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sexta-feira, 14 de julho de 2017

Chico Jó (Poemas Escolhidos)

CENAS DAQUELA FESTA

E é só vê-la outra vez... E é só fitá-la
Para em mim renascer o antigo ardor,
O mesmo antigo e apaixonado amor
Que de repente o coração me abala.

Os pares se entrelaçam pela sala,
A música maltrata a minha dor.
— Peço a todos silêncio, por favor,
Quero ouvir novamente a sua fala!

Mas ela não demonstra haver notado
Que busco o seu olhar, desesperado,
Nem parece entender minha aflição.

E alguém a chama e ela se vai, dançando,
Pisando tão de leve, mas pisando
Os restos de minha alma pelo chão!
__________________________
CONTRIÇÃO

Com migalhas de amor me satisfaço,
De nada, ou pouco menos, me sustento:
Vejo-te — e já venci todo o cansaço,
Sorris — e já esqueci todo tormento.

Na mesa farta em que te serves, passo
Por bem do que me dás, a teu contento:
Se me deixares o menor pedaço,
Será esse meu único alimento.

Não exijo, não peço, não suplico:
Espero - e se tu ficas, também fico,
E se foges de mim, eu te procuro.

Da luz que há nos teus olhos me cobriste:
Uma réstia de sol num dia triste,
Um raio de luar no céu escuro.
__________________________
DEPOIS DA TEMPESTADE

Nessas noites incertas e terríveis
Em que a farsa da vida me amedronta,
Dentro em meu ser um temporal aponta,
Rasgado por relâmpagos horríveis.

Chove; a água borbulha nos desníveis;
Não vê o sol que outra manhã desponta;
Monstro malsão de assombrações sem conta,
O vento inventa sons inexprimíveis.

Porém eu sei que essa aflição termina
E em minha alma lavada e cristalina,
Depois que a paz de espírito vier,

A brisa irá, como um clarim plangente,
Passando entre as folhagens, suavemente,
A murmurar um nome de mulher.
__________________________
EXILIUM

Muito tempo depois que neste mundo
Eu distante estiver, noutro lugar,
Quando alguém te sorrir, por um segundo,
Meu sorriso haverás de recordar.

Depois, muito depois que neste mundo
Eu esquecido for, em outro olhar
Qualquer coisa acharás, por um segundo,
Para a cor dos meus olhos relembrar.

E já longe, e depois de muito tempo,
Conhecerás alguém tímido e triste
Que te fará pensar que eu era assim.

E ouvirás dele o que de mim ouviste,
E notarás — depois de tanto tempo —
Que sem querer estás falando em mim!
__________________________
LINHA RETA

Por seres tu mulher e eu ser poeta
Foi que um dia juramos, com fervor,
Traçando a diretriz de nosso amor,
Seguir juntinhos uma linha reta.

Na geometria do viver, repleta
De curvas, com desvelo e sem temor,
Afrontei desengano e dissabor
E consegui manter a linha reta.

Mas, de juras e votos esquecida,
Foste aquela afinal que nesta vida
Perpendicularmente se afastou.

E hoje — trágica ideia desastrosa —
Tu vais como uma linha sinuosa
E eu... paralelo a tua vida vou!
__________________________
PIANO ANTIGO
Na penumbra de um canto da saleta,
Ex-amante infeliz e desprezado,
O teu piano de madeira preta
Esquecido ficou, velho e quebrado.

Mal se vê sua escura silhueta
Escondida no vão do cortinado;
Lá deixaste os papéis sobre a banqueta
E a poeira e o bolor sobre o teclado.

Mas em noites de lua e de surdina
Uma sombra saudosa, feminina,
Pairar nos ares, solitária, vem

E ele recorda, enternecido, quando,
Ao se entregar a tuas mãos, chorando,
Murmurava noturnos para alguém.
__________________________
TOUJOURS LA MÊME CHOSE

Hoje se foi minha última alegria:
Estou mais miserável do que Jó.
Vida, que enfim não passas de ironia...
Bem que dizia a minha sábia avó:

— À margem de qualquer filosofia,
Volvem, como o homem volve para o pó,
Todos os dias para o mesmo dia
E os sentimentos todos para um só.

Ontem, hoje, amanhã — depois de tudo,
Que é que resta, afinal? E por que a fútil
Dor de não entender que é sempre assim?

Por buscar e querer já não me iludo,
Ah! vi que tudo, em suma, é vão, é inútil,
Porque tudo há de ter o mesmo fim!
__________________________
VERÔNICA

Recordo agora os já desfeitos laços
Que nos uniram pela vida afora:
Ardentes confissões, doces abraços,
Eternidades gastas numa hora.

Vivos me surgem na memória os traços
Daquelas loucas emoções de outrora —
Lágrimas, risos, êxitos, fracassos,
Tudo que nos uniu recordo agora.

Ah! bem melhor seria o esquecimento,
Que essas evocações só desalento
Trazem, só desprazer, e não prazer,

E só me deixam na alma esta agonia,
Esta inquietude de quem não queria
Mas não mata a vontade de querer.

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Virgínia Crisóstomo (Poesias Avulsas)

Ser
 
No singular é pujança
que vaza e bebe e mergulha
para em seguida emergir
e se deixar derramar

Na alteridade oscila
o pendular desejo
a insinuar sem dizer
no seu falar de viés
de sinuosas vias

Na plenitude é presença
de grota a colher vida
contraste de sombra e de luz
a permear lacunas
frequência de onda lunar

É singular e plural
o sensual divino
do feminino ser
Feito cordas que vibram
antigas canções de ninar

Par a Par

O equilíbrio entre dois
na gangorra
é não ficar do mesmo lado

Não haveria diversão
não fosse o impulso sincronizado
às vezes desajeitado
a mover a gangorra

Sem a alternância
um estaria isolado no topo
e o outro preso no chão

E não desfrutariam do prazer
de estarem para a par na gangorra
a eixo de cada oscilação

Manto azul
 
O sol adormece sobre o cansaço do dia.
Na penumbra das horas a vida repousa
enquanto as trevas cumprem seu destino.

No encontro da noite com o dia,
a lua recolhe os miasmas sinistros
que o sol em breve irá cremar.

As últimas lágrimas de orvalho
diluem-se sobre as folhas,
umedecem a terra,
acordam a semente.

E a brisa da aurora dispersa as nuvens
para dar passagem à manhã
a envolver de esperanças
com seu manto azul, o novo dia.

Salgueiro
 
No recomeço de tudo
o sopro da vida pulsa
no escuro útero

É a regressão do ser
a vestir-se de grão

O broto em mutação
cava a passagem de ida
ao desconhecido instante
de orvalho e de sol
de vento e de lua

Fiel ao fio que o ancora
oferta à generosa chã
altaneira fronde
de flores e frutos

À tormenta e sua ceifa
inclina-se em reverência
e doa-lhe imoladas folhas
adubo de gérmen latente

Cada nó, cada gume
urde a preciosa trama
que forma a antiga morada
de todas as eras

O sopro da vida pulsa
e tudo é recomeço
neste jeito humano de ser

Fonte:
Rebra

Virgínia Crisóstomo

Virgínia Barbosa Leal Crisóstomo é recifense de nascimento e olindense de coração.

Filha de escritor e de historiadora e mãe de um casal de filhos, por trinta anos foi advogada da Caixa Econômica Federal em Pernambuco.

Iniciou seu percurso literário em 2003, com o livro “O Caleidoscópio da Vida”.

Em 2005 editou “Para quem não tem colírio – Desnudando o comportamento compulsivo”, e “Fênix”.

Participou de algumas antologias, entre elas “Pimenta Rosa” e “O Fim da Velhice – A superação bem humorada de um conceito”, “Pimenta Rosa”, “Antologia das Águas” e “Vozes – A Crônica Feminina Contemporânea em Pernambuco.

É sócia da União Brasileira de Escritores e integrante do Grupo Literário Celina de Holanda.

páginas em sites:

www.recife.pe.gov.br/pr/seccultura/fccc/cadastro/
 www.interpoética.com.br

Fonte:
Rebra

sábado, 19 de janeiro de 2013

Núbia Cavalcanti dos Santos (1962)


Núbia Cavalcanti dos Santos nasceu em 17 de junho de 1962, no município de Sanharó, uma pequena cidade do interior de Pernambuco.

É funcionária pública, formada em Ciências Físicas e Biológicas, pela FABEJA - PE.

Herdou da bisavó materna a paixão pela literatura, de acordo com informações obtidas por sua mãe e suas tias. 

Escreve poesias desde os quinze anos de idade. 

No ano de 2003, teve algumas dessas poesias divulgadas em uma Revista Mensal, Intitulada Revista de Sanharó. 

Em setembro de 2010, participou do XXXII Concurso Internacional Literário/SP, das Edições AG, e obteve o sexto lugar, com as poesias Muito além de um sonho e Um velho diário, publicadas na Antologia do livro “Noturno”.

 No ano de 2011, participou do Grande Concurso Cidade do Rio de Janeiro/RJ, com as poesias Reencontro, Solidão e Tributo, publicadas na Antologia “Poesia e Prosa no Rio de Janeiro”. 

No Concurso Quem Sabe Faz Agora/RJ, classificou- se com as poesias Sem você, Vou sair por aí... e Vida, minha vida.... 

Mais uma vez, obteve o quarto lugar  no XXXIII e XXXIV Concurso Internacional Literário/  SP, das Edições AG, com as poesias Amanhã, sem você e Um novo recomeço, publicadas na Antologia do livro “Amanhã, outro dia”; e Insônia e Boneca de Trapo, publicadas na Antologia do livro “Liberdade”. 

No 13º Concurso de Poesia 2011, da Biblioteca Popular de Afogados - Recife/ PE, classificou-se com as poesias Doce infância e Borboletas, ficando entre as cinqüenta selecionadas, que foram publicadas em Antologia no ano. 

No V Concurso Crônica e Literatura - Uberlândia/MG: Prêmio Literário Ferreira Gullar, ficou entre os cem classificados, com a poesia Escrava do medo, que fez parte da Antologia “Emoções Repentina - Volume III”, com publicação em fevereiro. 

Também participou das Antologias de Poetas Brasileiros Contemporâneos, pela CBJE, volumes 78, 79, 80, 81, 82 e 83, 84 e 85, com as poesias Eterno amor, Sonhos desfeitos, Razões do coração, Pai, Inspiração, Insônia, Foram tantas as vezes... e Lá se vai a madrugada, todas classificadas. 

Através dos Concursos Literários procura divulgar suas poesias. 

Blog:  http://nubia1962.blogspot.com 

Fonte:
http://www.tabacultural.com.br/nubiacavalcantidossantos.htm

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Socorro Lima Dantas / PE (Poemas)



AS MAIS DOCES PALAVRAS SOFRIDAS

É madrugada,
 aconchegada pela suave brisa da ilusão,
 traduzo o meu silêncio
  com palavras sofridas, 
 surgidas pelo sopro da tua respiração.
  
 Pensamento embaralhado,
 dos segredos por nós vivenciados,
 semeados pelo tempo outrora passado,  
 obrigam-me a escrever de um amor ainda silenciado.
    
 Com o dedo indicador, vou compondo...
 Concluindo quase a uma frase inteira !
 São palavras loucas, 
 escritas com os olhos vendados,
 procurando o segredo
 entre a versão verdadeira e a ilusão primeira.
  
 São tentativas repetidas, 
 palavras intermináveis...
  Arrisco ler a escrita primeira, 
 Não encontro...
  Pulo para a derradeira...
 Não há tempo sequer de ler a última citação !
 O vento encarregou-se de apagar uma história verdadeira!

 Nesta imensidão de areias brancas,
 diante deste oceano azul,  aspirações contidas, 
 colhidas neste mar de silêncio e pensamento,
 carregaram tão rapidamente meus sentimentos:
 As mais doces palavras sofridas!

QUEM É VOCÊ?

Quem é você ? 
 Que plantou uma rosa em meu jardim,
Adentrou em minha vida,
 chegou assim...  lentamente...
 sem pedir permissão
Penetrou em meu coração, 
e nele passou a habitar
Numa troca de afeição sem fim.

Quem é você ?
Que me traz rosas perfumadas
A cada vez que nos encontramos,
Sem ao menos conhecer a tua voz
Nem tu conheces a minha...
Que em nossas noites insones 
tantos segredos trocamos.

Quem é você ?
Que me faz revelações
Deixa-me sentir segura
Agarra-me forte pelas mãos
amparando-me da maneira mais pura.

Quem é você ?
Que se tornou minha alma-gêmea
dela não consigo mais abrir mão
e passou a fazer parte
do meu coração!

Seria você meu amigo?
Que segura a minha mão
Ouve a minha história
Ri e chora comigo,
E me chama de irmão!

MINHA VIDA

Há vezes: - deparo-me com indagações,
procuro repostas às minhas aflições,
da história de um amor guardado,
o tempo perdido...
coberto pela poeira do passado.

Peito comprimido,
hóspede dos sentimentos perdidos,
ressente-se com imagens de outrora,.
fecho meu mundo numa concha
permito escoar para mim vãs recordações.
Estou inerte !...  sem resposta alguma...
são inquietações e sofrimentos vividos.

Arrastada pela solidão,
comparo-me a uma bailarina... imóvel !...
no picadeiro, ninguém a me aplaudir...
um grito selvagem aborda o meu íntimo.
Sinto-me só, em meio a uma multidão.

Vem àquela vontade de esquecer,
partir definitivamente...
numa noite insone, exposta ao inesperado,
sem identidade da alma ...

sem levar a saudade !
quero esquecer o passado... o desejo insólito,
perdido ao encontro do nada...

Não há resposta a esta incerteza que me cerca !...
permanecem meus anseios,
aproxima-se o tédio...  
a saudade que ficou...
as recordações alteram as batidas do meu coração,
na inútil reconstrução do que fui,
e o que será deste meu eterno devaneio...

De repente,  
desperto meus pensamentos antes adormecidos !
descubro, sem querer acreditar,
tudo não passou de uma aspiração !...
pensamentos levados pelo vento
removidos pelos castelos construídos por mim,
num tempo vivido apenas para sonhar.

Anseios reprimidos,
aborda-me a vontade de esquecer tudo !
Retorno ao caminho de volta,
na inútil tentativa de mudar o destino.
Quero recontar a minha história,
alterar as versões...
mudar a rota dos nossos corações,
transformar nossas almas sofridas e amarguradas,
numa amplidão de amor ao alvorecer !

Quero viver este sonho,
quero te amar  como se não fosse existir outro momento igual,
quero esquecer a sucessão de outros dias,
viver apenas o presente !
Quero ser EU e TU numa só existência,
assim será a minha vida !

TRISTEZA… SOLIDÃO

Essa tristeza,
que não me abandona este coração,
recusa-se partir... dizer adeus...
Deixando-o em total desolação!

Essa tristeza,
que insiste em invadir a realidade,
atraindo o acesso a solidão,
que o peito não deseja enxergar...
entregando-se a saudade.

Essa tristeza... essa solidão...
Adentraram nesta alma sofrida,
que guarda um amor contido
sem licença pedir, 
Como se fosse seu !
É uma dor sem jeito, 
deixando-a perdida.

Essa tristeza... essa solidão...
que  impedem esta vida em paz prosseguir
 em seus sonhos imaginados,
devaneio de alegria
juras de amor
felicidade eterna
vida feliz
sem traumas
 sem cobranças
nem decisões imediatas.

Essa tristeza... essa solidão…

A VALSA DOS MEUS SONHOS

Embalada pelos braços da vida,
 Estou aqui, mais uma vez,
 entrando neste salão cheio de luzes e cores.
 Preparando-me para a realização de mais um sonho,
 confesso, com timidez.
    
 Interrompo o caminhar...
 Procuro abrigo para dividir esta alegria.
 Apuro o olhar e o sentir.
 Contemplo a orquestra... As pessoas...
 Descubro amigos a espera!!
 Por um momento, detenho-me,
 desacreditando viver este momento!
 Afinal, sou uma dama sonhadora
 Preste a concretizar uma aspiração,
 Este será o grande dia?!...
    
 Adianto o passo até o meio do salão,
 todos aplaudem, risonhos,
 denunciando a cumplicidade neste grande evento.
 A orquestra inicia os primeiros acordes
 da música tão esperada.
 Quanta emoção!
 Irei dançar  a valsa dos meus sonhos...
    
 Embalada pela realização, dou os primeiros passos!
 Flutuando como um pássaro...
 A melodia leva-me ao deslumbre do momento,
 Meu coração pulsa descompassado,
 São instantes de pura emoção!
  
   Enternecida nesta magia,
 Sigo deslizando docemente ao ritmo da valsa
 que não para de tocar!
 Esta é a mais linda música
 no salão de mais uma conquista.
 Será a mais inesquecível das valsas já bailadas...
 A felicidade invade minha alma!
    
 A incerteza dissolve-se...
 Descubro ser verdade!
 Extasiada pela magia do momento,
 sigo dançando com o coração cintilando
 nesta imensa realização da minha existência.
 Divido com vocês este encanto!
 Afinal, são os figurantes principais 
deste acontecimento na minha vida.
    
 Estou dançando a valsa da Felicidade!
 A valsa da realização!
 A valsa da emoção!
 A valsa de um sonho conquistado
 apenas com a alma!
 Convido todos para dançar comigo
 a valsa dos meus sonhos!

Fonte:
http://www.socorrolimadantas.com.br/poesias/index.html

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Drummond, Vinicius, Bandeira, Quintana e Campos (Cinco em Um)

Da esquerda para a direita: Carlos Drummond de Andrade, Vinicius de Moraes, Manuel Bandeira,
Mário Quintana e Paulo Mendes Campos
CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE
PAPAI NOEL ÀS AVESSAS


Papai Noel entrou pela porta dos fundos
(no Brasil as chaminés não são praticáveis),
entrou cauteloso que nem marido depois da farra.
Tateando na escuridão torceu o comutador
e a eletricidade bateu nas coisas resignadas,
coisas que continuavam coisas no mistério do Natal.
Papai Noel explorou a cozinha com olhos espertos,
achou um queijo e comeu.

Depois tirou do bolso um cigarro que não quis acender.
Teve medo talvez de pegar fogo nas barbas postiças
(no Brasil os Papai-Noéis são todos de cara raspada)
e avançou pelo corredor branco de luar.
Aquele quarto é o das crianças
Papai entrou compenetrado.

Os meninos dormiam sonhando outros natais muito mais lindos
mas os sapatos deles estavam cheinhos de brinquedos
soldados mulheres elefantes navios
e um presidente de república de celulóide.

Papai Noel agachou-se e recolheu aquilo tudo
no interminável lenço vermelho de alcobaça.
Fez a trouxa e deu o nó, mas apertou tanto
que lá dentro mulheres elefantes soldados presidente brigavam por causa do aperto.

Os pequenos continuavam dormindo.
Longe um galo comunicou o nascimento de Cristo.
Papai Noel voltou de manso para a cozinha,
apagou a luz, saiu pela porta dos fundos.

Na horta, o luar de Natal abençoava os legumes.

-
VINICIUS DE MORAES
O HAVER


Resta, acima de tudo, essa capacidade de ternura
Essa intimidade perfeita com o silêncio
Resta essa voz íntima pedindo perdão por tudo
- Perdoai-os! porque eles não têm culpa de ter nascido...

Resta esse antigo respeito pela noite, esse falar baixo
Essa mão que tateia antes de ter, esse medo
De ferir tocando, essa forte mão de homem
Cheia de mansidão para com tudo quanto existe.

Resta essa imobilidade, essa economia de gestos
Essa inércia cada vez maior diante do Infinito
Essa gagueira infantil de quem quer exprimir o inexprimível
Essa irredutível recusa à poesia não vivida.

Resta essa comunhão com os sons, esse sentimento
Da matéria em repouso, essa angústia da simultaneidade
Do tempo, essa lenta decomposição poética
Em busca de uma só vida, uma só morte, um só Vinicius.

Resta esse coração queimando como um círio
Numa catedral em ruínas, essa tristeza
Diante do cotidiano; ou essa súbita alegria
Ao ouvir passos na noite que se perdem sem história.

Resta essa vontade de chorar diante da beleza
Essa cólera em face da injustiça e o mal-entendido
Essa imensa piedade de si mesmo, essa imensa
Piedade de si mesmo e de sua força inútil.

Resta esse sentimento de infância subitamente desentranhado
De pequenos absurdos, essa capacidade
De rir à toa, esse ridículo desejo de ser útil
E essa coragem para comprometer-se sem necessidade.

Resta essa distração, essa disponibilidade, essa vagueza
De quem sabe que tudo já foi como será no vir-a-ser
E ao mesmo tempo essa vontade de servir, essa
Contemporaneidade com o amanhã dos que não tiveram ontem nem hoje.

Resta essa faculdade incoercível de sonhar
De transfigurar a realidade, dentro dessa incapacidade
De aceitá-la tal como é, e essa visão
Ampla dos acontecimentos, e essa impressionante

E desnecessária presciência, e essa memória anterior
De mundos inexistentes, e esse heroísmo
Estático, e essa pequenina luz indecifrável
A que às vezes os poetas dão o nome de esperança.

Resta esse desejo de sentir-se igual a todos
De refletir-se em olhares sem curiosidade e sem memória
Resta essa pobreza intrínseca, essa vaidade
De não querer ser príncipe senão do seu reino.

Resta esse diálogo cotidiano com a morte, essa curiosidade
Pelo momento a vir, quando, apressada
Ela virá me entreabrir a porta como uma velha amante
Mas recuará em véus ao ver-me junto à bem-amada...

Resta esse constante esforço para caminhar dentro do labirinto
Esse eterno levantar-se depois de cada queda
Essa busca de equilíbrio no fio da navalha
Essa terrível coragem diante do grande medo, e esse medo
Infantil de ter pequenas coragens.

--MANUEL BANDEIRA
RONDÓ DOS CAVALINHOS


Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
Tua beleza, Esmeralda,
Acabou me enlouquecendo.

Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
O sol tão claro lá fora
E em minhalma — anoitecendo!

Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
Alfonso Reys partindo,
E tanta gente ficando...

Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
A Itália falando grosso,
A Europa se avacalhando...

Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
O Brasil politicando,
Nossa! A poesia morrendo...
O sol tão claro lá fora,
O sol tão claro, Esmeralda,
E em minhalma — anoitecendo!

Consta que o poema acima, feito durante a "II Grande Guerra", foi escrito enquanto o autor almoçava no Jóquei-Clube do Rio de Janeiro, assistindo às corridas.

--MÁRIO QUINTANA
O MAPA


Olho o mapa da cidade
Como quem examinasse
A anatomia de um corpo...

(E nem que fosse o meu corpo!)

Sinto uma dor infinita
Das ruas de Porto Alegre
Onde jamais passarei...

Ha tanta esquina esquisita,
Tanta nuança de paredes,
Ha tanta moca bonita
Nas ruas que não andei
(E ha uma rua encantada
Que nem em sonhos sonhei...)

Quando eu for, um dia desses,
Poeira ou folha levada
No vento da madrugada,
Serei um pouco do nada
Invisível, delicioso

Que faz com que o teu ar
Pareça mais um olhar,
Suave mistério amoroso,
Cidade de meu andar
(Deste já tão longo andar!)

E talvez de meu repouso…

--PAULO MENDES CAMPOS
POEMA DIDÁTICO


Não vou sofrer mais sobre as armações metálicas do mundo
Como o fiz outrora, quando ainda me perturbava a rosa.
Minhas rugas são prantos da véspera, caminhos esquecidos,
Minha imaginação apodreceu sobre os lodos do Orco.
No alto, à vista de todos, onde sem equilíbrio precipitei-me,
Clown de meus próprios fantasmas, sonhei-me,
Morto do meu próprio pensamento, destruí-me,
Pausa repentina, vocação de mentira, dispersei-me,
Quem sofreria agora sobre as armações metálicas do mundo,
Como o fiz outrora, espreitando a grande cruz sombria
Que se deita sobre a cidade, olhando a ferrovia, a fábrica,
E do outro lado da tarde o mundo enigmático dos quintais.
Quem, como eu outrora, andaria cheio de uma vontade infeliz,
Vazio de naturalidade, entre as ruas poentas do subúrbio
E montes cujas vertentes descem infalíveis ao porto de mar ?

Meu instante agora é uma supressão de saudades. instante
Parado e opaco. Difícil se me vai tornando transpor este rio
Que me confundiu outrora. Já deixei de amar os desencontros.
Cansei-me de ser visão, agora sei que sou real em um mundo real.
Então, desprezando o outrora, impedi que a rosa me perturbasse.
E não olhei a ferrovia - mas o homem que sangrou na ferrovia -
E não olhei a fábrica - mas o homem que se consumiu na fábrica -
E não olhei mais a estrela - mas o rosto que refletiu o seu fulgor.
Quem agora estará absorto? Quem agora estará morto ?
O mundo, companheiro, decerto não é um desenho
De metafísicas magnificas (como imaginei outrora)
Mas um desencontro de frustrações em combate.
nele, como causa primeira, existe o corpo do homem
– cabeça, tronco, membros, as pirações e bem estar...

E só depois consolações, jogos e amarguras do espírito.
Não é um vago hálito de inefável ansiedade poética
Ou vaga adivinhação de poderes ocultos, rosa
Que se sustentasse sem haste, imaginada, como o fiz outrora.
O mundo nasceu das necessidades. O caos, ou o Senhor,
Não filtraria no escuro um homem inconsequente,
Que apenas palpitasse no sopro da imaginação. O homem
É um gesto que se faz ou não se faz. Seu absurdo -
Se podemos admiti-lo - não se redime em injustiça.
Doou-nos a terra um fruto. Força é reparti-lo
Entre os filhos da terra. Força - aos que o herdaram -
É fazer esse gesto, disputar esse fruto. Outrora,
Quando ainda sofria sobre as armações metálicas do mundo,
Acuado como um cão metafísico, eu gania para a eternidade,
sem compreender que, pelo simples teorema do egoísmo,
A vida enganou a vida, o homem enganou o homem.
Por isso, agora, organizei meu sofrimento ao sofrimento
De todos: se multipliquei a minha dor,
Também multipliquei a minha esperança.

domingo, 9 de setembro de 2012

Ernesto Coutinho Junior / PE (Poemas Avulsos)

VAQUEIRO ERRANTE

A vida de um vaqueiro
tem coisas para se contar
o patrão exige e grita
que ele deve cavalgar.

Surge um berro
chega um boi,
em galopada vibrante,
mensageiro da boiada
que ouviu o seu berrante.

A boiada assim entendendo
passo a passo caminhou,
para fazenda do patrão
que em pouco tempo chegou.

Reunido no curral,
nem um rés faltou,
o povo admirou,
o vaqueiro não chegou.

Cumprida a sua missão,
partiu para encontrar,
o amor que lhe foi roubado,
sem ter tempo de gritar.

Assim o vaqueiro foi
um dia ele há de voltar
pois na vida de um vaqueiro
tem coisas para se contar.

AS PEGADAS DA VIDA

Há momentos na vida
difíceis de se suportar
quando surge uma mão amiga
docilmente a nos acalantar.

O brilho que antes era raro
se faz presente ao acordar
descobrindo novos caminhos
fazendo-nos novamente triunfar.

Hoje a noite se tornou mais bela
o cérebro magnamente a criar
idéias, sonhos e anseios
no desejo nobre de reconquistar.

Permanecendo sempre humilde
deixando o exemplo de sempre servir
a todos com nobreza de alma
escrevendo o nome do verdadeiro amor.

LÁGRIMAS

Lágrimas que rolam de um rosto
Lágrimas que mexem sentimento
Lágrimas que se alegram por momentos
Lágrimas que expressam uma vida
Lágrimas derramadas em noites longas
Lágrimas que por horas se tornam pesadas
Lágriams doadas de um amor puro
Lágrimas sentidas de um homem criança
Lágrimas que falam de um alguém
Lágrimas que amam
Lágrimas que perdoam
Lágrimas que buscam
Mesmo com mágoas
Se alegram ao ver alguém
Quem? Você.
Fonte:
União Brasileira de Escritores

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Ascenso Ferreira (Poemas Avulsos)

O GÊNIO DA RAÇA

 Eu vi o gênio da raça!!!
 (Aposto como vocês estão pensando que eu vou
 falar de Rui Barbosa).
 Qual!
 O Gênio da Raça que eu vi
 foi aquela mulatinha chocolate
 fazendo o passo de siricongado
 na terça-feira de carnaval!

MINHA ESCOLA

 A escola que eu frequentava era cheia de grades como as prisões.
 E o meu Mestre, carrancudo como um dicionário;
 Complicado como as Matemáticas;
 Inacessível como Os Luzíadas de Camões!

 À sua porta eu estava sempre hesitante...
 De um lado a vida... - A minha adorável vida de criança:
 Pinhões...Papagaios...Carreiras ao sol...
 Vôos de trapézio à sombra da mangueira!
 Saltos de ingazeira pra dentro do rio...
 Jogo de castanhas...
 - O meu engenho de barro de fazer mel!

 De outro lado, aquela tortura:
 "As armas e os barões assinalados!"
 - Quantas orações?
 - Qual é o maior rio da China?
 - A 2+2 AB = quanto?
 - Que é curvilíneo, convexo?
 - Menino, venha dar sua lição de retórica!
 - "Eu começo, atenienses, invocando
 a proteção dos deuses do Olimpo
 para os destinos da Grécia!"
 - Muito bem! Isto é do grande Demóstenes!
 - Agora, a de francês:
 - Quand le christianisme avait apparu sur la terre...
 - Basta
 - Hoje temos sabatina...
 - O argumento é o bolo!
 - Qual é a distância da Terra ao Sol?
 - !??
 - Não sabe? Passe a mão à palmatória!
 - Bem, amanhã quero isso de cor...

 Felizmente à boca da noite,
 eu tinha uma velha que me contava histórias...
 Lindas histórias do reino da Mãe-d'Água...
 E me ensinava a tomar a bênção à lua nova.

TREM DE ALAGOAS
 
O sino bate,
 o condutor apita o apito,
 Solta o trem de ferro um grito,
 põe-se logo a caminhar…
 - Vou danado pra Catende,
 vou danado pra Catende,
 vou danado pra Catende
 com vontade de chegar...
Mergulham mocambos,
 nos mangues molhados,
 moleques, mulatos,
 vêm vê-lo passar.
 Adeus !
 - Adeus !
Mangueiras, coqueiros,
 cajueiros em flor,
 cajueiros com frutos
 já bons de chupar...
 - Adeus morena do cabelo cacheado !
Mangabas maduras,
 mamões amarelos,
 mamões amarelos,
 que amostram molengos
 as mamas macias
 pra a gente mamar
 - Vou danado pra Catende,
 vou danado pra Catende,
 vou danado pra Catende
 com vontade de chegar...
Na boca da mata
 ha furnas incríveis
 que em coisas terríveis
 nos fazem pensar:
 - Ali dorme o Pai-da-Mata
 - Ali é a casa das caiporas
 - Vou danado pra Catende,
 vou danado pra Catende
 vou danado pra Catende
 com vontade de chegar...
Meu Deus ! Já deixamos
 a praia tão longe…
 No entanto avistamos
 bem perto outro mar...
Danou-se ! Se move,
 se arqueia, faz onda...
 Que nada ! É um partido
 já bom de cortar...
 - Vou danado pra Catende,
 vou danado pra Catende
 vou danado pra Catende
 com vontade de chegar...
Cana caiana,
 cana rôxa,
 cana fita,
 cada qual a mais bonita,
 todas boas de chupar...
 - Adeus morena do cabelo cacheado !
 - Ali dorme o Pai-da-Matta !
 - Ali é a casa das caiporas
 - Vou danado pra Catende,
 vou danado pra Catende
 vou danado pra Catende
 com vontade de chegar...

A MULA DE PADRE

Um dia no engenho,
Já tarde da noite
Que estava tão preta
Como carvão...
A gente falava de assombração:

— O avô de Zé Pinga-Fogo
Amanheceu morto na mata
Com o peito varado
Pela canela do Pé-de-Espeto!
— O cachorro de Brabo Manso
Levou, sexta-feira passada,
Uma surra das caiporas!
— A Mula de Padre quis beber o sangue
Da mulher de Chico Lolão...

Na noite preta como carvão
A gente falava de assombração!
Lá em baixo a almanjarra,
A rara almanjarra,
Gemia e rangia
Oue o Engenho Alegria
É bom moedor...

Eh Andorinha!
Eh Moça-Branca!
Eh Beija-Flor. . .

Pela bagaceira
Os bois ruminavam
E as éguas pastavam
Esperando a vez
De entrar no rojão...
Foi quando se deu
A coisa esquisita:
Mordendo, rinchando,
As pôpas e aos pulos
Se pondo de pé
Com artes do cão,
Surgiu uma besta sem ser dali não...

— Atallia a bicha, Baraúna!
— Sustenta o laço, Maracanã!
E a besta agarrada
Entrou na almanjarra,
Tocou-se-lhe a peia
Até de manhã ...

E depois que ela foi solta
Entupiu no oco do mundo!
Num abrir e fechar d'olhos
A maldita se encantou...

De tardinha.
Gente vinda
Da cidade
Trouxe a nova
De que a ama
De seu padre
Serrador
Amanhecera tão surrada
Que causa compaixão!

.....................................
Na noite tão preta como carvão
A gente falava de assombração.

CARNAVAL DO RECIFE

Meteram uma peixeira no bucho de Colombina
que a pobre, coitada, a canela esticou!
Deram um rabo-de-arraia em Arlequim,
um clister de sebo quente em Pierrô!

E somente ficaram os máscaras da terra:
Parafusos, Mateus e Papangus...
e as Bestas-Feras impertinentes,
os Cabeções e as Burras-Calus...
realizando, contentes, o carnaval do Recife,
o carnaval mulato do Recife,
o carnaval melhor do mundo!

- Mulata danada, lá vem Quitandeira,
lá vem Quitandeira que tá de matá!

- Olha o passso do siricongado!
- Olha o passo da siriema!
- Olha o passo do jaburu!
E a Nação-de-Cambinda-Velha!
E a Nação-de-Cambinda Nova!
E a Nação-de-Leão-Coroado!

- Danou-se, mulata, que o queima é danado!
- Eu quero virá arcanfô!
Que imensa poesia nos blocos cantando:
"Todo mundo emprega
grande catatau,
pra ver se me pega
o teu olho mal!"
- Viva o Bloco das Flores! Os Batutas!
 Apois-fum!
(Como é brasileira a verve desse nome: Apois-fum!)
E o Clube do Pão Duro!
(É mesmo duro de roer o pão do pobre!)

- Lá vem o homem dos três cabaços na vara!
"Quem tirar a polícia prende!"

- Eh, garajuba!
Carnavá, meu carnavá,
tua alegria me consome...
Chegô o tempo das muié largá os home!
Chegô o tempo das muié largá os home!
Chegou lá nada...

Chegou foi o tempo delas pegarem os homens,
porque chegou o carnaval do Recife,
o carnaval mulato do Recife,
o carnaval melhor do mundo!

- Pega o pirão, esmorecido!

"OROPA, FRANÇA E BAHIA"

Num sobradão arruinado,
Tristonho, mal-assombrado,

Que dava fundos prá terra.
( "para ver marujos,
Ttituliluliu!
ao desembarcar").

...Morava Manuel Furtado,
português apatacado,
com Maria de Alencar!

Maria, era uma cafuza,
cheia de grandes feitiços.
Ah! os seus braços roliços!
Ah! os seus peitos maciços!
Faziam Manuel babar...

A vida de Manuel,
que louco alguém o dizia,
era vigiar das janelas
toda noite e todo o dia,
as naus que ao longe passavam,
de "Oropa, França e Bahia"!

— Me dá uma nau daquelas,
lhe suplicava Maria.
— Estás idiota , Maria.
Essas naus foram vintena
Que eu herdei da minha tia!
Por todo o ouro do mundo
eu jamais a trocaria!

Dou-te tudo que quiseres:
Dou-te xale de Tonquim!
Dou-te uma saia bordada!
Dou-te leques de marfim!
Queijos da Serra Estrela,
perfumes de benjoim...

Nada.
A mulata só queria
que seu Manuel lhe desse
uma nauzinha daquelas,
inda a mais pichititinha,
prá ela ir ver essas terras
"De Oropa, França e Bahia"...

— Ó Maria, hoje nós temos
vinhos da quinta do Aguirre,
uma queijadas de Sintra,
só prá tu te distraire
desse pensamento ruim...
— Seu Manuel, isso é besteira!
Eu prefiro macaxeira
com galinha de oxinxim!

"Ó lua que alumias
esse mundo de meu Deus,
alumia a mim também
que ando fora dos meus..."
Cantava Seu Manuel
espantando os males seus.

"Eu sou mulata dengosa,
linda, faceira, mimosa,
qual outras brancas não são"...
Cantava forte Maria,
pisando fubá de milho,
lentamente no pilão...

Uma noite de luar,
que estava mesmo taful,
mais de 400 naus,
surgiram vindas do Sul...
— Ah! Seu Manuel, isso chega...
Danou-se de escada abaixo,
se atirou no mar azul.

— "Onde vais mulhé?"
— Vou me daná no carrosé!
— Tu não vais, mulhé,
— mulhé, você não vai lá..."

Maria atirou-se n'água,
Seu Manuel seguiu atrás...
— Quero a mais pichititinha!
— Raios te partam, Maria!
Essas naus são meus tesouros,
ganhou-as matando mouros
o marido da minha tia !
Vêm dos confins do mundo...
De "Oropa, França e Bahia"!

Nadavam de mar em fora...
(Manuel atrás de Maria!)
Passou-se uma hora, outra hora,
e as naus nenhum atingia...
Faz-se um silêncio nas águas,
cadê Manuel e Maria?!

De madrugada, na praia,
dois corpos o mar lambia...
Seu Manuel era um "Boi Morto",
Maria, uma "Cotovia"!

E as naus de Manuel Furtado,
herança de sua tia?

— continuam mar em fora,
navegando noite e dia...
Caminham para "Pasárgada",
para o reino da Poesia!
Herdou-as Manuel Bandeira,
que, ante a minha choradeira,
me deu a menor que havia!

— As eternas naus do Sonho,
de "Oropa, França e Bahia"...

MARACATU

Zabumba de bombos,
Estouro de bombas,
Batuques de ingonos,
Cantigas de banzo,
Rangir de ganzás...

- Luanda, Luanda, onde estás?
Luanda, Luanda, onde estás?

As luas crescentes
De espelhos luzentes,
Colares e pentes,
Queijares e dentes
De maracajás...

- Luanda, Luanda, onde estás?
Luanda, Luanda, onde estás?

A balsa do rio
Cai no corrupio
Faz passo macio,
Mas toma desvio
Que nunca sonhou...

- Luanda, Luanda, onde estou?
Luanda, Luanda, onde estou?

FILOSOFIA

Hora de comer - comer!
 Hora de dormir - dormir!
Hora de vadiar - vadiar!

Hora de trabalhar?
- Pernas pro ar que ninguém é de ferro!

quarta-feira, 9 de maio de 2012

Marcelino Freire (Muribeca)


Lixo? Lixo serve pra tudo. A gente encontra a mobília da casa, cadeira pra pôr uns pregos e ajeitar, sentar. Lixo pra poder ter sofá, costurado, cama, colchão. Até televisão. É a vida da gente o lixão. E por que é que agora querem tirar ele da gente? O que é que eu vou dizer pras crianças? Que não tem mais brinquedo? Que acabou o calçado? Que não tem mais história, livro, desenho? E o meu marido, o que vai fazer? Nada? Como ele vai viver sem as garrafas, sem as latas, sem as caixas? Vai perambular pela rua, roubar pra comer? E o que eu vou cozinhar agora? Onde vou procurar tomate, alho, cebola? Com que dinheiro vou fazer sopa, vou fazer caldo, vou inventar farofa? Fale, fale. Explique o que é que a gente vai fazer da vida? O que a gente vai fazer da vida? Não pense que é fácil. Nem remédio pra dor de cabeça eu tenho. Como vou me curar quando me der uma dor no estômago, uma coceira, uma caganeira? Vá, me fale, me diga, me aconselhe. Onde vou encontrar tanto remédio bom? E esparadrapo e band-aid e seringa? O povo do governo devia pensar três vezes antes de fazer isso com chefe de família. Vai ver que eles tão de olho nessa merda aqui. Nesse terreno. Vai ver que eles perderam alguma coisa. É. Se perderam, a gente acha. A gente cata. A gente encontra. Até bilhete de loteria, lembro, teve gente que achou. Vai ver que é isso, coisa da Caixa Econômica. Vai ver que é isso, descobriram que lixo dá lucro, que pode dar sorte, que é luxo, que lixo tem valor. Por exemplo, onde a gente vai morar, é? Onde a gente vai morar? Aqueles barracos, tudo ali em volta do lixão, quem é que vai levantar? Você, o governador? Não. Esse negócio de prometer casa que a gente não pode pagar é balela, é conversa pra boi morto. Eles jogam a gente é num esgoto. Pr'onde vão os coitados desses urubus? A cachorra, o cachorro? Isso tudo aqui é uma festa. Os meninos, as meninas naquele alvoroço, pulando em cima de arroz, feijão. Ajudando a escolher. A gente já conhece o que é bom de longe, só pela cara do caminhão. Tem uns que vêm direto de supermercado, açougue. Que dia na vida a gente vai conseguir carne tão barato? Bisteca, filé, chã-de-dentro - o moço tá servido? A moça?Os motoristas já conhecem a gente. Têm uns que até guardam com eles a melhor parte. É coisa muito boa, desperdiçada. Tanto povo que compra o que não gasta - roupa nova, véu, grinalda. Minha filha já vestiu um vestido de noiva, até a aliança a gente encontrou aqui, num corpo. É. Vem parar muito bicho morto. Muito homem, muito criminoso. A gente já tá acostumado. Até o camburão da polícia deixa seu lixo aqui, depositado. Balas, revólver 38. A gente não tem medo, moço. A gente é só ficar calado. Agora, o que deu na cabeça desse povo? A gente nunca deu trabalho. A gente não quer nada deles que não esteja aqui jogado, rasgado, atirado. A gente não quer outra coisa senão esse lixão pra viver. Esse lixão para morrer, ser enterrado. Pra criar os nossos filhos, ensinar o nosso ofício, dar de comer. Pra continuar na graça de Nosso Senhor Jesus Cristo. Não faltar brinquedo, comida, trabalho. Não, eles nunca vão tirar a gente deste lixão. Tenho fé em Deus, com a ajuda de Deus eles nunca vão tirar a gente deste lixo. Eles dizem que sim, que vão. Mas não acredito. Eles nunca vão conseguir tirar a gente deste paraíso.

Fonte:
FREIRE, Marcelino. Angu de Sangue. Ateliê Editorial, 2000.

sábado, 28 de abril de 2012

Aécio Nordman Lopes Cavalcante (Livro de Sonetos)


SONETO A UMA PRINCIPIANTE

Os versos teus, tão dolentes,
(Por Deus, como não minto)
Por serem tudo o que sentes,
Não são mais do que eu sinto;

Que se vês alegre e extinto
De pranto e ranger de dentes
O peito meu - antes recinto
Das chagas mais maldizentes,

É que esse peito teu, criança,
Era alheio ao mal que se sente
Quando mal se vai a esperança;

E o meu, se sorri de repente,
É que esconde os ais da lança,
Dentro de um coração dormente!

ENTRE CACHORRO E GATO

Fosse eu um mágico, em um estranho truque
Roubava, do King, os olhos; do Kicão, o pêlo;
Do Tuli, a fome; e o cheirinho do Baruque,
De tudo eu faria, para eternamente tê-lo.

Tirava-me de vez da cartola e do smoke,
E de tudo o que antes fora, longe de sê-lo,
Eu iria a latir e a miar, e a mais querê-lo
Longe de mim, para do que sou mais lucre...

Quem sabe assim, se entre cachorro e gato,
Fosse eu ser-te o eterno guardião eleito,
A cheirar, do solo, a sola do teu sapato.

Mas, ai! Como me dói a idealização do feito!
Vai-te-me sonho! Não me sejas tão insensato,
Que trocar-me não posso o coração do peito!

A MINHA JURA

Ontem eu jurei: nunca mais hei eu
De amá-la! Tampouco querer vê-la!
Ela é para mim como uma estrela
Que já não brilha porque já morreu.

Seguirei meu caminho mesmo sem ela...
Posso lembrar que um dia lhe pertenceu
Todo este amor que sufoca o meu
Peito, mas contente e longe dela.

Isso eu jurei ontem, porque ainda
Hoje cedo minha vista quis revê-la,
E, louca, a procurou em busca infinda...

E o meu amor, que jamais atura
Um instante sequer sem merecê-la,
Hoje me fez quebrar a minha jura!

EIS O POETA

Tive de amar Joana, para amar Dolores;
Meu grito de amor, guardar bem quedo;
Ando mui lento, mas se avisto horrores,
Corro mil léguas, que não sou de enredo;

Sorrio ao inimigo que me apronta dores,
Tranco-me ao amigo que se faz de ledo;
Não sou nacional, por estar tão cedo,
E sou nacional, por sufocar rancores;

Por ti, leitor, vou de escravo a amo;
Quando em vida, dou milhões de flores,
Quando em morte, não aceito um ramo;

Em toca de santo eu não ponho o dedo;
O que mais detesto é o que mais amo,
E o que mais temo... é o medo.

SONETO A UM AMIGO HERÓI

Fraco guerreiro, já sem fé e sem trilho,
Descrido por todos nas feições do porte,
Eis que surgiste dos bordões da morte,
A gritar: “vencer!” - o teu só estribilho.

E deixaste lar, pátria, mulher e filho...
Em tua mente otimista, sorrias da sorte:
“- Hei de vencer, como só vence um forte:
Com coragem e bravura e garra e brilho!...”

E marchaste então à luta, grande soldado,
Sem corcel e sem escudo, tendo apenas
Por arma, a esperança no ideal traçado.

Foste e venceste, e tuas feições serenas
É incentivo maior ao viajor cansado,
Que não alcança na luta a razão das penas!

SONETO DA FALSA EXPRESSÃO

Se abro da pena e traço-te estes versos
No louco afã de decantar meu amor,
É que, afogado entre pranto e dor,
Quero afastar-me d’alma os ais imersos.

Mas na ânsia de dizer-te o quanto for,
Peco nos ditos, que os vês inversos
E frágeis, e de tão maus e reversos
Põem falso o poema que te vou compor.

Nem sei o que te diga, e sinto, e penso
Que por mais que eu t’o pinte infinito,
Minto; o meu amor é bem mais intenso.

Para o ter, não basta um frasear bonito,
Que há, nas palavras, o final tão denso,
E há, no amor, sempre algo pra ser dito!

SONETO A UMA MULHER BRIGUENTA

Dou toque-e-retoques sem achar-te o jeito
De veres-me perfeito nesses teus ciúmes:
Se avisto os cumes, estufas-te o peito,
E me pões afeito ao fedor de estrumes...

Nada te faço sem que, apressada, arrumes
Fingidos queixumes com arte e despeito:
Dou-te o direito a sentires-me ciúmes,
Dares-me aos perfumes o mais vil defeito;

Que eu, bem é certo, ouvir-te-ei calado
O injusto ralhar, e alheio ao meu enfado,
Estender-te-ei a mão para mais um bolo.

E se passo, de ti, indiferente a tudo,
Nem sequer percebes, do meu ódio mudo,
O quanto sou sábio em me fazer de tolo!

SONETO DO DESENCANTO

Ontem, quando pela primeira vez
Vi-te ali prostada ao pé de mim,
Sem a dúvida cruel do teu “talvez”,
Sem a negação do teu próprio “sim”,

Fitei então com tamanha altivez
Tua face roxo-clara de cetim,
Que todo o teu encanto se desfez
E pude constatar, surpreso, enfim,

Que não eras visão, mas carne e osso;
E a veste que te cobria, do mesmo pano
Que sempre cobriu o meu corpo de moço.

Eras mais uma Maria (morto o engano)
Com os pés em terra, incapaz de dano,
A puxar um cãozinho pelo pescoço.

SONETO DA BUSCA DA FELICIDADE

Seguindo sempre a atraente senda,
Fui-te, felicidade, com a fama:
Sempre mais alto do odor da lama,
Cri teu corpo por detrás da venda.

Oh! dor de ver tão cheia esta tenda
De tudo o que é belo e se mais ama,
E só ouvir o som que se derrama
Por vasta fenda de invisível fenda!

Cerra os meus olhos do vazio aberto
Aonde vai a estrela pueril e errante;
Sana, ó destino, cavaleiro incerto,

Da vida, a realidade ora jorrante:
A dor de vê-la cada vez mais perto,
E tê-la cada vez mais distante!

SONETO A OLAVO BILAC

“Príncipe dos Poetas” - o eterno eleito
De todos foste, brasileiro e forte,
A cantar, em gloriosa lira, o peito
Em dores mil, sem que da dor suporte

Os ferrões... E eu nada sou, que malfeito
É-me o estilo, e de desprezível porte
Ante o teu estilo, que, já sem jeito,
Maldigo, do saber, minha pouca sorte

De nunca achar em verso meu o estilo
Mais justo para as mágoas que abrigo,
E só compor-me verso como viste:

Sem perícia; que me acho, ao redigi-lo,
Pequeno ante as glórias que conseguiste,
E grande ante as glórias que não consigo!

Fonte:
http://www.sonetos.com.br/meulivro.php?a=83&x=15&y=8

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Edigles Guedes (Livro de Sonetos)


NAUFRAGO-ME NA SUPERFÍCIE

Páginas e mais páginas, folheadas
A inconsútil dedo, vagam por horas
A fio, na escrivaninha tão recheada
De livros imaginários… agora!…

Eis uma escrivaninha inexistente
Povoando a memória indelével de mim!…
Quem me dera! se eu pudesse navegar
Por entre as escumas, co’ odor de jasmim

A perseguir minhas ilusões!… Vagar,
Quiçá, por livros, que férteis são terras
De ideias mirabolantes, minha mente!…

E o vento sopra no meu rosto… Serra
Vai, monte vem… Montanha vai, planície
Vem… E eu naufrago-me na superfície…

DESCRIÇÃO MARÍTIMA

Ribombou o velho mar!… Tuas tênues ondas
Tecem fios de fiandeira na escuma atroz!…
Voa ligeiro e mais que veloz o albatroz,
Qual o sorriso de tua “La Gioconda”!…

Ostras perambulam por entre rochas
Anônimas!… Sociedades de corais
Pintam de Picasso os azuis anormais!…
Anêmonas acendem tortas tochas

De neurotoxinas… Peixes naufragam
Nos frios d’águas… Caranguejos afagam
A textura insondável do rochedo!…

É noite e o mar baloiça as velas, toscas
E trêmulas, voejam… Foscas moscas
Brincam com a lixeira do penedo…

TUA MÃO

Teu corpo de pérola em meu corpo
Deitado e vagamundo… Psiu tosco
De mão que mão se namora… Rede
Sem peixe para pescar: só mágoa…

Teia de aranha que arranha essa pele
De tigre… Peçonha que me chora
De dor inconcebível… Insídia
De cavaleiro medieval… Mídia

Sem suporte técnico… Parede
Sem porta ou caminho nu sem saída…
Sentimentos que me enredam… Pepe

Legal (cabuloso) sem Babalu,
Seu escudeiro; assim, ando por tabu
E teimosia… Acho tua mão lânguida!…

LUA DE OCEANO AQUÉM

Lua: bacia de prata, em que me banho de seus raios
Argênteos, na Noite fria e calma co’ essa chuva
Renitente… Descontente com as estrelas
Cadentes que nenhum dos meus desejos realizam…

Eis que Lua bamba, pendurada no trampolim
Da vaidade, sofre porque sofre com desmaios
De gravidade ausente!… Andorinha viúva
Procura marido em páginas amarelas…

Entretanto, essas estrelas parabenizam
A caçadora intrépida e seu vulgar gaiolim,
Que me prenderam aos grilhões: de Amor cárcere!…

Coruja corveja, abre asas, corre célere,
Zomba de minha insensatez, por amar a quem
Não me ama, qual Lua solitária, do oceano aquém.

ROSA CEGA

Corre e abraça-me com abraços longos
E apertados... Olha-me olhos oblongos,
Perquirindo o Tempo pretérito na
Minha face rústica... Bela Dona

Que balança seus quadris de ondas do mar...
No azo, torno-me domador a domar
Minha dor tão madura!... Cai, qual fruto
Proibido de ósculos, no plano astuto

Da Serpente devoradora de olhos
Humanos. Eis que não vejo a luz tênue
No final do túnel!… Sim, cata-piolho

Brigou com fura-bolo na bacia, aiuê!
De algodão-doce… Ah! Porquanto Amor caolho
Esconde a rosa cega de seu buquê!…

ABRAÇOS AMARGOS

Instantâneo segundo, que passo sem olhar
Fundo nos olhos de minha Dama, uma náusea
Bruta brota no meu peito de árvore pérsea!…
Mas, o outono chega: eis pungente esse desfolhar

De olhos castanhos, tão castos quanto suaves são;
Que seduzem e encantam límpido coração
Aventureiro, qual Xerazade com lábias
Mil na boca enganadora… Loucas e sábias

Palavras misturam-se em grão caldo de cana…
A Noite dadivosa vem pé de mansinho,
Com seu odor de blandícia, carícia e carinho…

Sem pedir licença, entra perfume de alfana
Nas minhas narinas; ouço os passos mui largos
De minha Flor: eis nossos abraços amargos!…

PROCURA-SE UM TROPEÇO

Procurei um sentido no sem sentido que sente
A alma gemente da gente, que anda descontente
Com o Fado: artista arlequim, guizos de Lua algente,
Malcriada e fatal mulher de olho concupiscente.

De tanto procurar esqueci-me de achar o que
Procurava; como tenra criança com bilboquê,
A qual se esquece do tempo com terno brinquedo
Na mão cândida e venturosa. Sim, corro e quedo.

Almejo alcançar o infinito do pensamento,
Desbravar a aventura néscia do sentimento,
Destronar do meu coração trágico lamento.

Ó alma tremente! se logrei meu intento, conheço
O fim do fio da meada que procuro; o começo,
Mas é duro; por isso, quero lembrar… tropeço!

AMOR MADURO EM CAIXA DE CHUMBO

Tu inoculas teu veneno de serpe
Aleivosa, que me engana como Eva
Embrulhou Adão no Jardim do Éden. Treva
Logrou ambos com sua língua, trapuz, de erpe!

Mas, é doce a peçonha que me adoça
O Fado ingente. Louca, consomes chá
De meus passos, após receber crachá:
“Ando a servir ao próximo por troça!”

Tu és serpente tremente de ódio por mal
Que nunca fiz a ti, antes salvaguardei
Nosso Amor maduro em caixa de chumbo.

Se Amor adoeceu em profundeza abismal,
Certamente a ele jamais eu reservei
Maléficos intentos, sons de zumbo!

CORAÇÕES ENGRINALDADOS

Lembro-me do retrato na parede do nosso
Quarto de dormir. Nossos olhos enamorados clamam
Um pelo outro, em suspiros de desejos; declamam
Poemas eróticos às quatro paredes!… Que osso

É a vida!… Foi ontem que subimos, jungidos beijos,
A ladeira do tálamo. Tu estavas formosa;
Esplendias com todas as primaveras!… Oh! rosa
Do meu jardim de Amor e delícias… Onde queijos

De Lua se esconde do paladar da minha boca,
Fremente de prazer e gozo?… Sim, eis quão louca
Paixão me consome o íntimo meu ser… Quiçá ninguém

Me escute o dessegredo… Ó coelhinha na toca
De amores! acolhida nos meus braços de mouca
Libido, que pena sou na alcova mais um alguém!…

Fonte:
http://www.sonetos.com.br/meulivro.php?a=110

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Valmir Jordão (Do Tricentenário de Zumbi)


Quilombo,Angola-Janga,
guerreando pra viver em paz,
igualdade direito de todos
salvaguardado pelos Orixás.

N'zambi,Zombi,Zumbi grande chefe
engravidou a Serra da Barriga,
de negritude,coragem,resistência
quilombola guerreiro bom de briga.

Mombaça,Congo,Camarões,Daomé
África oceânica palmarina,
enfrentando o amargo do açúcar
escravidão,tortura,má-sina.

Malungos nas várias Senzalas
Quimbundo,Mandinga,Jeje,Yorubá
em fuga,derrubam paus mandados,
pra ter tempo de jogar o Caxangá.
--

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Adelmar Tavares (Cantigas de Amor)


Renúncia de amor profundo
Guarda sublime troféu:
Transforma pedras do mundo
Em construções para o Céu.

Amor que eu saiba em vitória,
No rumo do firmamento,
Deve perder toda escória
No fogo do sofrimento.

Celeste amor que perdura
Atende a roteiro assim:
Ilimitada ternura
No entendimento sem fim.

Chagas de amor que se eleva
Recordam Cristo na cruz...
De cada golpe da treva
Jorra uma fonte de luz.

Amor vence espinho, ultraje,
Agravo, calúnia e lama.
Amor puro é Deus que age
No coração de quem ama.

Fonte:
Francisco Cândido Xavier (psicografia). “Trovas Do Outro Mundo”. Digitalização por Lúcia Aydir
Imagem = http://julioribeirocortez.blogspot.com

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Carlos Alberto de Assis Cavalcanti (Livro de Trovas)


Tinha viúva demais
no velório do bacana,
todas choravam iguais:
enganaste, seu sacana!

Os moradores do além
não causam mal aos de cá,
mas os que moram aquém
é que nos mandam pra lá.

Discursava no plenário,
se dizendo popular,
mas na hora do salário,
só pensava em se aumentar.

Se antigamente era a mão
que o noivo à noiva pedia,
agora os dois, de antemão,
já nem mais esperam o dia...

Há quem diga que a mentira
tem pernas curtas pra andar,
mas o dono dela estira
as suas para ajudar.

Há quem chore por defunto
bem na beira do caixão,
mas ninguém quer ficar junto
do finado sob o chão.

No domingo, bem contrito,
comunga da eucaristia;
na segunda, bem aflito,
comunga da carestia.

No passado, bem remoto,
havia a mata e o primata;
no presente, se bem noto,
nem primata, nem a mata.

Logo se fez um tumulto
na prova de Português,
achar um sujeito oculto.
pois aluno quer de vez

De que adianta tua cobiça,
teu rasante olhar de abutre,
se há de ser também carniça
essa carne que te nutre.

Se dizia o mais temido
lá no morro do presunto,
sendo assim foi promovido
de valente pra defunto.

Quando o homem é o predador
das belezas naturais,
não respeita nem a dor
que provoca aos animais.

Tão radical se mantinha
quando entrava em discussão,
que nem ele mesmo tinha
pra peleja a solução.

Era um deputado obeso,
mesmo estando em exercício,
tinha um salário de peso
pra tão pouco sacrifício.

Fontes:
UBT Nacional
Curriculo Lattes