quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Aparício Fernandes (Classificação da Trova) A Forma


A Trova pode ser classificada sob três aspectos; a forma, a mensagem (ou conteúdo) e a origem. Quanto à forma, podemos dividi-la em trova de rima simples e de rima dupla. A de rima simples é a mais antiga e a mais popular. Apareceu, segundo Luís da Câmara Cascudo, por volta do século XIII. É a que rima apenas o 2o. com o 4o. verso. Eis uma trova de Adelmar Tavares, que é um perfeito exemplo de trova de rima simples:

A inveja tem seu castigo,
Deus mesmo é quem retribui:
enquanto o invejado cresce,
o invejoso diminui...
                   A trova de rima dupla, como o nome está dizendo, é a que possui os quatro versos rimados entre si. É um tipo mais aprimorado, mais literário, mais artístico, embora, possivelmente, menos popular. A trova de rima dupla pode ter as rimas intercaladas, Isto é, rimando o 1.° com o 3° verso e o 2° com o 4°, ou internas, quando o 1.° verso rima com o 4° e o 2° com o 3°.
         Eis um exemplo de trova de rima dupla com as rimas intercaladas; é do trovador A. A. de Assis:
Desesperadora e triste
é a solidão dos ateus,
para os quais nem mesmo existe
a companhia de Deus.
                   Vejamos agora um exemplo de trova de rima dupla com as rimas internas, através desta linda quadrinha do saudoso poeta Gentil Fernando de Castro;
Que lição às nossas dores,
ó velho muro, desvendas!
— É na ferida das fendas
que mais te cobres de flores...
                   A trova de rima dupla interna é relativamente rara. Podemos considerá-la mais sofisticada, mais erudita e bem menos popular do que as suas irmãs, A tendência dos trovadores atuais é francamente pela composição da trova de rima dupla intercalada; num ensaio que se publicou, propôs-se que doravante só seja reconhecida como trova a quadra de rima dupla; ao que parece, Colbert Rangel Coelho e alguns outros trovadores são da mesma opinião.
                  O certo é que, pelo menos nos inúmeros Jogos Florais e demais Concursos de Trovas que frequentemente são realizados em nosso país, já não se aceita as trovas de rima simples, que são automáticamente desclassificadas. Não acreditamos, porém, que a trova de rima simples venha a desaparecer, pois:
a) é muito mais antiga que a trova de rima dupla;
b) está consagrada pelo povo, sendo de feição nitidamente popular;
c) várias trovas antológicas, que o povo sabe de cor, são de rima simples;
d) é o caminho de acesso natural à trova de rima dupía, encontrando ainda muitos compositores, principalmente entre os trovadores iniciantes.
                   Guimarães Barreto, poeta e escritor paraibano residente na Guanabara, em seu livro "Excursão peto Reino das Trovas" (Irmãos Pongetti, 1962, Rio) diz o seguinte:
"As trovas, provenham de letrados ou iletrados, caracterizam-se pelos motivos que as criam e que, como as composições musicais, lhe servem de elemento essencial, O tema, ou assunto que as motiva, é quase tudo".
                   Concordamos, em parte, com a opinião acima, porquanto, embora as duas coisas se completem, damos mais valor ao conteúdo poético de uma trova do que propriamente ao artifício de sua forma. Por isso, somos tolerantes. Embora nossa preferência recaia na trova de rima dupla, não vamos negar a existência de trovas de rima simples belíssimas, que de modo algum podem ser relegadas ao ostracismo. Nossa concordância com o Guimarães Barreto termina quando êle escreve o seguinte:
"Há casos em que a própria rima se dispensa e basta a homofonia nas últimas sílabas tônicas dos segundo e quarto versos (rimas toantes), multo de agrado dos trovadores portugueses. Essa ausência de rimas não perturba a boa qualidade das trovas, mas, pelo contrário, lhe dá um sabor de originalidade, um novo motivo de encantamento:
Quem me vê eu 'star sorrindo
não pense que estou alegre,
meu coração ‘stá tão preto
como a tinta que se escreve."
                   Em nossa opinião, uma quadra só será trova se tiver as rimas conforme o figurino legal. As rimas toantes podem ser interessantes para poemas livres ou para sonetos inovadores. Na trova não, mesmo porque não se enquadram na definição de trova que é hoje aceita sem contestação, pelo menos no que se refere às rimas.
                   Na quadra mencionada por Guimarães Barreto notamos ainda a utilização do apóstrofo no 1.° e no 3° verso. Somos contrário não só aos apóstrofos, como às licenças poéticas e a todo e qualquer recurso apelativo na composição de uma trova.
                   Quem é bom trovador, dispensa essas muletas: utiliza-se do vernáculo corretamente e nem por isso suas trovas deixam de ter a naturalidade musical de uma fonte cristalina.
                   Somos contrário até mesmo à utilização do têrmo pra em lugar de para, só o admitindo em casos especialíssimos. Uma trova com um pra dificilmente será uma trova de elevada categoria (vide nota). Quanto ao pro (para o), então, nem se fala...
                   Para terminar, vamos citar uma trova de Adelmar Tavares, de rima dupla intercalada, onde o poeta usa a mesma palavra para rimar o 1.° com o 3o verso:
Para matar as saudades,
fui ver-te em ânsias, correndo...
— E eu, que fui matar saudades,
vim de saudades morrendo...
                   E ainda uma outra, de Lia Pederneiras de Faria, que apresenta a curiosa particularidade de ter a rima "inha" nos quatro versos:
"Não há mãe melhor que a minha!"
— diz a filha à mamãezinha.
E a mãe sorrindo: – Filhinha,
melhor que a tua, era a minha!…
______________
* Nota: a contração “pra” pelas novas normas da UBT, é aceita tanto em trovas humorísticas como em líricas/filosóficas.
____________
continua…
Fonte:
Fonte: Aparício Fernandes. A Trova no Brasil: história & antologia. Rio de Janeiro/GB: Artenova,

terça-feira, 15 de setembro de 2015

Trovador Homenageado: Cláudio Derli Silveira

Bebia tanto o Liminha,
que causava dó na gente,
pois a sede que ele tinha
era só por aguardente!…
Bebo uísque, vinho, rum,
bebo até cachaça pura.
Não bebo por ser bebum,
mas por gostar da tontura!
Calma, meu amigo, calma,
nem tudo é assolação;
às vezes, faz bem à alma,
um pouco de solidão...
Da Tribuna, manda o aviso:
- Não roubo por ser ladrão,
tampouco porque preciso,
mas por coceira na mão!
Discursava um orador...
e o gaiato da cidade...
- A propósito, doutor,
dá chute o “pé de igualdade”!
Do bom caminho, “seu” padre,
só me desvio um pouquinho,
pois as curvas da comadre
são "trechos" de mau caminho!
 
Eis a vida, eis os caminhos...
na missão de precursores:
– o sábio evita os espinhos,
e o tolo... pisa nas flores!
Ela diz do namorado,
ao conversar com alguém,
que o rapaz é “bem armado”
mas não dá “tiro” em ninguém!
Eu deixo este amor desfeito
e busco novos caminhos,
levando sonhos no peito
e a esperança dos sozinhos!...
Foi de muitos...namorada
e o “xirú”: - Mas o que tem?
Mate com erva lavada,
sacia a sede também!…
Foi uma infeliz jogada
do goleiro Zé Maria:
– a bola que foi chutada
foi a que ele não queria!
Imitando o meu lamento
por quem não me preza mais,
ouço a voz triste do vento
na plataforma do cais!…
 
Lua de mel...E o Menote
com idade a lhe pesar,
foi com tanta sede ao pote
que acabou por infartar!…
Meu sonho de piá desperto,
nas cinzas tardes de outono,
era laçar, campo aberto,
os ventos xucros, sem dono!...
Na feira do troca-troca,
o Juca ficou nervoso,
quando ouviu sua “Dondoca”
propondo troca de esposo!...
Na "madruga" o patrãozinho
vai ao quarto da empregada,
bate à porta e diz baixinho:
- "É o fantasma camarada..."
Os romances me comovem...
E, embora com pé na cova,
“gato” velho vira jovem
nos braços de “gata” nova!…
 
Porto Alegre me sorri,
vestida de multicores...
Não sou natural daqui,
mas tenho aqui meus amores...
Sopra, ó vento, as nuvens rasas,
pelo verde pampa em flor,
transportando em tuas asas
meus sonhos de trovador.
Sou irmão dos vendavais,
dos mares que naveguei,
deixando de cais em cais
amores... que conquistei!
Tomo a cruz do meu destino
que me cabe, por missão,
sem deixar o desatino
sobrepujar-me a razão!...
Tua altivez te desbota
e a própria alma esvazia:
– fazer, da minha derrota
tua maior euforia...
Viúva quando assanhada,
apela pro desafogo.
É como lenha molhada 
que chora... mas prende fogo!

domingo, 13 de setembro de 2015

Alcione Sortica (1935)


  Alcione Sortica é natural de Cachoeira do Sul (RS), em 17 de dezembro de 1935, Formação colegial como contabilista. Depois de mudar-se para a capital Porto Alegre (RS), já como funcionário público da secretaria da Receita Federal - Auditor Fiscal do Tesouro Nacional - ingressou e concluiu curso de Bacharel em Ciências Contábeis. Após a carreira pública, passou exclusivamente a dedicar-se às artes, basicamente à literatura, mas com outros trabalhos na pintura e na música.
       Em 2000 a literatura começou a tomar forma com a publicação do poema Raio de Luz. Das inúmeras viagens nacionais e internacionais, aparecem as narrativas de histórias de viagem, publicados no Jornal Zero Hora e outros periódicos.

.       Em 2012 o artista recebeu quatro honrarias: o Troféu Carlos Drummond de Andrade, Destaques do Ano, na categoria literatura; o Troféu Pedro Aleixo- Personalidade Notável - pela sua contribuição artística-literária; a Comenda Caldre e Fião da Sociedade Pártenon Literário, por sua contribuição às Letras e à Cultura do Rio Grande do Sul; e eleito Membro de Honra da Divine Académie Française des Arts, Lettres et Culture.
       Pelo seu trabalho de divulgação e incentivo da literatura como arte, em setembro de 2012 foi convidado e empossado como Governador da Associação Internacional de Poetas para o Rio Grande do Sul. No sistema de rodízio, atua como Vice-Governador da Associação Internacional Poetas Del Mundo para o Rio Grande do Sul, juntamente com a poetisa Hilda Maria Brasil (atual Governadora). A Revista CAOSótica Nr 31 (abril de 2013) traz na capa e uma reportagem sobre a obra do escritor, com críticas literárias, ensaios, contos, crônicas e uma apresentação do lançamento do livro Beira de Açude. O escritor abre a publicação do "Livro II das Aldravias" (edição bilíngue em português e em espanhol) [16] e soma-se a outros 50 artistas na compilação desse trabalho.
       Em março de 2014 foi empossado como Embaixador da Divine Académie Française des Arts, Lettres et Culture, cerimônia ocorrida na sede da instituição no Champs Élysées em Paris (França) [10] . Em junho de 2015 foi empossado como Presidente do Conselho Fiscal da Academia de Artes, Ciências e Letras Castro Alves.
       Atualmente é um dos escritores mais premiados por seus contos, crônicas, ensaios e poesias, publicados em diversas obras e coletâneas literárias no Brasil e na América Latina.
       Entidades a que pertence:
q  Acadêmico e Presidente do Conselho Fiscal da Academia de Artes, Ciências e Letras Castro Alves, RS;
q  Acadêmico da Academia Brasileira de Estudos e Pesquisas Literárias, RJ;
q  Membro correspondente da Academia de Letras de Teófilo Otoni, MG;
q  Membro correspondente da Sociedade Brasileira de Poetas Aldravianistas, MG;
q  Membro Fundador e Diretor do Departamento Histórico e de Intercâmbio Cultural do Instituto Brasileiro de Culturas Internacionais, RJ;
q  Coordenador da Área de Cultura do Proyecto Cultural Sur Brasil;
q  Membro da Sociedade Pártenon Literário, RS;
q  Diretor de Divulgação e Imprensa do Instituto Cultural Nelson Fachinelli, RS;
q  Membro da Casa do Poeta Rio-Grandense - CAPORI, RS;
q  Associado da Estância da Poesia Crioula, RS.
      Obras Publicadas:
"Um ponto no Tempo", 2015; "De pai para filho", 2014 (edição em coautoria com o filho Eduardo); "Brasil em Cena", 2014 (edição bilíngue português e francês); "Livro II das Aldravias", 2013 (edição bilíngue português e espanhol); Beira de Açude, 2013; Peneirando Estrelas, 2012; Cacos do Tempo, 2005.