sexta-feira, 27 de setembro de 2013

A. A. de Assis (Poeminhas à moda de haicais) Parte 2, final

51.
Tão miudinha a avenca.
Ao lado um coqueiro enorme
súbito despenca.

52.
Fácil se define:
lá distante uma araponga
tine... tine... tine...

53.
Petit à petit,
pombinhos tecem seus ninhos.
Em Paris e aqui.

54.
Vós que, sobrevivos,
a mais que os demais amais,
uni-vos, uni-vos.

55.
Repicam os sinos.
Os mesmos de nós meninos,
na velha matriz.

56.
Colibri esvoaça.
Tem rosa nova, solteira,
no jardim da praça.

57.
Voa, voa, voa,
faz a cera, faz o mel,
abelhinha boa.

58.
Um cisco no chão.
Ah, não era cisco não.
Era uma esperança.

59.
Menino de rua.
Protege-o, Dindinha Lua,
dá-lhe colo, dá!

60.
Pião da saudade.
De uma era em que era franca
a felicidade.

61.
Um vaso de avenca.
Minimíssima floresta.
Mas é verde, é festa.

62
Chocados os ovos,
há o choque dos seres novos.
E a vida prossegue.

63.
Levantar cedinho.
Mens sana in corpore sano.
Ouvir passarinho.

64.
Curvam-se as roseiras.
Jogam as rosas, felizes,
beijos às raízes.

65.
Rola a Lua, rola.
Os mísseis zumbindo ao lado
e ela nem dá bola.

66.
De amor são seus uis.
As lágrimas que ela chora
devem ser azuis.

67.
Lua na montanha.
Me faz um favor, me faz:
sobe lá e apanha.

68.
Crianças na praça
cantando canções de roda.
Volta a paz à moda.

69.
Leio no jardim.
Idéias há e azaléias
em redor de mim.

70.
É um impasse e tanto:
trabalho, o canto atrapalho.
Nesse caso, canto.

71.
Olá, senhor Sol.
Bem-vindo ao nosso domingo.
Praia e futebol.

72.
Ah, havia o espaço.
Ave havia e havia ação.
Ave... avi...ão.

73.
Contam casos... súbito,
Negrinho do Pastoreio
passa bem no meio.

74.
Onda e sol... Floripa.
Tem lugar para mais a um.
Pega a prancha e... tchum!

75.
Trenzinho da serra...
Pa... Pa-ra-ná... Pa-ra-ná...
pra Paranaguá.

76.
De perder a voz.
Água, água, água, água.
Cataratas – Foz.

77.
Presépio do Sul.
Curitiba dos pinheiros
e da gralha azul.

78.
É chegar e amar.
Ri o Rio o ano inteiro.
Samba, sol e mar.

79.
Dim-dim-dão... dim-dão...
Os sinos de San-del-Rey
sempre em oração.

80
Bahia das festas.
De todos os sábios – tantos.
De todos os santos.

81
Aguinha de coco.
Areia, arara, caju.
Ah... é Aracaju.

82
Jangada ao luar.
Lagosta ao vinho depois.
Fortaleza a dois.

83.
Blem... Belém... blem-blem...
No Círio de Nazaré,
os sinos da fé.

84.
O tempo e a distância.
A festa de São Fidélis.
Transfusão de infância.

85
Armas e barões
muito além da Taprobana
ecoam Camões.

86.
Tela brasileira.
Um sabiá na palmeira
de Gonçalves Dias.

87.
Rosa, Rosa, Rosa,
ó Rosa das rosas ledas!
Dos sertões: veredas.

88.
Releio Pessoa.
Finjo tão completamente,
que a tristeza voa.

89.
Leoni, o poeta
da Petrópolis azul.
Alma azul. Raul.

90.
Luar no sertão.
Ah que falta faz Catulo
com seu violão!

91.
Bem-te-vi, Cecília,
nos ramos da madrugada.
Cantando, encantada.

92.
Mais do que Bandeira,
sobretudo Manuel.
Ou mais: man well.

93.
To you, tuiuiú.
Parabéns para você.
Happy bird are you.

94.
New York, New York,
make love, not work.
Ah, I love you!

95.
Passa a teoria
por debaixo do arco-íris.
Vira poesia.

96.
Pilhas de currículos.
Vencedor: o sabiá.
Sabia cantar.

97.
O sorriso é um dom.
Sorrindo você faz lindo
o seu lado bom.

98.
Aplainai as trilhas,
forrai-as de relva e flor.
Vai chegar o Amor.

99.
Brinquemos, irmãos.
Vamos dar as nossas mãos.
Brinquemos de paz.

100.
De braços abertos,
sobe o pinheiro. Subindo,
deixa o céu
m
a
i
s
l
i
n
d
o

Fonte:
A. A. de Assis. Poeminhas (à moda de haicais). Marinha Grande/Portugal: Biblioteca Virtual "Cá Estamos Nós". Outubro de 2004

Paulo Pellota (Paz na Terra aos homens de botequim)

Crônica premiada no "Concurso Grandes Escritores de São Paulo", Litteris Editora, 1977.
–––––––––––––––––––––––––––
Beber bem e bater papo são duas artes com grandes afinidades entre si. E o melhor lugar para exercitá-las é o botequim.

Há um consenso entre os grandes praticantes de que o bar, feito exclusivamente para beber e conversar, é o ambiente onde essas artes evoluem com notável fluência. Fluência que é percebida nas mesas de profissionais, gente que leva a sério 0 supremo ofício de rir e conversar.

A função social do bar é justamente liberar os espíritos e fazer aflorar as identidades a fim de facilitar a conversa. Os temas vão surgindo naturalmente e vai-se falando de tudo um pouco. Importantes decisões sobre os destinos da humanidade são tomadas. Política, futebol, discos voa- dores, o melhor chopp da cidade, tudo é discutido. Meu amigo Pérsio, competente em matéria de botequim, afirma que há nessas mesas uma fantástica cornucópia de onde brotam os mais interessantes assuntos. Médicos falam sobre direito, advogados tratam de medicina, empresários palpitam sobre música, músicos discutem política, vagabundos pontuam sobre direito do trabalho, em desordem alternada, podendo mudar o ponto de vista a qualquer momento. A lógica, a coerência, podem perfeitamente ficar do lado de fora, já que o bom papo de boteco não tem censura nem admite cobranças posteriores.

Já os amadores, que vão ao bar de vez em quando para comemorar um aumento de salário ou para falar sobre a crise, são facilmente identificáveis ela monotonia notada em suas mesas."Será que chove? Hoje está mais quente do que ontem." são as mais acaloradas discussões. 0 papo não anda, estão sempre a olhar o relógio, como questionando se deveriam estar mesmo no bar ou poderiam estar gastando seu tempo na academia ou correndo em volta do quarteirão. Se forem realmente amadores, podem questionar à vontade, mas, se por algum motivo se tornaram aprendizes, é dever lembrá-los que os exercícios físicos, hoje tão comuns para cultuar o corpo, não passam de modismos. Como tal, apresentam-se como fenômeno passageiro e, mais dia menos dia, pelo perigo que representam, serão extirpados da sociedade.

Quantas entorses, quantas lesões musculares, fraturas, distensões. Quantos infartos esses esforços violentos têm causado. O negócio é tão perigoso que se pedem diversos exames médicos antes de iniciar qualquer atividade física.

No botequim nada disso acontece. Não há registros de mortes súbitas em mesas de bar. Muito menos se comete a indelicadeza de pedir atestado médico antes de um chopp bem tirado.

Claro que é preciso estar em forma. Tanto profissionais como aprendizes sabem que precisam eleger seus bares preferidos e frequentá-los com assiduidade. Perseverar. Como tudo que se queira fazer bem feito, frequentar botecos também demanda tempo, dedicação e treinamento. E no bar, é na prática do cotidiano que se aprende com frequentadores de outras mesas. E uma alegre tarefa do grupo melhorar a atuação individual e coletiva, com a abordagem de temas originais, com a capacidade de surpreender, usando com competência e humor a liberação dos espíritos proporcionada pela atmosfera do ambiente.

Se disciplina é fundamental, também é importante que o novato reconheça que muitas vezes poderá cometer pequenos deslizes, como dar uma caminhada mais longa ou até mesmo uma corrida. Isso não deve ser motivo para pânico , principalmente se não acontecer com frequência. No começo, isso é normal, porque o iniciante não tem o condicionamento necessário para evitar certos programas e talvez tenha dificuldade para dizer "não". No fundo, o bom mesmo é rir dessa situação e no dia seguinte compensar esse tropeço tomando algumas doses a mais com os amigos.

Os mais assíduos frequentadores de bares têm plena consciência de que rir e conversar são importantíssimos para manter-se sempre rindo e conversando. Parece uma redundância, mas é muito mais profundo do que isso e, se houver dúvida, o tema poderá ser experimentado na próxima mesa.

0 aprendiz deve levar em conta a tradição. O hábito humano de reunir-se para conversar, beber, rir e comemorar faz parte da História do Mundo. A cerveja parece ter sido criada no antigo Egito, Noé carregou vinho na arca e produziu cerveja ao chegar no monte Ararat, Cristo consagrou o pão e o vinho como alimentos do corpo e do espírito, os vitoriosos unem-se e brindam.

*
Até na Santa Ceia todos sentaram-se à mesa e tomaram vinho — o único que não quis tomar nada e saiu mais cedo foi bem sóbrio receber os trinta dinheiros.

Não há, no entanto, menções históricas dando conta de que algum imperador, grande general, profeta ou o mais divino dos seres tenha dado uma corrida e voltado para o mesmo lugar, certo de que estava abafando.

Há que estar preparado, portanto, para a Novíssima Era que está chegando, em que homens e mulheres não discutirão se têm alguns quilos a mais ou alguns centímetros a menos na barriga. Estarão, sim, reunidos em torno de copos e garrafas, usufruindo do grande prazer de comer sem ter fome e de beber sem ter sede, de compartilhar experiências e de rir com os outros e de si mesmos.

Fonte:
PELLOTA, Paulo. Paz na Terra aos homens de botequim. SP: Clio Editores, 2003.

Ciranda da Primavera (Seleção por Simone Borba Pinheiro) Parte 2

BILL SHALDERS
Primavera


 Tempos de belas cores
 Tempos de suaves luzes
 Voam coloridas borboletas
 Voam belas inspirações
 Cantam alegres pássaros
 Cantam o mar e o céu
 No fundo de minha alma

 Mostram-se explosões de flores
 Cores fortes se expandem
 Felicidades explicitam
 Em verdejantes plantas
 Abrigam-se todas as alegrias
 Na exuberante natureza
 Primavera no meu ser

CANDY SAAD
Primavera

 A estação mais linda é a primavera,
 quando há o romper das flores,
 num desabrochar inebriante de cores
 perfumes e seivas!
 Beija-flores e borboletas coloridas
 anunciam a transformação de cor em amor!
 Meus olhos ficam encantados com tanta beleza!
 Como é linda a obra que nos fez o Criador!
 Desperta as emoções,
 acordando sonhos de amor adormecidos.
 Nesse jardim de primavera
 meu amor por você espera...
 Debaixo da copa do Ipê amarelo
 estarei pronta para te dar meu amor
 diante de toda natureza bela,
 exalando perfume de flor!
 Juntos vamos ver o romper da primavera
 contemplando a natureza se emocionar
 com nosso amor.

CARLOS ROBERTO
Primavera


 A mais bela das estações do ANO.
 Onde o belo renasce.
 Renasce a vida das árvores e das flores.
 Toda a NATUREZA renasce.
 Nós os SERES HUMANOS, também devemos
 imitar a NATUREZA, tendo como
 exemplo a PRIMAVERA.
 Vamos procurar renascer os nossos
 sentimentos por uma vida mais bela,
 plena de AMOR, FELICIDADE,
 SAÚDE e muita
 PAZ

CARMO VASCONCELOS
Primavera


 Desabrochadas minhas rosas amarelas
 Segredam-me a esplendorosa alegoria
 De ternas noites orvalhadas de euforia
 E mansos adormeceres com as estrelas

 Ciciam-me brilhos de sol, alvas manhãs
 Em que dissimulados ecos de tambores
 Convidam à simbiose castos amores
 De seivas similares, pétalas irmãs

 Murmuram-me rumores de água perto
 Lembrando o marginar de um rio desperto
 A matar a sede da terra que o venera

 E mais sibilam minhas rosas amarelas
 Que divina inspiração se vestiu delas
 Para consagrar uma nova Primavera

CÁSSIA VICENTE
Primavera


 Primavera...
 prima por beleza, cores,
 perfumes encantadores...
 são flores que alegram
 perfumes que inebriam
 e a vida neste tempo fica
 mais cheia de fantasia...
 os pássaros misturam às árvores suas cores
 enriquecem a paisagem com seus cantos...
 os corações embalam com os cheiros
 os olhos dos amantes...que a todo instante
 refletem o arco-irís nos corações de suas Damas da Noite
 ou dos seus Amores Perfeitos...
 E as amantes que são delicadas ao toque
 exalam o cheiro das Não-me toques
 disfarçando seus desejos embaixo das Pitangueiras...

 Jataí.GO

CECÍLIA RODRIGUES
Primavera


 Da Primavera em flor
 Muito se há-de cantar
 Flor rima com amor
 Cantar rima com amar

 Assim as palavras unem
 Um sentir, um bem-estar
 Amor e flor, perfumam
 Toda a Terra, todo o ar

 Todo o ar que respiramos
 É vida, é flor, amor, e canto
 Da passarada p'los ramos
 No arvoredo sem pranto

 Só música em coro entoa
 Por entre arvore enfeitada
 Sons de orquestra nos soa
 Vindo daquela passarada

 Nascem amores nos roseirais
 Vivem delírios na madrugada
 Enquanto Primavera são leais
 Morrem no Outono á chegada

CORA MARIA
Estão voltando as flores!


 Abra seu coração para a nova estação!
 Beije como um beija flor,
 Estenda os braços para o sol, que nasce
 Observe a borboleta,
 Construa um verso e a alguém ofereça,
 Faça bolinhas de sabão,
 Cante um refrão!
 Abra a janela,
 Comemore a primavera!
 Ame como jamais,
 Jogue fora todos os seus " ais"
 Perfume seus dias,
 Brinde a estação das flores,
 De alma colorida,
 Comemore a vida!

CRISTINA OLIVEIRA CHAVEZ - USA
Primavera


 A Primavera da alma é a vida!
 Esperanças, suas perfumadas flores
 quando o outono chega em fé perdida,
 e de saudade chora seus amores!

 Ela é maravilhosa, Fada Madrinha!
 converte do inverno, um paraíso,
 com suas cores de encanto azulzinha
 a vida eterniza como um sorriso!

 Já deixa-a entrar, é tão primorosa,
 está cheia de paz e de harmonia,
 o amor leva em seu pólen de rosa
 permite-lhe, te encha de alegria!

 Serenas são seus odes de ternura,
 viver com ela é uma grande euforia,
 passarinhos que cantam com doçura,
 A Primavera na alma...É a glória!

DENISE SEVERGNINI
Primavera


 Flores surgem
 em profusão
 Enchem meus olhos
 de emoção
 Desperta em meu olfato
 doce sensação

 Os pássaros entoam
 lindas canções
 Inflando de alegria
 nossos corações

 É a natureza que acelera
 Pois chega a primavera...

Fonte:
Seleção por Simone Borba Pinheiro. in http://www.familiaborbapinheiro.com

Monteiro Lobato (A Reforma da Natureza) Capítulo 2 – Aparece a Rã

Essa ocasião havia chegado. Ao saber que Dona Benta recebera convite dos chefes da Europa para ir arrumar o pobre continente, Emília deu um pulo de gosto e, já com a ideia da reforma da Natureza na cabeça, declarou que não ia.

- Não vai, como, Emília? - disse Dona Benta. - Acha que posso deixar você sozinha aqui?

Emília disfarçou a verdadeira razão de ficar. Declarou que não ia para evitar escândalos na Conferência da Paz.

- Sim - disse ela - se eu for não é para ficar dormindo no hotel, não! Também hei de querer tomar parte na Conferência - e tenho umas tais verdades a dizer aos tais ditadores que a senhora nem imagina. E fatalmente sai "fecha".  Vira escândalo. É isso que quero evitar.

Dona Benta ficou pensativa, e foi à cozinha consultar tia Nastácia.

Encontrou-a areando o tacho para fazer goiabada.

- Nastácia - disse ela - Emília encrencou. Quer ficar. Diz que se for à Conferência sai fecha com os ditadores e haverá um grande escândalo internacional - e estou com medo disso. Tenho horror a escândalos.

- E sai fecha mesmo, Sinhá. -Depois daquela história da Chave do Tamanho, Emília ficou prepotente demais. Não atura nada. Dá escândalo mesmo, Sinhá, e é até capaz de estragar o nosso trabalho por lá. Pedrinho me contou que aquilo nas Europas está pior que quarto de badulaque quando a gente procura
uma coisa e não acha. Tudo de perna para o ar, disse ele. Tudo sem cabeça, espandongado. A nossa serviceira vai ser grande, Sinhá, e com a Emília atrapalhando, então, é que não fazemos coisa que preste. Minha opinião é que ela fique.

- Mas ficar sozinha aqui, Nastácia?

- Fica com o Conselheiro e o Quindim - que mais a senhora quer? Juízo eles têm para dar e vender – e ainda sobra. Eu converso com o Conselheiro e explico tudo. .

Dona Benta pensou, pensou e afinal se convenceu de que tia Nastácia tinha razão. Controlada pelo Conselheiro e defendida pelo Quindim, que mal havia em Emília ficar?

E Emília ficou.

Narizinho, porém, que era a que mais conhecia a Emília, não deu crédito àquele pretexto de não ir para não dar escândalo.

- Isso é história dela, vovó! Emília até gosta de escândalo. Quer ficar sozinha eu sei para que é - para sapecar á vontade, fazer alguma coisa ainda mais maluca do que aquela da chave do tamanho. Eu, se fosse a senhora, não a deixava aqui sozinha.

Mas Dona Benta era a democracia em pessoa: jamais abusou da sua autoridade para oprimir alguém. Todos eram livres no sítio, e justamente por essa razão nadavam num verdadeiro mar de felicidade. Emília recusava-se a ir? Pois então que não fosse. Como forçá-la a ir? Com que direito? E que adiantaria ir a contragosto, emburrada? E Emília teve licença para ficar.

Isso foi na própria manhã da vinda do convite. Um mês depois chegava a comissão incumbida de levar Dona Benta.

Essa comissão veio no único navio ainda existente no mundo. Todos os outros estavam repousando no fundo dos mares, vítimas dos submarinos e torpedos aéreos. Dona Benta, arrumou as malas, vestiu o seu vestido de gorgorão amarelo do tempo de D. Pedro II, mandou que tia Nastácia pusesse a saia nova de pintinhas verdes e lá foram as duas para bordo do navio.

Pedrinho e Narizinho acompanhavam a ilustre vovó na qualidade de netos; e o Visconde, com uma gorda pasta de ciência debaixo do braço, seguia na qualidade de Consultor Científico.

Emília, o Conselheiro e Quindim estiveram presentes ao bota-fora na porteira, e ouviram as últimas recomendações de tia Nastácia sobre as galinhas, os porquinhos de ceva e uma ninhada de pintos que já estavam bicando.

- Não se ponham a ajudar os pintinhos a sair da casca senão eles morrem - disse ela. - Pinto sabe muito bem se arrumar sozinho. E não esqueçam de molhar as mudinhas de couve lá na horta.

Ouvindo aquelas recomendações tão sensatas, os homens da comissão entreolharam-se, como quem diz: - "Com pessoas de tão belo espírito prático, e tão cuidadosas de tudo, a Conferência vai ser um verdadeiro triunfo para a humanidade (e não erraram.)"

Assim que se pilhou sozinha, Emília correu ã máquina de escrever e bateu uma  carta para uma menina do Rio de Janeiro com a qual andava já de algum tempo se correspondendo e planejando "coisas."

"Querida Rã:

Estou só - só-só-ró-só-só! Todos foram para a Europa arrumar aqueles países mais amarrotados do que latas velhas e agora preciso que você venha passar uma temporada aqui.

Você é das minhas: das que não concordam. Podemos realizar aquele nosso plano de reforma da Natureza. O Américo Pisca-Pisca era um bôbo alegre. Reformou a Natureza como o nariz dele, e foi pena que a abóbora do sonho não lhe esmagasse a cabeça de verdade.

Seria um bobo de menos no mundo. Nós faremos uma reforma muito melhor. Primeiro reformamos as coisas aqui do sítio. Se der certo, o mundo inteiro adotará as nossas reformas. Sua mãe não há de querer que você venha. É "adulta" e os tais adultos são uns Américos Pisca-Piscas. Mas você vem assim mesmo.

Cheire meia pitada desse pó que vai no saquinho de papel - só meia, se não em vez de parar aqui você vai parar não sei onde. Eles partiram esta manhã e eu já estou me sentindo muito "tênia..." (Depois que Emília soube que "solitária" era sinônimo de "tênia", passou a empregar a palavra "tênia" em vez de "solitária." "Não é gramatical" - dizia ela - "mas é mais curto.")

A Rã, assim chamada por causa da sua magreza de menina de onze anos, era emilíssima, das que não concordam mesmo. Assim que leu a carta, deu dez pinotes e tratou de dividir o pó do saquinho em duas partes "bissolutamente" iguais. Por influência da Emília ela andava usando a palavra "absolutamente" dita dessa maneira.

Antes de reformar a Natureza, Emília já havia feito várias reformas na língua.

- Que está fazendo aí, menina? - perguntou a mãe da Rã, ao vê-la dividindo o misterioso pó.

- Estou "bi" o que leva e trás para que me leve e traga - respondeu ela em linguagem da pitonisa de Delfos (na língua emiliana "bi" queria dizer "dividir em dois.")

A boa senhora está claro que não entendeu coisa nenhuma, mas como já estava acostumada às respostas enigmáticas da filha, deu um suspiro e foi cuidar de outra coisa.

A Rãzinha cheirou o pó, de acordo com as instruções da carta. Imediatamente seus olhos se fecharam e em seus ouvidos cantou o célebre fiunn! Instantes depois sentiu-se largada no chão. Abriu os olhos: um terreiro! Só podia ser o terreiro do sítio. Mas não viu ninguém. A casa, fechada. No ar, só dois sons; um ronco que devia ser do Quindim na soneca do costume e um barulho de mastigação com jeito de ser Rabicó. Ainda sentada e tonta, a menina gritou: - Emília! Emilinha! Emiloca! ...
–––––––––––-
continua…

Folclore dos Estados Unidos (Crenças dos Haida)

Aldeia Haida
Segundo a lenda, quando uma orca aparece em frente de uma aldeia Haida, ela está tentando dizer que ela já foi humana

O Mundo da Terra é plano, e acima há um céu sólido como uma grande bola. Em cima do topo do céu está o País dos Céus. O céu se levanta regularmente, e assim as nuvens se chocam contra as montanhas e fazem barulho.

O Mundo da Terra está suspenso, mas descansa sobre O Sagrado Que Pára e Se Move, e ele repousa sobre uma caixa de bronze. Sobre o peito dele está um poste que alcança os céus.  Quando o Sagrado Que Pára e Se Move está para se mover, uma marta escala o poste fazendo o barulho de trovão que é sempre ouvido antes do terremoto. Porque quando este Sagrado se move, causa um terremoto.

No País dos Céus, o poder maior é de Poder-do-Céu-Iluminado. Ele dá poder a todas as coisas.  As nuvens são seus lençóis. Nuvens de chuva são o disfarce do Pássaro Trovão(1). Quando as penas do Pássaro Trovão farfalham fazem um barulho muito alto.

O Vento Sudeste vive debaixo do mar. O Vento Nordeste permanece ao longo das montanhas do norte.

Há muitas tribos do Povo do Oceano. Agora, na terra dos Haida, que são as ilhas Queen Charlotte a terra e o mar são emaranhadas de uma extraordinária maneira.

Assim é com a terra do Povo do Oceano – o Povo Octopus (2), o Povo Golfinho, o Povo Orca, e o povo Cachalote. De todos os povos do oceano, o povo Orca é o mais poderoso. Eles tem cidades dispersas ao longo da costa, debaixo da água, assim como os índios tem suas aldeias acima, ao longo da costa.

Quando um homem morre na terra dos Haida, ele segue uma trilha até que ele alcança a praia de uma baía. No outro lado da baía está a Terra Fantasma. Então ele chama, e logo aparece do lado oposto uma pessoa empurrando uma balsa. Essa balsa é feita de cascas de cedro de qualidade, como aquelas usadas nos anéis da sociedade secreta. Então a balsa vem de onde estava para o lugar onde o homem está de pé, e carrega ele.

Lá na Terra Fantasma existem inúmeras aldeias, e muitas cabanas em cada uma. Assim, se um homem procura por sua mulher lá, vai levar um longo tempo fazendo isso. Essas aldeias estão em inúmeras enseadas, perto da água, assim como estão as aldeias dos Haida na terra.

Quando comida ou gordura é colocada na fogueira de uma família de uma homem que acabou de morrer, essa comida aparece para ele de imediato, por isso ele não fica com fome. E, se sua família canta canções bem alto quando ele morre, então ele entra orgulhoso na Terra Fantasma, com sua cabeça erguida. É dado a ele um bom nome nessa terra. Mas se os parente não fazem isso, ele entra cabisbaixo na Terra Fantasma, e as pessoas não vêem importância nele. Quando um homem entra na Terra Fantasma há sempre uma dança em sua homenagem.

Pessoas que são afogados vão para a Terra das Orcas.  Nas primeiro eles vão para o Supremo-do-Mar que dá a eles suas barbatanas e então eles vão para as casas de outras orcas. Quando as orcas se reúnem na frente de uma aldeia, se deduz que eles são seres humanos que morreram afogados e agem desse modo para informar às pessoas.

Um homem que foi para a Terra Fantasma, após ter estado lá por um certo tempo, põem todos os seus pertences numa canoa e vai para Xada, que é a segunda Terra Fantasma. Então ele vai para uma terceira, e depois para uma quarta, e então volta para a terra na forma de uma mosca azul. Portanto, quando uma mosca azul esbarra em um homem na terra, ele diz: “este é meu amigo, que me diz dessa maneira que ele me reconhece.”

Em um lugar além da Terra Fantasma, e apenas visível de lá, vive um chefe chamado Grande Nuvem Andarilha.  Ele possui todo o salmão (3 ). Quando um jogador morre, ele vai até Grande Nuvem e joga com ele. Os prêmios são o salmão e fantasmas. Quando Grande Nuvem Andarilha ganha, muitos fantasmas entravam na Terra Fantasma. Quando o jogador ganha, há uma grande migração de salmão.
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Notas:

(1)
Na mitologia indígena norte-americana, um poderoso espírito em forma de pássaro. Pela sua obra, a terra se encheu de água e vegetação. Se crê que o raio é uma faísca de seu bico, e o bater de suas asas produz o trovão. Muitas vezes é representado com uma cabeça extra em seu peito. Ele é frequentemente acompanhado de pássaros espíritos menores, muitas vezes em forma de águias ou falcões. Embora sua lenda seja muito conhecido na América do Norte, muitas figuras similares são encontradas na mitologia da África, Ásia e Europa (onde é associado com o pica-pau).

(2)
O nome devilfish se aplica tanto à manta (arraia gigante), quanto à uma espécie de polvo.

(3)
O salmão chum, Oncorhynchus keta, é uma espécie de  peixe anadromo da família do salmão. É um salmão do pacífico, e também é conhecido como salmão cachorro e salmão Keta , and is often marketed under the name  salmão Silverbrite. O nome salmão chun vem do dialeto Chinook que se originou como uma gíria de comerciantes da pacífico nordeste e que espalhava desde o rio Columbia até o Alaska.  O chum significa “localizado” ou “marcado”, enquanto “Keta” vem dos evenkis da Sibéria oriental.


Fonte:
UDSON, Katherine B. Myths and Legends of British America. 1917.
Texto em portugues obtido em http://casadecha.wordpress.com

Leon Eliachar (O Drama de Cada Dois)

Num país onde o divórcio é uma perspectiva e o casamento uma falta de perspectiva, a maioria dos casais sofre problemas os mais disparatados que nem eles próprios conseguem resolver. Daí apelarem para o bom senso (ou falta de) dos colunistas especializados em pôr em ordem os distúrbios neurovegetativos de cada um. Como se vê, o desespero e a falta de preparo emocional para a convivência em comum, levam os pares humanos a pedir conselhos a pessoas estranhas ao serviço. Essas receitas apressadas, nem sempre decidem um destino apoiado na insensatez. No meu caso, sempre achei útil levar minha experiência e o meu profundo conhecimento dos enguiços da alma até aqueles que precisam de um bisturi moral. Respondo a essa gente em "curto-circuito", certo de que encontrarão em minhas palavras um fusível para os seus casos.

CARTA:
Gostaria muito de conhecê-lo pessoalmente, é possível? (Paula, ou Paulo - Gávea)

RESPOSTA:
Levei sua carta à farmácia, pra saber se o seu nome termina com "a" ou com "o".  Não pude saber: deram-me um remédio e me mandaram tomar de duas em duas horas.

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CARTA:
Meu marido nunca usou aliança, desde que nos casamos. (Vladmira — Florianópolis)

RESPOSTA:
0 importante no casamento, Vladmira, não é que o homem use a aliança — é que use a mulher.

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CARTA:
Sempre que vou à praia, meu marido exige que eu fique deitada de costas. Resultado: estou com a frente preta e as costas completamente brancas. O senhor acha isso normal? (Sandrinha - Guarujá)

RESPOSTA:
Gosto não se discute, Sandrinha. Vai ver, seu marido gosta de mulher de banda branca.

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CARTA:

Meu marido deu pra ver televisão de cabeça pra baixo, preciso tomar uma providência. (Jupira Nilópolis)

RESPOSTA:
Isso não é tão grave. Procure ver se a sua tevê está na posição certa. Se não estiver, chame um técnico pra examinar o aparelho; se estiver, peça ao técnico pra examinar seu marido. Há maridos que andam com a cabeça virada, às vezes é só trocar uma válvula. Mas não deixe, em hipótese alguma, levarem seu marido pra oficina: ele voltará pior do que estava.

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CARTA:
Minha mulher costuma receber flores quase diariamente e sempre rasga o cartãozinho sem deixar eu ver de quem é e coloca as flores numa jarra com todo o carinho. (Augusto – Magé).

RESPOSTA:
Seja sensato: pior seria se ela rasgasse as flores e colocasse os cartõezinhos na jarra, com carinho.

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CARTA:
Acordei sobressaltado com os gritos da minha mulher gritando "fogo! fogo". Quando abri os olhos, havia um homem saindo pela janela. (Adalberto Barbacena)

RESPOSTA:
Então, meu caro, é fogo mesmo.

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CARTA:
Gravei o sonho do meu marido e gostaria que o senhor ouvisse. (Iracema - Santos)

RESPOSTA:
Com todo prazer. Mas de preferência quando ele estiver dormindo.

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CARTA:
Minha mulher tem ido demais ao dentista e só chega em casa de noite. Resolvi segui-la e de fato ela estava no dentista. (Mauro - Sorocaba)

RESPOSTA:
Agora experimente seguir o dentista.

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CARTA:
Depois que meu marido comprou um automóvel nunca mais saiu de casa. (Raquel - Salvador)

RESPOSTA:
Você devia ficar feliz com isso. Pior se ele comprasse uma casa e nunca mais saísse do automóvel.

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CARTA:
Contratei um detetive pra seguir meu marido e comecei a seguir o detetive para ver se de fato ele seguia meu marido. Um dia encontrei o detetive batendo 0 maior papo com meu marido. Devo contratar outro detetive? (Mabel - Petrópolis)

RESPOSTA:
0 mais prudente é contratar outro marido.

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CARTA:
Tenho sido insistentemente pedida em casamento, mas não sei se devo aceitar por causa da diferença de idades: ele tem 42 e eu 18. (Ofélia - São João Del Rei)

RESPOSTA:
A diferença de um homem para uma mulher não é idade, Ofélia. Medite bem nisso.

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CARTA:
Minha mulher passa horas no telefone e nunca me diz com quem está falando. (Fernando – Piracicaba)

RESPOSTA:
Seja homem e tome uma atitude. Chegue perto de sua mulher e lhe diga frontalmente: "você sabe com quem está falando?” Depois, prepare-se.

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CARTA:
Em frente à minha casa, todas as noites, fica um homem de terno cinza acenando para a minha mulher. Ela insiste em dizer que se trata de uma estátua e não posso conferir, pois sou paralítico e ela não me leva até lá. (Zé Eduardo - Volta Redonda)

RESPOSTA:
Sua mulher é muito sensata. Já imaginou se ela o leva até lá e a estátua sai correndo? Além de paralítico, você acabaria débil mental.

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CARTA:
Tenho medo de dormir sozinha e meu marido trabalha de noite. (Maria Clara - Copacabana)

RESPOSTA:
Ligue para uma dessas agências de empregados e peça um acompanhante. Eles têm de tudo. Se um dia o seu marido passar a trabalhar de dia, vai ser o diabo pra se livrar do acompanhante.

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CARTA:
Peguei um trem e só quando cheguei em casa foi que reparei que dentro da minha capa havia um homem. (Arnalda - Engenho de Dentro)

RESPOSTA:
E o que foi que você fez: botou a capa no armário, com homem e tudo, ou guardou só a capa? Esse detalhe, embora não pareça, é muito importante para ajudá-la.

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CARTA:
Durante o noivado, minha noiva fazia questão de levar um primo para todos as nossos programas. Agora, que nos casamos, ela faz questão que ele venha morar conosco, pois o coitadinho é órfão. Que acha disso? (Orfeu - Taubaté)

RESPOSTA:
Depende do tamanho do primo. Se for pequenininho, acho que vai dar muito trabalho a ela. Se for grandinho, vai dar muito trabalho a você.

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CARTA:
Há vários anos que meu marido não me dá um par de sapatos, no entanto troca de carro todos os anos. (Ariana - Teresópolis).

RESPOSTA:
Há maridos que custam a se decidir, minha cara. A mulher deve ter paciência. Agüente a mão, ou melhor, agüente o pé.

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CARTA:
Minha mulher deu pra desconfiar de mim, logo agora que vamos completar cinqüenta e seis anos de casados. (Luis Jorge – Encantado)

RESPOSTA:
Já desconfia tarde.

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CARTA:
Meu psicanalista está doido, disse que eu precisava me casar com um psicanalista e acontece que já sou casada com um psicanalista, que é justamente ele. (Beatriz - Niterói)

RESPOSTA:
Então ele demonstrou ser um ótimo psicanalista e um péssimo fisionomista.

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CARTA:
Meu farmacêutico é anão e toda vez que vem me dar injeção, meu marido proíbe. Acha que eu seria capaz de simpatizar com um anão? (Florilda - Recife)

RESPOSTA:
Não acredito que seu marido tenha alguma coisa contra o anão. Talvez seja porque ele, ao aplicar a injeção, não alcance o seu braço.

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CARTA:
Todas as manhãs, quando abro o armário, meu terno marrom sai andando e pega o elevador. (Alcinó - Espírito Santo)

RESPOSTA:
Por enquanto, não há perigo. Chato vai ser quando seu terno marrom sair e voltar azul.

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CARTA:
Passei três meses viajando pra esquecer um homem e agora não me lembro mais quem é ele. (Harilda - Pelotas)

RESPOSTA:
Faça outra viagem pra ver se se lembra.

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CARTA:
Os vestidos de minha mulher encolheram e ela não manda fazer outros, fica com o busto de fora e não pode sentar sem mostrar os joelhos. E quer me convencer que está na moda. (Pedrinho - Brasília)

RESPOSTA:
De uma certa forma, sua mulher está com a razão: busto e joelho de mulher não caem nunca da moda, pelo menos enquanto não completam cinqüenta anos.
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CARTA:
Sempre que vou ao cinema com minha mulher, ela senta em cima e eu embaixo. O senhor acha isso normal? (Alfredo - São Paulo)

RESPOSTA:
Absolutamente, acho isso ridículo. E os vaga-lumes, não dizem nada? Se sua mulher é muita pesada, o lógico seria você sentar em cima.
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CARTA:
Meu marido passa as noites escrevendo o seu diário. Mas isso é o de menos, o pior é que costuma escrever com um garfo. (Ira - Rio)

RESPOSTA:
Consulte um garfologista.

Fonte:
ELIACHAR, Leon. O Homem ao Cubo. RJ: Álvaro Editor, 1964.

Bernardo Guimarães (Poemas Humorísticos e Irônicos : Mote Estrambótico)

Mote

Das costelas de Sansão
Fez Ferrabrás um ponteiro,
Só para coser um cueiro
Do filho de Salomão.

Glosa
Gema embora a humanidade,
Caiam coriscos e raios,
Chovam chouriços e paios
Das asas da tempestade,
— Triunfa sempre a verdade,
Com quatro tochas na mão.
O mesmo Napoleão,
Empunhando um raio aceso,
Suportar não pode o peso
Das costelas de Sansão.

Nos tempos da Moura-Torta,
Viu-se um sapo de espadim,
Que perguntava em latim
A casa da Môsca-Morta.
Andava, de porta em porta,
Dizendo, muito lampeiro,
Que, p’ra matar um carneiro,
Em vez de pegar no mastro,
Do nariz do Zoroastro
Fez Ferrabrás um ponteiro.

Diz a folha de Marselha
Que a imperatriz da Mourama,
Ao levantar-se da cama,
Tinha quebrado uma orelha,
Ficando manca a parelha.
É isto mui corriqueiro
Numa terra, onde o guerreiro,
Se tem medo de patrulhas,
Gasta trinta-mil agulhas,
Só para coser um cueiro.

Quando Horácio foi à China
Vender sardinhas de Nantes,
Viu trezentos estudantes
Reunidos numa tina.
Mas sua pior mofina,
Que mais causou-lhe aflição,
Foi ver de rojo no chão
Noé virando cambotas
E Moisés calçando as botas
Do filho de Salomão.

Aluísio Azevedo (O Coruja) Parte 47 , final

CAPÍTULO XXVIII

Dadas as providências para o enterro do velho Caetano, Teobaldo tomou algumas colheres de caldo e meteu--se na cama, recomendando que não o chamassem.

Passou o dia inteiro na modorra da febre e à noite foi necessário buscar o médico, porque o seu incomodo recrudescia. O médico examinou-o e declarou que havia uma congestão de fígado. Era, pois, indispensável para o doente evitar todo e qualquer abalo moral e submeter-se a um rigoroso tratamento, sem o que podia sobrevir a hemoptise, e a coisa tornar-se então muito mais séria. Acudiu logo muita gente com a notícia da moléstia de S. Exa.; como, porém, o doutor havia proibido ao enfermo falar a alguém, contentavam-se todos com deixar o cartão de visita; só o Coruja não levou lá o seu nome, porque nunca passava do portão do jardim e entendia-se com os criados inferiores.

Hipólito e D. Geminiana achavam-se então na fazenda e por isso não deram sinal de si.
Todavia, e apesar dos afetados desvelos de tanta gente, a hepatite do senhor conselheiro progredia, agravada agora por uma lesão pulmonar, cujos sintomas já se denunciavam. Ele, muito abatido, o rosto cor-de-oca, a barba de quatro dias, os olhos fundos e tingidos de amarelo, mostrava-se muito desanimado e com um grande medo de morrer.

O médico ia vê-lo três vezes ao dia e de todas lhe recomendava a mais completa tranqüilidade de espírito. O doente sorria ao ouvir estas palavras. Uma noite mandou chamar a mulher. Ela não se fez esperar e correu ao quarto do marido. A enorme transformação, que lhe notara logo ao primeiro golpe de vista, impressionou-a vivamente; contudo quedou-se fria e contrafeita à porta da alcova, como se estivesse defronte de um estranho.

— Branca!... Murmurou ele, volvendo para a esposa os olhos já despidos do primitivo encanto.

— O médico recomendou que lhe não deixassem falar... Respondeu ela, sem sair do ponto em que se achava.

— Venha para junto de mim, pediu o infeliz; preciso do seu perdão.

Branca aproximou-se dele, recomendando de novo que se calasse. Teobaldo, quando a sentiu ao alcance de suas mãos, quis abraçá-la. Branca retraiu-se com um movimento espontâneo, no qual só transparecia repugnância. Ele fechou os olhos e deixou cair a cabeça sobre os travesseiros. Ela então adiantou-se, arrependida talvez de o haver contrariado, mas soltou logo um grito, porque o marido sentindo congestionar-se-lhe o sangue no pulmão, erguera-se de súbito, sufocado por uma golfada de sangue. Era a hemoptise.

O quarto encheu-se de estranhos; uma balbúrdia formou-se em torno de Teobaldo; todos queriam socorrê-lo, mas ninguém o conseguia; o sangue lhe golpejava pelas ventas e pela boca.

O médico, quando entrou daí a nada, declarou-o morto.

CAPÍTULO XXIX

O fato, mal caiu em circulação, abalou deveras o público. Desde as nove horas da manhã notou-se na cidade um movimento anormal de ordenanças a cavalo e de tílburis, que subiam e desciam a todo o trote a praia de Botafogo.

No dia subsequente cada folha das diárias, trouxe na sua parte editorial um artigo de fundo a propósito do ilustre morto. Tudo que se pode dizer sobre um político e sobre um homem de talento publicou-se a respeito de Teobaldo; publicou-se em tipo grande, entrelinhado e guarnecido das melhores flores de retórica de que dispunham as redações; mas, no que pareciam ajustadas, era em glorificar o falecido como um peregrino exemplo de honestidade e retidão.

"Ainda há bem pouco tempo, dizia um dos jornais mais acreditados, tinha o insubstituível cidadão que a morte acaba de arrebatar-nos, a seu cargo uma das pastas mais rendosas, do ministério, e talvez, afora a da Fazenda, a que melhor se presta a certos manejos de especulação e, no entanto bem ao contrário do que é de costume entre nós, ele morreu pobre, paupérrimo, a ponto de se lhe encontrar em casa apenas um pouco de dinheiro em papel e quase nenhum objeto de valor. Só este fato, pela sua raridade, é mais que o bastante para dar idéia de quem foi Teobaldo Henrique de Albuquerque colocar o seu nome entre os daqueles que figuram no Panteão da História, cercado de glória, abençoado pela sua geração e eternamente benquisto pela humanidade."

Toda a imprensa se mostrou empenhada em que o governo estabelecesse imediatamente uma pensão à viúva de festejado defunto, e tal foi o entusiasmo que semelhante morte encontrou no público e até entre os colegas do morto que na câmara chegaram a falar em erigir-lhe uma estátua. Em uma subscrição para este fim aberta, figurava em primeiro lugar a assinatura de Afonso de Aguiar com a quantia de quinhentos mil réis.

Poucos, muito poucos dos enterros que têm havido no Brasil, poderiam rivalizar com o que ele teve. Parecia que se tratava da morte de um príncipe, tal era o acerto do gosto, a boa disposição artística; tal era a distinção, o luxo aristocrático daquelas cerimonias, que a gente tinha vontade de acreditar, que por ali andava o dedo do próprio Teobaldo e que tudo aquilo era obra dele. Dir-se-ia que de dentro do seu rico caixão, coberto de crepe e engenhosamente entretecido de fúnebres coroas, Teobaldo dirigia o solene préstito que o acompanhava à sepultura. Esperava-se ver a cada momento surgir entre as abas do caixão a cabeça do grande homem de gosto, exclamando para algum soldado que saíra da fileira:

— Mais para a direita! Para a direita! Em linha!

E, todo aquele reluzir de dragonas e comendas, e todo aquele deslumbramento de fardas bordadas, aquele cintilar de armas em funeral, e mais aquela marcha cadenciada da tropa; tudo se casava admiravelmente com a impressão gloriosa que Teobaldo deixava gravada na alma do povo, desse mesmo povo que ele dominou com a sua encantadora figura de fidalgo revolucionário e com o seu fino espírito de diplomata apaixonado pelas multidões.

Coruja estava na rua, quando lhe deram a notícia da morte do amigo. Ao contrário do que esperavam todos, ele a ouviu sem soltar uma palavra de dor ou derramar uma lágrima; apenas lhe notaram certa contração no rosto e um quase imperceptível sorriso de desdém. Contudo, atirou-se logo para Botafogo e, quando deu por si, estava defronte da casa do falecido, sem aliás sentir ânimo de levar àquelas magníficas salas em luto o seu pobre tipo farandolesco e miserável.

Acompanhou o enterro de longe, a pé, coxeando como um cão ferido que segue a carruagem do dono. Ao chegar ao cemitério já as formalidades do estilo estavam cumpridas. Um coveiro em mangas de camisas socava a sepultura de Teobaldo, e a multidão, que o acompanhara até aí, punha-se em retirada, com pressa, como quem volta de fazer uma obrigação e quer aproveitar ainda o resto do tempo.

Coruja parou cansado e encostou-se numa sepultura, a olhar estranhamente para tudo aquilo. O cemitério recaía aos poucos na sua pesada sonolência, enquanto os últimos clarões do dia descambavam no horizonte em um rico transbordamento de cores siderais. Já as montanhas ao fundo se cobriam de azul escuro e os ciprestes rumorejavam as primeiras horas da noite.

Ouviam-se rolar ao longo da rua as derradeiras carruagens que se retiravam e, de espaço a espaço, uma pancada surda e desdobrada pelo eco. Era a maceta do coveiro que socava a terra,

Coruja seguiu, coxeando, a direção dessas pancadas e, chegando à sepultura do amigo, ficou a contemplá-la em silêncio.

— Quer alguma coisa? Perguntou-lhe o coveiro.

— Nada, não senhor, respondeu André.

— Pois então é andar, meu caro, que são horas de fechar o cemitério!

Com efeito, quando os dois chegaram ao portão, já o guarda os esperava sacudindo as suas chaves.

Coruja, logo que se viu só, encostou-se ao muro do cemitério e começou a soluçar.

Chorou muito, até que um fundo cansaço se apoderou dele voluptuosamente. Sentia-se como que arrebatado por um sono delicioso; mas caiu logo em si, lembrando-se de que já se fazia tarde e naquele dia, distraído com a morte do amigo, descuidara-se da gente que tinha à sua conta.

E manquejando, a limpar os olhos com a manga do casaco, lá se foi, rua abaixo, perguntando a si mesmo "Onde diabo iria, àquelas horas, arranjar dinheiro para dar de comer ao seu povo?..."

FIM

Vocabulário de termos e expressões regionais e populares do Centro Oeste (Mato Grosso e Goiás) C, D e E

CABANO — Bovino de chifres inclinados para baixo.

CABRITO — Homem de côr parda; mulato.

CACHAÇO — Porco reprodutor; varão.

CADIQUINHO — Um pouquinho; um bocadinho.

CAITITU — Porco do mato, menor que o queixada e que eriça o pêlo quando enraivecido.

CALABOUÇO — Poço de monjolo, onde cai a água que se escoa do cocho.

CALHAU — Pedregulho grande.

CAMARADA — Assalariado: jornaleiro de serviço rural; guia de viagem; auxiliar de tropa.

CAMBÃO — Tirante que vai da canga ao cabeçalho da mesa do carro de bois; leva de madeira. Diz-se que a mulher pulou o cambão: praticou adultério.

CANDANGO — Trabalhador deslocado. Em Brasília a expressão é extensível a todos os assalariados. Antigamente os africanos designavam assim os portugueses.

CANDIEIRO — Aquele que guia os bois do carro; vai sempre com uma vara às costas, mas não chucha. O carreiro é o que segue a boiada do carro, ao lado e chuça.

CANELA-DE-EMA — Planta de tronco pilroso, característica dos altos chapadões. O caule sustenta o fogo aceso e é muito útil nas estivas de estradas. Predomina nas cercanias de Brasília. Com o caule, faz-se uma brocha para caiação de casa.

CANGA — Peça de madeira que vai aos pescoços dos bois. É pela canga que se faz a tração do carro.

CANGUÇU — A maior onça brasileira. Pintada.

CANZIL — Fueiro que enfia na canga, dois para cada boi, ao pescoço. Dança de macho com macho.

CAPA (pop.) — Cápsula medicamentosa.

CAPANGUEIRO — Comprador de diamante nos garimpos.

CARCUNDA, CACUNDA — Costas, dorso do corpo humano.

CARGA-DE-FUMO — Dois rolos de fumo que se conduz um de cada lado do animal. O fumo enrolado mede 32 metros de comprimento. Meia carga: um rolo com 16 metros.

CARMO DA BAGAGEM — Cidade mineira famosa pelas pedras de grande valor, encontradas nos seus garimpos. O seu nome atual é Estrela do Sul. Foi lá que encontraram o diamante Getúlio Vargas.

CATA — Abertura no solo para pronta do garimpar.

CATANA — Parte do jacaré que fica entre rabo e o corpo; é a melhor porção para se comer.

CATINGUEIRO — Capim melado, capim gordura; veado da catinga (mato baixo e seco).

CATIRA — Cateretê; dança de roceiros.

CHAMPRÃO (corrupt.) — Prancha, pranchão.

CHIFRAINA — Depreciativo, reles banda de música da roça.

CINCHA — Correia ‘com que se afirma a cangalha e a carga ao corpo do animal.

CINCHAR — Apertar a chincha.

CHUPE — Abelha agressiva, que constrói grandes colmeias em troncos de árvores altas, etc.

CIGARRO DE CORDA — Cigarro de palha de milho e fumo de rolo.

CIPÓ — Faca fina e comprida.

COCA — Galinha-de-angola.

COIVARA — Amontoado de paus e galhadas, no roçado, não queimados.

COIVARAR — Juntar galhos e madeiras não queimadas, na roça, para nova queima.

COMETA — Mascate ou viajante, carregando consigo amostras ou mesmo mercadorias. Os cometas eram famosos. Levavam uma boa tropa, inclusive a madrinha, que puxava a tropa e era sempre ou uma besta muito boa ou uma . eguinha branca, muito bonitinha. Trazia os cincerros e mais enfeites guardados e tirava-os perto do comércio. A madrinha era enfeitada, cheia de sedas, reluzentes cincerros, penacho na cabeça e muita pompa. O cometa enchia o balcão do comerciante de tudo quanto era amostra. O comerciante antigo do interior não comprava por conversa. Queria ver e palpar o artigo para mandar vir tantos metros disto, tantas enxadas, tantas foices e machados, tantos pares de sapatos, enfim, de tudo.

CORNIMBOQUE — Binga de isqueiro, feito de ponta de chifre.

CORÓ — Verme; larva que se desenvolve em madeira podre.

CORRUMAÇA — Carga de doenças venéreas. "O libertino apanhou uma corrumaca…"

CORRUTELA — Aldeiamento provisório de garimpeiros.

COXINILHO — Tecido peludo de lã ou algodão que se coloca sobre o arreio do animal ou na boléia dos carros.

CUERA (é) — Ruim, ordinário

CURUMI — Menino índio.

D

DE GRITO — Expressão usada pelos sertanejos para indicar distância perto. Eles usam espichar o beiço inferior e dizer: "é ali mesmo; é bem ali…" (vai andar pra ver).

DERRADEIRO — Último. Expressão muito usada. "Chegou por derradeiro…"

DESENFURNAR — Pôr para fora; desentocar; tirar da furna (os cachorros desenfurnaram a onça).

DESGUARITAR — Desgarrar; arribar; fugir.

DESMASELO (pop.) — Alfinete de pressão.

DILATAR — Demorar.

DIVINO PAI ETERNO — Interjeição em Goiás. É o "meu Deus" dos goianos.

DOCE — Açúcar.

E

EITO — Tarefa de serviço rural: eito de capina, de roçado etc.

EMBURRADO — Calhau enorme: bloco de pedra que contém minério.

EMPACHAR — Constipar; ter endurecimento do ventre…

EMPACHO — Prisão de ventre; dureza de intestinos; comida parada no estômago…

EMPATAR — Atrapalhar; estorvar… "Não desejo empatar os seus negócios…"

EMPREITEIRO — Palavra de cangaço que significa aquele que pega um "serviço" ou um "trabalho" para fazer.
Dizem que certa vez um fazendeiro se indispôs com um seu vizinho que lhe havia soltado o gado na roça. Este, no auge da raiva, procurou um "empreiteiro" para matar o tal vizinho. Ofereceu–lhe quatro contos de réis mais uma mula muito boa e ainda uma carabina não menos boa. Este assassino profissional residia na cidade. Ficou assentado o "serviço" para o dia tal. Na noite, véspera do crime, o fazendeiro fêz um exame de consciência e não pôde. dormir. Arrependeu-se do negócio, pois ele não era disso. Madrugou na casa do "empreiteiro". A mulher disse que ele estava na igreja. O fazendeiro alegrou-se com aquilo e dirigiu-se para lá. Entrou. O homem lá estava ajoelhado. O fazendeiro acercou-se cauteloso: — Ainda bem que o encontrei. Vim lhe dizer que pode ficar com os quatro contos, com a besta e a carabina, conquanto que não conte a ninguém, mas o "serviço" não quero mais não. Que fica para outra ocasião. Matar um homem por tão pouco não convém, não assenta em mim. — Tarde demais, meu coronel: um "trabalhador" como eu, "faz o "serviço" é bem cedo: já estou aqui de velho, rezando pela alma do finado…

ENCAFUAR — Esconder; guardar.

ENCOIVARAR — O mesmo que coivarar.

ENTOJADO — Pretensioso, enfatuado.

ENTOJAR-SE — Enf atuar-se; tornar-se soberbo; ter mania de superioridade.

ERADO — Adulto; "Boi erado".

ESCANCHELADO — Relaxado; Desmontado.

ESCARAFUNCHAR — Procurar com reboliço, remexer objetos; não deixar lugar algum sem busca.

ESCORVAR — Pôr um tico de pólvora no ouvido da arma.

ESPINHELO — Espinel: uma corda que atravessa o rio com várias pindas. Há espinel com mais de duzentos anzóis.

ESTAFERMO: Bobo; Sujeito maltrapilho.

ESTALEIRO — Latada; estaleiro para chuchus, parreira; etc.

ESTIVA — Secagem de um atoleiro por meio de paus, bagaços e saibro.

ESTIVAR — Secar uma passagem pantanosa.

ESTORVO — Impedimento. Estorvar; impedir; atrapalhar.

ESTRADA REAL — Estrada principal.

ESTRUDIA (corrup) — no outro dia.

ESTUGAR — Mandar para a frente (animais).

ESTUMAR — Atiçar. "Estumar o cão".

ESTUQUE (pop.) Forro de casa (em geral).

ESTÚRDIO — Extravagante; esquisito; tonto.

ESTURRAR — Urro da onça pintada, canguçu. A pintada não só esturra como dá grandes estalos com as orelhas, parecendo a quebra de um pequeno galho seco; depois dá outro; no terceiro, já está em cima da presa.

ÊTA! — Exclamação que indica admiração; muito comum em Goiás.

Fonte:
Estórias e Lendas de Goiás e Mato Grosso. Seleção de Regina Lacerda. . Ed. Literat. 1962

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

A. A. de Assis (Revista Virtual de Trovas “Trovia” – n. 166 - outubro de 2013)


No portão, os namorados
são como barcos no cais:
pelos beijos amarrados,
querem ir e ficam mais.
Cleonice Rainho
-
Juntamos nossos farrapos
naquele rancho sem flor:
era a miséria dos trapos
numa fartura de amor.
J. Guedes
-
Saudade quase se explica
nesta trova que te dou:
saudade é tudo que fica
daquilo que não ficou.
 Luiz Otávio
-
Na blusa prendes a rosa
à altura do coração.
Como pode ser viçosa
uma flor sobre um vulcão?!
Miguel Russowsky
-
No amor é bom ter cuidados
para evitar dissabor...
Nem sempre em beijos trocados
trocam-se beijos de amor.
Milton Nunes Loureiro
-

Eu faço agora um reparo,
embora você não faça:
– Se o nosso amor é tão caro,
por que brigamos de graça?
Roberto Medeiros

 
Se o teu beijo, que inebria,
deixasse os lábios doendo,
o bairro não dormiria,
com tanta gente gemendo!...
Edmar Japiassú Maia – RJ
-
De surpresa, muitas vezes,
vinha o noivo da vizinha...
E, depois de nove meses,
nasceu uma surpresinha...
Flávio Stefani – RS
-
A morena, quando passa,
no molejo das cadeiras,
deixa nos olhos a graça;
no pensamento, besteiras!...
J. J. Germano – RJ
-
Mulher de marido forte,
dando sopa a moço guapo,
se o moço não for de sorte,
a “sopa” acaba em so-papo!
José Ouverney – SP
-
Sou louco quando preciso
e o remorso não me assalta;
eu nunca tive juízo
e ele nunca me fez falta...
Milton S. de Souza – RS
-
Nas capelas, a candura
das esposas nas novenas.
Fora delas, a aventura
dos maridos “noutras” cenas...
Olga Agulhon – PR
-
Uma avestruz comilona
engoliu meu ioiô novo,
e faz dias que a glutona
vem botando o mesmo ovo!
Renata Paccola – SP
-
Com a bagunça rolando,
sem ter mais o que falar,
chilique, de vez em quando,
bota tudo no lugar!
Selma Patti Spinelli – SP


 

Vai, riozinho, sem pressa...
lembra ao mar, sem raiva ou mágoa,
que ele é grande, mas começa
num modesto olhinho d’água!
A. A. de Assis – PR
-
Quem espera sempre alcança...
Mas eu em lutas me ponho:
sou guerreira da esperança,
vivo em busca do meu sonho...
Adélia Woellner – PR
-
Sei que  a vida é muito dura
e por isso não me iludo,
mas sonhar não se segura
e em sonhos alcanço tudo.
Almir Pinto de Azevedo – RJ
-
Não desgastes, noutros leitos,
o ardor dos abraços teus,
pois teus braços foram feitos
para refúgio dos meus.
Almira Rebelo – MG
-
Não acredites em quem
te promete amor e paz
sem explicar de onde vem,
o que quer nem o que faz.
Amaryllis Schloenbach –SP
-
Xícaras postas na mesa
e o café sobre o fogão...
Só não aguento a incerteza
se você virá ou não.
Antonio Seixas – RJ
-
O amor, para muita gente,
é diversão perigosa.
Quem não sabe ser prudente
transforma em espinho a rosa.
Arlene Lima – PR
-
Conquista espaços, direitos,
mas, escrava da emoção,
a mulher pinta conceitos
com tintas do coração!
Carolina Ramos – SP
-

Há na tragédia da fome
este mistério profundo:
É Cristo quem se consome
em cada pobre do mundo.
Clevane Pessoa – MG
-
Velhas fotos! Que saudade!
Imagens bem conhecidas
dos tempos da mocidade,
dos fatos das nossas vidas...
Colavite Filho – SP
-
Teu grande amor, que ironia,
é hoje coisa esquecida...
– Foi luz que por um só dia
iluminou minha vida.
Conceição Assis – MG
-
Quanto mais a idade avança,
no longo tempo a correr,
eu tenho mais esperança
e mais prazer em viver...
Cônego Telles – PR
-
Gracias a los sembradores
que han tomado conciencia,
pues serán consechadores
de las mies por su prudência,
Cristina Oliveira Chávez – USA
-
Do vale emergi ao topo,
da relva virei madeira,
do poço fui ao escopo
e em tudo fui verdadeira.
Dáguima Verônica – MG
-
Cem vezes tu repetiste
que me amavas loucamente...
Cem vezes tu me mentiste
e cem vezes eu fui crente!
Delcy Canalles – RS
-
Trovador!  Que trova fazes?
– Amigo, nem sei dizer!
Com ela, já fiz as pazes,
casados até morrer!
Diamantino Ferreira – RJ
-
Agora, que tu partiste,
sinto a força da verdade
do grito de dor que existe
no silêncio da saudade.
Domitilla B. Beltrame – SP
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Do que agitou nossas almas
restam sonhos calcinados,
cingindo as crateras calmas
de dois vulcões apagados.
Dorothy Jansson Moretti – SP
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Cantarão céu, terra e mar
em harmonia festiva,
quando o mundo se tornar
a Grande Cooperativa.
Élbea Priscila – SP
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Aplauso é luz de dois gumes...
Cuidado... avisa o teu ego...
O excesso, às vezes, de lumes,
transforma o sábio num cego...
Eliana Dagmar – SP
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Criança muito levada,
que corre, chuta e sacode...
Que disciplina, que nada:
-- Casa da vó tudo pode!
Eliana Jimenez – SC
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Não culpe a mãe por problemas
que você sofre hoje em dia;
ela teve os seus dilemas
tentando dar-lhe alegria!
Eliana Palma – PR
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No tear da solidão,
rendeiro em dias tristonhos,
basta um fio de ilusão
para tecer os meus sonhos!
Elisabeth Souza Cruz – RJ
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Este orgulho que carregas,
insano, dentro do peito,
foge tão logo te entregas
de corpo e alma em meu leito.
Ester Figueiredo – RJ
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Este silêncio, tão mudo,
que o nosso olhar escondia...
nos fez sentir quase tudo
de tudo o que eu já sentia!
Eva Yanni Garcia – RN
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Pão, alimento completo.
Foi, por Deus, abençoado
e, pelo Filho Dileto,
com seu corpo comparado.
Evandro Sarmento – RJ
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Nesses conflitos da Terra,
a minha fé se refaz,
vendo que a bomba da guerra,
não vence a pomba da paz!
Francisco Garcia – RN
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Quem não tem família sente
a triste ausência dos seus,
porque a família presente
faz-se um presente de Deus.
Gabriel Bicalho – MG
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Qual fosse uma exímia artista,
a formiguinha (em verdade),
com dotes de equilibrista
desafia a gravidade!
Gasparini Filho – SP
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O progresso traz mudanças,
cria fábricas e usinas,
mas se esquece das crianças
que dormem pelas esquinas!
Gerson César Souza – PR
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Sou tão triste e tão sozinha,
que o eco do meu lamento,
desta saudade tão minha,
escuto na voz do vento!
Gislaine Canales – SC
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Quando o inverno se despede,
dá lugar à primavera;
de pronto o perfume excede,
anunciando a nova era.
Hulda Ramos – PR
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Saudoso comprei passagem
de retorno a minha infância.
Mas como seguir viagem
se eu nem mais sei a distância?
Humberto Del  Maestro – ES
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Vou perdendo todo o encanto
e a mais saudosa lembrança,
mas guardo ainda, num canto,
um restinho de esperança...
Istela Marina – PR
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Não há dor mais dolorida
do que a tristonha aparência
de quem matou pela vida
a sua própria inocência.
J.B. Xavier – SP
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Se palavras são em vão
ao amigo, no fracasso,
externo a minha emoção
no silêncio de um abraço.
J.B.X. Oliveira – SP
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O Almanaque Santo Antônio e a Folhinha do Sagrado Coração de
Jesus (Editora Vozes) – 2014 trazem numerosas de trovas. Confira.

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Fizeste tanto mistério
sobre o que por mim sentias,
que, quando falaste a sério,
já não cri no que dizias.
Jaime Pina da Silveira – SP
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Dei-te o melhor dos abraços,
do mais profundo querer...
Mas a força dos meus braços
não conseguiu te prender!
Janske Schlenker – PR
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Não sei se é pecado ou vício,
bobeira... sei lá mais quê
este agridoce suplício
de só pensar em você!
Jeanette De Cnop – PR
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Vivo em busca de carinho,
em castelos de ilusão...
Tanto tempo estou sozinho,
quem me aquece é a solidão.
José Feldman – PR
-
Se a vida, nos rios, nada;
nos galhos, brinca e balança,
podemos plantar na estrada
um novo pé de esperança.
José Lucas de Barros – RN
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Minha vida é tão vazia...
e ronda tanto a incerteza,
que, mesmo tendo alegria,
aperto a mão da tristeza!
José Messias Braz – MG
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Tuas cartas, minha linda,
contêm uns dons estranhos:
transmitem ternura infinda
paz em pequenos tamanhos!
Laérson Quaresma – SP
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Humor exige tempero, / porém na exata medida. /
Se na pimenta há exagero, / a graça resulta ardida... (aaa)

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Eu fui deixando um a um
meus vícios e compulsões...
E feliz, hoje, em jejum
me alimento de emoções
Lisete Johnson – RS
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Nessa vereda que é a vida,
vou de tropeço em tropeço,
pois cada nova subida
é sempre um novo começo.
Luiz Carlos Abritta – MG
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Qual o filho mais querido,
aquele que a mãe mais gosta?
Se existe algum preferido,
nem ela sabe a resposta!
Luiz Hélio Friedrich – PR
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Imortal não sou agora,
mas eu tenho uma alegria:
– Sou poeta e ao “ir-me embora”...
deixo um rastro de poesia!
Ma. Lúcia Daloce – PR
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A imensidão desse amor,
que me transcende o presente,
faz suportar minha dor
quando o seu corpo está ausente.
Mª Luíza Walendowsky – SC
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Sabedoria... só cabe
a quem tem por diretriz
não dizer tudo o que sabe,
mas... saber tudo o que diz.
Ma. Madalena Ferreira – RJ
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Saibam todos que o trabalho
ao homem bom enobrece;
mas quem não pega no malho,
seu espírito empobrece!
Maurício Friedrich – PR
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Uma flor a florescer,
nunca vi coisa mais bela,
parece o amor renascer,
entrando pela janela.
Neiva Fernandes – RJ
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O planeta está fadado
a sumir completamente,
pois a força do machado
já supera a da semente.
Nélio Bessant – SP

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Mais fraternidade. Mais criatividade. Menos competição.
A beleza maior da trova é fazer do amigo um irmão.

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Nossa união, fortes elos,
mostra ao mundo seu valor;
traça ao vivo paralelos
do que restou desse amor.
Olga Ferreira – RS
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Tento esconder como estou,
mas saudade não tem jeito:
– Tua ausência faz um gol
e rasga a rede em meu peito...
Pedro Melo – SP 
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Carícia mais eloquente
que meu coração aprova
é te dar um beijo ardente
nos versos da minha trova!
Renato Alves – RJ
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Encontrei com a saudade
solitária, mas tão bela,
e sem medo, sem vaidade...
Eu beijei as tranças dela.
Sarah Rodrigues – PA
-
Entre todos os recantos
é aqui que me sinto bem:
– o meu lar tem tais encantos
que outros lugares não têm!
Sônia Ditzel Martelo – PR
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Sei que viver é lutar,
mas luto em desigualdade.
Eu sou concha e a vida é o mar
em noite  de tempestade.
Therezinha Brisolla – SP
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Tendo um bom livro na mão,
viajo o mundo... crio asa.
Mando embora a solidão...
sem sair da min  ha casa!
Vânia Ennes – PR
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Não teme a seca inclemente
quem confia em seu labor;
planta a pequena semente
sentindo o cheiro da flor.
Wandira F. Queiroz – PR
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Que bom seria um enlace
entre a mente e o coração:
o que a gente desejasse
também quisesse a razão!
Wanda Mourthé – MG

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