sábado, 10 de novembro de 2012

Carolina Ramos (Ama!)


Olympio Coutinho (Caderno de Trovas e Reflexão sobre Amizade)



01
A velhinha no jardim
filosofava sorrindo:
- Não julgo o mundo ruim,
ainda há rosas se abrindo.

02
A superfície do mar
belo cenário formata
quando o clarão do luar
lhe veste um manto de prata.

A amizade é um amor que nunca morre.
Mário Quintana

03
Amor cigano, utopia,
triste busca por alguém;
quem tem um amor por dia
não tem o amor de ninguém.

04
Alegria em plenitude
cultiva dentro do peito
quem dá valor à virtude
e menospreza o defeito.

Para conseguir a amizade de uma pessoa digna é preciso desenvolvermos em nós mesmos as qualidades que naquela admiramos.
Sócrates

05

Ante as barreiras não paro
e minha crença eu não mudo:
- Que valor teria o claro
se não existisse o escuro?

06
Ante tanta aberração
num mundo fora dos trilhos
pergunto ao meu coração:
- O que eu ensino aos meus filhos?

O ódio dos fracos não é tão perigoso como a sua amizade.
Luc de Clapiers Vauvenargues

07

Bem se vê pelos olhares
que se cruzam no salão
que na cabeça dos pares
também dança... a tentação.

08

Busque sempre renovar
toda sua trajetória;
os que resolvem ousar
são os que fazem a história.

Um amigo se faz rapidamente; já a amizade é um fruto que amadurece lentamente.
Aristóteles

09

Da infância levanto o véu
de uma alegre brincadeira:
descobrir bichos no céu
numa nuvem passageira.

10

Com olhares tu fizeste
do coração uma cela,
e com teus beijos puseste
meu coração dentro dela.

O ser humano tem até de experimentar o amor, para que compreenda bem o que é a amizade.
Sébastien-Roch Chamfort

11

Cultiva a fraternidade
como quem cultiva a terra;
quem planta grãos de amizade
não colhe os frutos da guerra.

12

De meu pai, a honestidade,
de minha mãe, a ternura:
por isso, em meio à maldade,
mantenho minha alma pura.

As ligações de amizade são mais fortes que as do sangue da família.
Giovani Boccaccio

13

Diga não ou diga sim,
revele logo o que pensa;
o seu talvez para mim
é pior que a indiferença.

14

De meu pai, a honestidade,
de minha mãe, a ternura,
por isso, em meio à maldade,
mantenho minha alma pura.

A amizade é, acima de tudo, certeza – é isso que a distingue do amor.
Marguerite Yourcenar 

15

Desprezo eu senti de fato
ao ver em seus escaninhos
aquele nosso retrato
rasgado em mil pedacinhos.

16

Essas rosas que florescem
em jardins de casas pobres
são as mesmas que fenecem
enfeitando covas nobres?

Como as plantas a amizade não deve ser muito nem pouco regada.
Carlos Drummond de Andrade

17

Esta dor que me devora
em dois versos se resume:
gostei de muitas e agora
de todas tenho ciúme.

18

Eu creio na honestidade,
na justiça clara e reta,
no fim da desigualdade...
Não sou louco... eu sou poeta.

A melhor maneira de começar uma amizade é com uma boa gargalhada. De terminar com ela, também.
Oscar Wilde 

19

Enrubesceste, engraçado,
porque, amor, te beijei;
imagino o teu estado
se eu fizesse o que pensei...

20

Este abismo que o rancor
instalou na humanidade
só poderemos transpor
pela ponte da amizade.

Dos amores humanos, o menos egoísta, o mais puro e desinteressado é o amor da amizade.
Cícero

21

Existe um grande desgosto
na lágrima, que a brilhar,
vai rolando pelo rosto
dos que não querem chorar.

22

Eu creio na honestidade,
na justiça clara e reta,
no fim da desigualdade...
- Não sou louco... Eu sou poeta!

Mais prudente do que o amor, a amizade dispensa os juramentos.
Maurice Chapelan 

23
Eu não tenho o que queria,
mas sou feliz mesmo assim;
faço a minha terapia
na mesa do botequim.

24

Felicidade, um ranchinho
e, dentro dele, nós dois;
nove meses de carinho
e um molequinho depois.

A única amizade que vale é a que nasceu sem razão.
Arthur Schendel

25

Finges desprezo e eu não ligo,
vejo amor no teu olhar;
como diz ditado antigo:
quem desdenha quer comprar.

26

Feliz de quem não permite
que o domínio da razão
seja mais forte e limite
o que sente o coração.

A amizade que acaba nunca principiou.
Públio Siro

27

Hoje em dia pouco resta
do nosso amor, que passou:
tristes restos de uma festa
depois que a festa acabou.

28

Juventude, o procurar
permanente de viver,
enquanto a busca durar
ninguém vai envelhecer.

A amizade é semelhante a um bom café; uma vez frio, não se aquece sem perder bastante do primeiro sabor.
Immanuel Kant

29

Na imensidão do universo
tenho, em minha pequenez,
toda a grandeza de um verso
de um poema que Deus fez.

30

Nada recebe quem nega
dar amor ou coisa assim;
só colhe flores quem rega
dia e noite o seu jardim,

O amor passa, a amizade volta, mesmo depois de ter adormecido um certo tempo.
George Sand

31

Não fuja dos seus caminhos
nem busque atalhos a esmo;
quem tem medo dos espinhos
não acha a flor em si mesmo.

32

Nas noites claras de lua,
no desenho da calçada,
vejo a silhueta sua
à minha sombra abraçada.

O amor pode morrer na verdade, a amizade na mentira.
Abel Bonnard

33

Neste teatro que é a vida
(e a vida é uma somente)
prefiro o palco, querida,
do que ser mero assistente.

34

No alpendre do casarão,
em comovente vigília,
Dirceu cantava a paixão
em versos para Marília.

35

Noel Rosa bem sabia
o que mata uma paixão:
a noite triste e sombria
sem luar e sem violão.

36

Nunca ofereça amizade
quando a mulher quer amor;
é como dar caridade
a quem lhe pede um favor.

A amizade pode converter-se em amor. O amor em amizade...nunca.
Albert Camus

37

Meu pai, que eu nunca esqueci,
veja em mim a tua glória;
segui teus passos, venci,
é tua a minha vitória!

38

Papai Noel, a cegonha,
lendas que mamãe contou;
deixei de crer, por vergonha,
e a minha infância acabou.

A verdadeira amizade é como a saúde: o seu valor só é reconhecido quando a perdemos.
Charles Colton

39

Partiste, mas, na saudade,
eu só peço ao Criador
que a tua felicidade
seja igual à minha dor.

40

Oferecendo a miragem
de uma vida sem escolta, 
o vício vende passagem
para a viagem sem volta.

A amizade duplica as alegrias e divide as tristezas.
Francis Bacon

41

O trem da vida ao destino
chega no horário marcado;
- Por que não desce o menino
que embarcou tão animado?

42

Perdida não é a bala,
que gera um medo profundo,
mas aquele que se cala
ante a violência do mundo.

A verdadeira amizade é aquela que nos permite falar, ao amigo, de todos os seus defeitos e de todas as nossas qualidades.
Millôr Fernandes

43

Por mais que esta vida o açoite
prossiga na caminhada;
depois do negror da noite
sempre surge a alvorada.

44

Privado da liberdade,
o passarinho, a cantar,
exprime a dor da saudade,
já que não sabe chorar. 

O amor é cego, a amizade fecha os olhos.
Blaise Pascal

45

Quem cultiva uma amizade
dentro do seu coração
pode morrer de saudade
mas nunca de solidão.

46

Remorso rude, mesquinho,
está ferindo o meu peito;
chamou-me "filho" um velhinho
com quem faltei ao respeito.

Ainda que seja raro o verdadeiro amor, é no entanto menos raro que a verdadeira amizade.
François La Rochefoucauld

47

Sorria a todo momento
por pior que esteja a vida;
quem sorri no sofrimento
torna a dor mais resumida.

48

Sou prisioneiro feliz
e não busco outros espaços;
esta sorte eu sempre quis:
ficar preso nos teus braços.

A amizade não precisa de palavras - é a solidão sem a angústia da solidão.
Dag Hammarkskjod

49
Trate todos como gente,
pois somos todos iguais;
nenhum ser é diferente
por ter pouco ou por ter mais.

50

Uma lágrima infinita
surgindo nos olhos teus...
Foi a forma mais bonita
de você dizer-me adeus. 

Há duas espécies de chatos: os chatos propriamente ditos e ... os amigos, que são nossos chatos prediletos.
Sócrates

Fonte:
Colaboração do Trovador

Olympio Coutinho (1940) – Biografia Atualizada


OLYMPIO da Cruz Simões COUTINHO nasceu em na zona da Mata mineira, em 9 de outubro de 1940. Em Ubá, fez o primário e o secundário, tendo exercido diversas atividades esportivas como atleta da Praça de Esportes (natação e basquete), do Tabajara Esporte Clube (basquete e vôlei) e do Esporte Clube Aimorés (futebol).

Já fazia trovas e mantinha correspondência com trovadores como J. G. de Araújo Jorge, Luiz Otávio, Aparício Fernandes, Rodolfo Coelho Cavalcanti e muitos outros. Em 1962, foi para Belo Horizonte para estudar Jornalismo, tendo se formado em 1965: trabalhou na edição mineira da Última Hora, Folha de Minas, Jornal de Minas, Diário de Minas e Estado de Minas (onde entrou como repórter em 1967 e saiu como editor em 2003). Ainda em 1965 ingressou na Academia Mineira de Trovas e assumiu a cadeira nº 11 (patrono Casimiro de Abreu), tornando-se o mais novo acadêmico.

Em 1966, lançou a primeira edição de Festival de Trovas, que reunia 101 trovas feitas durante sua adolescência em sua terra natal, livro que ganhou como prefácio trecho de comentário de J. G. de Araújo Jorge, publicado no Jornal Feminino, suplemento literário de O Jornal, do Rio de Janeiro, em 1961:“Minas é a grande ilha no arquipélago da poesia brasileira. Terra de poetas e trovadores. 

Desde a primeira Escola de Poesia, com Gonzaga, Alvarenga, Cláudio Manoel da Costa, até os modernistas autênticos, como o grande Drummond, alto e de ferro, mas musicado de águas como uma montanha de Itabira. Começo com estas palavras para falar de um trovador que desponta: Olympio da Cruz Simões Coutinho, de Ubá”… 

Já Rodolfo Coelho Cavalcante, em carta, escreveu: “O seu livro Festival de Trovas fez-me dizer sinceramente: o Brasil tem mais um bom trovador! Tanto no lirismo como no humorismo, o amigo é um bom trovador. Sorri bastante com o seu grande humor na questão dos “pintinhos”. Fazia tempo que eu não ria com uma boa trova e não queira saber a gostosa gargalhada que eu dei”.

Em 2003, Olympio criou e edita até hoje um jornal de bairro, o Jornal Sion: atualmente, edita ainda outros dois jornais de bairro (Lourdes e Lagoa Notícias), dirigidos por sua filha. 

Em junho de 2007, foi convidado para trabalhar na Assessoria de Imprensa do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais (IPSEMG), onde permanece. 

Tendo interrompido sua produção literária em 1968, voltou a fazer trovas em 2008. Em 2009, ingressou na União Brasileira de Trovadores (UBT), seção de Belo Horizonte.

Segundo as palavras de Olympio em e-mail enviado ao Singrando Horizontes: Apesar dos meus 72 aninhos, ainda trabalho: na Assessoria de Comunicação da Controladoria-Geral do Estado de Minas Gerais, situada na Cidade Administrativa, a cerca de 30 quilômetros de minha residência - trecho que percorro diariamente de ônibus e metrô; às vezes, pego um frescão que me cobra R$ 5,00 (ou seja, nele não tenho isenção de passagem).

Fonte:
Blog do Pedro Mello
E-mail enviado por Olympio Coutinho

Olivaldo Junior (Trovas sobre Sonho )



Cada sonho que se tem 
faz da vida uma ilusão; 
mas ainda quero alguém 
que me iluda o coração. 

Sonhos não se jogam fora, 
mas joguei os meus, neném, 
quando foste logo embora 
sem sonhares com ninguém. 

O meu sonho foi cantar, 
mas não fui um passarinho; 
minhas asas, sem voar, 
me espetaram neste ninho.

Fonte:
Colaboração do Trovador

António Torrado (A Parede com Ouvidos)


Ilustração: Cristina Malaquias

(Da Seleção de Contos Infantis)

Era uma vez uma parede que tinha ouvidos.

Nada de estranhar. Ele há gente que se pela por contar segredos, próprios ou alheios, sem ligar ao aviso dos mais prudentes: "Cuidado que as paredes têm ouvidos". Alguma vez acabaria por ser verdade.

Esta tinha ouvidos e até olhos, calculem. Só lhe faltava a boca e, já agora, o nariz.

Espessa e toda fechada, sem portas nem janelas, acumulava o que via e ouvia no cerrado dela mesma, no mais dentro das pedras e do cimento de que era feita.

– É uma parede fixe – diziam as pessoas, espalmando as mãos na parede que, já se vê, não dava de si.

Até que um dia, houve uma festa na aldeia, festa a valer, com foguetório, música na praça, artistas vindos de fora e bailarico até altas horas.

Um dos altifalantes da instalação sonora foi aplicado à parede que tinha ouvidos.

A meio da musicata, ouviu-se uma voz dizer em segredo, mas de modo que todos ouvissem:

– A Tia Hermínia só toma banho na Páscoa.

O pessoal riu-se. Aquilo seria brincadeira de garotos… Logo a seguir, outra revelação:

– O Armindo e a Arminda andam a namorar às escondidas.

Embora a maioria da aldeia já soubesse, alguns estranharam o despropósito da notícia, a interromper a música.

– O Porfírio faz de pobretana, mas tem quilos de notas a forrar o colchão.

Aqui a surpresa foi maior, sobretudo para o Porfírio, mendigo de mão estendida à porta da igreja.

Mas donde viriam as falas? Da cabine de som não era. Do cantor, que no palco esbracejava a sua irritação, também não era.

– A Dona Camila já não paga aos criados há três meses, mas não quer que se saiba.

Aquilo já soava a escândalo. Foi a própria Dona Camila que apontou para o altifalante, pendurado na parede, a tal que tinha ouvidos:

– A voz vem dali.

Pois vinha. Arrancaram os fios ao altifalante e a voz calou-se. Acabaram-se as novidades, as inconfidências.

E, à cautela, quando voltou a haver festa na terra, nenhum altifalante coube à parede que sabia demais.

Júlio Salusse (Os Cisnes: A História Belíssima de um Soneto)


Nilo Bruzzi, amigo e biógrafo de Júlio Salusse, escreve:

"Júlio Salusse adquire um terreno na avenida Friburgo, à margem do Bengalas, desenha uma planta de casa, contrata um pedreiro e faz construir um simpático "chalet" em centro de formoso jardim. É hoje (1950) a casa nº 158 da Avenida Comte. de Bittencourt, residência do Doutro Hugo Antunes. Ali instala-se sozinho. É o Promotor Público de Nova Friburgo. A cidade regurgitava de famílias elegantes do Rio que para lá iam passar o verão.  Os condes de Nova Friburgo tinham regressado da Europa e habitavam o suntuoso Castelo do Barracão. 

"Baile no Cassino. O que há de mais distinto na sociedade de Nova Friburgo ali está. Júlio Salusse, cabelos dourados, olhos profundamente azuis, buço louro, tez muito clara e rosada, elegante, alto, lenço de cambraia evolando perfume inebriante, gravata de seda fina e colorida, também ali está. Duas moças formosíssimas polarizam a atenção de todos os rapazes. Vera van Erven, loura, clara, olhos azuis, elegantíssima, inteligente, risonha, dançando muito bem, intelectual, dizendo versos de cor, conversando com todos e por todos admirada. Laura de Nova Friburgo, a castelã do Barracão, lindíssima, de um moreno delicioso, olhos brilhantes e escuros, recém-chegada da Europa, onde fora se instruir. [...]

"Júlio Salusse naquela noite conheceu ambas e com ambas dançou. [...]

"Dias depois, nova festa em casa do Dr. Ernesto Brasil de Araújo.

"Baile animado. Laura está mais linda, com seu fofo vestido de rendas, seus maravilhosos cabelos, olhos provocadores, aquele moreno inesquecível.

"Em seguida, vieram dias de chuvas copiosas. Júlio Salusse fica preso em casa, naquele simpático "chalet" à margem do rio, cercado de flores. Uma noite, o sonho embala o seu pensamento. Passa-lhe pela lembrança a formosa moça do Castelo do Barracão...

"Está só. A chuva lá fora cai ininterrupta. As águas do rio crescem. E o poeta começa a compor o soneto - Cisnes - que lhe vai abrir as portas da glória imorredoura. Quando, no terceiro dia, cessa a chuva, Júlio Salusse tem pronto os versos imperecíveis. [...]

"Um novo baile, agora no Castelo do Barracão, proporciona novo encontro de Júlio Salusse com Laura de Nova Friburgo. Dançam, conversam. Mas o poeta, que é arrojado no pensamento, tem, entretanto, a palavra contida pela timidez, oriunda da falta de confiança em si mesmo. [...]

"E o que poderia ter sido um delicioso enredo sentimental ficou sendo um êxtase ungido da filosofia de Platão, silencioso, como daquele outro Petrarca que, em 1327, à porta da Igreja de Santa Clara, em Avignon, viu pela primeira vez aquela outra Laura de Novaes, esposa de Ugo de Sade, e nunca mais a esqueceu nos seus versos imortais".

JÚLIO SALUSSE

Os Cisnes

A vida, manso lago azul algumas
vezes, algumas vezes mar fremente,
tem sido para nós constantemente
um lago azul, sem ondas, sem espumas.

Sobre ele, quando, desfazendo as brumas
matinais, rompe um sol vermelho e quente,
nós dois vagamos indolentemente
como dois cisnes de alvacentas plumas.

Um dia um cisne morrerá, por certo.
Quando chegar esse momento incerto,
no lago, onde, talvez, a água se tisne,

que o cisne vivo, cheio de saudade,
nunca mais cante, nem sozinho nade,
nem nade nunca ao lado de outro cisne.

Fonte:
Colaboração de Nei Garcez

Os Jornais no Brasil (Diário “A Manhã” – Local: Salvador, BA)


Diário publicado na Bahia em formato standard, A Manha começou a circular no dia 7 de Abril de 1920. Era, como informava o subtítulo, “Propriedade da Sociedade Anonyma Diario de Noticias”, pertencente a A. Marques dos Reis e Altamirando Requião, ambos também diretores das duas publicações. 

As intenções do jornal, como revela o editorial de apresentação, eram as melhores: 

“Não precisamos publicar o programa, pelo qual traçaremos a nossa diretriz. O publico bahiano bem conhece os que dirigem esse jornal e sabe, de sobejo, pelos exemplos dados em outra trincheira á nós tão querida e para quem sempre teremos os maiores desvelos, que aqui se comentará sempre pelo que concorrer pelo levantamento da nossa Bahia, por processos que honrem ao jornalismo e dignifiquem a imprensa.” (Ano I, nº 1, 7 de Abril de 1920)

O jornal se declarava “nacionalista” e de oposição ao governo federal do presidente Epitácio Pessoa. Como se lê respectivamente na edição de números 3 e 156, dos dia 9 de abril e 16 de outubro de 1920: 

“Sujeitos batalhadores audazes em prol de tudo que for pelo Brazil, pela sua grandeza, pelo seu progresso, para honra de seu renome. Que nada nos entibie na campanha, em que nos devemos empenhar de alma e de coração, cumprindo o mais nobre e elevado dos deveres – o do amor á Patria. (…) Na Bahia, mais do que em outro qualquer logar a campanha nacionalista deve-se incentivar e propagar de maneira extraordinaria, porque só assim por meio da propagação dos nobres, verdadeiros e são ideaes nacionalistas conseguirá ella voltar ao que foi, á sua grandeza passada, aos tempos gloriosos de que só existem no momento resquicios.” 

 “Cada brazileiro de coração e de honra, deve formar na campanha benemerita de combate ao governo Epitacio Pessoa”. 

O periódico se alinhava com o conterrâneo Rui Barbosa, que havia perdido a última eleição para Epitácio. Um de seus diretores, Antonio Marques dos Reis, havia concorrido a uma cadeira na Câmara dos Deputados.

Entre redatores e colaboradores estavam (possivelmente alguns nomes fossem pseudônimos) Altamirando Requião e A. Marques dos Reis, D. Mario de Souza, Assis Curvello, Nuno de Andrade, Nuno Pinheiro, Andrade Martins, João Arruda, Eduardo Vianna, Oliveira Lima etc. 

Algumas das colunas publicadas: “No meio esportivo” (depois passa a se chamar “Esportes”), “No mundo theatral” (depois “Palcos”), “Vida Social”, “Ultima Hora”, “Serviço Telegraphico”, “Informações Commerciaes”.

Em 30 de Janeiro de 1921, na edição de número 241, o jornal anunciava a suspensão da circulação por tempo indeterminado: 

“Motivos de ordem imperiosa, que prendem á escassez de papel, nos centros productores de todo o mundo, fazendo com que os nossos fornecedores reduzissem á metade as remessas de bobinas que lhes haviamos encommendado, para o anno corrente, obrigam-nos muito a contragosto nosso, a suspender, por tempo indeterminado, a publicação d'A Manhã, do dia 1º de Fevereiro em deante.”

Fonte:
http://hemerotecadigital.bn.br/artigos/manha-0

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 723)



Uma Trova de Ademar  

Num desespero medonho, 
acordei quase enfartando, 
pois vi no melhor do sonho 
que a sogra estava voltando! 
–Ademar Macedo/RN– 

Uma Trova Nacional  

Morre a sogra... e o genro, “terno”,
fala com certo cinismo:
“Talvez o calor do inferno 
seja bom pra reumatismo...” 
–Pedro Mello/SP– 

Uma Trova Potiguar  

Com desespero e irritado, 
apertou devagarzinho... 
-Quem é você seu safado????? 
-Eu sou Raimundo, o mudiiinho!!!! 
–Manoel Cavalcante/RN– 

Uma Trova Premiada  

2005 - Nova Friburgo/RJ 
Tema : COMILÃO - 3º Lugar 

- Três frangos, polenta e vinho –
pede um gordo comilão.
- Comes tudo isso sozinho?!?!
- Não, garçom, como com pão!
–Marina Bruna/SP– 

...E Suas Trovas Ficaram  

Cuspiu na parede. E quando 
lhe chamaram atenção, 
mostrou um cartaz rogando: 
“Favor não cuspir no chão”! 
–Eno Teodoro Wanke/PR– 

U m a P o e s i a  

Tiradentes era o dono 
de uma fábrica de pneus, 
o Papa falou que Deus 
não passava de um colono, 
e Carlos Roittman num sono 
virou o carro em pesqueira, 
Kelpes vendeu pão na feira, 
Hitler brigou no cangaço; 
eu querendo também faço 
igualzinho a Zé Limeira. 
–Jomací Dantas/PB– 

Soneto do Dia  

“QUINHENTO É QUINHENTO”. 
–Francisco Macedo/RN– 

O “cara” no maior assanhamento, 
todo animado no embalo do creu, 
chegando logo cedo no bordel, 
diz à mais linda : Vem que eu dou “quinhento”. 

Mas gosto de bater, diz o nojento; 
e a pobre endividada pra dedéu, 
já pensando em pagar o aluguel, 
disse: Eu vou porque quinhento é quinhento 

Saiu toda chorosa, cara inchada, 
e a outra diz: Tu tas é endinheirada! 
Inda chorando diz a tal mundana, 

Mulher, eu só nasci para sofrer, 
o macho só parou de me bater , 
depois que eu devolvi aquela grana. 

Pedro DuBois (Cristais Poéticos)


OLHAR

No olhar diversificado
percebo à direita
o senso oposto
ao esquerdo lado
das contradições: retorno
ao mediano
olhar
espantado
no plano
horizontal

na frente dos olhos repousa
a lagarta encasulada em futura
borboleta.

ENVOLTO

Envolto em luas
distraio fracas luzes
e repasso a cena
em cômodas
e lentas
metades: revolta
latejada
no tempo
despreparado.

O destino
sela luzes
aparentes.

Envolto em luas
desconsidero a farsa:
lado revisto pelo espelho.

PODER

Ávido de poder reclamo a sorte 
que me cabe no negócio: o amor
tolhe os movimentos. O corpo
cede à angústia de estar vivo. A sorte
é instante acordado. O poder trafega
a ilusão da luz apagada. A lanterna
cessa a sombra imaginada. O destino
presente na ponta dos dedos. Águas
sôfregas rasgam a terra e depositam
mensagens de descobrimento.

Aviso em praça pública: o poder
combina a estática com o movimento 
em falso do adormecido.

SOBRAS

Prefiro as sobras do banquete
o vinho quente na garrafa
o azedo da salada
o restante da carne
junto ao osso

o guardanapo
usado com esforço

guardo a rolha
em confirmação: aguardo
o retorno
inserido
na minha vontade.

AO LONGE 

Vai para longe
não leva a bandeira
fala com os de longe
não leva a pátria
sorri aos de longe
o sorriso esconde
a veracidade:

está aqui
na casa
na rua
na calçada
na mesa
no fundo
do bar

longe é estar presente
em não acontecimentos.

Fonte:
Colaboração do Poeta

José de Alencar (Ao Correr da Pena) 3 de dezembro: Os Grandes Dias da Pátria


Um dos mais belos traços que apresenta a história da humanidade é o culto respeitoso que votam os grandes povos aos grandes dias de sua pátria. A influência misteriosa que exerce o passado sobre o futuro tem o que quer que seja de grande e de sublime.

Há um sentimento nobre nessa força irresistível que de ano a ano, de século a século, num momento determinado, obriga as gerações que se vão sucedendo a irem por sua vez depositar no livro dos fatos nacionais o testemunho de uma justa veneração pelas suas antigas tradições, renovando, com o exemplo, a fé e a crença nas instituições do país.

As datas memoráveis figuram na vida das nações como esses marcos que se colocam à beira do caminho para designar o espaço percorrido, e ao pé dos quais o viandante vem descansar, refazendo-se das fadigas e cobrando novas forças para continuar a jornada.

Assim, quando o historiador, elevando-se pelo pensamento acima das condições materiais da existência humana, lança os olhos sobre o quadro da humanidade, pode ver cada povo, cada nação, percorrendo seu caminho através dos séculos, como o indivíduo que transpõe dia por dia o curto espaço da vida.

Como o indivíduo, a nação passa por todas as vicissitudes da experiência, vai da infância à velhice, do mal ao bem, sofre todas as alternativas da fortuna. Como o homem tem o germe de todos esses nobres sentimentos que vivem no coração, fortifica-os pela união, engrandece-os pelo entusiasmo e os transmite pela tradição.

Como nós, o povo sente todos os afetos, curte todas as dores, experimenta todos os estados da vida. Como nós, ama, odeia, chora, ou ri; é um pai ou um filho, um amigo ou um inimigo; é um menino frágil que precisa ser guiado, um delinqüente a quem se inflinge o castigo, e muitas vezes um soberano que dita a sua vontade e impõe a lei.

Por isso há vinte e nove anos, no dia de ontem, a nação brasileira vinha aos pés de um berço saudar o nascimento de um menino com toda a efusão do homem que contempla o seu primeiro filho. Durante quinze anos serviu-lhe de pai; e em todo esse tempo nem uma só vez se desmentiu esse amor paternal que a nação votava ao seu Imperador ainda na infância.

Veio o ano de 1840. À infância segui-se a juventude; o berço foi substituído por um trono. A nação brasileira veio então, não mais como um pai e sim como um depositário fiel, restituir a coroa e o cetro que lhe foi confiado. A cena ia mudar-se: o amor,que um dia fora paternal, começava a envolver-se do respeito que inspira o poder e a majestade.

Deixemos ainda correr o tempo; cheguemos ao dia de ontem; vinte e nove anos apenas nos separam, porém a mudança é completa. Sabeis o que significam essas festividades que por toda a extensão do país celebram o dia 2 de dezembro? Sabeis que sentimento exprimem essas manifestações espontâneas da nação, por ocasião do aniversário do seu monarca?

É o povo brasileiro que, como um filho reconhecido, veio aos degraus do trono para beijar a mão ao pai da nação, para agradecer-lhe os benefícios recebidos e pedir-lhe ainda a direção, a paz, o trabalho, a instrução, a indústria, a colonização, e todos esses germes da civilização, que o país encerra no seu seio, e que serão um dia fecundados pelo pensamento criador do seu governo.

A esta grande manifestação do seu povo, o Imperador respondeu agraciando-o na pessoa daqueles brasileiros cujos serviços entendeu mereciam ser remunerados. Algumas dessas mercês não são unicamente uma graça, mas uma antiga dívida que S.M. pagou em nome da nação a alguns velhos servidores do nosso país. Entre estes há especialmente alguns nomes que, para fazer-se o seu elogio aos brasileiros, basta despi-los do seu título e repeti-los.

Havia cinco anos que não se realizava esse poético costume das monarquias, de fazer a distribuição das graças nos dias aniversários de algum acontecimento feliz. Sempre uma contrariedade qualquer vinha obstar aquele ato. Este ano, porém, as circunstâncias favoráveis de uma atualidade calma e serena permitiram.que a munificência imperial pudesse ao mesmo tempo pagar as dívidas da nação e auxiliar a realização do pensamento de união e concórdia, que é o programa de governo do Sr. D Pedro II e o seu voto o mais ardente como Brasileiro e como soberano.

Este ano já a tolerância tinha passado a esponja por sobre todos estes nomes de guabiru e de praieiro, de luzia e de saquarema, de exaltado e conservador, aos quais outrora os ódios políticos fizeram representar na luta encarniçada dos partidos o papel de guelfos e gibelinos. S.M. por conseguinte podia lançar os olhos pela união brasileira, e ver unicamente cidadãos que se distinguiam pelo seu mérito e pelos seus serviços, sem que uma necessidade dolorosa do seu governo viesse, como nos anos anteriores, batiza-los de ministeriais, de descontentes, ou de oposicionistas. O preceito constitucional começou enfim a ser para os brasileiros uma verdade benéfica, precursora de novos melhoramentos.

Além desses fatos, que se prendem necessariamente ao dia 3 de dezembro, tiveram ontem lugar alguns extraordinários, que foram reservados para este dia, para assim receberem maior realce e se realizarem sob os auspícios felizes de uma data memorável para o Brasil.

Às dez horas do dia a Câmara Municipal desta corte inaugurava na sala de suas sessões, em presença de um grande concurso, o novo retrato de S.M. O salão está pintado com todo o apuro. O teto representa um quadro alegórico da indústria e do comércio, trazendo a abundância ao Brasil; aos lados estão os bustos de D. João VI e de D. Pedro I, do conde de Bobadela, de D. Luís de Vasconcelos, de Estácio de Sá e de José Bonifácio.

Todo o trabalho de pintura, executado por R, d’Agostini e Júlio Lechevrel, debaixo da direção dos Srs. Porto Alegre e Costa Ferreira, é digno de atenção pelo bem acabado e pelo risco do desenho; merece com efeito ser examinado pelas pessoas que sabem apreciar essas obras de arte, ainda bem raras em nosso país.

Depois desta solenidade teve lugar na Academia das Belas Artes, por volta do meio-dia, a inauguração da Pinacoteca Imperial pelo Sr. Ministro do Império. A medalha da inscrição gravada na casa da moeda, com o busto de S.M. numa face e o nome do fundador na outra, é um trabalho que mostra os progressos que vamos fazendo neste ramo de arte.

A fundação da Pinacoteca Imperial, destinada à exposição das obras dos artistas nacionais, vai dar um salutar impulso ao desenvolvimento da pintura, da escultura e da estatuária no nosso país. É com as suas grandes exposições anuais, com os seus prêmios de honra, que a França, promovendo uma nobre emulação entre os artistas e criando o bom gosto na população, tem conseguido elevar a arte a um grau de perfeição e desenvolvimento qu atualmente nada tem que desejar à Itália, a terra das obras primas, a pátria dos grandes pintores, dos grandes estatuários, dos grandes arquitetos.

O dia que começara tão artisticamente  devia acabar da mesma maneira, e de fato acabou com a representação do Roberto do Diabo no Teatro Lírico. Apesar de estarmos conversando hoje, creio que compreendeis bem a razão por que não vos conto alguma coisa dessa representação que se deu ontem: são coisas da imprensa.

Contudo, como estamos no teatro, suponde que houve na cena uma mutação rápida, e que vos achais de repente num salão iluminado, no meio de música, de perfume, de flores, de espelhos, de moças, e de velhas também. Dança-se... Adivinhai o quê?

Não é nem quadrilha diplomática, nem a valsa estonteada, nem a schottish com os requebros, ou a polca com os seus pulinhos. É uma coisa que tem um pouco de tudo isto, é que me faz lembrar o meu bom tempo de colégio, porque há uma espécie de marcha que se executa ao som de palmas, tal e qual como nas classes. Chama-se esta dança Ril da Virgínia, terra donde eu sabia que vinha bom fumo, donde não me consta que nunca se despachassem danças na alfândega.

O caso é que, pela alfândega ou por contrabando, dança-se hoje no Rio de Janeiro o Ril da Virgínia, que os velhos bailarinos aborrecem de morte, pela razão muito simples de não admitir canelas de cinqüenta anos passados. Os moços, porém, adoram-no; e isto também por uma razão muito simples: porque cada um, embora tire seu par, nem por isso deixa de danças com todas as moças, e de ser ao mesmo tempo par de todos os pares dos outros.

De maneira que agora já não há risco de se ir tarde para o baile, e não encontrar o par que se deseja; nem de andar a catar pelo meio, e não encontrar o par que se deseja; nem de andar a catar pelo meio da casa moças bonitas e espirituosas. Outra vantagem ainda: como a dança é uma roda-viva, estamos dispensados de  estar ai a inventar motivos de conversa, e de levarmos uma boa meia hora a esgrimir-nos contra um sim ou um não, que se encastelam nalguma boquinha arrebitada, donde não há força tira-los.

Ao menos se o sim fosse constante, eu começava logo por pedir alguma coisa que me conviesse. Mas qual! O sim e o não se revezam como duas sentinelas sempre alerta e prontas a impor o respeito à menor infração da disciplina. Por conseguinte, o melhor é tomar-se o expediente de que uso – fazer-lhes a continência, e passar de largo.

Mas onde já ando eu? Comecei num salão de baile, e parece-me que estou nalgum corpo de guarda. Eis aí o risco de escrever ao correr da pena. Se eu tivesse um compasso e um tira-linhas, não me havia de suceder semelhante coisa. Riscaria primeiramente o meu papel, escreveria o meu artigo letra por letra, pensando maduramente sobre cada palavra, refletindo profundamente na colocação dos pontos e vírgulas; depois convocaria um conselho de sábios, e, discutido o artigo em conclusões magnas, entrega-lo-ia ao compositor, quando se findassem os nove anos de correção que impõe o preceito da Arte Poética. Então, cheio de entusiasmo ao contemplar o meu artigo metido entre quatro gravuras de pau, exclamaria como Sanzio: Anch’io son pittore!  Agora já posso aspirar à honra de escrever um artigo ilustrado!

O que é verdade é que já não sei onde deixei a nossa agradável soirée, na qual se dançava com tanto prazer e animação o Ril da Virgínia, dança que daqui a alguns dias deve estar com muita razão no galarim da moda. E sobre isto desejo comunicar aos diretores das sociedades uma observação que fiz a propósito deste dançado. Tenho notado que, depois de um ril, cada um daqueles turcos transforma-se num cossaco temível; e então não há empadas nem chocolate que os farte. A respeito de gelo não falemos; seria necessário algum Himalaia ou Chimborazo feito sorvete. Por isso a moda tem muito razoavelmente destinado a dança para o fim da noite.]Com tudo isto, ainda não vos disse em que lugar da cidade nos achamos; mas contentai-vos em saber que estamos num dos nossos lindos arrabaldes, numa excelente casa de campo. E como já é perto de duas horas e as estrelas começam a fugir com as claridades precursoras do dia, segui o meu exemplo, dizei adeus a esses salões, a essas horas de prazer, que tão cedo não voltarão, e ide fazer poeticamente ao vosso travesseiro as íntimas confidências de algum segredo do coração.

Fonte:
José de Alencar. Ao Correr da Pena. SP: Martins Fontes, 2004.