SONETO A UMA PRINCIPIANTE
Os versos teus, tão dolentes,
(Por Deus, como não minto)
Por serem tudo o que sentes,
Não são mais do que eu sinto;
Que se vês alegre e extinto
De pranto e ranger de dentes
O peito meu - antes recinto
Das chagas mais maldizentes,
É que esse peito teu, criança,
Era alheio ao mal que se sente
Quando mal se vai a esperança;
E o meu, se sorri de repente,
É que esconde os ais da lança,
Dentro de um coração dormente!
ENTRE CACHORRO E GATO
Fosse eu um mágico, em um estranho truque
Roubava, do King, os olhos; do Kicão, o pêlo;
Do Tuli, a fome; e o cheirinho do Baruque,
De tudo eu faria, para eternamente tê-lo.
Tirava-me de vez da cartola e do smoke,
E de tudo o que antes fora, longe de sê-lo,
Eu iria a latir e a miar, e a mais querê-lo
Longe de mim, para do que sou mais lucre...
Quem sabe assim, se entre cachorro e gato,
Fosse eu ser-te o eterno guardião eleito,
A cheirar, do solo, a sola do teu sapato.
Mas, ai! Como me dói a idealização do feito!
Vai-te-me sonho! Não me sejas tão insensato,
Que trocar-me não posso o coração do peito!
A MINHA JURA
Ontem eu jurei: nunca mais hei eu
De amá-la! Tampouco querer vê-la!
Ela é para mim como uma estrela
Que já não brilha porque já morreu.
Seguirei meu caminho mesmo sem ela...
Posso lembrar que um dia lhe pertenceu
Todo este amor que sufoca o meu
Peito, mas contente e longe dela.
Isso eu jurei ontem, porque ainda
Hoje cedo minha vista quis revê-la,
E, louca, a procurou em busca infinda...
E o meu amor, que jamais atura
Um instante sequer sem merecê-la,
Hoje me fez quebrar a minha jura!
EIS O POETA
Tive de amar Joana, para amar Dolores;
Meu grito de amor, guardar bem quedo;
Ando mui lento, mas se avisto horrores,
Corro mil léguas, que não sou de enredo;
Sorrio ao inimigo que me apronta dores,
Tranco-me ao amigo que se faz de ledo;
Não sou nacional, por estar tão cedo,
E sou nacional, por sufocar rancores;
Por ti, leitor, vou de escravo a amo;
Quando em vida, dou milhões de flores,
Quando em morte, não aceito um ramo;
Em toca de santo eu não ponho o dedo;
O que mais detesto é o que mais amo,
E o que mais temo... é o medo.
SONETO A UM AMIGO HERÓI
Fraco guerreiro, já sem fé e sem trilho,
Descrido por todos nas feições do porte,
Eis que surgiste dos bordões da morte,
A gritar: “vencer!” - o teu só estribilho.
E deixaste lar, pátria, mulher e filho...
Em tua mente otimista, sorrias da sorte:
“- Hei de vencer, como só vence um forte:
Com coragem e bravura e garra e brilho!...”
E marchaste então à luta, grande soldado,
Sem corcel e sem escudo, tendo apenas
Por arma, a esperança no ideal traçado.
Foste e venceste, e tuas feições serenas
É incentivo maior ao viajor cansado,
Que não alcança na luta a razão das penas!
SONETO DA FALSA EXPRESSÃO
Se abro da pena e traço-te estes versos
No louco afã de decantar meu amor,
É que, afogado entre pranto e dor,
Quero afastar-me d’alma os ais imersos.
Mas na ânsia de dizer-te o quanto for,
Peco nos ditos, que os vês inversos
E frágeis, e de tão maus e reversos
Põem falso o poema que te vou compor.
Nem sei o que te diga, e sinto, e penso
Que por mais que eu t’o pinte infinito,
Minto; o meu amor é bem mais intenso.
Para o ter, não basta um frasear bonito,
Que há, nas palavras, o final tão denso,
E há, no amor, sempre algo pra ser dito!
SONETO A UMA MULHER BRIGUENTA
Dou toque-e-retoques sem achar-te o jeito
De veres-me perfeito nesses teus ciúmes:
Se avisto os cumes, estufas-te o peito,
E me pões afeito ao fedor de estrumes...
Nada te faço sem que, apressada, arrumes
Fingidos queixumes com arte e despeito:
Dou-te o direito a sentires-me ciúmes,
Dares-me aos perfumes o mais vil defeito;
Que eu, bem é certo, ouvir-te-ei calado
O injusto ralhar, e alheio ao meu enfado,
Estender-te-ei a mão para mais um bolo.
E se passo, de ti, indiferente a tudo,
Nem sequer percebes, do meu ódio mudo,
O quanto sou sábio em me fazer de tolo!
SONETO DO DESENCANTO
Ontem, quando pela primeira vez
Vi-te ali prostada ao pé de mim,
Sem a dúvida cruel do teu “talvez”,
Sem a negação do teu próprio “sim”,
Fitei então com tamanha altivez
Tua face roxo-clara de cetim,
Que todo o teu encanto se desfez
E pude constatar, surpreso, enfim,
Que não eras visão, mas carne e osso;
E a veste que te cobria, do mesmo pano
Que sempre cobriu o meu corpo de moço.
Eras mais uma Maria (morto o engano)
Com os pés em terra, incapaz de dano,
A puxar um cãozinho pelo pescoço.
SONETO DA BUSCA DA FELICIDADE
Seguindo sempre a atraente senda,
Fui-te, felicidade, com a fama:
Sempre mais alto do odor da lama,
Cri teu corpo por detrás da venda.
Oh! dor de ver tão cheia esta tenda
De tudo o que é belo e se mais ama,
E só ouvir o som que se derrama
Por vasta fenda de invisível fenda!
Cerra os meus olhos do vazio aberto
Aonde vai a estrela pueril e errante;
Sana, ó destino, cavaleiro incerto,
Da vida, a realidade ora jorrante:
A dor de vê-la cada vez mais perto,
E tê-la cada vez mais distante!
SONETO A OLAVO BILAC
“Príncipe dos Poetas” - o eterno eleito
De todos foste, brasileiro e forte,
A cantar, em gloriosa lira, o peito
Em dores mil, sem que da dor suporte
Os ferrões... E eu nada sou, que malfeito
É-me o estilo, e de desprezível porte
Ante o teu estilo, que, já sem jeito,
Maldigo, do saber, minha pouca sorte
De nunca achar em verso meu o estilo
Mais justo para as mágoas que abrigo,
E só compor-me verso como viste:
Sem perícia; que me acho, ao redigi-lo,
Pequeno ante as glórias que conseguiste,
E grande ante as glórias que não consigo!
Fonte:
http://www.sonetos.com.br/meulivro.php?a=83&x=15&y=8
Os versos teus, tão dolentes,
(Por Deus, como não minto)
Por serem tudo o que sentes,
Não são mais do que eu sinto;
Que se vês alegre e extinto
De pranto e ranger de dentes
O peito meu - antes recinto
Das chagas mais maldizentes,
É que esse peito teu, criança,
Era alheio ao mal que se sente
Quando mal se vai a esperança;
E o meu, se sorri de repente,
É que esconde os ais da lança,
Dentro de um coração dormente!
ENTRE CACHORRO E GATO
Fosse eu um mágico, em um estranho truque
Roubava, do King, os olhos; do Kicão, o pêlo;
Do Tuli, a fome; e o cheirinho do Baruque,
De tudo eu faria, para eternamente tê-lo.
Tirava-me de vez da cartola e do smoke,
E de tudo o que antes fora, longe de sê-lo,
Eu iria a latir e a miar, e a mais querê-lo
Longe de mim, para do que sou mais lucre...
Quem sabe assim, se entre cachorro e gato,
Fosse eu ser-te o eterno guardião eleito,
A cheirar, do solo, a sola do teu sapato.
Mas, ai! Como me dói a idealização do feito!
Vai-te-me sonho! Não me sejas tão insensato,
Que trocar-me não posso o coração do peito!
A MINHA JURA
Ontem eu jurei: nunca mais hei eu
De amá-la! Tampouco querer vê-la!
Ela é para mim como uma estrela
Que já não brilha porque já morreu.
Seguirei meu caminho mesmo sem ela...
Posso lembrar que um dia lhe pertenceu
Todo este amor que sufoca o meu
Peito, mas contente e longe dela.
Isso eu jurei ontem, porque ainda
Hoje cedo minha vista quis revê-la,
E, louca, a procurou em busca infinda...
E o meu amor, que jamais atura
Um instante sequer sem merecê-la,
Hoje me fez quebrar a minha jura!
EIS O POETA
Tive de amar Joana, para amar Dolores;
Meu grito de amor, guardar bem quedo;
Ando mui lento, mas se avisto horrores,
Corro mil léguas, que não sou de enredo;
Sorrio ao inimigo que me apronta dores,
Tranco-me ao amigo que se faz de ledo;
Não sou nacional, por estar tão cedo,
E sou nacional, por sufocar rancores;
Por ti, leitor, vou de escravo a amo;
Quando em vida, dou milhões de flores,
Quando em morte, não aceito um ramo;
Em toca de santo eu não ponho o dedo;
O que mais detesto é o que mais amo,
E o que mais temo... é o medo.
SONETO A UM AMIGO HERÓI
Fraco guerreiro, já sem fé e sem trilho,
Descrido por todos nas feições do porte,
Eis que surgiste dos bordões da morte,
A gritar: “vencer!” - o teu só estribilho.
E deixaste lar, pátria, mulher e filho...
Em tua mente otimista, sorrias da sorte:
“- Hei de vencer, como só vence um forte:
Com coragem e bravura e garra e brilho!...”
E marchaste então à luta, grande soldado,
Sem corcel e sem escudo, tendo apenas
Por arma, a esperança no ideal traçado.
Foste e venceste, e tuas feições serenas
É incentivo maior ao viajor cansado,
Que não alcança na luta a razão das penas!
SONETO DA FALSA EXPRESSÃO
Se abro da pena e traço-te estes versos
No louco afã de decantar meu amor,
É que, afogado entre pranto e dor,
Quero afastar-me d’alma os ais imersos.
Mas na ânsia de dizer-te o quanto for,
Peco nos ditos, que os vês inversos
E frágeis, e de tão maus e reversos
Põem falso o poema que te vou compor.
Nem sei o que te diga, e sinto, e penso
Que por mais que eu t’o pinte infinito,
Minto; o meu amor é bem mais intenso.
Para o ter, não basta um frasear bonito,
Que há, nas palavras, o final tão denso,
E há, no amor, sempre algo pra ser dito!
SONETO A UMA MULHER BRIGUENTA
Dou toque-e-retoques sem achar-te o jeito
De veres-me perfeito nesses teus ciúmes:
Se avisto os cumes, estufas-te o peito,
E me pões afeito ao fedor de estrumes...
Nada te faço sem que, apressada, arrumes
Fingidos queixumes com arte e despeito:
Dou-te o direito a sentires-me ciúmes,
Dares-me aos perfumes o mais vil defeito;
Que eu, bem é certo, ouvir-te-ei calado
O injusto ralhar, e alheio ao meu enfado,
Estender-te-ei a mão para mais um bolo.
E se passo, de ti, indiferente a tudo,
Nem sequer percebes, do meu ódio mudo,
O quanto sou sábio em me fazer de tolo!
SONETO DO DESENCANTO
Ontem, quando pela primeira vez
Vi-te ali prostada ao pé de mim,
Sem a dúvida cruel do teu “talvez”,
Sem a negação do teu próprio “sim”,
Fitei então com tamanha altivez
Tua face roxo-clara de cetim,
Que todo o teu encanto se desfez
E pude constatar, surpreso, enfim,
Que não eras visão, mas carne e osso;
E a veste que te cobria, do mesmo pano
Que sempre cobriu o meu corpo de moço.
Eras mais uma Maria (morto o engano)
Com os pés em terra, incapaz de dano,
A puxar um cãozinho pelo pescoço.
SONETO DA BUSCA DA FELICIDADE
Seguindo sempre a atraente senda,
Fui-te, felicidade, com a fama:
Sempre mais alto do odor da lama,
Cri teu corpo por detrás da venda.
Oh! dor de ver tão cheia esta tenda
De tudo o que é belo e se mais ama,
E só ouvir o som que se derrama
Por vasta fenda de invisível fenda!
Cerra os meus olhos do vazio aberto
Aonde vai a estrela pueril e errante;
Sana, ó destino, cavaleiro incerto,
Da vida, a realidade ora jorrante:
A dor de vê-la cada vez mais perto,
E tê-la cada vez mais distante!
SONETO A OLAVO BILAC
“Príncipe dos Poetas” - o eterno eleito
De todos foste, brasileiro e forte,
A cantar, em gloriosa lira, o peito
Em dores mil, sem que da dor suporte
Os ferrões... E eu nada sou, que malfeito
É-me o estilo, e de desprezível porte
Ante o teu estilo, que, já sem jeito,
Maldigo, do saber, minha pouca sorte
De nunca achar em verso meu o estilo
Mais justo para as mágoas que abrigo,
E só compor-me verso como viste:
Sem perícia; que me acho, ao redigi-lo,
Pequeno ante as glórias que conseguiste,
E grande ante as glórias que não consigo!
Fonte:
http://www.sonetos.com.br/meulivro.php?a=83&x=15&y=8
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