sábado, 24 de maio de 2008

Tertúlia Literária do Movimento Médico Paulista do Cafezinho Literário

Na próxima 4a feira, dia 28, haverá novamente uma reunião em Sorocaba para uma Tertúlia Literária do Movimento Médico Paulista do Cafezinho Literário - MMCL., como de costume na Sociedade Médica de Sorocaba (Rua Mons João Soares, 75) a partir das 19h30.

Será levado para sorteio entre os presentes cinco exemplares de cada um dos dois livros recentemente editados por Ottoni Editora tangentes ao MMCL: ANAIS do I Congresso Paulista Comunitário de Letras, do MMCL, festejando o terceiro aniversário do Movimento e que se fez realizar em Santos entre 2 e 4 de maio p.p. e o primeiro volume do livro A Presença Literária do MMCL, ambos magnificamente elaborados.

Cada um dos sorteados receberá os dois livros. O MMCL já realizou 75 reuniões literárias em 13 cidades do Estado de São Paulo com a participação de cerca de 450 pessoas que apresentaram em torno de mil trabalhos (resenhas, poesias, contos, crônicas, relatos, etc.) O Movimento é gratuito e aberto a todos os interessados, médicos e não médicos. A única exigência é a apresentação de um trabalho de sua própria lavra e para a qual tem 10 minutos..

Um dos que se farão presentes, será William Moffitt Harris, o qual participou do Roda Mundo 2008, com três crônicas em português e mais três capítulos em inglês do livro que está escrevendo sobre as andanças e aventuras do seu pai, logo após a Primeira Guerra Mundial, entre os índios "lengua" na margem oriental do Rio Paraguai em pleno Chaco Paraguajo. Vivenciou inclusive alguns choques culturais com bastante maturidade apesar dos seus 24-25 anos de idade durante os cinco anos que lá esteve.

Fonte:
Colaboração de Douglas Lara. In
http://www.sorocaba.com.br/acontece

XI Concurso Literário - Algarve-Brasil / 2008, do Clube da Simpatia

O Clube da Simpatia homenageia este ano, Tito Olívio, sócio n.º 100 e Delegado do Clube, em Faro. Talentoso Poeta e Prosador que muito tem contribuído para o enriquecimento do nosso património Cultural, será o seu soneto, “Os Teus Olhos”, que, este ano, servirá de tema para todas as modalidades do Concurso Literário, Algarve-Brasil, que, de ano para ano, vai crescendo em qualidade e quantidade, de trabalhos literários.

REGULAMENTO

O concurso destina-se a todos os cidadãos, maiores de 16 anos, de nacionalidade portuguesa ou brasileira, sócios ou não do Clube da Simpatia, que apresentem produções inéditas escritas em língua portuguesa e que respeitem o tema proposto.

Tema para o Conto: “ BRINCANDO COM O LUME…”

Tema para a Quadra: “ OS TEUS OLHOS “

Tema para o Soneto e Poesia Lírica:

Um verso do soneto, “ OS TEUS OLHOS “ do Poeta, Tito Olívio, que a seguir se transcreve:

OS TEUS OLHOS

Nos teus olhos me afogo com doçura,
nesse mar remansoso da esperança
que minha alma perdera e agora alcança
nas ondas dos teus beijos de ternura.

Por certo deve ser uma loucura
amar mais tempestade que bonança,
gostar da luta em vez da vida mansa,
mas eu tenho atracção pela aventura…

E há também no perigo poesia…
Por isso eu vou brincando com o lume,
não receio nadar por entre escolhos,

Mergulho em teu olhar com alegria.
E nem sequer do mar tenho ciúme,
porque há muito mais verde nos teus olhos.

❀❀❀

MODALIDADES:

POESIA
1 – QUADRA: em redondilha maior, de rima ABAB.
2 - SONETO: de características clássicas, em versos de 10 sílabas.
3 – LÍRICA: sem sujeição a qualquer sistema poético, não podendo, no entanto, ser soneto, nem exceder 20 versos.

PROSA
CONTO - Pequena narrativa real ou fictícia subordinada ao tema proposto. O conto não pode exceder quatro páginas A/4 escritas de um só lado.

a) - Cada concorrente pode apresentar a Concurso um máximo de dois trabalhos de cada modalidade com pseudónimos diferentes para cada um. As composições devem trazer no cimo da página a indicação da modalidade e no final do trabalho o pseudónimo.

b) – Para todas as produções é obrigatório o envio de três exemplares dactilografados ou digitados em papel A/4, escritas de um só lado. As margens devem ter, pelo menos, dois centímetros. O espaço entre linhas será de um e meio e os caracteres de tamanho 12 com letra “Times New Roman” ou idêntica. As quadras também serão apresentadas, uma em cada folha A/4.

c) - Anexo a cada trabalho será enviado um envelope fechado contendo, no exterior, a indicação da modalidade e do pseudónimo e, no interior, a identificação completa do autor: nome, morada, número de telefone e e-mail, se possuir.

d) - Os originais serão enviados, sem indicação de remetente, (excepto para o Brasil que será o mesmo do endereço) até ao dia 25 de Agosto de 2008 (carimbo dos correios) para:

CLUBE DA SIMPATIA
XI Concurso Literário - ALGARVE-BRASIL /2008
8700-911 Olhão - Portugal

e) - O Júri, constituído por individualidades de idoneidade e competência reconhecidas, deliberará por maioria e das suas decisões não haverá recurso, salvo se vier a provar-se que houve plágio ou que os trabalhos não são inéditos.

f) - Não se devolvem os trabalhos não distinguidos.

g) - Para cada modalidade serão atribuídos 1º, 2º, e 3º Prémios e as Menções Honrosas que o júri entender merecidas.

h) - Os premiados serão avisados com a devida antecedência.

i) - A entrega dos prémios está marcada para o dia 5 de Outubro de 2008, data do 13.º Aniversário do Clube.

O Regulamento está disponível em:

http://www.geocities.com/clubedasimpatia

Fonte:
Colaboração de A. A. De Assis, por e-mail.

Tito Olívio (1931)

Tito Olívio Henriques é natural de Penalva do Castelo, Distrito de Viseu, onde nasceu em 1931 e vive em Faro.

É licenciado em Engenharia Civil (1958) e Sociologia (1961).

Como Engenheiro Civil trabalhou no setor privado e no setor público.

Em suas atividades sociais antes da Reforma, pode-se destacar
- Vice-presidente da Assembleia Geral do Cine-Clube de Faro
- Presidente do Sporting Club Farense
- Secretário da Comissão Distrital de Árbitros de Faro
- Presidente da Assembleia Geral do Sport Faro e Benfica
- Presidente da Associação de Xadrez de Faro
- Secretário da Delegação de Faro da Cruz Vermelha Portuguesa
- Presidente do Rotary Club de Faro
- Presidente da Comissão Distrital dos Serviços à Comunidade do Distrito Rotário 196
- Presidente da Direção dos Bombeiros Voluntários de Faro
- Vereador da Câmara Municipal de Faro
- Presidente da Comissão Municipal de Arte e Arqueologia da C.M.F.
- Secretário-Geral do Conservatório Regional do Algarve - Maria Campina.
- Colaborador de jornais diários e regionais

Atividades depois da Reforma
- Fundador e Editor do jornal "Poetas de Faro" (1997-99)
- Chefe de redação do jornal "Distrito de Faro" (1995-98)
- Presidente da Assembleia Geral da Associação dos Jornalistas e Escritores do Algarve
- Subdiretor do mensário "Jornal Escrito"
- Colaborador de jornais regionais

Livros publicados antes da Reforma
- O Romance do Homem Solitário – contos (1963)
- Sonetos Proibidos e Outros Poemas – poemas (1983)
- Roteiro do Algarve – ensaio (1983)
- Divisão Administrativa do Algarve – ensaio (1983)
- Algures... Alguém – sonetos (1987)
- A Democracia Que Temos – ensaio (1988)
- Algures... Alguém - 2ª Edição – sonetos (1989)
- Contradições da Democracia – ensaio (1989)
- A Democracia Que Temos - 2ª Edição – ensaio (1989)
- Cantata Para Um Corpo – sonetos (1989)

Livros publicados depois da Reforma
- Formas de Fumo – sonetos (1990)
- A Gota de Água – poema infantil (1993)
- Flor de Luz – sonetos (1993)
- Ode a Penha Garcia – poema (1994)
- A Democracia Que Temos - 3ª Edição – ensaio (1995)
- Ode a Penha Garcia - 2ª Edição – poema (1995)
- Justiça Social – ensaio (1995)
- Sombra Desfeita – sonetos (1996)
- A Cauda do Cometa – poemas (1997)
- A Lenda do Moliceiro – contos (1997)
- Sombra Desfeita - 2ª Edição – sonetos (1997)
- A Cauda do Cometa - 2ª Edição – poemas (1998)
- A Lenda do Moliceiro - 2ª Edição - contos (1998)
- Guia Prático do Poeta – didático (1999)
- E Agora?... – poemas (2000)
- Mulheres Sem Verão - romance (2004)
- Para Quê Helena - romance (2006)

Honrarias
Mais de 90 prêmios literários, entre os quais,
- Prêmio Cidade de Olhão-Prosa,
- Menção Honrosa no Prêmio Eça de Queiroz (Lisboa),
- Referência especial no Prêmio Revelação Manuel Teixeira Gomes (Portimão)
- Sócio Honorário do Boa Esperança Atlético Clube Portimonense (1960)
- Medalha de Mérito da Cruz Vermelha Portuguesa (1973)

Fontes:
http://www.caestamosnos.hpg.ig.com.br/
http://www.geocities.com/clubedasimpatia/

Tito Olívio (Cama Vazia - Botões de Rosa)

CAMA VAZIA

Na cama vazia, uma sombra fenece,
Suspiro se solta, vestido de louco,
A mão que procura se perde, arrefece,
Por ter tido muito e sobrado tão pouco.

Cortinas, espelhos, sofás, almofadas,
Imóveis na espera do quê que não volta,
Relembram a mágoa das noites paradas
Nos lençóis de linho em fúria revolta.

O quarto esquecido em solidão de ausência,
A mão que procura e tacteia pra nada...
Navegam no escuro batéis de demência,
Que a mancha da noite morreu de cansada.

Se há gritos na rua, ou são arvoredos
Ou gente que berra no seu desvario,
Fugindo à desgraça, à sombra dos medos,
Ou pobre mendigo tremendo de frio.

Será pois da morte o escuro capote,
De cal a brancura da face sombria?
Será uma musa, ditando algum mote
P’ra versos de raiva p’la cama vazia?

Quem há de fazer um poema perfeito,
Quintilhas ou odes à viva saudade,
Se a mão, percorrendo esse lado do leito,
Só toca na angústia da triste verdade!

A marcha das horas remarca infinito
E, lentos, os passos de quem já não vem,
Perdidos agora, não são mais que mito
Ou são cantarinhas perdidas além.

Nas voltas e voltas, estria madura,
O sono não vem e, nas horas que vão,
Desejos de agora não são mais loucura
E a ausência não pode ter graça ou perdão.

BOTÕES DE ROSA

Por baixo do cetim de fino corte,
Pendente do teu corpo abandonado,
Havia a luz do Sol alcandorado,
Que macerava a vista, de tão forte...

Era a festa das rendas transparentes,
Como astros radiosos nos espaços,
Cortando as doces curvas dos teus braços
De riscos luminosos, refulgentes,

E emoldurando os peitos arquejantes,
Dois montes esculpidos em marfim,
Exalando perfume de jardim
Nos seus acordes de harpa provocantes.

E vi então teus seios luminosos,
Dum branco radioso cor de leite,
Como se fossem asas de um enfeite
Ou apenas dois cisnes caprichosos.

E tinham duas pintas, amuletos
De magia, de sonhos esquecidos
Ou dois faróis de cultos prometidos
Em aras dos deleites mais completos,

Oh! Dois olhos castanhos, astrolábios
Medindo a latitude da loucura,
Botões de rosa ardendo na secura,
A pedir a frescura dos meus lábios.

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Mary Shelley (Conto do mortal imortal)

Dezesseis de julho de 1833. Este é um aniversario especial para mim, cumpro trezentos e vinte três anos!

O judeu errante? Decerto que não, por ele já passaram mais de oito séculos. Em comparação com ele sou um imortal muito jovem.

Serei imortal? Isso é o que me tenho perguntado dia e noite durante os últimos trezentos anos, e ainda não fui capaz de responder. Precisamente hoje descobri um cabelo branco entre meus fartos morenos, e isso certamente significa que começo a envelhecer. Ainda que também poderia já estar ali escondido durante trezentos anos, pois algumas pessoas têm o cabelo completamente branco antes de cumprir os vinte.

Vou contar a minha historia; e logo, deixarei que os leitores julguem por mim. Assim, enquanto a conto, irão passando umas tantas horas desta longa eternidade que me está sendo tão insuportável. Para sempre! É isso possível? Viver para sempre! Tenho escutado sobre encantamentos em que as vítimas foram entregues a um profundo sono e despertaram cem anos depois, frescas coma uma rosa. Ouvi falar, por exemplo, dos Santos dormentes e do feliz que foi o lendário Nourjahad. Ser imortal dessa maneira não seria cansativo porém, ai, que insuportável se faz o peso do tempo eterno, o lento passo das horas sucedendo-se sem fim! Mas sigo com meu relato.

Todo o mundo ouviu falar de Cornelius Agrippa. A sua memória é tão imortal como sou eu, por causa da sua sabedoria. Todo o mundo ouviu também falar daquele discípulo seu que, sem querer, invocou o Inimigo na ausência do mestre e foi destruído por ele. O relato deste acidente, verdadeiro ou falso, pôs em apuros o célebre filósofo. Abandonaram-no todos alunos seus, e os seus serventes desapareceram. Não tinha quem mantivesse o lume aceso enquanto dormia ou quem prestasse atenção às mudanças de cor das suas poções enquanto estudava. Um após outro, estragavam-se todos seus experimentos, já que duas mãos não bastavam para ter conta deles. Os espíritos das trevas riam-se dele por não conseguir reter um só mortal a seu serviço.

Eu era naquela época mais novo, muito pobre e estava muito apaixonado namorado. Fora discípulo de Cornelius durante um ano mais ou menos, porém estava ausente quando ocorreu o acidente. Quando regressei, os meus amigos pediram-me que não voltasse àquela casa. Tremia quando me contaram aquela arrepiante historia e não esperei por um segundo aviso; assim que, quando Cornelius me veio oferecer uma bolsa de ouro para ficar sob seu teto, senti como se o próprio Satanás me estivesse a tentar. Estava arrepiado, batiam-me os dentes e sai correndo tão rápido quanto me permitiam as minhas debilitadas pernas.

Desfalecido, deixei que os meus passos me levassem ao lugar onde me dirigira cada serão dos dois últimos anos: a uma fonte da qual brotava suavemente uma água pura e limpa, perto da qual aguardava uma moça de cabelos mouros com olhos fixos no caminho pelo qual eu acabava de chegar. Não recordo o tempo em que não amava Bertha: fomos vizinhos e companheiros de jogos desde crianças; os seus pais, coma os meus, eram de condição humilde porém honrados, e nosso amor era fonte de alegria para eles. Mas um funesto dia, uma febre maligna levou seu pai e sua mãe, e Bertha ficou órfã. O meu pai a acolheria de bom grado sob nosso teto, porém, desgraçadamente, a dona do castelo vizinho, rica, solitária e sem filhos, declarou a sua intenção de apadrinhá-la. Daí em diante, Bertha vestiria roupas de seda, moraria num palácio de mármore e todos a veriam como aquela a quem sorria a fortuna. Realmente, apesar da sua nova situação e os seus novos amigos, Bertha seguia fiel a seu amigo de tempos mais humildes. Visitava amiúde a casa do meu pai, e quando lhe proibiram ir ali, desviava-se para um caminho próximo para encontrar-se comigo na sombria a fonte.

Dizia amiúde que com a sua nova protetora não tinha um compromisso tão sagrado como o que a unia comigo. E como eu não era bastante rico para poder casar, ela começava a estar farta de viver atormentada por causa minha. Era orgulhosa porém também impaciente, e exasperava-se pelos obstáculos que impediam a nossa união. Ela estivera muito aflita enquanto eu estava fora, e agora lastimava-se com amargura e me reprovava por ser pobre. Respondi-lhe sem pensar: "Sou pobre porém honrado! Não te preocupes, quem sabe logo serei rico!"

Esta afirmação deixou-a cheia de perguntas. Tinha medo de assustá-la se lhe confessasse a verdade. Porém conseguiu que eu contasse; e então, com um olhar de desprezo, disse: "Diz que me ama, não obstante tem medo de enfrentar o diabo por mim!"

Assegurei-lhe que só temia ofendê-la, porém ela teimava que receberia uma magnífica recompensa. Assim, alentado e envergonhado por ela, cego pelo amor e pela esperança e rindo-me dos meus temores, voltei com passo rápido e coração ligeiro para aceitar a oferta do alquimista, quem me devolveu imediatamente o meu antigo posto.

Passou um ano e ganhei uma soma considerável de dinheiro. O costume espantou os meus temores. Ainda que estava à espreita em todo momento, nunca achei nenhuma pegada de bode na nossa casa, nem se viu nunca a tranqüilidade do nosso estudo perturbada por gritos demoníacos. Segui vendo Bertha às escondidas e a esperança renasceu em mim; esperança sim, mas não felicidade completa, pois que Bertha cuidava que a segurança era inimiga do amor e se comprazia-se fazendo-me elixir entre eles. Ainda que fiel, era bastante coquete e fazia-me adoecer de ciúmes. Desprezava-me de mil maneiras e nunca se desculpava, fazia-me gemer de raiva e logo obrigava-me a suplicar-lhe perdão. Às vezes, quando cuidava que não era submisso o bastante, inventava alguma historia dum rival que era o preferido da sua protetora. Vivia rodeada de moços vestidos de seda, ricos e galantes, que oportunidade poderia ter o esfarrapento discípulo de Cornelius comparado com eles?

Numa ocasião, o filósofo tinha-me tão ocupado que não pude encontrar-me com ela tal como combináramos. Cornelius andava enredado em trabalho muito importante, e tive que ficar alimentando o forno e vigiando os preparados químicos dia e noite, enquanto Bertha esperava em vão na fonte. Era orgulhosa, e zangou-se muito por isso. Quando por fim pude escapar durante os escassos minutos que tinha para dormir, esperava que ela me confortasse; contudo, recebeu-me com indiferença e desprezo, e assegurou-me que não havia concedido sua mão a um homem que não fosse capaz de estar em dois lugares ao mesmo tempo por ela. Jurou que se vingaria, e decerto que o fez. Enquanto eu sofria em silêncio minha derrota, escutei dizer que ela estivera caçando acompanhada de Albert Hoffer. Hoffer era o preferido da sua protetora, e um dia passaram os três cavalgando diante de minha casa. Pareceu-me que mencionavam o meu nome, seguido duma risada burlesca, enquanto Bertha cravava os seus olhos escuros, cheios de desprezo, na minha velha casa.
Todo o veneno e o desassossego dos céus assolou meu coração. Primeiro derramei um rio de lágrimas pensando que nunca chegaria a ser minha, e logo reneguei da sua veleidade. Porém ainda assim tinha que seguir atiçando o lume e vigiando as mudanças das ininteligíveis mezinhas do alquimista.

Cornelius levava três dias e três noites de vigília sem sequer cerrar olhos. As poções dos seus alambiques progrediam a um ritmo mais lento do que ele esperava. Apesar de sua preocupação, já não podia manter os olhos abertos; custava-lhe um tanto sacudir o sono que lhe cegava uma e outra vez os sentidos. Por fim, olhou melancólico os crisóis e murmurou: "Ainda não está pronto, terá que passar ainda outra noite antes de que a obra esteja pronta. Winzy, filho, tu que és arguto e leal e dormiste pela noite, vigia este vaso. Contém um líquido duma cor ligeiramente rosada; quando começar a mudar de tom, acorde-me, até então deixa-me fechar um pouco os olhos. Primeiro põe-se branco, e depois despende faiscas douradas; porém não esperes até que passe disso, quando a cor rosa começar a sumir, acorda-me". Estas últimas palavras, murmuradas enquanto adormecia, já quase não as escutei. Mas, nem sequer então se deixou dobrar pelas leis da natureza e seguiu dizendo: "Winzy, filho, não toques o vaso, não se te ocorra levá-lo aos lábios. É um filtro que cura o amor, e tu não queres deixar de amar a tua Bertha, não é? Pois muito cuidado com ele!"

Repousou a venerável testa no peito e caiu no sono, apenas se escutava a sua respiração. Observei o vaso durante uns minutos, porém o tom rosa do liquido não mudou. Então, a minha mente começou a vagar, vi-me na fonte, em lembrando cenas encantadoras que nunca haviam de voltar, nunca! Quando a palavra "nunca" começou a tomar forma nos meus lábios encheu-me o coração de veneno. Traidora!, traidora e cruel! Nunca tornaria a olhar como olhava Albert. Mulher detestável e odiosa! A coisa não podia ficar assim, como vingança havia de dar morte a Albert a seus pés... mataria a ela com minhas próprias mãos... Sorria triunfante e altiva, consciente da minha aflição e o seu poder. Mas, que poder tinha ela sobre mim? O poder de provocar minha ira, o meu desprezo mais absoluto, a minha... qualquer coisa menos indiferença! Se pudesse conseguir isso! Se pudesse olhá-la com olhos indiferentes e entregar-lhe esse amor não correspondido a outra mais pura e sincera, isso seria, sem dúvida, uma vitória!

De repente, um luz intensa cintilou ante meus olhos. Já me esquecera da poção do mestre. Contemplei-a com assombro: a superfície do liquido refulgia com beleza admirável, despendia umas faíscas mais brilhantes que as produzidas pelos raios de sol ao passar através de um diamante. Uma fragrância deliciosa embebeu meus sentidos, o vaso parecia uma bola luminosa e brilhante, fascinante para a vista e cativante para o olfato. A minha primeira reação, inspirada instintivamente pelos sentidos, foi: "quero beber! tenho que beber!" Levei o vaso aos lábios e murmurei: "Curara-me deste amor, desta tortura!" Quando o filósofo acordou, já eu engolira a metade do licor mais delicioso que provou o paladar humano. Assustei-me e deixei cair o vaso, o liquido derramou cintilando pelo chão e começou a arder. Entretanto, senti como Cornelius me apertava a garganta berrando: "Desgraçado, destruíste o trabalho de toda a minha vida!"

Não se deu conta de que eu bebera parte da poção. Cria que pegara o vaso por curiosidade e que o deixara cair, assustado pelo resplendor e a intensa luz que desprendia; versão que eu admiti implicitamente. Nunca lhe contei a verdade. Apagamos o lume e o resto da poção foi-se esvaecendo, Cornelius recuperou a serenidade, como deve fazer todo filósofo ante as maiores adversidades, e deu-me permissão para descansar.

Seria inútil tentar descrever o sono celestial que elevou a minha alma ao paraíso do gozo durante as restantes horas daquela noite inesquecível. As palavras seriam simples representações banais da satisfação e da alegria que assolavam o meu coração quando despertei. Flutuava no ar, o meu pensamento vagava pelas nuvens. A terra parecia o céu, e o meu legado desse paraíso era viver num êxtase de gozo. "Isto é estar curado do amor", pensei. "Hoje irei visitar a Bertha e mostrar-me-ei frio e distante, demasiado feliz como para tratá-la com desprezo, porém completamente indiferente ante ela!"

As horas voavam e Cornelius, certo de que se o conseguira a primeira vez também o havia lograr uma segunda, começou de novo a elaborar a sua poção. Fechou-se com os livros e as ervas, e deu-me uns dias de descanso. Vesti-me cuidadosamente e olhei-me num escudo velho porém brilhante que me serviu de espelho; parecia que o meu aspecto melhorara extraordinariamente. com bom ânimo e rodeado de toda a beleza do céu e da terra, sai para fora dos limites da cidade. Fui ao castelo, chegando lá, dei-me conta conta de que era capaz de ver suas grandiosas torres com espírito leve, porque já estava curado do amor. Bertha viu-me ao longe quando subia pelo caminho, e não sei que repentina força despertou no seu peito que, ó verme, desceu a escada de mármore brincando com uma corça e começou a correr para mim. Mas também me viu a velha bruxa fidalga que se fazia chamar sua protetora e, na realidade, era a sua tirana; subia abafada e coxeando para o pórtico, enquanto um pagem, tão feio coma ela, lhe sustentava o vestido. Foi ele que deteve minha linda amiga dizendo: "Onde vais com tanta pressa, desvergonhada? Volta à tua gaiola, que fora revoam os falcões".

Podem apreciar como Bertha apertava as mãos, com olhos ainda voltados para mim. Como aborrecia a velha harpia que teimava em reprimir os nobres impulsos da minha amada quando por fim começava a comover-se! Até então, eu sempre evitara defrontar-me com a senhora do castelo por respeito, porém naquele momento não reparei em considerações tão triviais. Já curara do amor e estava por cima de qualquer temor humano, assim apurei o passo e cheguei em seguida ao pórtico. Bertha estava preciosa! Brilhavam-lhe os olhos e ardiam de impaciência e raiva, estava mais garrida e encantadora que nunca, porém eu já não a amava Oh, não! Adorava!, Venerava! Idolatrava!

Aquele dia pressionara-a com mais insistência que nunca para que consentisse em casar de imediato com meu rival. Reprovava-lhe que lhe tivesse dado azos, e ameaçava-a com expulsá-la da casa envergonhada e desonrada. Ela, orgulhosa, rebelou-se contra a tal ameaça; mais, ao lembrar todos os desprezos que me fizera, e que, quiçá por isso, perdera o que agora considerava o seu único amigo, rompeu a chorar com raiva e remorsos. Nesse momento apareci. "Oh, Winzy!", exclamou. "Leva-me em seguida a cabana da teu pai. Renego todos os luxos desta suntuosa casa que não me trouxe mais que desgraças, leva-me de volta à pobreza e à felicidade!"

Colhi-a nos braços, extasiado. A velha ficou muda de raiva, e quando começou a proferir impropérios já estávamos longe, caminho da casa dos meus pais. A minha mãe recebeu com ternura e alegria a coitadinha refugiada, que acabava de escapar duma gaiola de ouro buscando a liberdade na singeleza; e o meu pai, que lhe queria coma a uma filha, deu-lhe as boas-vindas de todo coração. Foi um dia de júbilo, o meu coração pulava de alegria sem necessidade de nenhuma poção mágica.

Pouco depois daquele dia tão agitado casei com Bertha. Deixei de ser discípulo de Cornelius, porém segui sendo seu amigo. Sempre lhe estive agradecido por permitir, sem saber, tomar um gole daquele elixir divino que, em vez de curar-me do amor –triste cura!, um remédio cheio de saudade e dor contra uma coisa que hoje se assemelha a uma bênção– infundiu em mim a coragem e resolução necessárias para conquistar o inestimável tesouro que resultaria ser Bertha.

Com freqüência, recordo aquela época de embriaguez quase hipnótica. A beberagem de Cornelius não cumprira o cometido para o que ele afirmava que fora preparada, mas não há palavras que possam expressar os efeitos tão maravilhosos que produziu em mim. Ainda que o efeito se ia esvaecendo, durou muito tempo e encheu-me a vida de delícia. Às vezes, Bertha abraçava-se ao me ver tão alegre e entusiasmado, algo inusitado em mim já que antes era mais bem sério, mesmo tristonho. Agora, com meu novo caráter, ainda me queria mais, e nas nossas vidas não havia lugar para a tristeza.

Uns cinco anos depois, Cornelius mandou-me chamar a seu leito de morte requerendo a minha presença imediata. Achei-o deitado no leito cunha febre altíssima; a faísca de vida que lhe restava brilhava-lhe no penetrante olhar, fixo num vaso de vidro que continha um líquido rosado.

—Notaste do insignificante que é a vontade humana? –disse com voz entrecortada e como para si. Pela segunda vez estão a ponto de ver-se cumpridas as minhas esperanças, e uma segunda vez me escapam. Vês essa poção? Lembra que há uns cinco anos preparei a mesma beberagem com mesmo resultado: daquela, como agora, esperava poder saciar a minha sede com elixir da imortalidade então, entregá-lo a ti e agora, já é tarde demais!

Falava com dificuldade e tinha que recostar-se contra a almofada. Mas não pude evitar dizer-lhe:

—Porém, venerado mestre, como pode um remédio contra o amor devolver-lhe a vida?

—Um remédio para o amor e para tudo: o Elixir da Imortalidade! Ai, se pudesse bebê-lo agora viveria para sempre! –disse, de maneira case ininteligível, enquanto que um vago sorriso lhe iluminava a cara.

E, dizendo isto, do vaso surgiu um resplendor dourado, e uma fragrância bem conhecida por mim espalhou-se no ar. Apesar de débil que estava, ergueu-se e estendeu o braço, a força parecia retornar a seu corpo como por arte de magia. A mim assustou um forte estalo, o elixir despendeu fagulhas e o vaso quebrou em mil cacos. Olhei para o filósofo: caíra de costas e tinha os olhos vidrados e as feições rígidas, estava morto!

Porém eu estava vivo e ia viver para sempre! Isso disse o desafortunado alquimista, e durante uns dias acreditei nas suas palavras. Recordava a felicidade embriagadora que me inundou depois de tomar aquele trago às escondidas. Passei a observar as mudanças que se produziram no meu corpo e na minha alma: a exultante elasticidade do primeiro e o eufórico entusiasmo da última. Examinei o meu rosto detalhadamente no espelho, e não notei que se tivesse produzido nenhuma mudança nas minhas feições durante os últimos cinco anos. Recordava a luminosa cor e o aroma daquela deliciosa bebida, dignos do poder que possuía. Portanto, eu era Imortal!

Uns dias mais tarde, eu mesmo ria da minha credulidade. O velho provérbio que diz que "ninguém é profeta na sua terra" resultou ser verdade tocante a mim e meu defunto mestre. Eu apreciava-o como pessoa e respeitava-o como mestre, porém a idéia de que pudesse ter algum poder sobre as forças das trevas parecia-me ridícula e ria-me do medo supersticioso com que o olhavam. Era um filósofo sábio, mas não conhecia outros espíritos que não fossem os recobertos de carne e osso. Os seus conhecimentos eram puramente humanos; e o saber humano, conseguiu convencer-me, nunca chegaria a dominar as leis da natureza até o ponto de poder encerrar a alma para sempre na sua morada carnal. Cornelius elaborara uma bebida que restabelecia o espirito, uma bebida mais embriagadora que vinho e mais doce e olorosa que nenhuma fruta, e que provavelmente tinha poderes medicinais: proporcionava alegria ao coração e vigor aos membros. Porém os seus efeitos acabariam desaparecendo, no meu corpo já começavam a minguar. Considerava-me um tipo afortunado porque o meu mestre me obsequiara com boa saúde e alegria e quiçá uma longa vida. Porém a minha boa fortuna acabava ai, a longevidade era bem diferente da imortalidade.

Segui abrigando esta crença durante muitos anos, ainda que às vezes me passava uma idéia pela cabeça: estava realmente equivocado o alquimista? Mas, em geral, seguia a crer que chegaria a minha hora como a qualquer cristão, talvez um pouco tarde porém, a uma idade normal. Mas não havia dúvida que tinha uma aparência extraordinariamente juvenil. As pessoas riam de minha vaidade por olhar-me no espelho com tanta freqüência. Porém era tudo debalde, já que na minha fronte não se via uma ruga; as madeixas, os olhos, tudo eu seguia tão jovem como aos vinte anos.

Estava desconcertado, olhava a mirrada beleza de Bertha, e parecia mais a minha mãe. Pouco a pouco, os vizinhos começaram a fazer comentários deste tipo e finalmente, descobri que me chamavam "o rapaz amigado". Mesmo Bertha começou a inquietar-se, tornou-se zelosa e irritável e, com o tempo, começou a fazer perguntas. Não tínhamos filhos, estávamos completamente sós; porém, assim como tudo, ao ir envelhecendo, o seu caráter leve e esperto acabou por aquietar-se, e a sua beleza começou a murchar. Contudo, eu apreciava-a como a amante que adorara na juventude e a esposa que conquistara com tanta dedicação.

A final, a situação tornou-se insuportável. Bertha tinha cinqüenta anos e eu vinte. Envergonhado, adotei costumes de velho: nos bailes já não me juntava com moços, ainda que o meu coração brincava com eles e tinha que conter os pés para não dançar; fazia uma figura ridícula entre os homens maduros da vila. Porém as coisas já começaram a mudar antes de tudo isso. Rejeitavam-nos todos porque acreditavam que fizéramos, pelo menos eu, um pacto diabólico com algum dos supostos aliados do meu antigo mestre. De mim tinham medo e aborreciam, e a pobre Bertha, ainda que lhe tinham mágoa, abandonaram-na à sua sorte.

Que podíamos fazer? Ficar sentados a frente do lume vendo como a pobreza entrava na nossa casa, já que ninguém queria comprar os produtos da minha granja. Amiúde tinha que fazer vinte milhas de viagem para poder vendê-los em local onde não me conhecessem. Menos mal que tínhamos algo guardado por virem maus tempos.

Ficávamos sós, o moço avelhentado e a sua antiquada mulher sentados diante do fogo. Bertha seguia insistindo em saber a verdade, juntava tudo o que escutara sobre mim e tirava as suas próprias conclusões. Chegou a suplicar-me que desfizesse aquela magia. Tentou convencer-me de quanto mais formosas eram as cãs que meus cabelos castanhos, elogiava o respeito e a veneração que inspira a velhice, comparados com a escassa consideração que se tem com os jovens. Como podem imaginar que o desprezável dom da juventude e a beleza seria mais forte que ódio, o desprezo e a vergonha? Acabariam queimando-me por praticar magia negra, e a Bertha –a que não fora capaz de transmitir nem sequer uma pequena parte da minha boa fortuna– poderiam dilapidá-la por ser a minha cúmplice. Por último, chegou a insinuar que devia compartilhar meu segredo com ela para que pudesse gozar dos mesmos benefícios, se não queria que me denunciasse, e depois começou a chorar.

Vi-me tão encurralado que pensei que o melhor era dizer-lhe a verdade. Contei com todo o tato que pude, e não lhe falei de imortalidade, senão duma longa vida, que era também o que melhor encaixava com a idéia que eu tinha do assunto. Quando rematei o relato, pus-me de pé e disse-lhe:

—E agora, Bertha, ainda queres denunciar o teu amante de juventude? Sei que não o farás, porém seria injusto que ui, a minha querida esposa, sofresse as conseqüências da minha má sorte e das artes malditas de Cornelius. Devo-me ir. A ti fica o bastante para viver; e, quando eu partir, voltarão os velhos amigos para dar-te uma mão. Ainda pareço novo e sou forte, posso trabalhar e ganhar o pão onde ninguém me conheça nem suspeite de mim. Amei-te de moço e ponho a Deus por testemunha de que não te abandonaria na velhice, se não fosse pela tua própria segurança e felicidade.

Vesti o casaco e dirigi-me à porta; porém em seguida senti que os braços de Bertha rodeavam o meu pescoço e os seus lábios bicavam os meus. "Não, meu queridinho, meu Winzy", disse,"não te irás só, leva-me contigo; deixaremos este lugar e, como ti disseste, entre desconhecidos estaremos seguros e livres de qualquer suspeita. Ainda não sou tão velha para envergonhar-te. Seguramente há de desaparecer logo o feitiço e, por Deus, envelhecerás como deves. Por favor, não te vás sem mim!"

Abracei-a forte contra o meu peito e disse-lhe: "Não temas, não te deixarei, não o pensara nem por um momento. Seguirei sendo o teu maridinho fiel e cuidarei de ti até que Deus te chame a seu lado".

No dia seguinte preparamo-nos em segredo para a partida. Teríamos que renunciar a muitas coisas, era inevitável. Reunimos a soma de dinheiro necessária para manter-nos pelo menos enquanto Bertha vivesse e, sem dizer adeus a ninguém, deixamos nossa terra natal para refugiar-nos num lugar remoto do oeste de França.

Foi cruel afastar a pobre Bertha da sua vila natal e os seus amigos de juventude e levá-la a um país com outra língua e outros costumes. Para mim, a partida era algo sem demasiada importância devido ao segredo do meu insólito destino. Compadecia-me profundamente dela e alegrava-me comprovar que encontrava consolo para as suas desgraças em pequenas casualidades ridículas. Longe de todos os conhecidos, ela tentava ocultar a evidente diferença de idade que nos separava mediante milhares de truques femininos: punha carmim nos lábios, usava roupa juvenil e comportava-se coma uma mocinha. Não podia aborrecer-me com ela, não levava eu também uma máscara? Por que havia de discutir com ela se os seus truques não funcionavam tão bem como os meus? Uma tristeza infinita assolava o meu coração quando lembrava que essa era a minha Bertha, a que eu amara tão apaixonadamente, a que tanto me custara conquistar. Aquela garota de cabelos mouros e olhos escuros, com sorriso pícaro e cativador, que saltitava como uma corça, convertera-se nessa velha mexeriqueira e zelosa. Deveria venerar as suas cãs e rugas! Sabia que era o meu dever.

Porém esse tipo de decadência não era o que me aborrecia nela. A sua desconfiança não tinha limite. A sua principal ocupação era descobrir que, apesar da aparência externa, eu também estava a envelhecer. Creio que, no fundo, a pobre amava-me de verdade; mas nunca conheci uma mulher com forma tão opressiva de mostrar o seu carinho. Descobria rugas no meu rosto e debilidade no meu andar, enquanto eu brincava com vitalidade juvenil e parecia o mais novo dos moços do lugar. Nunca se me ocorreria falar a outra mulher; porém, numa ocasião, ela, crendo que a beleza da vila me via com bons olhos, comprou-me uma peruca cinza. O tema habitual de conversação com suas amizades era que, ainda que parecesse tão novo, o meu corpo estava a deteriorar-se e o pior sintoma, afirmava, era essa aparente saúde. Dizia que a minha juventude era uma enfermidade e que devia estar preparado, se não para uma morte repentina e horrível, quando menos para espertar uma manhã com o cabelo todo branco, cuvado e com todos os achaques da velhice. Deixava-a falar e amiúde mesmo corroborava as suas conjecturas, que concordavam com minhas eternas especulações sobre o meu estado. Até cheguei a tomar um sério ainda que doloroso interesse por escutar tudo o que o seu rápido engenho e a sua imaginação exaltada podiam discorrer sobre o tema.

Para que estender em mais detalhes? Ainda vivemos juntos muitos anos. Bertha ficou paralítica e prostrada numa cama. Cuidei dela como uma mãe cuidaria um filho. Com o tempo, tornou-se ainda mais raivosa e obsessiva, sempre cismando sobre quanto tempo eu ia sobreviver. Consola-me saber que cumpri escrupulosamente o meu dever para com ela. Foi a minha companhia na juventude e foi também na velhice e, afinal, quando enterrei o seu corpo, chorei desconsolado pela perda do único elo que realmente me unia a este mundo.

Desde então, quantas foram as minhas preocupações e pesares e que poucas e vãs as alegrias! Vou deixar a minha historia neste ponto, não paga a pena seguir. Um marinheiro sem temor nem compaixão, sacudido por um mar tormentoso; um viajante perdido num monte imenso, sem luzes nem estrelas que o guiem: isso é o que eu sou e estou mais perdido e desesperado que nenhum deles. Um barco próximo ou a luz d’alguma casa ao longe poderiam salvá-los, porém para mim não há outro farol que a esperança da morte.

Morte! misteriosa dama de escuro rosto que alentas os pobres mortais! Por que, entre todos eles, tivestes que me privar a mim do teu abraço protetor? Oh, a paz, o profundo silêncio da tumba! Se o meu cérebro se detivesse e o meu coração deixasse de sentir emoções que só variam em novas formas de tristeza!

Então, sou imortal? Volto com a primeira pergunta. Em primeiro lugar, nao é mais provável que a poção não concedesse a vida eterna, senao uma longa vida? Isso é o que eu espero. Ademais, só tomei a metade da poção, não teria que bebê-la toda para completar o feitiço? Portanto, tomar a metade do Elixir da Imortalidade só suporia ser semi-imortal e assim, a minha eternidade ficaria truncada e invalidada.

Ora, de todo o modo, quem poderia saber quantos anos são a metade da eternidade? Amiúde, trato de adivinhar segundo que regra se pode dividir o infinito. Às vezes imagino que me acho velho. já encontrei uma cã. Porém sou um tolo!! ainda me lamento? Sim, invade-me com freqüência o medo da velhice e morte; e, ainda que aborreço a vida, quanto mais vivo mais me aterra a morte. Ai, o ser humano é um mistério! Nascemos para perecer e teimamos em lutar, como faço eu, contra as leis que regem a nossa natureza.

Maldita contradição, estou certo de que algum dia hei morrer. A poção do alquimista não poderá mais que o fogo, uma espada ou as profundas águas dum rio. Já me tenho visto mais duma vez nas azuis profundidades de um plácido lago ou nos tumultos rápidos dum imenso rio, pensando que a paz reside nas suas águas. Porém, assim mesmo, sempre dei volta para seguir vivendo outro dia mais. Pergunto eu se o suicídio será um pecado para alguém que não tem outra forma de cruzar as portas do outro mundo. Fiz de tudo, exceto apresentar-me voluntário para o exército ou um duelo, porque desta maneira não só destruiria a mim mesmo, não, senão também outros mortais, por isso dei para trás. Os mortais não são os meus iguais. A inesgotável força vital que habita o meu corpo e a sua existência efêmera nos faz tão opostos como os pólos. Por isso, eu não seria quem ergueria uma mão nem contra o mais débil nem o mais forte deles.

Assim vivi durante todos estes anos, só e aborrecido de mim mesmo, desejando morrer porém ainda vivo: um mortal imortal. não tenho ambições nem sou cobiçoso, e esse ardente amor que me rói o coração –esse que não voltará nunca, porque nunca encontrei um igual a quem possa entregá-lo– perdura só para atormentar-me.

Precisamente hoje, ideei um projeto com o qual poderei acabar com tudo sem ter que suicidar-me nem fazer doutro homem um Caim: uma expedição a que nenhum mortal, nem sequer alguém novo e forte como eu, havia sobreviver. Desta maneira, porei à prova a minha imortalidade e descansarei para sempre ou voltarei para converter-me num prodígio da natureza e um benfeitor da humanidade.

Mais antes de partir, a vaidade levou-me a escrever estas páginas. Não quero morrer sem deixar pegada. Já passaram três séculos desde o funesto dia em que bebi aquela poção e não há de passar outro ano antes de que, enfrentando enormes perigos, lutando contra as forças do céu no seu próprio terreno, açoitado pelo temporal, a fome e a fatiga, abandone a ação da chuva e o vento este corpo que se converteu numa gaiola demasiado resistente para uma alma tão sedenta de liberdade. Porém se sobrevivo, o meu nome será lembrado como um dos mais célebres entre os mortais. E, daquela, hei empregar métodos mais contundentes para dispersar e aniquilar todos os átomos que compõem o meu corpo e liberar a vida encadeada dentro, a que tão cruelmente se lhe impediu ascender deste mundo de trevas a uma esfera mais adequada á sua essência imortal.

Fontes:
http://victorian.fortunecity.com/postmodern/135/

Sergio Antonio Meneghetti (Manifesto de Poeta)

Se a poesia é ferramenta para paz
Que utilizem desta para pacificar
Que a escrita nobre que se faz
Fale de amor, e não de crucificar.

A letra que ataca
Está no nível da guerra
Esta corta o homem como a faca
E será mais uma contenda nesta Terra.

O poeta busca a beleza na divindade
Ele é o elo entre a palavra e a criação
Sua conduta no papel é responsabilidade
E não pode levar ódio algum no coração.

A poesia da concórdia fala de luz
Não é separatista em nenhuma questão
São ensinamentos semelhantes à de Jesus
Esta que eleva o homem, tirando seus pés do chão.

No manifesto dos poetas em Natal
Lembre-se que harmonia se consegue com dedicação
Arrancando primeiro dentro de nós todo o mal
Este é o primeiro passo, para a grande união.

Fonte:
Sergio Antonio Meneghetti. Publicado em 13/02/08.
http://www.congressopoetasdelmundo.com/

quinta-feira, 22 de maio de 2008

Primeiro Congresso Internacional de Poetas Del Mundo (Natal - RN)


O lançamento Oficial do 1º Congresso Internacional de Poetas del Mundo - "Natal um Mar de Poesia e Paz", aconteceu no dia 2 de outubro de 2007, em Natal - RN.

A Entidade – espera, nesse encontro, que dar-se-á de 24 a 31 de maio de 2008, a participação de poetas de todos os cantos do mundo anônimos e famosos em busca da "Paz" tão sonhada por toda humanidade. E também, promoverá ações que deverão ser levados adiante num movimento que pugna pela luta em prol da Paz, da Igualdade, da Justiça e pelo Meio-Ambiente.

Para o lançamento Oficial contamos com a presença da Senhora Delasnieve Daspet de Souza, Embaixadora da Paz para o Brasil, nomeada por Gèneve, Suíça, Subsecretária de Poetas Del Mundo, que também representou o Secretário Geral e fundador do Movimento de Poetas del Mundo, Luis Árias Manzo; Senhora Marisa Cajado, poetisa, musicista e autora do hino da referida entidade, que foram anfitrionados por Deth Haak, "A Poetisa dos Ventos", Cônsul de Poeta Del Mundo para o Rio Grande do Norte, membro da SPVA-RN - Sociedade dos Poetas Vivos e Afins e organizadora desse mega evento.

Forma:

O evento será dividido em partes e terá o envolvimento de todas as artes com oficinas, exposições de poesias visuais por toda a cidade, envolvendo as escolas municipais, particulares e universidades.

Em tese, teremos aqui, poetas dos cinco continentes.
50% - leitura de poesias
15% - lançamentos de livros
15% - performances poéticas
10% - assembléias para discutir-se o movimento, o seu futuro e a sua forma de intervir e/ou interagir com as ocorrências mundiais.

Fonte:
http://www.congressopoetasdelmundo.com/

Deth Haak (A Noiva do Sol)

Natal em maio de 2008, se converterá em um mar de Poesia e Paz! O sonho da SPVA-RN, Sociedade dos Poetas Vivos e Afins - RN se fará em um encontro que reunirá Poetas del Mundo, do mundo todo, laureados e anônimos.

E em palavras formaremos elos condensados nos versos. Plasmaremos Poetas Del Mundo ou não, sim a Vida é a missão concedida aos homens e mulheres e crianças eleitos por Orfeu, que inundaram esse solo com um dilúvio de "PALAVRAS".

Quando apresentei a cidade do Natal o fiz através de palavras, bordadas em um Acróstico descrevendo-a Assim: "Rio Grande do Norte Natal Brasil", versos que flanaram como véus a beleza das Dunas, honrando seus mártires ovacionando as Mulheres que fizeram história nesse rincão por mim amado. Contei seus feitos e fatos da velha Ribeira; citei Ferreira Itajubá inebriando versos com olor de caju. O mestre Câmara Cascudo inspirava a Potioca que do Vento recebeu alvíssaras em rimas. Ousei como Nizia Floresta, e o defeso com galhardia abriu seu leque, e como Auta de Souza a descrevi como Olimpo erguendo um altar sagrado pro templo da Poesia! Eis que a Praieira de Othoniel Meneses se fará! "Natal um Mar de Poesia e Paz". De mãos dadas, o Mundo ao Brasil virá testemunhar que a Paz pode ser conquistada através das "PALAVRAS, que o verbo se faz Verbo".
A NOIVA DO SOL!
Deth Haak

Natal cidade, um dia talvez nos entenda
De o porquê render-te versos de amor e paz
Porque de ti bordamos a beleza que é prenda
Porque não cantamos tristes os seus azas...
Talvez seja a linha do Equador que o lenço emenda
Pra secar da face o pranto enquanto sorri o que é voraz.
Forjaras rimas para que a humanidade compreenda
Que nos seus véus a Poesia irmanará Poetas iguais.
Que neste Mar de Poesia e Paz possam advir regaços
Borbotados em tríades inspiradas alianças poéticas
Assinando bodas nas nuvens que entremearão os laços
Entre a Noiva do Sol e a história, explodindo ogivas éticas
Que ouvirá o Mundo a redimir dos seres os percalços
Da insanidade alastrada por almas tão maléficas!

Paz, Poetas Del Mundo ou não!

"A Poetisa dos Ventos"

SPVA-RN
AVSPE
Cônsul Poetas Del Mundo - RN

Luis Arias Manzo (O Poeta e a Poesia na Luta pela Paz no Mundo)

O Primeiro Congresso de Poetas Del Mundo acontecerá nos dias 24 a 31 de maio de 2008 na bela cidade de Natal no Estado do Rio Grande do Norte, no Brasil.

Os Poetas del Mundo, se reúnem no país do futuro, assim como o chamou Stefan Zweig, e não obstante disso já faça mais de sessenta e cinco anos, seu vaticínio ainda cobra vigência hoje mais que nunca. Por isso nada mais significativo e simbólico que nosso Primeiro Congresso de Poetas del Mundo se leve a cabo neste país, o país de Luis Carlos Prestes, como solo nomeá-lo. O mundo nos reclama.

O poeta é um ente especial, tem o dom de fazer da palavra algo belo que transcende o sentido simples quando ela está desnuda. O poeta a veste de uma maneira que a faz forte, espetacular, bela.

Para os tempos que vivemos é necessário que o homem consiga entender-se através do diálogo, mas o ruído dos canhões impede que nos escutemos, então se necessita imperiosamente que a voz ultrapasse o retumbar das armas, e o poeta sabe disso.

Vivemos atualmente o processo de morte de uma etapa degenerada e o nascimento de uma NOVA ERA, em que o poeta tem um rol determinante de coisas em que intervir. O poeta não pode ficar atrás, o poeta deve ir à primeira fila, se não o faz, é que não é um verdadeiro poeta, em todo caso, não é um verdadeiro Poeta del Mundo.

Como algo concreto neste combate pela vida e pela paz, fixei-me na árdua tarefa de unir os Poetas de todo o mundo que abraçam os ideais de liberdade, justiça e igualdade, e em conseqüência, criei o “Movimento Poetas del Mundo” fixando-me um ambicioso objetivo: converter a palavra em uma força real capaz de influir nos destinos do mundo e no equilíbrio do planeta. Logo, quando nossa voz ressoar nos frios palácios do Poder e chegar também ao bairro que o poeta não pode deixar de visitar, devemos ser capazes de propor uma via que nos retire do estado de decadência que vive nossa sociedade.

Nesta tarefa futurista o sujeito social é o poeta, e este poeta guerreiro deve nutrir-se da realidade social, mesclar-se nela e ser capaz de abandonar o Ego. Qualquer lugar onde se desenvolva a atuação do escritor é uma trincheira de combate, porque em todas as partes há decadência.

Os políticos fracassaram; arrastaram-nos à situação apocalíptica em que nos encontramos pelo que hoje é necessária uma troca profunda na estruturação da organização do mundo, em outras palavras, creio que estamos vivendo nos limites do aceitável e muito perto do início de uma revolução planetária, é aí onde o escritor pós-moderno tem uma lista determinante de coisas em que intervir.

É certo que a guerra não é algo novo que nos surpreenda, a guerra tem existido sempre; desde a noite dos tempos em que o homem tomou consciência de sua existência, viemos nos combatendo uns com os outros, o problema é que hoje a ambição do homem está provida de armas capazes de fazer desaparecer a vida no planeta em poucas horas. O que estamos vendo no Oriente Médio é uma etapa de um nefasto projeto muito ambicioso do Império, que consiste em apoderar-se dos recursos naturais que possui essa região, hoje se trata do petróleo (energia), amanhã será a água doce e a biodiversidade.

Então, os poetas devem usar a melhor arma para combater o horror, a ignorância ou a inconsciência dos homens, essa arma é o poema; essa maneira curta de expressar algo grande, essa forma de dizer brevemente algo que envolve um sentimento enorme ao interior mesmo das entranhas da alma. O poema é a linguagem misteriosa que brota inexplicavelmente desde a fonte que nutre a vida sentimental do ser, isso que chamamos inspiração.

É uma forma de comunicação entre o eu terrestre e a voz misteriosa que sussurra no interior de cada um. O poema pode ser tão potente, que se o usamos bem, o podemos converter em uma arma poderosíssima para combater os sentimentos cinzentos destes loucos que nos governam. Para lá se encaminha meu ambicioso projeto: Criar um exército de poetas guerreiros cuja arma seja a palavra que se expande pelo mundo como uma torrente de resistência para o que mata a vida e a felicidade.

Estou consciente do perigo que implica este projeto; não faz muito, faz algo assim como dois mil anos, eram os tempos do Império romano, um homem jovem entrou em Jerusalém falando de amor e de paz, sua arma era a palavra, todos sabem como terminou sua aventura. Não me estranharia que em algum tempo mais, nos acusem de terroristas intelectuais, e nos persigam por todas as partes, mas ainda assim vale à pena dar esta batalha pela vida e a paz.

Por isso convoco os Poetas del Mundo a envolver-se ativamente nos problemas que aflijam as suas comunidades, sobretudo ali onde os homens perdem a razão e o sentido essencial de nossa existência. A poesia deve começar a jogar seu rol nestes tempos de guerra, de extermínios, de fome, de seqüestros, de injustiças, de aquecimento global do planeta e das novas pestes que carcomem a mentalidade de quantos detenham o poder e decidem sobre os destinos do mundo.

Convoco o nosso Corpo Diplomático Poético a fazer dos seus misteres e a atuar ali onde seus bons ofícios são necessários, e a pensar em como ser mais eficaz em nosso histórico praticado pela humanidade.

Estes e outros temas estarão no nosso Primeiro Congresso de Poetas del Mundo onde chegarão poetas de todo o planeta.”

VIVA A VIDA!

Luis Arias Manzo: Fundador e Secretário Geral do Movimento Poetas Del Mundo
Delasnieve Daspet: Embaixadora para o Brasil e Sub Secretaria para as Américas
Deth Haak: Cônsul dos Poetas Del Mundo para o Rio Grande do Norte
Tradução: Nadir Silveira Dias - Cônsul Poetas Del Mundo para o Estado do Rio Grande do Sul.
.

Deth Haak (Discurso em Trovas de Lançamento do 1o Congresso Mundial de Poetas Del Mundo - 2007)

Discurso proferido em trovas pela Coordenadora Sra. Deth Haak, Cônsul do Movimento de Poetas del Mundo no Estado do Rio Grande do Norte, no ato do lançamento oficial do 1º Congresso Mundial de Poetas del Mundo em 02.10.2007.

NATAL, UMA MAR DE POESIA E PAZ
Deth Haak

Que unidas todas as mãos
Inundem com alegrias
Poetas Del Mundo irmãos
Façam versos em demasia;

O mundo inteiro hoje vê
Na SPVA nordeste
Da Potyoca pra você
Versos de cabra da peste.

CASCUDO então me diria
Por e-mail ou telefone
Que Minerva aqui faria
Os versos em ciclone;

Bastante Camões virão
De Flor Bela, muitos clones
Poetas declamarão
Seus versos nos microfones

A SPVA deu provas
Que o verso e seus acalantos
Trará-nos nas boas novas
A Paz de todos os cantos

Em Deus Pai, tenho esperança
Que a Poesia reinará
E a Paz será a herança
Que Natal vos legará!

Será amena a lembrança
Que a saudade plantará
E então em cada criança
A Paz Mundial medrará;

Sinta qual Brisa a palavra
Plasmando o que eu sonhei
A Musa que o Vento lavra
Natal rainha sem rei!

Cidade Sol evidência
De universal harmonia
Busca da rima essência
E do verso a sinfonia;

Saudar Natal com ardor
Eis que o mar amante canta
E as Dunas primam o louvor
Na musica sacrossanta;

Poder exaltar-te em vida
Com trovas de puro amor
Enalteço-te comovida
Agradecendo ao Senhor;

Quem com versejar milita,
Basta ver-te magistral
Para despir-te bendita
Natal nubente sensual...

Poetas louvam-te em gloria
A Praeira do Othoniel
Cascudo em ti fez história
Cingindo-te com laurel!

És louvada por teus filhos
Em noitadas e manhãs
De Auta áureos estribilhos
E Luiz Carlos Guimarães;

Versos em Trovas altivas
O Cordel popular manto
Do Parnaso as sempre-vivas
Emolduradas de encanto;

Na verve de seus autores
Elevemos a nobreza
Pedro Grilo e seus valores
Da potiguar realeza.

Será em Maio o casório
Mês de Maria senhores
E haverá sol compulsório
Na Roma dos trovadores;

Que chova rima e o verso
No amparo da inspiração
Nas vírgulas do estro terço
Rezas preces e emoção;

Vinte e quatro a trinta e um
Num certame assaz afoito
Tu serás Natal o podium
Em Maio dois mil e oito;

Um mar de Paz te proponho
Minha Natal que amo tanto
Voragem de amor e sonho
Por isso em verso te canto;

Crispiniano o Presidente
Da Fundação se empolgou
E o projeto de repente
Desta poetisa aprovou;

Sou Poetisa e me orgulho
De ser par na confraria
Onde no verso procuro
A femína Academia.

Bem digo Ademar Macedo
Trovador da minha estima
Também louvo ao bardo ledo
Diógenes da Cunha Lima;

Poetas são pensadores
Nos mais variados climas
Neruda e demais autores
Os li pra cantar-lhes rimas

O Itajubá é saudade
Zila Mamede também
São dois anjos de bondade
Lá no azulado além!

Nobre guardião Luiz Árias
Dos pacifistas senhores
Almas da Paz sectárias
Recebam nossos louvores.

Digníssimo Secretario
Que do evento é timoneiro
É de escol o dignitário
De Natal pro Mundo inteiro;

Dona Vilma de Farias
Ilustre Governadora
Foi com Mar de Poesia
Simpática e acolhedora;

No dever bastante ativa
Desde o primeiro momento
Mui gentil e receptiva
Deu garantia ao evento;

Para o Brasil é a primaz
Esta escrita na lousa
Embaixadora da Paz
Delasnieve Daspet de Souza;

Prefeito Carlos Eduardo
Flutuando em cordialidade
Fará a entrega ao bardo
Da chave desta cidade;

Poetas Vivos e Afins
Firmes idealizadores
Ouçam de Cristo os clarins
O Mestre dos Sonhadores...

"A Poetisa dos Ventos"
Sociedade dos Poetas Vivos e Afins do Rio Grande do Norte
Cônsul Poeta Del Mundo - RN
AVSPE

Fonte:
http://www.congressopoetasdelmundo.com/

Delasnieve Daspet (Discurso Oficial do 1o Congresso Mundial de Poetas Del Mundo)

Discurso de Abertura Oficial do 1º Congresso Mundial de Poetas del Mundo, pronunciado pela Embaixadora no Brasil do Movimento Poetas del Mundo, Sra. Delasnieve Daspet, representando o Secretário Geral do Movimento Poetas del Mundo, Sr. Arias Manzo, no ato de seu lançamento em 02.10.2007, às 19hs no Palácio da Cultura/Pinacoteca em Natal, Rio Grande do Norte.

Aos poetas que participam da organização do Primeiro Congresso do nosso Movimento "Poetas del Mundo".

Aos poetas de todo o Brasil que se uniram a este esforço e que acreditaram nesta utopia que consiste em pôr poesia nos problemas que agoniam a humanidade.

Aos Poetas del Mundo
Desde Chile, o país de Gabriela Mistral e Pablo Neruda, dois Prêmios Nobel de Literatura, quero saudar a todos os poetas que trabalham na organização do nosso primeiro congresso que se realizará na cidade de Natal, Brasil. Quero saudar-lhes através da nossa Sub-Secretária Geral e Embaixadora Delasnieve Daspet, que tem trabalhado lado a lado comigo desde o início deste magno projeto, e que tem a difícil missão de fazer deste evento histórico um êxito sem precedentes na história da humanidade. Envio esta mensagem por ocasião do lançamento deste evento, acontecimento do qual quis participar pessoalmente, mas por dificuldades que não vem ao caso explicar agora, não pude estar com vocês, porém sei que os responsáveis de Natal e do Brasil saberão representar e expressar nossos ideais e princípios.

O poeta é um ser especial; tem o dom de fazer da palavra algo belo que transcende o sentido simples quando esta está desnuda, o poeta a veste de uma maneira que a faz forte, espetacular, bela. Para os tempos que vivemos é necessário que o homem consiga entender-se através do diálogo, porém o ruído dos canhões impede que nos escutemos, então se necessita imperiosamente que a voz ultrapasse o retumbar das armas, e o poeta sabe disso. Vivemos atualmente o processo de morte de uma etapa degenerada e o nascimento de uma NOVA ERA em que o poeta tem uma lista determinante de coisas em que intervir. O poeta não pode ficar atrás, o poeta deve ir na primeira fila, se não o faz, é que não é um verdadeiro poeta, em todo caso, não é um verdadeiro poeta del mundo.

Como algo concreto neste combate pela vida, me fixei na árdua tarefa de unir os poetas de todo o mundo que abraçam os ideais de liberdade e criei O Movimento Poetas del Mundo e fixei um ambicioso objetivo: converter a palavra em uma força real capaz de influir nos destinos do mundo e no equilíbrio do planeta. Logo, quando nossa voz ressoe nos frios palácios do Poder e chegue também ao bairro que o poeta não pode deixar de visitar, devemos ser capazes de propor uma via que nos retire do estado de decadência que vive nossa sociedade.

Nesta tarefa futurista o sujeito social é o poeta, e este poeta guerreiro deve nutrir-se da realidade social, mesclar-se nela e ser capaz de abandonar o Ego. Qualquer lugar onde se desenvolva a atuação do escritor, é uma trincheira de combate, porque por todas partes há decadência. Os políticos fracassaram; nos arrastaram a situação apocalíptica em que nos encontramos, hoje é necessária uma troca profunda na estruturação da organização do mundo, em outras palavras, creio que estamos vivendo nos limites do aceitável e muito perto do início de uma revolução planetária, é aí onde o escritor pós-moderno tem uma lista determinante de coisas em que intervir.

É certo que a guerra não é algo novo que nos surpreenda, a guerra tem existido sempre; desde a noite dos tempos em que o homem tomou consciência de sua existência viemos nos combatendo uns com os outros, o problema é que hoje a ambição do homem está provida de armas capazes de fazer desaparecer a vida no planeta em poucas horas. O que estamos vendo no Oriente Médio é uma etapa de um nefasto projeto muito ambicioso do Império, que consiste em apoderar-se dos recursos naturais que possui essa região, hoje se trata do petróleo, amanhã será a água doce.

Então, os poetas devemos usar nossa melhor arma para combater o horror, a ignorância ou a inconsciência dos homens, essa arma é o poema, essa maneira curta de expressar algo grande, essa forma de dizer em breve algo que envolve um sentimento enorme ao interior mesmo das entranhas da alma. O poema é a linguagem misteriosa que brota inexplicavelmente desde a fonte que nutre a vida sentimental do ser, isso que chamamos inspiração. É uma forma de comunicação entre o eu terrestre e a voz misteriosa que sussurra no interior de cada um. O poema pode ser tão potente, que se o usamos bem, o podemos converter em uma arma poderosíssima para combater os sentimentos cinzentos destes loucos que nos governam. Para lá se encaminha meu ambicioso projeto: Criar um exército de poetas guerreiros cuja arma seja a palavra que se expande pelo mundo como uma torrente de resistência para o que mata a vida e a felicidade.

Estou consciente do perigo que implica este projeto; não faz muito, faz algo assim como dois mil anos, eram os tempos do Império romano, um homem jovem entrou em Jerusalém falando de amor e de paz, sua arma era a palavra, todos sabemos como terminou sua aventura. Não me estranharia que em algum tempo mais, nos acusem de terroristas intelectuais, e nos persigam por todas as partes, mas ainda assim vale a pena dar esta batalha pela vida e a paz.

Luis Arias Manzo
Fundador e Secretário Geral do Movimento Poetas del Mundo
Tradução: Nadir Silveira Dias, Poeta del Mundo em Porto Alegre e Cônsul Estado do Rio Grande do Sul, com o estrito cuidado de preservar o exato pensamento e a construção lingüística do autor, no idioma original.
.
Fontes:

Delasnieve Daspet (Movimento Poetas Del Mundo - Poesia: Conviver com responsabilidade)

Movimento Poetas del Mundo

Tem a aparência de uma cadeia. Cadeia sinonímia de corrente. Sempre circulando. Sempre em movimento. De braços dados estamos lutando -com e pela palavra – pelo direito à vida. Vida com qualidade. Do ar sem poluição. Da água límpida. Da manutenção das matas. Do direito das minorias. Dos aviltados. Pela voz de todos os povos – oprimidos ou não.

Para nos fazermos ouvir – estamos falando pela poesia. Dela mesma. A palavra efetiva, de suas composições, de seus mitos, de suas espécies, de suas formas, metrificadas ou não, pois a poesia é a dialética da vida!

A poesia imita por diversos meios.

Exprime-se em cores ou figuras.

Imita a vida com o som, com o ritmo, com a harmonia. É tragédia ou comédia. Um canto, um ritmo. Epopéia, versos soltos, poemas livres....

Estes são alguns dos movimentos da palavra e de como a descrevem os poetas.

Então, amigos, não há que se falar em norte único do movimento. Tudo o que esta escrito no Manifesto faz parte.

Mas, é muito mais do que isso! Cada um tem de buscar dentro de si o que pode fazer – não esperar que lhes diga o que pode fazer.

Atuem no seu bairro. Na sua vila. Na sua família. No trânsito. Com seu amigo. Com seu próximo.

Exerça a sua cidadania. Isso não dependerá de qualquer movimento, mas sim, do interesse de cada um pela vida.

Olhem quanta coisa existem ao nosso redor... Falem de fatos que estão aí... à mão, por exemplo, sobre o meio ambiente. Se os governantes da terra, se cada um de nós – não nos conscientizarmo-nos muito em breve a poesia na e da Terra se calará.

Não haverá nada a ser cantado. Nem um por de sol, nem penumbra, nem vida...

Então?

Desejo que todos consigam realizar bom combate:

CONVIVER COM RESPONSABILIDADE
Delasnieve Daspet

O que esta fazendo o homem?
Dominar a natureza é sua intenção...
Não tem como, não!
Antes de dominar o planeta temos de aprender
A nos conhecer...

É hora de parar e examinar nossa sede de extermínio,
De agressão à vida,
Necessitamos de uma nova visão de progresso
De consciência ecológica,
Pois somos partes, integrantes, deste mundo,
Partilhamos com ele nossos sonhos e projetos.

Ganhamos o planeta de presente,
Só falta convivermos com zelo e responsabilidade.
Já foi dito que poderíamos aproveitar de
Todos os frutos, de todas as riquezas,
Conservando-a com sabedoria.

Diz-se que o planeta não tem instinto...
Que não pode se vingar
Do que lhe fazem no dia a dia,
Quando vivemos a poluir e a exterminar...

Mas ele tem se virado contra o homem,
Mostrando sua força e exigindo respeito...
Ou o que dizer dos tornados, tsunamis, enchentes,
Fogo, frio, calor, lixos, secas latentes...

Homens ouçam:
O planeta, a natureza , o universo, a vida
Pedem clemência!

05.06.05
Campo Grande MS

José Feldman (Um Dia...)

Um dia você pega as suas coisas, faz as malas, se despede de quem ama e sai porta afora, para um mundo novo, buscando a liberdade e a felicidade tão sonhada.

Um dia você aluga um apartamento ou uma casa, aprende que tem que cozinhar para si próprio, se quiser comer. Que tem que limpar sua casa, se quiser um lugar organizado, aprende que independência da casa dos pais não implica em fazer o que bem entende. A sociedade tem regras, e você começa a sentir isto na pele, e deve segui-las.

Um dia você vê que só o seu dinheiro poupado durante tantos anos a fio, já não é o bastante, então tem que procurar um emprego, para poder se sustentar. Sempre achava que a liberdade era uma coisa linda e maravilhosa, e você não precisaria se preocupar com nada. Agora vê, que ela engloba responsabilidades, deveres e direitos.

Um dia você se sente deprimido, pois a vida independente não é um mar de rosas, e se arrepende de ter saído da casa de sua família, e pensa em voltar. Mas, também pensa em tudo o que aconteceu para sair, e fica dividido entre o que fazer.

Um dia você descobre que apesar de estar sendo exatamente igual a seus pais, o seu lar é o seu castelo, e você se sente feliz consigo próprio, e assim como seus pais eram os reis na casa deles, você é o rei na sua.

Um dia você descobre que ser rei de seu castelo envolve deveres, direitos e responsabilidades, e que mesmo assim não é fácil, é uma batalha constante para manter seu pedacinho de chão.

Um dia você descobre que está envelhecendo, que está ficando mais chato, mais turrão, a memória está falhando, se sente mais cansado, se sente meio frustrado, pois seus sonhos eram apenas sonhos, e as lágrimas correm tão facilmente em momentos inesperados.

Um dia você percebe que nos momentos que deveria falar, se calou e em outros, quando deveria ficar calado, falou.

Um dia você descobre que muitas coisas que fez não tinham razão de ser, e que se pudesse voltar atrás, mudaria tudo, entretanto, existem tantas outras que mesmo com algum final desastroso, deixaria como está.

Um dia você descobre que os seus verdadeiros irmãos são aqueles que um dia passaram por sua vida e deram um encontrão em você e seguiram adiante. Outros, que estiveram sempre presentes, mesmo que ausentes.

Um dia você descobre que nunca esteve sozinho, que sua família esteve sempre ligada a você em todos os momentos de sua vida, e você sempre, na verdade, seguiu os passos dela, sem nem mesmo perceber.

Um dia você percebe que aquilo pelo qual você sempre lutou só vai ser reconhecido por você mesmo, pelos que acompanharam sua caminhada e aqueles que realmente te amaram, e sempre estiveram a seu lado torcendo por você e incentivando quando você cambaleava.

Um dia você percebe que os verdadeiros inimigos de sua evolução não estão nas ruas, mas dentro da casa que você abandonou, dizendo-se irmãos, primos, sobrinhos, etc. Percebe que você é infeliz, pois ainda está ligado ao que pensam de si.

Um dia você percebe que é hora de se desvincular disso tudo e seguir os seus próprios passos, caminhar com seus pés, fazer sua própria vida e ser aquilo que você quer ser, não aquilo que os outros querem que você seja.

Um dia você percebe que a felicidade está dentro de você, e você tinha este tempo todo a chave para abrir esta porta e liberta-la.

Um dia você vai ter coragem suficiente para deixar suas coisas de lado, abandonar as malas do passado, carregar dentro de seu coração aqueles a quem ama e quem realmente estiveram a seu lado e sair porta afora, para um mundo novo, livre e feliz...

Um dia você vai perceber que finalmente realizou seu sonho e finalmente é feliz.

(Ubiratã, 22/05/08)

Artur da Tavola (A Chave do Pai na Fechadura)

A perda de um pai é dos sentimentos mais difíceis de elaborar, no volume das contradições que a figura paterna sempre representa. O pai perdido na infância, na juventude é alguém a quem apenas começamos a perceber, delinear, compreender e entender em profundidade.

O pai é sempre aquele no qual o filho precisa colocar o que de ruim e de bom vai descobrindo no ser humano. A grandeza de um pai se mede pela capacidade de suportar todas essas fases pelas quais o filho passa na busca de modelos. Tanto a fase na qual o considera o maior do mundo, como naquela em que o tem como falho, errado, símbolo de tudo aquilo o que imagina não ser ou querer. Por isso a morte dele, sobretudo se repentina, priva o filho da continuação dessa intensa pesquisa preliminar de viver. Com a morte, a visão que tem do pai torna-se madura e acabada em questão de segundos. A morte, paradoxalmente às suas perdas, tem o condão de instantaneamente transformar a figura do pai na imagem que só o tempo se encarregaria de compor.

No exílio, em 1964, tornei-me íntimo amigo de um líder comunista bem mais velho que eu, Roberto Morena. Ele foi uma pessoa importante na minha vida e formação, mesmo não sendo eu comunista. Chegou a morar em minha casa no Chile. Inteligentíssimo, operoso, tinha lutado como voluntário na Guerra Civil Espanhola e, já naquele tempo, defendia idéias que, anos depois, Gorbatchev tornaria atos concretos com o fim da União Soviética e o sonho de um socialismo liberal. Por causa das lutas políticas, ele estava sempre fora de casa, inúmeras vezes preso. Foi uma grande figura, um patriota. O filho dele se ressentia da falta do pai e muito brigava com ele nos naturais impasses da juventude diante da maneira dos mais velhos verem o mundo. Não o compreendia e manifestava isto com franqueza.

Um dia, comovido e com os olhos úmidos, Roberto Morena, já na casa dos sessenta e poucos anos, conta-me a relação difícil com o filho por causa de sua atividade política e, por isso, faz questão de mostrar, todo orgulhoso, uma carta dele, da qual destacava um trecho realmente comovente: "Brigamos muito e por vezes eu não o entendia. Hoje, tenho saudade até do barulho de sua chave, altas horas da noite, na fechadura da porta lá de casa".

O barulho da chave na fechadura, funcionando como elemento de recordação filial, só revela o quanto aquela alma, então adolescente, se pacificava com a chegada do pai. Sempre que um pai volta para casa, algo se pacifica no coração do filho. Aí está o segredo do amor entre pai e filho, mesmo quando se desentendem: a certeza de que ele traz a segurança e a base necessária à estabilidade emocional. É essa base a que se rompe quando um pai parte, sem voltar...
==============
A obra imortal de Paulo Alberto Artur da Távola M. Monteiro de Barros segue preservada também no endereço eletrônico http://www.arturdatavola.com/
==============
Fonte:
Colaboração da Equipe "Artur da Távola", por e-mail.

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Escritor português lança romance histórico

"Rio das Flores", o novo romance do escritor português Miguel Sousa Tavares, autor do consagrado "Equador", será lançado no dia 26 de maio, no Rio de Janeiro, na Livraria Travessa de Ipanema (Av. Visconde de Pirajá, 572).

A obra é um mergulho no momento histórico de um mundo marcado pela emergência de regimes autoritários. É na formação da ditadura salazarista, em Portugal, do regime Vargas, no Brasil e uma passagem pelo surgimento do franquismo na Espanha que se ambienta este romance.

O título é uma evocação do município fluminense onde ficava a fazenda cafeeira que o personagem acabou comprando para realizar seu sonho. Já o livro é uma ode de amor ao Brasil. Miguel de Sousa Tavares transfere para seu personagem Diogo uma paixão que não esconde ter pelo país.

==============================
Sobre o Autor

Miguel Andresen de Sousa Tavares (Porto, 25 de Junho de 1952) é um jornalista e escritor português.

Filho da poetisa portuguesa Sophia de Mello Breyner Andresen e do advogado Francisco Sousa Tavares, começou a sua vida profissional pela advocacia, que abandonou em favor do jornalismo, de onde passa para a escrita literária. Tem uma obra diversificada, essencialmente marcada por crônicas e reportagens, mas fez já outras digressões literárias, nomeadamente com a publicação de um livro infantil, de vários contos e do romance Equador, um best-seller em Portugal durante 2004 e 2005. No ano 2007 publicou o romance "Rio das Flores"

Jornalista famoso e controvertido, é dono de opiniões fortes, trava polêmicas em vários campos: política, literatura, esportes e outros.

Colabora atualmente com o jornal Expresso, com a estação de televisão TVI onde é comentador. Contribui também, semanalmente, para o jornal A Bola onde escreve uma coluna com o nome "Nortada".

Bibliografia
Equador, Oficina do Livro, 2003
Anos Perdidos, Oficina do Livro
Não Te Deixarei Morrer, David Crockett, Oficina do Livro
Sul, Viagens, Oficina do Livro, 2004 (Edição Ampliada)
O Segredo do Rio, Oficina do Livro
Um Nómada no Oásis, Relógio d'Água Editores
O Dia dos Prodígios
O Planeta Branco, Oficina do Livro, 2005
Rio das Flores, Oficina do Livro, 2007

Fontes:
http://www.releituras.com/
http://pt.wikipedia.org/
Colaboração de Douglas Lara. In Acontece em Sorocaba. http://www.sorocaba.com.br/acontece

Miguel Sousa Tavares (Primeiro dia)

O que o acordou foi o silêncio. Primeiro, o do despertador que não tocou à hora combinada todas as manhãs. Depois, o de outra respiração, que devia ouvir e não ouvia. Estendeu a mão para o quente do outro lado da cama e encontrou o frio. Apalpou e encontrou vazio. Então, sim, despertou completamente.

Um prenúncio de tragédia desceu por ele abaixo, como um arrepio. O que acabara de se lembrar era que não acordara só por acaso ou por acidente: aquele era o primeiro dia, a primeira manhã da sua separação — o primeiro de quantos dias? — em que acordaria sempre sozinho, com metade da cama fria, metade do ar por respirar.

Era Abril, sábado e chovia. Sentado na cama, lembrou-se das instruções que dera a si mesmo para aquela manhã: fazer peito forte à desgraça. Nada é inteiramente bom, mas nada é inteiramente mau - pensou. Posso ler à noite até me apetecer sem me mandarem apagar a luz, posso dormir atravessado na cama, posso-me livrar daquele rol de cobertores com o qual ela me esmagava, fizesse sol, chuva ou frio, porque as mulheres são mais friorentas que eu sei lá, posso usar a casa-de-banho todo o tempo que quiser, posso espalhar as roupas, os jornais e os papéis pelo quarto à vontade e até - oh, suprema liberdade — posso fumar à noite na cama.

Levantou-se para se olhar ao espelho da casa-de-banho. Sorriu à sua própria imagem, ensaiou-a calma, tranquila, confiante. Imaginou mentalmente o texto que poderia redigir sobre si mesmo para a secção de anúncios pessoais do jornal: “Divorciado, 40 anos, bom aspecto, licenciado, rendimento médio-alto, casa própria e espaçosa, desportos, ar livre, terno e com sentido de humor”. Mulheres compatíveis? Deus do céu, dezenas delas! Sou um partidão — concluiu para o espelho.

Calmo, tranquilo e confiante, passou aos outros aposentos da casa para dar uma vista de olhos ao resultado da partilha dos móveis, aliás feita sem grandes problemas, como é próprio de gente civilizada. Por alto, entre o living, o hall, o escritório, a cozinha, o quarto de casal e as duas casas-de-banho, estimou nuns setecentos contos o preço da reposição das coisas em falta. Mais metade dos livros e dos CD's, quase todas as fotografias dos últimos dez anos das suas vidas e algumas outras coisas cujo verdadeiro valor era o vazio que encontrava se olhasse para o lugar onde elas costumavam estar.

“Até agora vou-me aguentando”, considerou ele. Entre perdas e danos e a certeza adquirida de que nada dura para sempre, restavam-lhe várias razões e objectos e sentimentos para olhar em frente sem um sobressalto.

Enquanto fazia, com um prazer insuspeitado, o seu primeiro pequeno-almoço de homem só, passou à fase seguinte do que chamara o “plano de sobrevivência”: desfolhar a agenda de telefones em busca de amigos igualmente sós com quem fazer “programas de homens” ou de antigas namoradas, que se tinham separado ultimamente ou outras que achava acessíveis mas que nunca tivera a coragem e a oportunidade de aproximar. A primeira desilusão foi com os amigos: de A a Z, realizou que só tinha dois amigos sem mulher e, para agravar as coisas, com nenhum deles lhe apetecia sair e entrar numa de “anda daí e mostra-me lá como é o mundo lá fora”. Quanto às mulheres que julgava sortables, sempre eram cinco, mas o resultado foi quase patético. Duas já não moravam naqueles telefones, outra tinha-se casado entretanto, e o marido estava ao lado a ouvir a conversa, o que o deixou completamente idiota a inventar pretextos absurdos para o telefonema. Do número da quarta atendeu uma criancinha e ele desligou e foi só na última da lista que finalmente teve sorte: sim, a Joana morava ali, era ela própria ao telefone. Não, não estava casada nem, pelo que, esforçadamente, percebeu, tinha namorado. Sim, ok, por que não irem jantar logo, para falar do projecto que ele tinha e onde ela poderia caber. “Ah, a tua mulher não vem? Separados? Não, não sabia. Recente? Pois, essas coisas são tão chatas, mas ainda bem que reages e tens projectos novos e tudo! Ok, às oito e meia vens-me buscar”. Ele teria desligado quase em êxtase, não fosse a frase final dela, à despedida, que o deixou verdadeiramente abalado. “Olha, vais-me achar uma grande diferença. A idade não perdoa a ninguém, não é?”

Enfim, sempre era um date. O primeiro, certamente, de uma longa lista. O que interessa se for um flop — achas que ias encontrar uma mulher super logo ao virar da esquina? É preciso é entrar no circuito, pá, começar a sair, a ser visto, fazer com que as pessoas saibam que estás disponível. O resto vem por arrasto.

Passeou-se pela casa, pensativo, fumando o primeiro cigarro do dia. De repente lembrou-se que ainda não tinha visto o quarto do filho. A cama e a escrivaninha tinham ido, assim como praticamente todos os brinquedos. Sobrava um boneco de peluche, três ou quatro carrinhos semi-partidos, uns legos e um quadro para fazer desenhos, com os respectivos marcadores, pousados, à espera de uma mão de criança. A mesa-de-cabeceira ficara e parecia absurda no meio do quarto, sem a cama nem os outros móveis, com um retrato dele e do filho numa praia do Algarve, sorrindo, abraçados um ao outro. Sem saber porquê, sentou-se no chão encostado à parede, muito devagar, a olhar para a fotografia. Duas grossas lágrimas escorregaram-lhe pela cara abaixo e caíram na madeira do chão, entre as pernas. Foi só então que ele percebeu que estava a chorar.
(foi mantida a grafia original)

Fonte:
TAVARES, Miguel Sousa. Não te deixarei morrer, David Crockett. RJ: Editora Nova Fronteira, 2005. In http://www.releituras.com

terça-feira, 20 de maio de 2008

Lendas (A saga de Gilgamesh)

Esta obra, baseada em figuras reais, conta a luta de um rei na sua busca pela imortalidade.

Gilgamesh foi um dos reis de Uruk, cidade-estado (hoje em dia Warka, Iraque), da primeira dinastia depois do dilúvio babilônico, na Mesopotamia, em meados do terceiro milênio a.C.

Esta história chegou até nós porque se descobriu a biblioteca do rei babilônico Asurbanipal (668-627 a.C.), em doze tábuas incompletas escritas em linguagem acádia em Nínive. De maneira indireta, tem uma descrição quase exata da história de Noé e o dilúvio Universal e da amizade entre Davi e Jonata; e na literatura grega, a união de de Aquiles e Patroclo.

A literatura suméria, na antiga Mesopotamia é a mais antiga da historia. Milhares de cilindros, selos e tabuletas de argila foram descobertas, porém so cerca de 10% pode ser considerada literatura mesmo, de ficção.

Alem disso, os judeus, durante o primeiro exílio babilônico, foram fortemente influenciados pelas lendas e mitos sumérios, babilônicos e mesopotâmicos, preservando muitas destas informações através do Velho Testamento.

O épico de Gilgamesh é composto por 12 tabuletas. Na primeira é explicada a conformação divina de G, que era 2/3 divino e 1/3 humano. Foi construtor e guerreiro, mas era um sacana, tirano e despótico. Os deuses, atendendo as suplicas do povo oprimido, enviam Enkidu, meio humano, meio animal, para que enfrente G e o mate. A luta, mesmo terrível, não deu em nenhum vencedor. Ao contrário, os dois ficam amigos e partem para aventuras e enfrentamento de outras bestas.

Já longe de Uruk, enfrentam Huwawa, o guardião divino dos bosques de Cedro. Faltam partes das tabuletas que contam essa parte da história, mas se deduz que G corta o bosque, derrota Huwawa.

Voltando a Uruk, Ishtar, a deusa do amor e deidade da cidade lhe propõe casamento. Mas G, sabendo do destino dos homens que se unem a ela, recusa. Ishar, doida da vida, convence seu pai que envie um tal de touro celestial para matar G. contudo, ele e Enkidu enfrentam o monstro e e o derrotam. Enkidu é castigado e num sonho, três deuses, Anu, Ea e Shamah, dizem-lhe que vai morrer. Em seguida, adoece e morre. Gilgamesh, desconsolado chora a morte de seu amigo e parte numa perigosa viagem em busca do sabio Ut- Napishtim, possuidor do segredo da imortalidade e único sobrevivente do diluvio babilonico. Igual ao da Bíblia. Ut-Napishtim é justo e piedoso em meio a barbárie e injustiça. Os deuses o advertem que construa um barco no meio do deserto e espere o pior. Durante 6 dias e 6 noites desata o aguaceiro, tão poderoso que até mesmo os deuses de assustam. Com as aguas acalmadas, surge a nova Mesopotamia, da qual G é parte. Contada a história do diluvio, Ut-Napishtim, que é imortal, explica onde conseguir a planta que lhe dará a juventude eterna: está no fundo de um lago. G vai buscar a tal planta e, como sempre, triunfa. Mas ao voltar a Uruk, uma serpente lhe rouba a planta milagrosa e ele acaba chorando amargamente a perda da imortalidade.

Fontes:
http://victorian.fortunecity.com/postmodern/135/
http://www.historywiz.com (imagem)

Kim Edwards (O Guardião de memórias)

Inverno de 1964. Uma violenta tempestade de neve obriga o Dr. David Henry a fazer o parto de seus filhos gêmeos. O menino, primeiro a nascer, é perfeitamente saudável, mas o médico logo reconhece na menina sinais da síndrome de Down.

Guiado por um impulso irrefreável e por dolorosas lembranças do passado, Dr. Henry toma uma decisão que mudará para sempre a vida de todos e o assombrará até a morte: ele pede que sua enfermeira, Caroline, entregue a criança para adoção e diz à esposa que a menina não sobreviveu.

Tocada pela fragilidade do bebê, Caroline decide sair da cidade e criar Phoebe como sua própria filha. E Norah, a mãe, jamais consegue se recuperar do imenso vazio causado pela ausência da menina. A partir daí, uma intrincada trama de segredos, mentiras e traições se desenrola, abrindo feridas que nem o tempo será capaz de curar.

Trecho do Livro

Março de 1964

I

A neve começou a cair horas antes de ela entrar em trabalho de parto. Primeiro alguns flocos, no céu cinzento e opaco do fim de tarde, depois volteios e redemoinhos impelidos pelo vento ao redor das quinas da ampla varanda frontal. Ele parou ao lado da mulher, à janela, observando as rajadas abruptas de neve sucederem-se em ondas, rodopiarem e caírem no chão. Em todo o bairro acenderam-se as luzes e os galhos nus das árvores embranqueceram.

Depois do jantar, ele acendeu a lareira, aventurando-se na nevasca para buscar lenha do monte que empilhara junto à garagem no outono anterior. O ar penetrante e frio bateu-lhe no rosto, e a neve na entrada da garagem já chegava a meia altura de seus joelhos. Ele juntou algumas toras, sacudindo a camada macia e branca que as cobria, e as levou para dentro. Os gravetos sobre a grelha pegaram fogo imediatamente e, por algum tempo, ele ficou sentado junto à lareira, pernas cruzadas, acrescentando toras e observando o saltitar das chamas, azuladas e hipnóticas. Lá fora a neve continuava a cair silenciosamente na escuridão, tão brilhante e densa como estática nos cones de luz formados pelos postes de iluminação. Quando se levantou e olhou pela janela, seu carro se transformara numa colina branca e fofa à beira da calçada. Suas pegadas na entrada da garagem já tinham desaparecido.

Ele sacudiu as cinzas das mãos e se sentou no sofá ao lado da mulher, que tinha os pés apoiados em almofadas, cruzando os tornozelos inchados, e um exemplar do livro do Dr. Spock equilibrado sobre a barriga. Absorta, ela lambia a ponta do dedo indicador, distraída, a cada vez que virava uma página. Tinha mãos delgadas, de dedos curtos e firmes, e mordiscava o lábio inferior, concentrada, enquanto lia. Ao observá-la, ele sentiu uma onda de amor e deslumbramento: por ela ser sua esposa e pelo fato de seu bebê, esperado dali a apenas três semanas, estar prestes a nascer. Seria o primeiro filho. Fazia só um ano que estavam casados.

Ela ergueu os olhos, sorridente, quando o marido ajeitou o cobertor em volta de suas pernas.
– Sabe, andei pensando em como deve ser... – disse. – Quero dizer, antes de nascermos. É uma pena a gente não se lembrar.

Abriu o roupão e levantou o suéter que usava por baixo, revelando uma barriga redonda e dura como um melão. Passou a mão pela superfície lisa, enquanto a luz do fogo brincava em sua pele, lançando em seu cabelo um tom de ouro avermelhado.
– Você acha que é como estar dentro de uma grande lanterna? O livro diz que a luz atravessa minha pele, que o bebê já consegue enxergar.
– Não sei – disse ele.

A mulher riu.
– Por que não? – perguntou. – O médico é você.
– Sou apenas um cirurgião ortopedista – lembrou-lhe o marido. – Poderia explicar o padrão de ossificação dos ossos fetais, mas só isso.

Levantou o pé da mulher, delicado e inchado dentro da meia azul-clara, e começou a massageá-lo de leve: o tarso possante do calcanhar, os metatarsos e as falanges, escondidos sob a pele e sob a densa camada de músculos, como um leque prestes a se abrir. A respiração dela enchia a sala silenciosa, o pé aquecendo-se nas mãos do marido, e ele imaginou a simetria perfeita, secreta, dos ossos. Na gravidez, sua mulher lhe parecia linda, mas frágil, com as finas veias azuis transparecendo vagamente na pele alva e pálida.

Tinha sido uma gestação excelente, sem nenhuma restrição médica.Mesmo assim, já se iam vários meses sem que ele conseguisse fazer amor com a mulher. Em vez disso, descobria-se querendo protegê-la, carregá-la nas escadas, envolvê-la em cobertores, levar-lhe xícaras de creme de ovos. Não estou inválida, ela sempre protestava, rindo. Não sou um filhote de passarinho que você tenha encontrado na grama. Apesar disso, gostava das gentilezas do marido. Às vezes, ele acordava e a observava durante o sono: o tremor das pálpebras, o movimento lento e ritmado do peito, a mão estendida, tão miúda que ele conseguia envolvê-la completamente com a sua.

Ela era 11 anos mais moça. Fazia pouco mais de um ano que ele a vira pela primeira vez, subindo uma escada rolante de uma loja de departamentos no centro da cidade, num sábado cinzento de novembro em que saíra para comprar gravatas. Ele tinha 33 anos e era novo em Lexington, no Kentucky, e a moça havia emergido da multidão como uma espécie de visão, com o cabelo louro penteado para trás e preso num coque elegante, pérolas reluzindo no pescoço e nas orelhas. Ela usava um mantô de lã verde-escuro e tinha a pele clara e pálida. Ele subiu a escada, abrindo caminho pela aglomeração e se esforçando para não perdê-la de vista. A moça foi para o quarto andar: lingerie e meias. Quando ele tentou segui-la por entre os corredores repletos de araras cheias de anáguas, sutiãs e calcinhas, todos com um brilho suave, uma vendedora de vestido azul-marinho com gola branca o deteve, sorrindo, perguntando em que poderia servi-lo. Um roupão, disse ele, vasculhando os corredores até avistar o cabelo da moça, um ombro verde-escuro e a cabeça inclinada, que revelava a curva elegante e pálida de sua nuca. Um roupão para minha irmã que mora em Nova Orleans. Ele não tinha irmã, é claro, nem qualquer parente vivo que conhecesse.

A vendedora desapareceu e voltou um instante depois, com três roupões de tecido felpudo e grosso. Ele escolheu às cegas, quase sem baixar os olhos, pegando o do topo da pilha. Temos três tamanhos, dizia a vendedora, e haverá uma variedade maior de cores no mês que vem.Mas ele já seguia pelo corredor, com um roupão cor de coral pendurado no braço e os sapatos rangendo no piso de lajotas, enquanto se deslocava com impaciência por entre os outros clientes, em direção ao local em que ela havia parado.

A moça estava examinando as pilhas de meias caras, cujas cores transparentes reluziam pelas aberturas brilhosas de celofane: castanho, azul-marinho, um marrom-escuro como sangue de porco. A manga de seu casaco verde tocou-o de leve e ele sentiu seu perfume, suave mas penetrante, como as pétalas densas e pálidas dos lilases fora da janela do quarto de estudante que ele um dia ocupara em Pittsburgh.As janelas de seu apartamento no porão estavam sempre sujas, cobertas pela fuligem e pelas cinzas da siderúrgica, mas na primavera havia lilases em flor, borrifos brancos e purpúreos no vidro, e o aroma invadia o aposento como a luz.

Ele pigarreou – mal conseguia respirar – e levantou o roupão felpudo, mas a vendedora atrás do balcão estava rindo, contando uma piada, e não o notou. Quando tornou a pigarrear, a mulher o olhou de relance, irritada, e fez sinal com a cabeça para sua freguesa, que nesse momento segurava nas mãos três embalagens finas de meias, como cartas de baralho gigantes.
– Creio que a Srta. Asher chegou aqui primeiro – disse a vendedora, fria e altiva.

Foi quando os olhos dos dois se encontraram, e ele ficou surpreso ao ver que os da jovem eram do mesmo tom verde-escuro de seu mantô. Ela o estava avaliando – o sólido sobretudo de tweed, o rosto escanhoado e avermelhado pelo frio, as unhas bem aparadas. Sorriu, divertida e meio desdenhosa, apontando para o roupão em seu braço.
– Para sua mulher? – indagou. Falava com o que ele reconheceu ser um sotaque refinado do Kentucky, numa cidade de velhas fortunas em que essas distinções tinham peso. Depois de apenas seis meses na cidade, ele já sabia disso. – Está tudo bem, Jean – prosseguiu a jovem, tornando a se virar para a vendedora. – Pode atendê-lo primeiro. Esse pobre homem deve estar se sentindo perdido e sem graça com toda essa renda aqui.
– É para minha irmã – disse ele, aflito por desfazer a má impressão que estava causando. Isso já lhe acontecera várias vezes na cidade; era afoito ou direto demais e ofendia as pessoas. O roupão caiu e ele se abaixou para pegá-lo, enrubescendo ao levantar. As luvas da moça estavam sobre o vidro do balcão e suas mãos se cruzavam de leve ao lado delas. O constrangimento do homem pareceu abrandá-la, pois, quando os olhos voltaram a se encontrar, os dela se mostraram gentis.

Ele tentou de novo:
– Desculpe. Parece que não sei o que estou fazendo. E estou com pressa. Sou médico. Estou atrasado para o hospital.

Nesse momento, o sorriso dela se modificou, tornou-se sério.
– Entendo – disse, e se voltou de novo para a vendedora. – Jean, por favor, atenda-o primeiro, sim?

Concordou em vê-lo de novo, escrevendo seu nome e telefone com a letra perfeita que aprendera na terceira série, cuja professora era uma ex-freira que havia imprimido em seus pequenos pupilos as regras da caligrafia. Toda letra tem um formato, ela lhes dizia, um único formato no mundo, e nenhum outro, e é sua responsabilidade fazer com que ele seja perfeito. Aos oito anos, pálida e magrela, a mulher de mantô verde que viria a ser sua esposa havia agarrado a caneta entre os dedinhos e praticado a letra cursiva, sozinha em seu quarto, hora após hora, até escrever com a fluência requintada da água corrente. Tempos depois, ao ouvir essa história, ele a imaginaria com a cabeça inclinada sob o abajur, com os dedos dolorosamente apertados em volta da caneta, e se admiraria com a perseverança dela, com sua crença na beleza e na voz autoritária da ex-freira. Nesse primeiro dia, porém, não sabia de nada disso. Carregou o pedaço de papel no bolso do jaleco branco, de um quarto de doente para outro, rememorando as letras dela a fluírem até desenhar a forma perfeita de seu nome. Telefonou-lhe na mesma noite, levou-a para jantar na seguinte e, três meses depois, os dois estavam casados.

Fontes:
http://www.americanas.com.br/
http://veja.abril.com.br/