sábado, 5 de julho de 2008

Errata

Favor corrigir as postagens de Abel Fernandes de 20 de junho de 2008. O endereço de seu blog foi digitado errado. Constava http://www.abelfernandes.blogspot.com/, quando o correto é sem o www. no início, sendo http://abelfernandes.blogspot.com/
Obrigado,
José Feldman

Vãnia Souza Ennes (Os trovadores passam, as Trovas ficam)

A palavra, matéria prima e vital do trovador, manifesta-se diante da capacidade de escrever construtivamente e desponta para escancarar os mistérios que nascem no fundo de um coração poetizado. O poder mágico do trovador é inventar, pensar coisas belas, abrir a porta dos sonhos, eternizar momentos, filosofar, demonstrar humor, aproximar o tempo, chorar num ombro amigo, interagir com a espiritualidade; é ser forte na capacidade de atuar em assuntos do passado, do presente e do futuro. Assim sendo, a mente do trovador reveste-se de especial colorido quando põe seus neurônios para agir e, imediatamente, transferir os sentimentos para o papel. A Trova é força indiscutível da sensibilidade interior de cada poeta e exterioriza-se em valiosas mensagens no momento em que se torna pública, no intuito de suavizar as adversidades da vida, amenizar as durezas da existência e melhorar os caminhos da humanidade. O ato de escrever Trovas é algo fascinante e, seguramente, não vai acabar em inércia capaz de fazer cães e gatos roncarem de tanto sono, porque ela é clara, transmite bons fluídos, renova e reinventa sentimentos! Descobrir as táticas de escrever trovas é um ato de conhecimento, que significa perceber as forças das relações entre o mundo da natureza e o mundo dos homens, o mundo real e o imaginário. E, ato de sabedoria, ao conduzir o homem a uma abertura de horizontes mentais que se dá pela criatividade do conjunto de palavras que seleciona, para formar seu acervo trovadoresco. Enfim, a trova quando rica em sabedoria, nobre na mensagem e estética na beleza, é capaz de emocionar pela magia e continua viva, mesmo após a partida do trovador para o mundo celeste!

Portanto, a Trova eterna eterniza o trovador!

Fonte:
Vânia Souza Ennes – Presidente Estadual da UBT do Paraná
Boletim Nacional da União Brasileira de Trovadores, julho 2008. n. 480.

Erico Veríssimo (Caminhos Cruzados)

É sábado, o professor Clarimundo Roxo, solteirão, solitário, de 48 anos, desperta às cinco e meia da manhã para começar o dia dando aulas. Sua preocupação é com o tempo, sabe que o conceito sobre este é algo diferente daquilo que pensa a viúva Mendonça ou o sapateiro Fiorello. Contudo, a escravidão ao tempo é algo marcante.

Clarimundo vive sob o tique-taque do relógio. Sente culpa quando se atrasa alguns minutos para as aulas. Pensa no livro que ainda escreverá. Será de cunho científico, nele pretende colocar toda sua cultura e algumas gotas de fantasia. O protagonista escolhido é um homem lá da estrela de Sírio. Com um telescópio mágico, olhará a terra e descobrirá a verdade das coisas. Prepara o café e se senta para os costumeiros 40 minutos de leitura.

Às sete da manhã, quem desperta é Honorato Madeira, lembrando-se, também, de chamar a mulher, Virgínia. Ela desperta, mas se entrega aos pensamentos. Relembra que tem um filho de 22 anos e um marido obeso, sem graça, que sempre faz as mesmas coisas, o que lhe causa desgosto. Ele reclama da ida, à noite, ao baile do Metrópole; bem poderia ficar em casa descansando do trabalho.

O filho, Noel, já está tomando café e recordando os dias de infância, quando a negra Angélica lhe preparava para ir à escola e levava-o à terceira esquina, onde se encontrava com a menina Fernanda, sempre limpa, bem arrumada e alegre, num contraste flagrante com seu estilo taciturno. Volta ao presente, recorda que teve uma infância recheada de histórias fantásticas, contadas por Angélica.

Nunca correu descalço pelas ruas ao sol. Seu mundo era dos livros, dos soldadinhos de chumbo e a parede do quarto dos brinquedos limitava seu mundo. Este cai com a morte da negra Angélica, quando Noel tinha 15 anos.

Sua primeira experiência sexual foi repugnante, viscosa e violenta. Noel sabe que o horário de refeição em sua casa é o momento menos cordial, de raros diálogos. A mãe reclama de tudo: da roupa, do marido, das criadas. Diz que já devia estar trabalhando. Não está estudando Direito? O melhor de sua vida era a amizade com Fernanda, a amiga de infância.

Em outro canto da cidade, Salustiano Rosa acorda às 9 horas com o sol batendo em cheio em seu rosto. Dorme ao lado de uma moça loura, Cacilda, que encontrou na noite anterior. Pede-lhe que saia logo do seu prédio, sem ser vista. Veste-se e sai feliz, logo após a moça.

Às onze horas, em outro lugar, Chinita pensa em Salustiano. Recorda-se do rapaz tocando-lhe os bicos do seio por cima do vestido e acha a sensação deliciosa. Hoje à noite, vai encontrá-lo no chá dançante do Metrópole. Ela está na casa do pai, Cel. José Maria Pedrosa, onde decoradores embelezam tudo com enfeites dourados e pintura na parede. D.Maria Luísa, a esposa, teme pelos gastos, mas o marido quer que a vivenda dos Moinhos de Vento seja o melhor palacete do bairro. A festa de inauguração será na terça-feira e Chinita redigirá os convites.

D. Maria Luísa conserva sempre o ar de vítima, eternamente triste e preocupada. A riqueza do Cel. veio com a sorte tirada num bilhete de loteria, comprado com trezentos mil-réis. A mulher chorou à tarde inteira, quando soube da despesa com aquele pedaço de papel. Souberam da sorte, na véspera de Natal. Pedrosa e os filhos ficaram radiantes, apenas D. Maria Luísa estava triste, brigando por seu rico dinheiro, defendendo-o dos pedintes. O marido resolve se mudar para Porto Alegre e todos da cidade de Jacarecanga vêm dizer adeus à esposa desconsolada, sempre saudosa da vida simples de Jacarecanga.

Fernanda mora na Travessa das Acácias. Ela descansa, enquanto espera a hora de ir para o trabalho. Vai pensando na vida dura que tem levado, na morte do pai. A mãe, D.Eudóxia, lhe chama à realidade, lembrando-lhe que não deve dormir. A senhora é extremamente pessimista, crendo que tudo vai dar errado. A filha evita dar muita atenção à mãe, prefere pensar em Noel e chamar o irmão, Pedrinho para o trabalho.

Outro morador da Travessa é João Benévolo, leitor dos Três Mosqueteiros. Gosta tanto da leitura que se deixa transportar para a Paris de 1626, quando deixa de ser o fraco Benévolo, tornando-se ágil e ousado. Sua mulher, Laurentina, fica furiosa com a distração do marido. Quer saber se ele não vai procurar emprego; é 1 hora da tarde e lá está ele lendo, já está desempregado há 6 meses! As contas estão atrasadas, a costura que faz para fora pouco ajuda, não dá nem para o aluguel. Eles têm um filho, Napoleão, magro, que chora por qualquer coisa.

Da janela da casa, João e a esposa vêem um carro luxuoso estacionar e de dentro dele sai D.Dodó, Doralice Leitão Leiria, esposa do comerciante Teotônio Leitão Leiria, proprietário do Bazar Continental, onde Benévolo trabalhou. A senhora vem visitar Maximiliano, seu empregado que está atacado pela tuberculose. Deixa algum dinheiro, prometendo transferi-lo para um hospital. Parte feliz, certa de que tem seu lugar garantido no céu.

Honorato e Noel já saíram. Aliviada, Virgínia desce para o chá, aborrecida porque tudo lhe lembra o marido e o filho. Trata mal as empregadas, fica aborrecida com a juventude de Querubina, grita, ralha, humilha a empregada.

Teotônio Leitão Leiria despede o motorista e segue a pé, para se encontrar com a moça dos olhos verdes, Cacilda, que mora na Travessa das Acácias. Teme ser reconhecido, vai cheio de culpa, porque pensa na caridosa esposa, Dodó. Cacilda não apareceu ainda e Leitão fica temeroso, pedindo explicações à viúva Mendonça pela demora. Cacilda chega e entrega-se a Teotônio, pensando no belo rapaz que amou na noite anterior.

A volta de Teotônio Leiria para casa repõe a rotina doméstica nos trilhos. A esposa aguarda o querido marido para o baile no Metrópole, preparado por ela, para a comemoração das Damas Piedosas. Depois vai ao quarto da filha, Vera, e pede-lhe para não ler o tipo de livro que anda lendo: A Questão Sexual, de Forel.

No salão do Metrópole, Salustiano encontra Chinita e a aperta, com certa violência, contra o peito, convidando-a para darem uma volta lá fora. Dr. Armênio espera que Vera compreenda o sentimento que lhe devota, mas a moça está interessada mesmo é em Chinita. Honorato Madeira está louco para voltar para casa, mas tem que esperar a decisão da esposa.

O professor Clarimundo ouve batidas em sua porta. Trata-se da viúva Mendonça, que vem reclamar a falta de pagamento do aluguel por Benóvolo, desempregado há alguns meses. Conta que, toda noite, um sujeito mal encarado vem visitar a esposa de Benévolo. Faz várias reclamações e vai embora.

Enquanto isso, às 11 horas da noite, Laurentina, está diante de Ponciano, o visitante mal-encarado, mencionado pela viúva. Em outros tempos, era o candidato preferido das tias de Laurentina, com quem a moça morava. Elas queriam vê-la casada com o moço. Mas João Benévolo apareceu, Ponciano se afastou. Após 10 anos, reaparece e se põe diante dela, todas as noites, esperando um instante de fraqueza da mulher para pedir-lhe que abandone o marido e o siga. Ela já compreendeu seu objetivo, mas não tem ânimo para falar. O visitante pede que fique com 20 mil-réis e os deixa sobre a mesa, sonhando com o dia em que terá Laurentina nos braços.

Na casa de Honorato, a esposa Virgínia desperta, decide tomar umas pílulas rejuvenescedoras. Olha-se no espelho e vê, lá do outro lado, Virgínia Matos Madeira, mulher de 45 anos, cabelos meio grisalhos, queixo duplo e princípio de rugas, tão diferente daquela que sente ser. Recorda-se de sua empregada já falecida, Angélica. Ela criou Noel e dirigiu a casa até a morte. Quando o Capitão Brutus começou a fazer-lhe galanteios e aparecer diante de sua janela, Angélica ameaçou contar o fato a Honorato. O tempo passou, o capitão foi transferido e Virgínia continuou levando a vida.

O palacete dos Pedrosa continua sendo preparado para a inauguração. Chinita se comporta como uma estrela de Hollywood e o pai paga-lhe todos os luxos que tanto desgostam a mãe, a triste e desconsolada, Maria Luísa. O filho, João Manuel, não leva vida diferente. Às vezes, não dorme em casa ou então só retorna de madrugada, para dormir até o meio da tarde. A família está se acabando, para D. Maria Luísa. Onde irá parar tudo aquilo? O luxo da casa, a mobília, os gastos desnecessários assustam a dona da casa que prefere ser uma estranha e não participar dos desmandos. Assim, se voltar à pobreza não sentirá a diferença.

É domingo. Clarimundo está de novo na janela de sua casa, pensando em como será o livro que vai escrever. Qualquer dia irá começá-lo pelo prefácio. Vê Fernanda e seu irmão, Pedrinho, sentados para o almoço. A moça avisa a mãe que irá a Ipanema para se encontrar com Noel. Fernanda deseja modificá-lo. Pensa no duro que dá no escritório do Senhor Leitão Leiria, na luta com o fatalismo da mãe, enquanto o rapaz só pensa em literatura, em escrever livros, sem nada fazer para tornar o projeto realidade.

Mais tarde, Pedrinho está no quarto de Cacilda, relutando em deixá-la. Ela diz que ele deve sair logo, pois tem visitas a receber. O rapaz anda perdidamente apaixonado por ela. Não consegue trabalhar, só vê sua figura o tempo todo. Lamenta o tipo de vida que a moça leva. Sonha em lhe dar um colar muito bonito que viu na Sloper. Cacilda fica aborrecida com as constantes visitas do rapazinho, mas não tem coragem para magoá-lo.

É segunda-feira, na casa de Benévolo a pobreza é gritante. Almoçam pouco, o filho chora de dor no estômago, a mãe lhe dá elixir paregórico. Benévolo sonha, lendo o livro, comprado com parte do dinheiro deixado por Ponciano. Quando a esposa o irrita ou alguma coisa o aborrece, Benévolo assobia o Carnaval de Veneza. É o que faz, ao ouvir Laurentina lhe mandar procurar emprego.

Na casa de Chinita, o vai-e-vém é constante. Todos estão envolvidos com a preparação para a festa inaugural, exceto D.Maria Luísa. Vera beija Chinita, loucamente, no quarto e a moça se entrega às carícias da amiga. Depois, descem para o chá.

Noel, trancado em seu quarto, tenta escrever seu romance, segundo o desafio de Fernanda. Enquanto isso, João Benévolo vai ao escritório de Leitão Leiria, tentando ser recontratado. Fernanda o recebe e diz que vai falar com o patrão. Leiria lhe dá uma carta de recomendação, encaminhando-o a um amigo, dono de uma fábrica de mosaicos. Assim que Benévolo se despede, Leiria telefona para a fábrica e pede desculpas por ter envolvido o amigo naquele problema, mas foi forçado, pede-lhe para não se preocupar com o desempregado.

Virgínia está em sua janela, esperando por um novo galanteador: Alcides, postado do outro lado da calçada, e vem cortejá-la todos os dias. A cada ruído, no interior da casa ou barulho do bonde, sobressalta-se, deliciada por tudo estar ocorrendo como no tempo de moça.

Terça-feira, festa no palacete do Cel.Pedrosa. A orquestra toca no hall. Há doces e salgados sobre as mesas. O proprietário está felicíssimo, vem-lhe à lembrança a imagem do amigo de Jacarecanga, o Madruga, com quem fazia apostas e resmungava. Fica imaginando a cara do amigo, se pudesse ver todo seu sucesso. Toda vez que algo extraordinário lhe acontece sempre pensa na cara do amigo. Salu dança agarrado com Chinita, que sonha que a festa é na casa de Joan Crawford. O namorado lhe diz frases cheias de insinuações e a convida para ir até o parque. Num recanto oculto, junto à piscina, Salu derruba Chinita, entregue definitivamente às suas carícias.

Chove forte. Salu desperta, o corpo dói, a cabeça está zonza. Logo recorda da noite com Chinita, da pergunta da moça sobre seu interesse por ela. Vai ao telefone e em surdina, Chinita marca um novo encontro. Está chocada, aturdida com o acontecimento da noite anterior.Teme ficar grávida e ao mesmo tempo, sente vontade de ficar para sempre com Salustiano.

Leiria fica enciumado com a festa dada pelo novo rico, Cel. Pedrosa. Pensa numa forma de derrotá-lo sem levantar a menor suspeita. Talvez, uma carta anônima resolva o problema. Recorda-se que o Monsenhor Gross lhe pediu emprego para uma moça, decide despedir Fernanda.

Pedrosa está com a amante, Nanette Thibault que lhe pede um automóvel de presente, enquanto, sete andares acima, a filha, Chinita faz amor com Salu. Virgínia, desgostosa com a vida de casada, espera na janela por Alcides, mas ele não aparece. D. Maria Luísa recebe uma carta anônima, dizendo que o marido, Cel.Pedrosa, tem uma amante no Edifício Colombo. Ela analisa toda sua vida até ali; o filho vive entre prostitutas e bebidas, a filha parece ter perdido o respeito, solta pela cidade e, agora, o marido tem uma amante.

Quarta-feira, 6 horas da manhã, Clarimundo lê Einstein, enquanto Maximiliano, o tuberculoso, morre sob os olhos da mulher, filhos e vizinhos. Chinita só pensa em Salu e João Benévolo vaga pela rua, sentindo fome e frio; o dinheiro acabou, não há alimento em casa. Cai de fraqueza com o estômago doendo. O carro da assistência o apanha e o coloca numa ambulância.

Laurentina chorou o dia inteiro, esperando pelo marido. Os vizinhos dão o que comer a ela e ao filho. Ponciano já está ali sentado, olhando-a e dizendo que nada aconteceu a Benévolo, ele é que não presta mesmo. Laurentina chora. Recorda-lhe que a avisou. Por que não vem morar com ele?

Laurentina sabia, há muito, que o convite ia ser feito, mas o que responder, não tem coragem nem para se revoltar.O homem continua insistindo, mostra-lhe a carteira cheia de dinheiro, afirmando que tudo será dela. Pode esperar mais um pouco, afinal, diz Ponciano, já esperou por ela há dez anos.

Virgínia já está na janela, mas sabe que Alcides não vai passar. Apanha o jornal e tem um sobressalto, o retrato do rapaz está ali, estampado no jornal, morto por um marido enciumado.

Noel, finalmente, consegue fazer Fernanda entender que está apaixonado por ela. Não precisou dizer tudo claramente, mas a moça, como sempre, adivinhou o sentimento do amigo. D.Dodó comemora feliz seu aniversário e a filha Vera, indiferente não consegue tirar Chinita do pensamento. Telefona para a casa da amiga, D.Maria Luísa lhe diz que a filha saiu há 2 horas atrás para ir visitá-la. Vera desliga e D. Maria fica pensando que o marido está com a amante e a filha?

Clarimundo chega em casa, depois de dar aulas, e resolve aproveitar o silêncio da noite para começar a escrever o livro que pretende sobre o homem da estrela de Sírio. Na introdução coloca que, após observar de sua janela a vizinhança, resolveu escrever sobre um observador, colocado num ângulo especial que, certamente, terá uma visão diferente do mundo; termina, dizendo: 'Pois eu te vou contar, leitor amigo, o que meu observador de Sírio viu na Terra'. De repente lembra-se da chaleira fervendo, levanta-se para fazer o café.

Fontes:
http://www.algosobre.com.br
http://minerva.ufpel.edu.br (imagem)

Roberto Bittencourt Martins (Ibiamoré)

Ibiamoré, o trem fantasma, composta por um conjunto que envolve mitos e a história rio-grandense. O cenário é Ibiamoré, cidade que se localiza na fronteira do Brasil com o Uruguai e a Argentina. De lá o trem parte, sem respeitar fronteiras, passando por onze estações. Durante o percurso do trem fantasma, entram em cena muitas personagens, e vários narradores: heróis, índios, jesuítas, espanhóis, portugueses, imigrantes, mulatos, mestiços, estrangeiros. O conjunto de mitos termina com a da criação do Universo e do homem sob a ótica sulista. Já a História lembra os episódios que iniciam com a guerra jesuítica até a construção das primeiras estradas de ferro no final do século XIX.

'Entrou num trem cheio de passageiros, mas ninguém parecia vê-lo; procurava um lugar vago e não encontrava nenhum. Descobriu, já aflito, apenas uma cadeira no fundo. Sentou-se e, só então, pôde olhar com mais vagar para seus companheiros de viagem. Surpreendeu-se que estivessem todos de olhos fechados, adormecidos, mesmo com o trem parado. Somente quando o trem começou a andar é que lhe veio a idéia horrível de que todos estavam mortos. Quis gritar para que parassem o trem, queria sair - mas não conseguiu mover os lábios para falar'.

Este sonho dá o tom no romance Ibiamoré de Roberto Bittencourt Martins. No centro da trama encontramos a lenda do Trem Fantasma, localizada na fronteira sul do Brasil, entre o Rio Grande e as repúblicas platinas. Cada um dos capítulos corresponde a uma das onze estações imaginárias da Viação Férrea. Por trás da lenda está a irrupção da máquina no espaço virgem do campo.

O ideal pastoral foi utilizado para definir o significado do Novo Mundo desde o seu descobrimento. Os primeiros cronistas lançaram mão das imagens de Virgílio para descrever uma natureza selvagem e inóspita. Com o advento da industrialização, o idílio decai: o apito estrídulo da locomotiva irrompe na paz dos campos e os cantos dos pássaros, o mugido das vacas e o relinchar dos cavalos cedem lugar ao silvo do trem, emblema do progresso.

A interrupção da máquina no jardim aponta, no caso do Brasil, para o fim do Império [1870-1888], época em que as primeiras locomotivas corriam pelos trilhos recém-construídos. Em Ibiamoré encontramos, porém, um tempo histórico anterior: aparecem as figuras fundadoras do Rio Grande do Sul - Afonso Inácio, o capitão-menino, representante do português açoriano, o índio Teireté protestando contra a violência das guerras guaraníticas [1753-1756] e Frei Esteban Cruz, o padre jesuíta espanhol, difusor das letras e pai espiritual da lenda do Trem. Ao longo das narrações dos vários cronistas, Frei Esteban acaba por incorporar-se à lenda como padre sacrílego expiando suas culpas no fatídico trem.

O romance foi publicado em 1981. O livro, no seu duplo significado, mostra o progresso, representado pela idéia do trem e, ao mesmo tempo, denuncia a ruptura dos valores cultivados pelo gaúcho.

Fontes:
http://www.algosobre.com.br
http://www.dicadeteatro.com.br (imagem)

Lindolf Bell (O Código das Águas)

É a partir de Lindolf Bell que a poesia catarinense recupera o teor de originalidade, legado por Cruz e Souza, e passa a sugerir algo novo. Não dita normas para o fazer literário, não restringe o campo de ação do poeta. Mas amplia, posto que, opondo-se a algumas teorias estéticas das vanguardas de 50 e 60, pressupõe a permanência do vínculo entre o poeta e o seu poema. Exigindo do poeta a divulgação direta com o público, tornando-se um intermediário vivo entre o poema e o seu consumidor, a poesia realimenta-se de suas atribuições originais de laudos e desempenho social.

Sendo essa sua orientação básica, a Catequese Poética, liderada por Lindolf Bell, possibilita a agregação de poetas das mais variadas tendências, num convívio sem conflitos estéticos.

Daí o uso de ingredientes que favorecem os efeitos acústicos e o ritmo, como a repetição e a reiteração. O convite à participação do público não se dá somente ao nível fônico e visual, mas igualmente, na sugestão contida na matéria tematizada.

Em Código das Águas afirma-se a trajetória desempenhada pelo poeta enquanto peregrino em busca da poesia ideal. A palavra, aí, é o instrumento capaz de apreender a essência do universo criado. O código das águas reelabora o ideário estético de Lindolf Bell, que tem a ver unicamente com o fluir irredutível, ininterrupto e inclassificável de sua poesia - águas - insubmissa a códigos, exceto o das águas, cuja, codificação nega a si mesmo, exigindo-se a mutabilidade, o dinamismo constante.

ANÁLISE DA OBRA:

O Código das Águas é uma poesia que celebra o refazer-se, a mudança, a transição e o caráter transitório de tudo pela 'palavra/ quem em breve/ será a palavra dentro em breve./ A palavra/ que se reveste de linho real/ na linha real da vida:/ enfermidade, / efemeridade'. O título da obra fala de uma impossibilidade, uma contradição: suas águas são aquelas do rio heraclitiano, puro movimento, irrepetíveis.

Portanto, impossíveis de serem codificadas, pois um código é sempre forma, constância, conjunto de regras e padrões estáveis.

Lembremos que, em seus primeiros livros, Bell, como retrata o prof. do curso Geração, apresentava-se como poeta que denunciava a perda de laços de fraternidade e de densidade humanística em nossa sociedade.

Uma característica deste livro em contraste com os dois anteriores, é a sua descontinuidade aparente. As Annamarias e As Vivências Elementares são quase um poema só, divido em partes, algo como variações sobre o mesmo tema. Aqui, não: temos partes bem distintas, coexistindo poemas, enfermidade, efemeridade, com outros lineares e despojados, parecendo até uma abdicação do uso de determinados recursos poéticos. E outros, ainda, que se caracterizam pela brevidade e concisão, como na série Minifúndios.

Ou seja, onde seus dois livros anteriores têm uma estrutura fechada, quase com começo, meio e fim, desta vez temos uma obra que, mesmo conservando sua unidade, também apresenta algo de incluso e aberto - justamente por registrar uma passagem, um processo de transformação.

O Código das Águas é poesia em movimento e este movimento é ultrapassar-se, ir além. E, principalmente, ir mais fundo.

Alguns textos remetem igualmente ao não mais existente e ao imemorial, como o Inseto de Lagoa Santa, ou o índio do veemente Poema para o Índio Xokleng, que 'emudeceu entre castanhas, bagas e conchas/ de seus colares de festa'.

A linguagem para falar do imemorial e do anterior à memória também é outra: requer uma palavra anterior à palavra. Este é um tema constante, que atravessa o livro:
'Não é a palavra fácil/ que procuro./ .../ Procuro a palavra fóssil./ A palavra antes da palavra./ .../ Esta que me antecede / e se antecede na aurora/ e na origem do homem'. Por isso, 'procuro desenhos/ dentro da palavra./.../Sinais, vendavais,silêncios./ Na palavra enigmam restos, rastros de animais,/ minerais da insensatez'. Não mais 'mero esboço de um desenho inacabado de homem,/ inadequado, por certo, na forma de chegar e falar / das coisas do mundo e de mim'.

Busca-se, portanto, a escrita primordial, rastro e inscrição e ao mesmo tempo, movimento: 'Entendi a escrita minha
ao entender a escrita da andorinha',
pois 'tudo que penso
pouco mais dura que a escrita,
a da raiz, a da marca do pé na terra,
que mino, rumino,
e que me habita'.

Há passagens que são verdadeiras profissões de fé ou declarações de princípios poéticos, que, na sua visão da escrita, como se despojar e deixar de ser, aproximam-se do que Elliot diz nos Quatro Quartetos:
'Para possuíres o que não possuís
Deves seguir pelo caminho da despossessão.
Para chegares ao que não és
Deves seguir pelo caminho onde não estás.
E o que não sabes é a única coisa que sabes
E o que possuis é o que não possuis
E onde estás é onde não estás'.

A trajetória de Bell é um caminho na direção de um território insondável,
' a face inversa da luz
onde me extravio
e não cessarei jamais.
Pois menor que meu sonho
não posso ser'.

Isto implica viver o 'Desterro.
Desterra.
ali se resume a vida.
e nada é em vão.
Ainda que pareça o contrário'.

Percebe-se, lendo O Código das Águas, como Lindolf Bell sabe que o caminho da poesia é um caminho da perda, percorrendo o avesso e a negação da realidade instituída e aceita. Tudo isso faz que acompanhemos com enorme interesse o prosseguimento de sua obra poética, os ganhos obtidos percorrendo o caminho da perda e da despossessão.

Textos selecionados:

XIX

Onde a morte se fere de si mesma
Onde a morte morre
Onde o corpo se inscreve
Nas linhas sinuosas da alegria

Ali meu coração bate
Sem falas guaranis
Nem pampas latifúndios

Meu coração
Não passa de um minifúndio
E minha linguagem
Chama-se viver

DESTERRO
I

Aqui estou
Em pleno século XX
Desterrado por Platão.
Dentro do círculo da vida
Nõa mais aberto
Que um não.

Que faço neste tempo
Entre terra e céu de ironia?
Em coração caracol
E tempo de uvas verdes?

Faço um poema.
Me desfaço.
Me desfaço como um laço
De uma caixa de presentes vazia.

Enquanto me desfaço no poema
Afino o sentimento do mundo:
Desterro se faz de nenhum lugar.
E só se faz de saudade.

POEMA MATEMÁTICO

Me somo
E fico um
Me multiplico
E permaneço um.

Me divido.
E continuo um.

Me diminuo.
E resto um.

Me escrevo
E sou nenhum.

ASA DA PRIMEIRA IDADE

Longe de mim
Como a mais distante estrela.
Próxima de mim
Em meus olhos [e coração]
Que me permitem vê-la.

Pouco sobra da vaidade,
Da divisão dos tempos,
Da distribuição de afetos.

Ensina-me sobra, sombra, terra,
Aonde me perdi.
Ensina-me do orvalho
Que umedece o sonho de perfeição
Que não esqueci.

A minha aldeia chama-se:
Ninho de liberdade.
Mas onde terá ficado a asa
Da primeira idade?

Fontes:
http://www.algosobre.com.br
http://i.s8.com.br (imagem)

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Luiz Fernando Emediato (Os Herdeiros do Nada)

Estão aí pelas ruas,
tristes e solitários poetas
da sarjeta

Em 1977, um ano antes de abandonar Minas Gerais em troca da cidadania paulistana, conheci na avenida Afonso Pena, em Belo Horizonte, um músico de rua que se chamava Casquinha. O povo o tinha como mendigo, mas ele fazia questão de esclarecer que não pedia e jamais pediria esmolas: tocava sua flauta. Quem quisesse pagar pelo espetáculo era só deixar cair algumas moedas no seu velho e furado chapéu. Gordo, meio cego, diabético e neurótico, Casquinha só desaparecia do seu conhecido ponto na avenida quando a Saúde Pública o recolhia à força.

Tocava bem, e não eram poucos os que ficavam ali admirando-o, e quando parava explodiam aplausos. Um diretor de teatro deu-lhe emprego: de terça a domingo tocava flauta num canto do palco, enquanto se desenrolava, ao longo de duas horas, uma tragédia doméstica envolvendo duas mulheres que se odiavam.

Atração especial, Casquinha tornou-se famoso na imprensa e acabou se apresentando nos programas do Chacrinha e do Sílvio Santos, como uma curiosidade. Quis então ser artista, mas riram dele e o expulsaram do estúdio.

Pobre Casquinha. Em 1979, já vivendo em São Paulo, encontrei-o na praça Patriarca, cego de um olho, cada vez mais gordo, doente.

Não me reconheceu. Voz fraca, quase surdo, já não tocava tão bem. Recusava-se ainda a ser chamado de mendigo, mas era o que era. Poucos paravam, agora, para admirar-lhe a arte, que ele procurava sofisticar tocando também um tambor, com os pés, enquanto agitava chocalhos amarrados nos cotovelos. No alto da cabeça, prendera uma latinha com grãos de milho. E, enquanto soprava a flauta, fumava. Pobre coitado. Pobre Casquinha. Decadente, enquanto músico, procurava chamar a atenção fazendo malabarismos. Assim se apresentou num programa de calouros. Foi vaiado. Estava no fim.

Frágil e ingênuo Casquinha. Eu o vi uma vez mais, nem me lembro quando. Depois sumiu. Pode ter morrido por aí, numa noite gelada, talvez tenha sido enterrado como indigente – quem sabe? Quando vou a Belo Horizonte, ando pela avenida Afonso Pena, e quando ouço som de flauta corro para ver se o encontro. Inútil: outros Casquinhas, menos criativos, mas da mesma forma desgraçados, deserdados, espalham-se por ali, recolhendo migalhas.

Um dia, passeando pelo centro da cidade, vi diante do Mappin uma criancinha gorda, cega e suja. Sentava-se no chão, de pernas abertas, olhinhos fechados, e movia-se de um lado para o outro ao som da música que extraía, serenamente – mas com que tristeza, meu Deus! – de um pequeno acordeon. Como se parecia com o velho Casquinha! Devia ter uns onze ou doze anos, mas o rosto sofrido aparentava mais. Enquanto tocava, entretanto, parecia fora do mundo, em êxtase.

E ninguém parava para ouvi-lo.

Por todos os lados havia mendigos, alguns também vendendo dignamente sua música barata, mas a maioria só encostada por ali, exibindo sua miséria, seus lamentos, sua ferida, sua inevitável solidão. No meio deles, alguns loucos e alguns – poucos – mendigos falsos, tentando arrancar dinheiro de cidadãos ingênuos.

A repórter Alba Carvalho entrevistou um desses mendigos, ali mesmo no centro. – e a história, terrível, cortava o coração. Era – tinha sido – um jornalista. Um jornalista mineiro, culto, 45 anos. Afirmava ter trabalhado nos Diários Associados, mas estava, naquele instante, relegado à mais subumana condição: a de pedinte.

Voz firme, olhar duro e acusador, ele enfrentou a câmara, suportando dignamente a condição de entrevistado, ele que um dia fora entrevistador.

Eram ainda os tempos da Velha República. Chegou a Nova, com tanta esperança, e eu me perguntei: onde andará Casquinha? Estará morto, toca flauta em Belo Horizonte, em Itaquera, Fortaleza, Manaus? Aquele colega caído em desgraça, terá recuperado sua dignidade? O menino cego do Mappin, que futuro o aguarda? Eu pergunto e ninguém responde. Nas praças e ruas e campos deste país tão grande e tão rico, homens frágeis e outros, que foram fortes, dividem com as crianças abandonadas o mesmo e triste destino dos deserdados.

Pois tudo continua igual.
24-04-2008
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Sobre o autor
Luiz Fernando Emediato
Jornalista e escritor vencedor de vários prêmios literários, e dos prêmios Esso de Jornalismo e Rei de Espanha de Jornalismo Internacional. Criador do Caderno 2 de O Estado de S. Paulo e responsável pela introdução do "âncora" na televisão brasileira. Autor de "Trevas no Paraíso", "Geração Abandonada", entre outros livros. É editor da Geração Editorial.
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Fonte
Crônica retirada do livro A grande ilusão públicado em 1992
http://www.geracaobooks.com.br/colunistas/colunista.php?id=448

3a. Edição do Prêmio VivaLeitura

As inscrições para a 3a edição do Prêmio VivaLeitura terminam no próximo dia 8 de julho. Podem participar do concurso projetos de escolas e bibliotecas públicas, privadas e comunitárias, ONGs, pessoas físicas, universidades, faculdades e instituições sociais. O vencedor de cada categoria receberá um prêmio de R$ 30 mil. Uma menção honrosa será atribuída a projetos de empresas públicas e privadas. O Prêmio VivaLeitura integra o Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL) e tem o objetivo de estimular, fomentar e reconhecer boas práticas de leitura. Iniciativa dos Ministérios da Cultura (MinC) e da Educação (MEC), em conjunto com a Organização dos Estados Ibero-americanos para Educação, a Ciência e a Cultura (OEI), o prêmio é patrocinado pela Fundação Santillana. As inscrições são gratuitas.

fonte:
Divulgação por Douglas Lara

Autores Atuais Reescrevem Machado de Assis

No centenário da morte de Machado de Assis, com organização do premiado contista, doutor em Letras pela Unicamp e professor universitário Rinaldo de Fernandes, a Geração Editorial lança a antologia Capitu mandou flores: contos para Machado de Assis nos cem anos de sua morte, que, além de incluir os dez melhores contos de Machado, traz um conjunto de narrativas recriando esses dez melhores contos e passagens/situações do romance Dom Casmurro. São autores renomados, emergentes e jovens promessas da literatura brasileira atual que reescrevem Machado de Assis na antologia: Lygia Fagundes Telles, Moacyr Scliar, Hélio Pólvora, Cecília Prada, Nelson de Oliveira, André Sant’Anna, Fernando Bonassi, Glauco Mattoso, Ivana Arruda Leite, Andréa del Fuego, Marcelo Coelho, Deonísio da Silva, Daniel Piza, Godofredo de Oliveira Neto, Bernardo Ajzenberg, João Anzanello Carrascoza, Antonio Carlos Secchin, Leila Guenther, Marilia Arnaud, Rinaldo de Fernandes, Raimundo Carrero, Mário Chamie, Aleilton Fonseca, Tércia Montenegro, Maria Valéria Rezende, Maria Alzira Brum Lemos, W. J. Solha, Amador Ribeiro Neto, Carlos Gildemar Pontes, Nilto Maciel, Aldo Lopes de Araújo, Suênio Campos de Lucena, Carlos Ribeiro, Ronaldo Cagiano e Sérgio Fantini.

Diz Rinaldo de Fernandes, no texto de apresentação da antologia: “O conto ‘Missa do Galo’, de Machado de Assis, é aqui recriado por quatro escritores. Osman Lins, na década de 70, já havia preparado um livro propondo o mesmo a cinco autores: Antonio Callado, Autran Dourado, Julieta de Godoy Ladeira, Lygia Fagundes Telles e Nélida Pinõn. O próprio Osman Lins, com uma narrativa inédita, integrou o livro, intitulado Missa do Galo – variações sobre o mesmo tema. Retomei o projeto do autor de Avalovara e o ampliei. Agora não apenas ‘Missa do Galo’ é refeito, mas ainda nove outros contos de Machado. O conjunto dos dez contos aqui reescritos: ‘Missa do Galo’, ‘A Cartomante’, ‘O Espelho’, ‘Noite de Almirante’, ‘A causa secreta’, ‘Pai contra mãe’, ‘O Alienista’, ‘Uns braços’, ‘O Enfermeiro’ e ‘Teoria do medalhão’. Foram, na ordem em que estão, escolhidos como os melhores do Bruxo por dezessete escritores brasileiros, em enquete que realizei”. Diz ainda Rinaldo: “Para ampliar ainda mais o projeto em que me baseei, aqui são reescritos também trechos/situações do Dom Casmurro (um resumo do romance foi feito pela professora de literatura brasileira Sônia Maria van Dijck Lima). Há ainda alguns ensaios, fechando o livro, que investigam aspectos importantes da ficção, da poesia e do teatro machadianos.” Ensaios imperdíveis, de autores importantes, como Silviano Santiago, Luiz Costa Lima, Pedro Lyra, Regina Zilberman e André Luís Gomes.

Enquanto, no presente, para prestar homenagem aos cem anos de morte do autor, alguns lançamentos acumulam-se buscando cobrir as tantas facetas da produção de Machado, este Capitu mandou flores consegue abarcar várias delas de uma só vez: traz narrativas insuperáveis do célebre escritor, as recriações dessas narrativas e ainda ensaios bastante esclarecedores de aspectos fundamentais da obra do autor de Brás Cubas.

Com certeza, este livro ficará entre as obras mais importantes da literatura brasileira contemporânea. Um exercício de reescritura de Machado de Assis até aqui nunca proposto em nossas letras, abrangendo tantos autores e textos de qualidade. Pode-se afirmar sem medo: um livro ímpar, para ser lido por gerações. Um livro imperdível!
www.geracaoeditorial.com.br

RUA MAJOR QUEDINHO, 111 – 20º. ANDAR - 01050-030 – CENTRO – SÃO PAULO – SP - BRASIL
55 11 3256-4444 – FAX 3257-6373 – EMAIL GERACAO@TERRA.COM.BR

Fonte:
Colaboração do escritor Nilto Maciel

Regine Limaverde (Teu Cheiro - O Tamanho do Amor - Palavra - Ao Mar Tu Pertencias)

Teu Cheiro

Teu cheiro - meu mundo
Tua boca - o universo.
Teu beijo - minha vida.
Teu amor - o meu verso

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O Tamanho do Amor

O amor cabe
numa mão.
O amor cabe
num grito.
O amor cabe
numa palavra.
O amor é o céu
e cabe no infinito.
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Palavra

A palavra - faca de dois gumes.
Desassossega, alivia.
Pode ser faca, matar.
Pode ser remédio, curar.

A palavra sai e é punhal e alívio.

Na busca da palavra me perco,
me encontro, me enervo, me embalo.

Na busca da palavra canto-música
Te invoco- suspiro.

Pela palavra choro,
Pela palavra rio.
És a palavra e ao
invocar tua imagem,
sorrio. Sou rio.
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Ao mar tu pertencias

Ao poeta Fernando Mendes Vianna (que partiu há pouco) 30/10/2006

Ao mar tu pertencias,
estranho marinheiro
da poesia.
Embarcavas no seco e molhado,
eras um mágico encantado,
o sol e a madrugada,
um final de estrada.
Eras a poesia bem dita,
a palavra bendita.

Partiste e deixaste
o vazio.
Eras da poesia, o fio.
Hoje, a noite apagou o dia
e, embora há muito
não te encontrasse
te sabia ao alcance da mão.
Fiquei mais pobre no meu coração.
Se me visses, dirias
que não sou eu.

Voltaste para as plagas de
onde vieste..
Agora teus versos serão cantados
na terra dos encantados.
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Sobre a autora
Poeta e contista, mestre em tecnologia de alimentos e doutora em microbiologia do pescado. Autora de 14 livros, sendo 13 de literatura e um de microbiologia. Detentora do Prêmio do Estado do Ceará (Poesias) em 1983, Prêmio Osmundo Pontes (poesias) em 1997, Prêmio Gente de Bem Fica para Sempre (poesias) em 2002 e Medalha Labomar 40 anos (mérito científico).
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Fontes:
Academia de Letras e Artes do Nordeste (ALANE). Revista Urupema. Ano II. v.2. n.1 Fortaleza, CE. p.39-40.
Soares Feitosa - Jornal de Poesia. Fortaleza, CE. Disponível em http://www.secrel.com.br/jpoesia/poesia.html

Ariano Suassuna (O Santo e a Porca)

Eudoro Vicente manda uma carta a Eurico dizendo que lhe pedirá o seu bem mais precioso. Na casa do comerciante, moram a filha Margarida, a irmã de Eurico, Benona, a empregada Caroba e, já há algum tempo, Dodó, filho do rico fazendeiro Eudoro. Dodó vive disfarçado, finge-se de torto, deformado e sovina. Assim conquistou Eurico, que lhe atribuiu a função de de guardião da filha, quem Dodó namora às escondidas.

O desenrolar dos fatos se desencadeira com a carta enviada por Pinhão, empregado de Eudoro e noive de Caroba, empregada de Euricão. Eudoro informa que fará uma visita para pedir esse bem tão precioso a Eurico, que fica apreensivo, pois pensa que lhe pedirá dinheiro emprestado. Eurico insiste em de dizer pobre, repetindo as frases: "Ai a crise, ai a carestia".

Na sala da casa de Eurico, onde as cenas se desenrolam, há uma estátua de Santo Antônio, de quem Eurico é devoto, e uma antiga porca de madeira, a quem ele dedica especial atenção e que logo o público saberá que esconde maços de dinheiro.

Caroba, muito esperta, percebe que Eudoro pedirá margarida em casamento, é assim que ela entende o bem mais precioso de Eurico que o fazendeiro, pai de Dodó, quer saber. Então ela arma um circo para alcançar alguns objetivos: ganhar algum dinheiro, pois quer casar com Pinhão, casar Dodó e Margarida além de Eudoro e Benona, que já tinham sido noivos há muitos anos. Eudoro, viúvo, querias Margarida, mocinha; Benona, solteirona, queria Eudoro, fazendeiro; Margarida queria Dodó, pois o amava; Caroba e Pinhão se queriam; Euricão queria a porca, ou será que queria a proteção de Santo Antônio para a porca?

Caroba negocia uma comissão com Eurico para ajudá-lo a tirar vinte contos de Eudoro Vicente, antes que este peça dinheiro a Eurico. Acertam-se. Aí Caroba convence Benona que Eudoro virá pedi-la em casamento e se dispõe a ajudá-la. São então tramas de Caroba: fazer Eurico pedir vinte contos a Eudoro para o casamento (na realidade, para um jantar); convencer Benona de que Eudoro viria pedi-la em casamento; fazer Eudoro acreditar que pede Margarida; fazer Eurico crer que Eudoro pede Benona; armar um encontro entre Eudoro e Margarida na penumbra; ficar no lugar de Margarida, com o vestido dela.

Conseqüências das armações de Caroba: Dodó sente ciúme de Margarida, pois pensa que ela irá encontrar-se com Eudoro; Pinhão sente ciúme de Caroba quando sabe que ela irá em lugar de Margarida; Euricão desconfia que querem roubar sua porca recheada, pois ouve falarem em devorar porca e pensa ser a sua, quando é a do jantar que se encomendou para receber Eudoro; Pinhão desconfia de Eurico e o observa, porque este age estranhamente.

Na hora do encontro entre Margarida e Eudoro, Caroba tranca Margarida no quarto, manda Benona permanecer também no seu e vai, vestida de Margarida, receber Eudoro. Dodó vê Caroba e pensa ver Margarida, pois está com o vestido dela. Para não ter que se explicar, Caroba o empurra e tranca no quarto com Margarida. Caroba então veste roupa de Benona e esta a de Margarida. Caroba então recebe Eudoro vestida de Benona. Ele é enganado: pensa estar conversando com a antiga noiva, que se insinua a ele, na penumbra não percebe que é Caroba. Ela o leva ao quarto de Benona e o tranca com a ex-noiva, por quem agora já está novamente interessado.

Pinhão ao sair do esconderijo onde estivera observando a cena, vê Caroba e pensa ser Benona e tenta seduzí-la. Ela reage e bate em Pinhão e o manda esperar por Caroba, que tira as roupas de Benona e diz que acompanhou toda a cena, bate outra vez em Pinhão, mas na confusão começam a se beijar. Aí destrancam as portas dos quartos de Margarida e Dodó, Benona e Eudoro, e entram em outro.

Dodó e Margarida saem do quarto e pensam ter sido surpreendidos por Eurico, que entra em casa dizendo estar perdido.Na verdade Eurico havia saído para enterrar sua porca recheada dentro do cemitério. A conversa entre Eurico e Dodó é engraçada, pois ambos se enganam: Dodó fala de Margarida, enquanto Eurico fala da porca que desapareceu. Eurico pensa que o rapaz lhe roubou a porca, já que este o traiu. No desespero, Eurico finalmente revela que a porca estava cheia de dinheiro guardado há tantos anos.

Com os gritos da discussão, Pinhão e Caroba saem do quarto. Depois Eudoro e Benona do seu. A cena é divertida: são três casais que de repente estão juntos e felizes ante Euricão lamentando a perda da porca. Graças a Caroba os casais se entendem sem Euricão nem Eudoro perceberem o engano de que foram vitimas. Margarida desconfiou de Pinhão e afirmou que ele pegara a porca. Eurico lhe salta no pescoço e Pinhão acaba contando, mas exige vinte contos para dizer onde escondeu a porca, os vinte contos que Eurico conseguiu emprestados de Eudoro com a ajuda de Caroba. Com o vale do dinheiro na mão, mostra a porca que estava na casa mesmo.

Então, Eudoro faz Eurico perceber que aquele dinheiro era velho e havia perdido o valor. Eurico se desespera. Tentam dissuadi-lo da importância do dinheiro, mas ele manda todos embora e fica só, com a porca e o Santo, tentando entender o que aconteceu, qual o sentido de tudo que houvera.

Características da Obra de Sussuna:

Quando começamos a estudar a produção dos autos de Ariano Suassuna, não podemos dissociar esta análise das produções do escritor Gil Vicente. Ambos possuem semelhanças concretas, principalmente, com relação à:

1. construção das personagens - cada personagem representa uma classe social - que é criticada - e, por vezes, possui um nome que o identifica a função que exerce na comunidade onde vive, ou apelidos cômicos, como acontece com João Grilo, Chico, a mulher do padeiro, todos do Auto da Compadecida; Gil Vicente identifica seus personagens como mercadores, padres, pobres, etc., sempre numa alusão às classes da hierarquização social da Era Humanista ( marca o fim da Idade Média );

2. religiosidade - ambos os autores reforçam a manipulação que o clero exerce sobre o povo mais simples, compactuando com os interesses econômicos representados por coronéis, bispos (Ariano Suassuna) e por nobres, ricos (Gil Vicente); as figuras de diabos, anjos, Jesus e Nossa Senhora estarão presentes nas obras dos escritores, com a devida evolução de linguagem no caso dos textos de Suassuna - dentre essas a figura que rouba a cena é a do diabo pela sua força expressiva e sua posição de juiz das almas já que enumera as falcatruas dos outros personagens (efetuando, inclusive, uma rememoração da história que está sendo contada).

3. crítica social - os períodos históricos em que os autos são escritos apresentam características semelhantes: grande desnivelamento social, fome, desmandos de poderosos e, em se tratando das obras de Suassuna, há o agravante dos fatores naturais que tornam a vida do sertanejo muito difícil.

4. ironia - é a grande marca que identifica os autores e é o grande recurso utilizado para elaborar a crítica. Em Gil Vicente, há obras cuja ironia crítica serviu de modelo para as gerações seguintes, como em Auto da Lusitânia (e os personagens "Todo o mundo" e "Ninguém"). E em Ariano Suassuna, o mesmo será comprovado no reconhecido Auto da compadecida, mas também em O santo e a porca e em Farsa da boa preguiça.

Comparação com Plauto

Na apresentação de sua peça O Santo e a Porca (1957), Ariano Suassuna a sub-intitula de uma "Imitação Nordestina de Plauto", referindo-se à Aululária, do autor latino.

A palavra imitação, usada por Suassuna, nos remete ao conceito aristotélico de mímesis, cujo significado não representa apenas uma repetição à semelhança de algo, uma cópia, mas a representação de uma realidade, mais precisamente de uma revelação da essência dessa realidade.

Essa essência está representada, nessas duas obras, pela avareza humana.

Neste trabalho, pretendemos uma abordagem desse tema, sob o aspecto de como o objeto depositário da avareza foi tratado pelos dois autores: a panela, em Aululária; a porca, na comédia de Suassuna.

Optamos pelo enfoque simbólico dessa proposta, visto que a obra de Suassuna, que se declara uma imitação da de Plauto, mantém uma distância de mais de dois milênios da original e está contextualizada, tanto geográfica como culturalmente, numa distância não menor do que a temporal.

Nesse paralelo, destacamos a trajetória dos dois objetos que constituem o eixo norteador de toda a ação das duas peças.

Na comédia do autor latino (Plauto Titus Maccus - 250?-184? a.C.), de influência grega e estilo tipicamente romano, o velho avarento Euclião descobre na lareira de sua casa uma panela cheia de moedas de ouro deixada por seu avô. O casamento de sua filha com um velho rico é o motivo que origina toda a ação da peça. Os recursos utilizados por Plauto dão à comédia um ritmo ágil e hilariante, cheio de ambigüidades e desencontros. "O diálogo, como em todas as suas peças, lembra a fala rápida da comédia musical americana (e na verdade era representada com acompanhamento musical)" (GASSNER, 1974, p.112).

Ariano Suassuna retoma o tema e situa-o no Nordeste. Seu protagonista chama-se Euricão Árabe.

Na contracapa do livro de Suassuna (1984), Manuel Bandeira comenta as duas obras:

Plauto é o mais linearmente clássico, na sua pintura de um caráter de avarento; Suassuna é o mais complicado, não só pela maior abundância de incidentes na efabulação, como pela evidente intenção de moralidade filosófica; (...) e os elementos nordestinos da porca e seu protetor, o Santo (Santo Antônio) são os grandes achados de Suassuna, e o que confere o timbre de originalidade na volta ao velho tema.

Na seqüência das duas narrativas, tanto a panela quanto a porca acompanham todo o ciclo de transformação interior dos respectivos protagonistas, o que nos induz a uma interpretação simbólica desse trajeto.

Tomamos como símbolos, na Aululária ou O Vaso de Ouro, o Deus Lar, a lareira, o templo da Fidelidade, o bosque de Silvano e o objeto representativo da avareza, a panela (vaso). Em O Santo e a Porca, temos como correspondentes o Santo Antônio, a sala, o porão, o cemitério e o objeto da avareza, a porca de madeira.

Considerando os costumes e as crenças inerentes às duas épocas retratadas pelos autores, cabe primeiramente um destaque à parte mística e mítica das duas peças.

Para os romanos, os Lares eram deuses domésticos, protetores de cada família e de cada casa, cultuados no lararium, uma espécie de oratório. Tinham um templo, no Campo de Marte, onde eram feitos os sacrifícios e as oferendas. Interessante destacar que, quando se tratava de sacrifício público, a vítima ofertada era o porco (SPALDING,1982).

Euclião, até o momento da perda de sua panela com o tesouro, invoca o deus Hércules, identificado com o deus grego Héracles, símbolo da força combativa. Os romanos também o tinham como divindade protetora dos bens materiais e dos bons lucros nos negócios.

Após a perda de seu tesouro, Euclião invoca Júpiter, que simboliza tanto a expansão material como o enriquecimento vital.

Santo Antônio, por sua vez, é um santo de grande devoção popular nos países de origem latina. No Nordeste, esse santo é grandemente festejado durante as chamadas festas juninas. É tido, também, como "santo casamenteiro".

Euricão Árabe, o velho avarento de O Santo e a Porca, invoca o santo, questiona-o, do início ao fim de sua aventura. Embora, em alguns momentos, oscile entre o santo e a porca, mantém-se fiel ao santo de sua devoção. Esta oscilação poderia representar o movimento entre espiritualidade e materialidade inerentes ao ser humano.

Euclião, no entanto, é a imagem da personificação da avareza. Apela para o deus ou divindade que melhor atender à necessidade de determinado momento.

Nesse contexto de crenças e costumes, a avareza das duas personagens está representada em dois objetos: a panela (vaso) com o ouro de Euclião, escondida na lareira, e a "porca de madeira, velha e feia (...) com pacotes de dinheiro" (SUASSUNA, 1984, p.13), depositada na sala de Euricão sob a imagem de Santo Antônio.

A lareira expressa o simbolismo da vida em comum, do centro da casa. Seu calor e sua luz aproximam as pessoas, é o centro da vida. Assim como a sala, tem o significado de "um santuário, no qual se pede a proteção de Deus, celebra-se o seu culto e guardam-se as imagens sagradas" (CHEVALIER, GHEERBRANT, 1994, p.536).

A panela e a porca de madeira eram guardadas, respectivamente, nesses dois ambientes domésticos - lareira e sala -; portanto, equivalentes.

O vaso com as moedas de ouro (a panela de Euclião) representa "um reservatório de vida (...), o segredo da vida espiritual, o símbolo de uma força secreta". Se o vaso for "aberto em cima, indica uma receptividade às influências celestes" (CHEVALIER, GHEERBRANT, 1994, p.932).

Por sua vez, a moeda traz uma imagem ambivalente: a de valor e a de alteração da verdade.

A porca, juntamente com o porco, são considerados símbolos universais. Este representa a impureza, a voracidade, as tendências obscuras, enquanto que a porca, divinizada desde os egípcios, simboliza a abundância e o princípio feminino de reprodução, de criação da vida.

Todo o sentido da vida de Euclião e da de Euricão, simbolizado na panela guardada na lareira e na porca de madeira guardada na sala ao pé do santo, foi ameaçado por um acontecimento inesperado: o casamento das filhas. É o início do processo de vivência da perda:

Euricão: Ai minha porquinha adorada! (...) querem levar meu sangue, minha carne meu pão de cada dia, a segurança de minha velhice, a tranqüilidade de minhas noites, a depositária de meu amor! (SUASSUNA, 1984, p.33-34)

Diante da ameaça, Euclião esconde seu tesouro no templo da Fidelidade, e Euricão, numa grande cova ("socavão"), no porão de sua casa.

No plano simbólico, o templo e a cova sintetizam o lugar dos segredos, a busca ao desconhecido. Para os romanos, em particular, o templo era de grande importância. Lá, eles veneravam seus deuses, acorriam para pedir graças e proteção, em troca de sacrifícios e oferendas Era, pois, o reflexo do mundo divino e de seus mistérios.

Impulsionados pela ameaça da perda de seus bens, cultivados durante toda a vida, Euclião e Euricão buscam novo esconderijo para seus tesouros. O primeiro esconde-o no bosque de Silvano; o segundo, no cemitério da igreja.

Silvano, para os romanos, era um deus campestre de significação ambígua: protegia a agricultura e presidia às florestas (silva, "floresta") e, ao mesmo tempo, era uma "espécie de bicho-papão" que causava medo às crianças.

Além de simbolizar o inconsciente, a floresta carrega o significado do vínculo que as árvores mantêm entre a terra (raízes) e o céu (copa).

Euricão esconde sua porca no cemitério da igreja, num socavão entre o túmulo de sua mulher e o muro. O socavão evoca o simbolismo da abertura para o desconhecido, no sentido do imanente ao transcendente; o túmulo, associado à morte, é o lugar da metamorfose, do renascimento, ou das trevas; o muro, também de significado ambíguo, simboliza a separação e a defesa.

Podemos sintetizar essa etapa da trajetória dos avarentos como de conflito existencial diante da perda, em direção a uma nova visão de mundo e renovação de valores.

Euclião agradece aos deuses, despede-se alegremente de sua panela e a dá de presente aos noivos.

Euricão, diante da constatação da realidade (seu dinheiro não tinha mais nenhum valor), sente-se traído pela vida. Melancolicamente, reconhece: "Um golpe do acaso abriu meus olhos (...). Que quer dizer isso, Santo Antônio? Será que só você tem a resposta?" (SUASSUNA, 1984, p.82).

Na comparação simbólica das duas comédias, vimos que os elementos representativos da avareza (a panela e a porca) podem ser associados às etapas marcantes da narrativa.

O primeiro momento (a panela e a porca; o Deus Lar e Santo Antônio) podemos caracterizar como o do potencial latente e inerente à natureza humana: o material e o espiritual. O poder de acumulação e a visão desses valores são representados, em Euclião e Euricão, pela avareza.

O segundo momento, podemos caracterizar como o do conflito e do início da transformação desses valores (o templo da Fidelidade e o porão): a busca ao desconhecido, ou seja, um momento de interiorização e reflexão das personagens, sobre os valores até então tidos como sólidos e permanentes.

O terceiro momento, finalmente, seria o da constatação da perda. E, aqui, haveria duas possibilidades de escolha: a da evolução ou a da involução, simbolizada pela ambigüidade do "bosque de Silvano" e a do "cemitério da igreja".

A escolha de Euclião e de Euricão foi a da transformação no sentido evolutivo e de discernimento de que os bens materiais são um meio e não um fim. Diríamos que foi uma escolha do caminho ascendente entre a terra e o céu, entre o transitório e o permanente.

A avareza dos protagonistas nos remete, em contrapartida, a duas outras personagens, também idosas (Megadoro, na Aululária, e Eudoro, em O Santo e a Porca), que não apresentam tal característica, sendo, portanto, opostas a Euclião e Euricão.

Concluindo, lembramos as palavras de Cícero sobre os defeitos comumente atribuídos à velhice. Diz o orador latino que: são defeitos dos costumes, não da velhice. (...) Não compreendo o que a avareza do ancião quer para si mesmo. Há algo de mais absurdo que aumentar as provisões de viagem à medida que menos caminho resta? (CÍCERO, 1980, p.81).

Fontes:
Resumo adaptado do Site http://osantoeaporca.vilabol.uol.com.br/
http://www.algosobre.com.br
http://i.s8.com.br (imagem)

Dias Gomes (O Pagador de Promessas)

1. Aspectos estruturais

Trata-se de um texto escrito para teatro, ou seja, para ser levado ao palco, ser encenado. A peça é dividida em três atos, sendo que os dois primeiros ainda são subdivididos em dois quadros cada um. Após a apresentação dos personagens, o primeiro ato mostra a chegada do protagonista Zé do Burro e sua mulher Rosa, vindos do interior, a uma igreja de Salvador e termina com a negativa do padre em permitir o cumprimento da promessa feita. O segundo ato traz o aparecimento de diversos novos personagens, todos envolvidos na questão do cumprimento ou não da promessa e vai até uma nova negativa do padre, o que ocasiona, desta vez, explosão colérica em Zé do Burro. O terceiro ato é onde as ações recrudescem, as incompreensões vão ao limite e se verifica o dramático desfecho.

2. Enredo

Primeiro ato. Primeiro quadro.

A ação da peça tem início nas primeiras horas da manhã [4 e meia], numa praça, em frente a uma igreja, em Salvador. O personagem denominado Zé do Burro carrega uma cruz e se aloja na frente da igreja. A seu lado Rosa, sua mulher, apresentada como tendo 'sangue quente' e insatisfação sexual. Zé espera a igreja abrir para cumprir sua promessa, feita a Santa Bárbara. Aparecem no lugar, algum tempo depois, Marli e Bonitão: ela prostituta; ele, gigolô. Há uma clara relação de exploração e dependência entre eles. Encontrando Zé, Bonitão dirige-se a ele e percebe ser alguém ingênuo. Rosa, por sua vez, conversando com o gigolô, queixa-se de Zé, contando que ele, na sua promessa, dividiu suas terras com lavradores pobres. Percebendo a ingenuidade, Bonitão propõe-se a providenciar um local para Rosa descansar. Zé não só aceita, como incentiva. Saem os dois, Bonitão e Rosa, de cena.

Primeiro ato. Segundo quadro.

Aos poucos, começa o movimento ao redor da praça. Aparecem a Beata, o sacristão e o Padre Olavo, titular da igreja. Zé explica a promessa: Nicolau foi ferido com a queda de uma árvore; estando para morrer, Zé fez a promessa. O burro - Nicolau é um burro! - salva-se. Ingenuamente, Zé revela ter usado as rezas de Preto Zeferino e feito a promessa num terreiro de candomblé, a Iansã, equivalente afro de Santa Bárbara. O padre fica escandalizado. Estabelece-se o conflito. O sincretismo Iansã-Santa Bárbara, natural para Zé do burro, é um grandioso pecado para o padre. A situação agrava-se com a revelação da divisão de terras. Impasse. O padre manda fechar a igreja e proíbe o cumprimento da promessa. Zé do burro fica atônico.

Segundo ato. Primeiro quadro.

Duas horas mais tarde, já a movimentação no lugar é intensa. O Galego, dono do bar, abriu seu estabelecimento. Surgem Minha Tia, vendedora de acarajés, carurus e outras comidas típicas, Dedé Cospe-Rima, poeta popular, ao estilo repentista e o Guarda. Zé do burro quer cumprir a promessa. O Guarda tenta intervir. Rosa reaparece com 'ar culpado'. Chega o Repórter. Seguindo a linha do oportunismo sensacionalista, o repórter quer tirar vantagens da história de Zé do Burro. Quer torná-lo um mártir, para virar notícia. Enquanto isso descobre-se que Rosa transou com Bonitão. Marli faz um pequeno escândalo, denunciando a história Rosa-Bonitão.

Segundo ato. Segundo quadro.

Três da tarde, Dedé oferece poemas para Zé, a fim de derrotar o Padre. Aparecem, em momentos subseqüentes, o capoeirista Mestre Coca e o policial, o Secreta, chamado por Bonitão, ficando ambos, por enquanto, nas cercanias. Zé começa a perder a paciência e arma uma gritaria. O padre reage. Chega o Monsenhor, autoridade da igreja, propondo a Zé uma solução: ele, Monsenhor, na qualidade de representante da Igreja, pode liberar Zé da promessa, dando-a por cumprida. Zé não aceita, dizendo que promessa foi feita à Santa e só ela poderia liberá-lo. Segue o impasse. Zé explode novamente e avança com a cruz sobre a Igreja. O padre fecha a porta. Zé, já desesperado, bate com a cruz na porta. O drama é total.

Terceiro ato.

Entardecer. Muita gente na praça e nos arredores da Igreja. Há uma roda de capoeira. O Galego, oportunista, oferece comida grátis a Zé, pois a história está trazendo movimento ao seu bar. O Secreta, no bar, avisa que a polícia prenderá Zé, ameaçando os capoeiristas, caso eles interfiram. Marli volta. Ofende Rosa, ofende Zé. O protagonista parece mudar de atitude. Resolve ir embora 'à noite'. Rosa quer ir embora já. Conta que Bonitão avisou a polícia. Retorna o repórter, que tenta montar um verdadeiro circo em torno do Zé, com o objetivo de vender o jornal. Chega Bonitão e convida Rosa para ir com ele. Zé pede a ela para ficar. Rosa hesita, a princípio, mas, em seguida, vai com Bonitão. Mestre Coca avisa Zé sobre a chegada da polícia. Zé está perplexo: 'Santa Bárbara me abandonou'. Da igreja saem o Sacristão, o Guarda, o Padre e o Delegado. Tensão da cena acentua-se. Zé ainda tenta, ingênua e inutilmente, explicar alguma coisa. Ao ser cercado, puxa uma faca. As autoridades reagem. Os capoeiristas também. Briga e confusão. De repente, um tiro espalha gente para todos os lados. Zé é mortalmente ferido. Mestre Coca olha para os companheiros, que entendem a mensagem. Os capoeiristas tomam o corpo do Zé colocam-no sobre a cruz e, ignorando padre e polícia entram na igreja, carregando a cruz.

3. Comentário

A peça de Dias Gomes tem nítidos propósitos de evidenciar certas questões socio-culturais da vida brasileira, em detrimento do aprofundamento psicológico de seus personagens. Assim, ganha força no drama a visão crítica quanto:

a] à intolerância da Igreja católica, personificada no autoritarismo do Padre Olavo, e na insensibilidade do Monsenhor convocado a resolver o problema;

b] à incapacidade das autoridades que representam o Estado - no episódio, a polícia - de lidar com questões multiculturais, transformando um caso de diferença cultural em um caso policial;

c] à voracidade inescrupulosa da imprensa, simbolizada no Repórter, um perfeito mau-caráter, completamente desinteressado no drama do protagonista, mas muito interessado na repercussão que a história pode ter;

d] ao grande fosso que separa, ainda, o Brasil urbano do Brasil rural: Zé do Burro não consegue compreender por que lhe tentam impedir de cumprir sua promessa; os padres, a polícia, a imprensa não conseguem compreender quem é Zé do Burro, sua origem ingênua, com outros códigos culturais, outras posturas. Além disso, a peça mostra as variadas facetas populares: o gigolô esperto, a vendedora de quitutes, o poeta improvisador, os capoeiristas. O final simbólico aponta em duas direções. Em primeiro lugar a morte do Zé do Burro mostra-se com fim inevitável para o choque cultural violento que se opera na peça: ninguém, entre as autoridades da cidade grande, é capaz de assimilar o sincretismo religioso tão característico de grandes camadas sociais no Brasil, especialmente no interior nordestino. Em segundo lugar, a entrada dos capoeiristas na igreja, carregando a cruz com o corpo, sinaliza para rechaçar a inutilidade daquela morte: os populares compreenderam o gesto de Zé do Burro.

Fontes:
http://www.algosobre.com.br
http://nadiatimm.com (imagem)

Moacyr Scliar (O Centauro no Jardim)

I- Autor:

Moacyr Jayme Scliar nasceu em Porto Alegre no ano de 1937. Médico, romancista, contista e cronista, publicou também ensaios. Iniciou com alguns livros de contos. Posteriormente, publicou romances e novelas, quase todos tratando dos judeus imigrados do Leste europeu a partir das guerras mundiais. Enfoca as dificuldades de ambientação e perda gradativa das raízes e tradições do judaísmo à medida que as gerações vão se sucedendo.Também apresenta características de textos fantásticos, de um certo realismo mágico. O cenário escolhido é invariavelmente a cidade de Porto Alegre, mais precisamente o bairro do Bom Fim, tipicamente judeu até hoje. Suas últimas obras, entretanto, já se dedicam aos temas sociais do presente. Nos últimos anos, vem se destacando como cronista; seus textos são publicados nas páginas de cultura do jornal Zero Hora aos domingos, e já possui livros de crônicas publicados.

II- Espaço:

A história ocorre num restaurante tunisiano, em São Paulo [SP], com lembranças de Quatro Irmãos [RS], Porto Alegre [RS] e Marrocos.

III- Tempo:

O livro conta os primeiros trinta e oito anos da vida de Guedali Tratskovsky, de 1935 até 1973.

IV- Personagens:

Guedali Tratskovsky: É o personagem do romance, filho de imigrantes judeus russos. Nasce centauro, vindo a crescer escondido e protegido de todos os que não faziam parte de sua família. Por causa desse isolamento, acaba criando o hábito da leitura, tornando-se extremamente culto e inteligente. Tem características físicas e psicológicas ora de humano e ora de cavalo.

Tita: Centaura de nascimento, é a companheira de Guedali. Foi criada num universo exclusivamente feminino. Como cresce isolada do mundo exterior e não tem acesso a livros, é uma pessoa agressiva, ignorante.

Leão Tratskovsky: imigrante judeu russo, veio para o Brasil por causa das condições adversas da Rússia. Cultivava as terras da regiâo por uma questão de necessidade e com forma de homenagear o Barão Hirsch, um homem que o ajudou a viajar até o Brasil.

V- Resumo:

O livro começa no restaurante tunisiano “Jardim das Delícias”, onde Guedali relembra seu passado na comemoração de seu 38º aniversário. Seu pensamento remete a uma fazenda em Quatro Irmãos [RS] em 1935. Ali nasce Guedali, filho caçula dentre os quatros de um casal russo. O nascimento causa espanto na família fazendo com que sua mãe fique vários dias de cama. No mesmo dia de seu nascimento decidem que vão proteger o centauro e procurar tratá-lo com o máximo de normalidade possível.

Guedali galopa muito no campo e, numa dessas vezes, encontra um índio chamado Peri. Solitário, vibra com a conquista do que imaginava ser seu primeiro amigo, mas nunca mais o vê. Também é descoberto por Pedro Bento, filho dos fazendeiros da fazenda vizinha. O pai, quando descobre, decide se mudar para a capital, vendo que seria muito difícil proteger Guedali dos outros no campo.

Em Porto Alegre, Guedali se vê mais preso ainda, e se limita a ler livros e observar uma garota por um telescópio. Essa situação o deixa indignado e, já com vinte e um anos, resolve sair de casa.

Vai, então para um circo, onde faz um número como se estivesse mais um irmão dentro da sua “fantasia” de centauro. Ao envolver-se com a domadora, ela acaba por descobrir que ele é um centauro e Guedali foge dali.

Nessa fuga, encontra Tita, outra centaura, que fugia de Zeca Fagundes, seu pai. Este a perseguia pois descobrira somente naquele dia. Guedali o mata e tem uma relação sexual com Tita. Vivem então na casa de Tita com Cetinha, viúva de Zeca Fagundes, quase uma mãe para eles. Tudo vai bem até Tita começar a se deprimir por causa de sua natureza, quando decidem ir ao Marrocos, onde poderiam tentar uma cirurgia para resolver seus problemas. Em Marrocos a cirurgia corre tudo bem e eles começam a caminhar sobre as duas patas traseiras, encobertas por botas e calças.

Na volta para o Brasil, passam algum tempo, na casa dos pais de Guedali, decidindo viver em São Paulo. Mudam-se para lá em 1960, quando Guedali e Tita compram uma casa, ele abre uma firma de importação,e levam uma vida quase normal. Têm gêmeos, enriquecem e fazem várias amizades. Nessa fase da vida, Guedali e Tita já não mostram o mesmo envolvimento sentimental dos velhos tempos, e Guedali se envolve com Fernanda, mulher de seu melhor amigo, Paulo, mas ninguém descobre. Decidem ir viver com amigos num condomínio horizontal, onde, num primeiro momento, Guedali se sente muito mal, pois o motorista do condomínio era Pedro Bento, mas este promete guardar segredo para não perder o emprego. Com o tempo o casco de Guedali racha e cai, dando origem aos pés.

Um dia, Guedali flagra Tita transando com um outro centauro. Arma-se uma confusão com a chegada dos amigos do casal, o centauro, assustado, corre e á assassinado por guardas do condomínio.

Abalado, Guedali decide ir para o Marrocos, onde pede para o velho médico marroquino reverter a operação realizada há anos atrás. O médico, com relutância, concorda. Como tinha de fazer exames e esperar o cavalo ser tratado para doar suas patas, Guedali dica no Marrocos. Nesse meio tempo, conhece a maior relíquia do médico marroquino: uma esfinge chamada Lolah. Esta se apaixona por Guedali que, para satisfazer seu instinto animal, se relaciona com ela todos os dias.

Passando o tempo, Guedali decide não mais se transformar em centauro. Quando se dirige ao médico para contar sua decisão, o médico aplica-lhe uma anestesia para prepará-lo para a operação. Por sorte, Guedali havia deixado a jaula de Lolah aberta e ela, ao notar a sua ausência tenta salvá-lo e é assassinada pelo assistente do médico. A operação é cancelada e Guedali volta para o Brasil.

Sem notificar Tita, retorna à fazenda onde nasceu e começa a construir uma vida bucólica com a ajuda de um índio que imagina ser Peri. Com o passar do tempo ele sente muita falta de sua mulher e também sente vontade de voltar a ser um centauro. Peri diz que é mágico e que é capaz de fazê-lo voltar à sua forma natural. Quando esse faz a mágica, que não dá certo, Tita aparece na fazenda para a alegria de Guedali. Depois de um tempo no campo, decidem voltar a São Paulo, convencidos por seus amigos.

Em setembro de 1973, Guedali reúne seus amigos para a comemoração de seu aniversário no restaurante tunisiano. Observa Tita confidenciando com uma moça. Tita está contando a história de suas vidas com uma leve distorção: como se nunca tivessem sido centauro.

MORAL: A figura do centauro remete para a questão básica que autor discute: o simbolismo do homem judeu na sua dúplice característica quer racial quer religiosa.

Fonte:
http://www.algosobre.com.br/

Robert Drummond (Hilda Furacão)

Desde que foi lançada a campanha a favor da Cidade das Camélias, a Zona Boêmia é um promontório da alegria. sugere os últimos dias de Pompéia. Tudo lá é encantado. A rua principal, a Guaicurus, conhece noites inesquecíveis. E nunca se viu tanto dinheiro. O vendedor de churrasquinhos triplicou as vendas. No restaurante Bagdá, especialista em comida árabe, é preciso disputar um lugar. As mulheres dos hotéis de primeira, segunda , terceira e quarta categorias jamais foram tão solicitadas. E na noite da última quinta feira, a polícia foi chamada para conter os ânimos dos que disputavam um lugar na fila que vai dar num território mágico: o quarto 304, no terceiro andar do Maravilhoso Hotel onde Hilda Furacão é uma fada sexual. (Roberto Drummond )

O romance Hilda Furacão [1991] tem uma proposta narrativa interessante, bem ao gosto pós-moderno. Várias ações transcorrem no texto conferindo uma dinâmica que prende o leitor à narrativa, perseguindo um desfecho que nos é insistentemente prometido.

A história central focaliza a personagem que dá nome ao romance, Hilda Furacão. Entretanto, o lugar de protagonista é disputado pelo narrador que conta a sua história e ao contá-la, conta várias outras histórias, que se entrelaçam formando um tecido de conflitos que vamos conhecendo e com os quais muitas vezes nos identificamos.

Os capítulos se sucedem ao modelo dos folhetins, criando um suspense que buscamos desvendar com a leitura do próximo, sucessivamente. Essa técnica permite que, a cada capítulo, as personagens se revezem e ganhem um destaque na trama. Isto é tão evidente que a obra já foi encaminhada para o teatro pela direção de Marcelo Andrade e ainda ganhou projeção nacional ao se tornar uma grandiosa mini-série homônima, na Rede Globo.

O cenário principal da obra é a capital mineira do final dos anos 50 e início dos anos 60 [lembramos que o autor reside em Belo Horizonte e hoje representa um dos grandes nomes do jornalismo mineiro], mas há que se falar no cenário secundário que é a pacata cidade de Santana dos Ferros.

Personagens
Roberto é o alter- ego biográfico do jornalista Roberto Drummond. Jovem comunista e idealista que ama a bela M. Aramel, o belo 'nunca houve homem mais belo que Aramel' jovem que almeja o estrelato hollywodiano por sua aparência de galã. Acaba por tornar-se um cafetão a serviço do poderoso Antônio Luciano. Após um desencontro amoroso humilhante vai para os EUA e torna-se gângster

Frei Malthus o pivô do grande romance julgado pela comunidade como 'o santo' este personagem se apaixonará pela bela Hilda Furacão. O mito da Cinderela é passado ao leitor quando do acidente que deixa o sapato de Hilda sob a posse do frei que tentará fugir do pecado martirizando-se e comendo o seu favorito doce de jabuticaba.

As tias Ciana e Çãozinha são as representantes [ há vários flashes de Santana dos Ferros interior mineiro] do conservadorismo e liberalismo. São as tias que Roberto trava correspondência constantemente.

Gabriela A primeira amada de Aramel, que fora contratado pelo traumatizado, gordo e tímido jornalista Emecê para representá-lo no encontro marcado. Antônio Luciano representante do poder econômico e político. Sua diversão era deflorar virgens e Aramel era o encarregado de receptá-las.

Cenário / tempo / espaço
Alguns dizem que o romance é bairrista, e não é a verdade , pois o que se apura dessa obra é uma grande homenagem à cidade de Belo Horizonte e tudo que faz dela um grande cenário natural para representar o microcosmo político e social do macrocosmo que era o regime militar em seu tempo cultural e estético. •

Estrutura Narrativa

É muito presente nos textos de Roberto Drummond um constante diálogo com o leitor. A esse diálogo entre textos do mesmo autor damos o nome de intratextualidade. Outros diálogos intertextuais aparecem ao longo da narrativa, mesclando ditos populares e modinhas ao discurso narrativo. Outro aspecto intertextual que se observa é a construção da intriga entre Hilda Furacão e Frei Malthus desencadeada a partir do sapato que a moça perde e do qual o rapaz se apossa, tal 'L qual acontece no conto da Gata borralheira ou Cinderela., Logo na abertura do romance, e nos capítulos que se seguem, Roberto narrador deixa claro que, por toda o texto, vai estar dialogando com o leitor, fazendo- nos presentes no tempo da enunciação -presente da narrativa. Essa é uma técnica bastante usada por nossos escritores, em especial por Machado de Assis. e confere uma dinâmica interessante ao relato, tornando-nos quase cúmplices do escritor.

Resumo

Como já dito anteriormente o romance é muito desfragmentado, pois possui constantes mudanças de enfoques. Para facilitar o nosso trabalho proporemos que se faça duas leituras: uma primeira que almeja desvendar o mistério da garota do maiô dourado [ a Hilda que desfilava sua beleza pelo Minas Tênis e depois tornou-se prostituta]; uma segunda que mistura ficção e realidade histórica brasileira [ditadura militar e censura]; o mais brilhante é que tudo começa e termina no dia 1° de abril que simboliza o dia da mentira eis então a grande proposta ficcional do autor. Roberto começa narrando em 1° pessoa a sua própria condição jovem de comunista e idealista. pretendo ser um grande jornalista e irritadiço por compararem seu sobrenome com o grande poeta Carlos Drummond de Andrade. Pelo que o narrador fala de si e da cidade observamos que o tempo precede os anos de 64 [época do golpe militar]. Nesse interím, o narrador trava correspondência com as tias de Santana dos Ferros Tia Ciana e Çãozinha, que são as interlocutoras do relato. A grande trama da obra verifica-se no encontro entre o santo Frei Malthus e a bela Hilda no qual aquele, ao tentar expurgar o mal da zona boêmia acaba enredado pela paixão que estabelece-se entre ele e Hilda. Roberto é o jornalista que relatará ao leitor como estão acontecendo os fatos na zona boêmia [lembre-se que Malthus, Aramel e Roberto são os três mosqueteiros amigos de infância e desta forma Roberto terá maior possibilidade de levantar dados para o leitor].

Após o desaparecimento do seu sapato, Hilda lança um concurso para que o devolvam então inicia-se um conto de cinderela às avessas pois Malthus acabará por reconhecer o seu amor pela bela. Contudo o final é triste pois ambos desencontram-se quando da fuga para viverem um grande amor Malthus será preso no primeiro dia de vigência do golpe militar de 64.

Fonte:
http://www.algosobre.com.br/

quinta-feira, 3 de julho de 2008

Douglas Lara na Ordem Nacional dos Escritores do Brasil (ONE)















No dia 24 de julho, durante a semana do escritor, o organizador Douglas Lara será aceito como sócio permanente da Ordem Nacional dos Escritores do Brasil - ONE.

A ONE foi fundada em 18 de maio de 1982, é uma sociedade civil com fins culturais e científicos, sem objetivos ou finalidades lucrativas, sediada na cidade e município de São Paulo e que abrange todo o espaço da LUSOFONIA. Tem cerca de quinhentos membros, na maioria brasileiros, em sua instituição cultural.

Os principais objetivos da Ordem são: promover, estimular, incentivar as atividades literárias e congregar, aconselhar e auxiliar os autores, seus associados em quaisquer obras e ou produções artístico-literárias, técnicas e científicas, bem como defender a atuação do escritor lusófono na livre manifestação de seu pensamento e em defesa de seus trabalhos e direitos.

Na impossibilidade da presença do Presidente da ONE, José Verdasca, a honra da entrega do colar ao escritor Douglas Lara, será delegada ao diretor-coordenador do Núcleo de Lisboa (Portugal), Joaquim Evónio que estará presente durante a 4ª Semana do Escritor de Sorocaba.
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Em meu nome, da delegacia ubiratanense da União Brasileira dos Trovadores e Associação dos Literatos de Ubiratã, gostariamos de parabeniza-lo por esta glória obtida, resumindo a luta de Douglas Lara, nas palavras do trovador Eduardo Simões Brites (Rio de Janeiro):

A natureza, perfeita,
ao dar-me dois braços sãos,
dá-me a glória da colheita
do que plantei com as mãos.
Com certeza, merece fazer parte das paginas da história de nossa cultura, e inspiração para os que estão presentes e aos que ainda estarão por vir.
José Feldman (3/6/08)

Cees Nooteboom (Paraíso Perdido)

Poucos escritores viajam como o holandês Cees Nooteboom (a pronúncia é "seis nôtebôm"), nome recorrente entre os candidatos ao Prêmio Nobel e um dos principais convidados da Festa Literária Internacional de Parati (Flip), que vai de 2 a 6 de julho.

Cees Nooteboom, uma das atrações da Flip, lança livro com protagonista brasileira Alma

Como Paul Theroux e Bruce Chatwin, ele transforma suas aventuras em literatura. Como Melville ou Joseph Conrad, foi marinheiro para conhecer o mundo. E como Peter Handke ou Robert Walser, usa suas jornadas como inspiração filosófica.

Seu último romance, "Paraíso Perdido", que agora chega às livrarias, tem uma curiosidade. A personagem central (Alma) é uma brasileira, moradora dos Jardins, fã de Maria Bethânia, que inicia sua jornada espiritual para superar o trauma que sofre em São Paulo: um estupro na favela de Paraisópolis, depois que seu carro enguiçou.

Ela e a amiga Almut, descendentes de alemães, partem para realizar um sonho: conhecer a Austrália, onde Alma vira amante de um aborígene e tem um encontro efêmero com um crítico literário holandês (alter ego de Nooteboom). E é o crítico que encerra o livro, em Berlim, depois de ter reencontrado Alma em uma clínica na Áustria, por acaso.

Inspirado no poema épico de John Milton, Nooteboom também empresta do imaginário de Rilke a figura dos anjos, que povoam seu livro. É exatamente fantasiada de anjo, em uma intervenção teatral na Austrália, que Alma aparece para o holandês, como uma revelação.

Isso é o livro. Nooteboom, por outro lado, é terreno e cuidadoso ao comentar suas influências. Falando à Folha de Amsterdã, por telefone, evita citar os contemporâneos e diz que leu muito Borges, Proust, Ovídio e Homero. "Ninguém escreve sem ter ao menos cem escritores em suas mãos".

Anjos

A figura do anjo tem uma inspiração real. Veio do "Angel Project", que assistiu na cidade australiana de Perth, ao participar de um festival literário. "Isso realmente aconteceu. Você precisava percorrer a cidade e encontrar anjos. Acompanhei, em 2000, então foi fácil descrever. Usavam jovens e atores".

O tema também tem, claro, um fundo religioso. "Tive uma educação católica. Anjos sempre estavam presentes", diz. "Nós adoramos a idéia de anjos. Eles são uma necessidade para que exista amor".

A visão de São Paulo também é concreta, resultado de várias viagens, a última pouco antes de escrever o livro, publicado em 2004. "Fiquei passeando de ônibus, para sentir a cidade, que é enorme".

Nooteboom conhece o Brasil desde o final dos anos 60. Já esteve em Manaus, Brasília e no Rio. "Não posso dizer que 'conheço' o país. Mas, como falo espanhol, consigo entender textos em português". ("Eu naum fálo portugueishh", emenda.)

"Me perguntam como alguém com a minha idade pode se colocar no papel das jovens. Mas é ficção, eu achei perfeitamente plausível que duas jovens brasileiras, com uma certa educação, estivessem interessadas no imaginário dos aborígenes. Estive na Austrália várias vezes. Para mim não é difícil imaginar duas garotas em um país muito distante. E a idéia da perda de inocência em diferentes perspectivas me atraía. A Austrália é um exemplo disso, onde uma civilização de 40 mil anos também perdeu a inocência", afirma.

Viagem

E como relatos de viagem se transformam em literatura? "No meu caso foi simples. Eu sempre viajei, desde os meus 17 anos. Isso aparece nos meus livros sem soar artificial, incluindo "Paraíso Perdido". Minha vida tem a ver com viagem".

O interesse pela aventura já o levou a todo o mundo, começando pelo Suriname, nos anos 60, como marinheiro. A paixão pela Espanha virou livro ("Caminhos para Santiago"). E as jornadas por Berlim inspiraram uma de suas principais obras, "Dia de Finados", que trata da ausência.

Já "Tumbas de Poetas y Pensadores" (ed. Siruela, 264 págs., 42, R$ 107 mais frete), publicado na Espanha, traz textos dele e fotos da mulher, a fotógrafa Simone Sassen, abordando os túmulos pelo mundo de escritores famosos, como Thomas Mann, James Joyce e Pablo Neruda. No Rio, os dois registraram os túmulos de Machado de Assis (que ele conhece) e de Carlos Drummond de Andrade (que conhece muito).

As respostas de Nooteboom explicam muito da sua obra. Híbrida, é ao mesmo tempo sofisticada, prosaica, fluente, lírica e repleta de referências.

Ele trabalha atualmente em dois livros. Um de contos, outro com relatos de viagem que inclui suas mais recentes aventuras: no sul da Argentina, na Índia e no remoto arquipélago norueguês de Svalbard, próximo ao pólo norte. E, claro, talvez Paraty, para onde segue em julho, antes de seguir para Salvador ("a parte mais africana do Brasil").

Fonte:
MARCOS STRECKER da Folha de S.Paulo. In Folha On Line
http://www1.folha.uol.com.br/folha/ilustrada/ult90u404954.shtml
Foto por Gustavo Cuevas/Efe

Baú de Literatos I


Ana Maria Machado (Rio de Janeiro, 1941)
Ganhadora do Prêmio Hans Christian Andersen (2001), considerado o Nobel da literatura infanto-juvenil, a jornalista e escritora Ana Maria Machado é autora de mais de 100 títulos, alguns deles publicados em 17 países, somando mais de 18 milhões de exemplares vendidos. Formada em Letras, lecionou na UFRJ e PUC. Durante a ditadura militar, exilou-se em Paris, onde cursou pós-graduação com Roland Barthes. Trabalhou na revista Elle, em Paris, na BBC de Londres e em vários jornais e revistas brasileiros. Em 1979, fundou no Rio de Janeiro a Malasartes, primeira livraria brasileira dedicada exclusivamente a crianças e adolescentes. Também notabilizou-se pela sua produção de literatura para adultos, com o premiado A audácia dessa mulher (1999) e Texturas — sobre leituras e escritos (2001). Desde 2003, Ana Maria Machado ocupa a cadeira 1 da Academia Brasileira de Letras
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Alessandro Baricco (Turim, Itália, 1958)
Um dos mais importantes escritores italianos contemporâneos. Formado em filosofia e música, escreveu peças teatrais, ensaios e romances como Oceano mar (1993), City (1999), Sem sangue (2002) e Esta história (2005). Baricco tem carreira próspera no cinema: A lenda do pianista do mar (1998), de Giuseppe Tornatore, é baseado em seu monólogo Novecentos (1994), e o romance Seda (1996) virou filme homônimo, dirigido por François Girard. Este ano estréia como diretor com o filme Lezione 21, do qual também assina o roteiro. A formação em música estimulou ainda uma parceria com a dupla francesa Air, experiência que resultou no disco City Reading (2003).
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Cees Nooteboom (Haia, Holanda, 1933)
Escritor contemporâneo de maior destaque nos Países Baixos. Ensaísta, poeta e expoente da literatura de viagem, tem cinco obras publicadas no Brasil – os romances Rituais (1980), A seguinte história (1991) e Dia de finados (1998), além do livro de viagens Caminhos para Santiago (1992) e de seu romance mais recente, Paraíso perdido (2004). Comparado a Jorge Luis Borges e J. M. Coetzee, cotado com freqüência para o Prêmio Nobel, Nooteboom tece uma prosa rica em experimentos lingüísticos, mas não abre mão do relato de vivências extremas nem da exploração da interioridade dos personagens.
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Chimamanda Ngozi Adichie (Abba, Nigéria, 1977)
Nome de proa da literatura africana. Aos dezenove anos Adichie mudou-se para os Estados Unidos, onde foi bolsista na Universidade de Princeton. Purple Hibiscus (2003) e Half of a Yellow Sun (2006), pelo qual venceu o Orange Prize de 2007, têm como tema a guerra em Biafra, que entre 1967 e 1970 matou mais de 1 milhão de pessoas. Crítica da forma como a imprensa costuma tratar a África, Chimamanda mostra que a insistência na imagem do africano despossuído e carente esconde uma parcela expressiva e atuante da população, cuja voz merece ser ouvida com mais freqüência.
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Cíntia Moscovich (Porto Alegre, RS, 1958)
Em Por que sou gorda, mamãe? (2006), Cíntia Moscovich propõe uma espécie de Carta ao pai, de Franz Kafka, porém menos ressentida e triste que a do escritor tcheco. Acerto de contas da personagem central com a mãe e com o próprio corpo, o romance traz melancolia e humor em doses equivalentes. É dessa forma que a escritora – também jornalista, professora e tradutora – parece lidar com os temas que aborda em seus livros, entre eles o judaísmo e a condição feminina. Cíntia é autora da reunião de contos Arquitetura do arco-íris (2004, Prêmio Jabuti e finalista do Prêmio Portugal Telecom) e dos romances Duas iguais (1998) e Mais ou menos normal (2008), entre outros.
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David Sedaris (Binghamton, Estados Unidos, 1956)
Iniciou a carreira em 1995 em programas humorísticos de rádio e logo passou a escrever para revistas como Esquire e New Yorker. A voz peculiar, as narrativas auto-irônicas e formalmente impecáveis garantiram o sucesso do comediante. Grande parte de sua obra se compõe de contos autobiográficos, em que a infância no interior dos Estados Unidos, a vida familiar e o homossexualismo são tratados com sarcasmo e lirismo. Seus principais livros são Pelado (1997), Eu falar bonito um dia (2000) e De veludo cotelê e jeans (2004), que lhe valeu o título de humorista do ano pela Time Magazine. When You Are Engulfed on Flames (2008) é sua mais recente publicação. De veludo cotelê e jeans (2004), que lhe valeu o título de humorista do ano pela Time Magazine, e Eu falar bonito um dia (2000), lançado no Brasil neste ano.
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Fernando Vallejo (Medellin, Colômbia, 1942)
Apesar de ter nascido na Colômbia, foi no México, país onde vive até hoje, que Fernando Vallejo desenvolveu sua carreira cinematográfica e literária, após ter seu primeiro filme censurado pelo governo militar. A difícil experiência na Colômbia, porém, marcaria para sempre sua obra, caracterizada por um forte componente autobiográfico.
Temas como violência, drogas e política dividem espaço com filosofia, gramática e biologia. A virgem dos sicários (1994), seu livro mais famoso, trata das conseqüências do narcotráfico para a realidade social colombiana. Em 2003, o romance O despenhadeiro (2001), recentemente publicado no Brasil, recebeu o Prêmio Rómulo Gallegos, um dos mais prestigiados da literatura em língua espanhola.
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Humberto Werneck (Belo Horizonte, MG, 1945)
Jornalista e escritor. Ao longo de trinta anos de carreira, passou por alguns dos principais veículos da imprensa nacional e celebrizou-se pela qualidade da prosa jornalística e pela apuração minuciosa. Entre suas obras destacam-se O desatino da rapaziada (1992), retrato da geração de jornalistas e escritores mineiros da qual fizeram parte Otto Lara Resende, Paulo Mendes Campos e Fernando Sabino, e O santo sujo (2008), recém-lançada biografia do músico e boêmio modernista Jaime Ovalle. Werneck também assina a organização de Minérios domados (1993), reunião da poesia de Helio Pellegrino, a seleção de crônicas Boa companhia (2005) e a reportagem biográfica incluída em Tantas palavras (2006), songbook de Chico Buarque.
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Martín Kohan (Buenos Aires, Argentina, 1967)
Escritor, crítico literário e professor de Teoria literária nas universidades de Buenos Aires e da Patagônia. Autor de dois livros de contos, três de
ensaio e sete romances, entre eles Los cautivos (2000), Duas vezes junho (2002), Segundos afuera (2005), Museo de la revolución (2006) e Ciencias morais (2007), vencedor do prêmio Herralde e lançado no Brasil neste ano. Em seus romances, Kohan enfoca as formas diluídas e indiretas do controle social: a partir do dia-a-dia de um colégio portenho ou da Copa de 1978, constrói um quadro de muitos matizes sobre a ditadura argentina e seu significado para a história recente do país.
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Richard Price (Nova York, EUA, 1949)
Escritor e roteirista. The Wanderers (1974), seu primeiro romance, baseado na infância no Bronx, foi adaptado e dirigido por Philip Kaufman, de A insustentável leveza do ser (1988). Desde então, escreveu roteiros para filmes como O preço da coragem (1996) e a série televisiva A escuta (2004). Teve parceria bem-sucedida com o diretor Martin Scorsese em duas ocasiões: no longa A cor do dinheiro (1986) e no videoclipe Bad (1995), de Michael Jackson, dos quais assinou o roteiro. Um de seus romances mais conhecidos é Clockers (1992), que virou filme do diretor Spike Lee e foi indicado ao Oscar. Seu último livro é o aclamado Lush Life (2008).
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Pierre Bayard (Paris, França, 1954)
Escritor e professor de literatura francesa. No recente Como falar dos livros que não lemos? (2007), gerou polêmica ao questionar a importância da literatura e discutir em que medida é fundamental ler as obras ditas obrigatórias. Para Bayard, o verdadeiro letrado não é quem leu de tudo, mas quem reconhece o valor de determinada obra para a cultura que o cerca. Como falar dos livros que não lemos? confirma a verve iconoclasta de Bayard, presente também em obras anteriores, como Comment améliorer les oeuvres ratées (2000) e Enquête sur Hamlet (2002).
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Tom Stoppard (Zlín, República Tcheca, 1937)
O dramaturgo inglês Tom Stoppard consagrou de tal forma seu estilo que se tornou adjetivo: stoppardian é o termo usado para classificar autores e peças que utilizam a via do humor para dialogar com conceitos filosóficos. Em 1966 estreou nos teatros com Rosencrantz e Guildenstern estão mortos, em que a saga de Hamlet é recontada a partir da perspectiva de personagens secundários na trama original. Autor de mais de vinte peças e roteiros de cinema, é famoso pela criação de diálogos cheios de ironia e sarcasmo, potencializados pelo uso de duplos sentidos, trocadilhos e múltiplos pontos de vista.

Fonte:
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