspeitos de terem cometido crimes contra o patrimônio. A nenhum deles, porém, foi possível imputar o latrocínio.

Folheei a novela e por um bom tempo me deixei a cismar. Pensei no meu passado, em César, e quase não consegui dormir. E decidi que hoje procuraria saber onde vivia César. Queria recordar com ele todos os nossos sonhos, todos os nossos sofrimentos, ele por ter tido suas ilusões tão duramente mortas, eu por ter perdido meu pai de maneira tão bárbara e misteriosa. Como pudemos nos esquecer tão depressa, apesar daquela amizade quase apaixonada que nutríamos um pelo outro? Como somos fracos, débeis, inconstantes!

Onde, porém, eu poderia encontrá-lo? Detrás de um balcão de loja? Na cozinha de um restaurante? Ou teria conseguido realizar seus sonhos literários, pelo menos os mais modestos? Ou teria ido embora para bem longe? Talvez até estivesse morto.

Não, não adiantava fazer suposições. Mais fácil procurar seu nome na lista telefônica. Se não estivesse tão mal, certamente teria um telefone. Tentei lembrar-me de seu nome completo. Lamentei mais uma vez a fragilidade do coração humano. Como pude esquecer tão facilmente o nome de meu melhor amigo? Ainda bem que a novela se encontrava comigo, e, com toda certeza, nela estaria o nome inteiro, um sobrenome pelo menos. Corri os olhos e li: César Augusto dos Reis, no alto da capa.

Hoje disquei o número e atendeu uma voz grossa e autoritária. “Quero falar com o novelista César Augusto dos Reis”. A voz do outro lado se mostrou aborrecida: “Não existe nenhum novelista aqui. Quer deixar de brincadeiras, meu senhor.” Apresentei-me. Ele se fez de esquecido ou de fato não se lembrava mais de mim. Depois se disse surpreso: “Não sabia que você ainda era gente”. Conversamos mais. Quis saber de minha vida. “Sou advogado. E você?” Falou em barzinho, dificuldades, “aturando esses bêbados dia e noite”. Pedi o endereço.

O barzinho chama-se “Restaurant Carnivorous”, serve pratos da cozinha internacional, recebe a fina flor da sociedade e é irmão de outros dois e de um prédio de doze andares.

César mandou dizer por um moleque de recados que não podia receber ninguém. Em um minuto deveria sair para compromisso inadiável. Não dei ouvidos ao recado e entrei no escritório. E só saí de lá uma hora depois.

Falamos da morte de meu pai, de comércio, de literatura e artes plásticas, do passado, de nossos sonhos, mil coisas, tudo de forma desordenada, como se quiséssemos falar todas as palavras ao mesmo tempo. Contou-me sua história: antes de adquirir o primeiro barzinho, trabalhou como garçom, copeiro e cozinheiro. O barzinho rendia alguma coisa, até se transformar num bar de verdade. O bar virou restaurante. “Tudo porque sou muito controlado e trabalhador. Não ando esbanjando dinheiro”.

Surpreendi-me diante de tanta riqueza e fui para casa desconfiado não sei de quê. E todo o passado voltou à tona, aos borbotões, feito vômito. Relembrei todas as nossas conversas, todos os sonhos, todos os projetos, a novela, tudo. E me interroguei com mil perguntas: por que César não publicou o livro, não virou o escritor que desejava ser, se tem tanto dinheiro? E se havia dito numa de nossas últimas conversas que nada o impediria de se transformar num grande homem, famoso, reconhecido por todos! Como um barzinho podia ter se transformado num restaurante daqueles em tão pouco tempo?

Não durou muito aquele vômito e voltei ao restaurante. Da porta gritei: “César, você matou o meu pai”. Ele quis explodir, gritar, correr, agredir. Apontei-lhe o revólver e ele se rendeu.

Fonte:
Nilto Maciel. Babel. Brasília/DF: Editora Códice, 1997.
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