sábado, 10 de novembro de 2018

Trova 327 - Olympio Coutinho (Belo Horizonte/MG)


Mário Quintana (Os Sonetos e Doutor Quejando)


Lili, ao revelar-me um dia umas composições suas - onde os lugares-comuns esvoaçavam com toda a novidade da inocência muito se espantou do meu espanto pelo fato de que os títulos nada tinham a ver com o texto. Explicou-me que um dos sonetos se chamava João porque era o nome de um seu amiguinho de escola e o mesmo se dava com o soneto chamado Sofia.

Ora, ora, me quedei pensando, não estaria ela com a razão? Já teve a poesia o seu período temático, como a pintura. Daí, hoje, a desnecessidade de títulos, nas telas como nos poemas. O que, cronologicamente, não é bem assim, tanto que Camões e Petrarca se limitavam a numerar os seus sonetos, nem é de crer que assim fizessem simplesmente por falta de imaginação. Deixemos, pois, de generalizações, que levam sempre a becos sem saída. E, em troca, este "soneto" que improvisei naqueles tempos para Lili, quando a sua mania, além de chamar tudo de soneto, era meter, em tudo, a palavra "POIS":

O Doutor Quejando, pois, vinha andando andando, quando encontrou o carneirinho Mé em companhia da vaquinha Bu.

- Olé! Como vais tu? - disseram-lhe os dois.

O Doutor Quejando continuou andando, mudo.

Mas na cerca havia um urubu. Mudo.

E o Doutor Quejando e o urubu trocaram um horrivel olhar de simpatia.

E o pior de tudo é que se acabou a história... Se acabou a história e a vida continua.

Fonte:
Mário Quintana. Caderno H. Porto Alegre/RS: Globo, 1973.

Zeferino Brazil (Poemas Recolhidos)


ASPIRAÇÃO

Ser pedra! não sofrer nem amar, ó que ventura!
Excelsa aspiração que merece um poema!
Ser pedra e ter da pedra a consistência dura
Que resiste do tempo à corrupção extrema.

Alma! sopro de luz que me anima e depura,
Antes tu fosses pedra: um diamante, uma gema
Não te seria a vida esta insana loucura
Do eterno aspirar à perfeição suprema!

Homem, não mudarás! És homem, serás homem;
Lama vil animada, onde vive e onde medra
A venenosa flor das mágoas que consomem.

Homem sempre serás, imperfeito e corruto...
E melhor é ser pedra e viver como pedra
Que ser homem assim e viver como um bruto!..

DE LEVE BEIJO AS SUAS MÃOS PEQUENAS

De leve, beijo as suas mãos pequenas, 
Alvas, de neve, e, logo, um doce, um breve, 
Fino rubor lhe tinge a face, apenas
De leve beijo as suas mãos de neve.

Ela vive entre lírios e açucenas, 
E o vento a beija, e, corno o vento, deve 
Ser o meu beijo em suas mãos serenas, 
— Tão leve o beijo, como o vento é leve.. . 

Que essa divina flor, que é tão suave, 
Ama o que é leve, como um leve adejo 
De vento ou como um garganteio de ave, 

E já me basta, para meu tormento, 
Saber que o vento a beija, e que o meu beijo 
Nunca será tão leve como o vento.. .

ZELOS

De leve, beijo as suas mãos pequenas,
alvas, de neve, e, logo, um doce, um breve,
fino rubor lhe tinge a face, apenas
de leve beijo as suas mãos de neve.

Ela vive entre lírios e açucenas,
e o vento a beija, e, corno o vento, deve
ser o meu beijo em suas mãos serenas,
— Tão leve o beijo, como o vento é leve.. .

Que essa divina flor, que é tão suave,
ama o que é leve, como um leve adejo
de vento ou como um garganteio de ave,

e já me basta, para meu tormento,
saber que o vento a beija, e que o meu beijo
nunca será tão leve como o vento.. .

FORMOSURA IDEAL

Esta visão que em sonhos me aparece,
e que, mesmo sonhando, me resiste,
por que foge, por que desaparece,
mal eu desperto, apaixonado e triste?

Por que, branca e formosa resplandece
como uma estrela, e a torturar-me insiste,
se é certo, - oh! dor cruel que me enlouquece!...
que ela somente no meu sonho existe?

Cheia de luz e de pureza e graça,
- alma de flor e coração de estrela -
ela, sorrindo, nos meus sonhos passa...

E sempre a mesma angústia dolorida:
branca e formosa dentro d´alma tê-la,
sem poder dar-lhe forma e dar-lhe vida!

NA ALCOVA

Formosa e diáfana visão de lenda,
Elsa, subindo o leito de escarlata,
o cortinado cerra, e a rir, desvenda
a alva nudez escultural e exata.

Antes que o fino laço se desprenda,
a loura coma em ondas se desata,
e a moça esconde em flóculos de renda
o régio corpo modelado em prata.

Doce perfume o colo lhe embalsama...
Abrindo as asas de rubi e lhama,
olha-a, entre flores, um cupido louro...

Cerra, afinal, as pálpebras de neve,
e o sonho desce, e estende, leve, leve,
sobre o leito o estrelado manto de ouro...

Zeferino Brazil (1870 - 1942) Príncipe dos Poetas Rio-Grandenses

Zeferino Antônio de Souza Brazil, filho de João Antonio de Souza e de Fausta Carolina de Souza, nasceu em 24 de abril de 1870, no distrito ribeirinho de Taquari, em Porto Grande. 

Em 1879, mudou-se para a capital provincial do Rio Grande do Sul, onde exerceu diversas funções até ingressar, em 1889, através de concurso, no funcionalismo público, como oficial do Tesouro do Estado. 

Em 1890, conheceu Celina Ribeiro Totta, com quem se casou em 1891. 

Zeferino Brazil firmou-se como cronista, romancista, dramaturgo, crítico, mas a sua marca pessoal, como artista da palavra, foi a poesia, obtendo, por isso, o epíteto “Príncipe dos poetas rio-grandenses”, devido à sua expressiva e notória sensibilidade poética: “romancista de vastos recursos, prosador imaginoso e ágil, lidador da imprensa diária, humorista fino e mordaz, orador elegante e fluente, tudo isto Zeferino Brazil conseguiu ser! O Poeta, porém, constituía o feitio integral daquele espírito cheio de harmonias e de doçuras infindas!”, conforme Augusto de Carvalho. 

Colaborou com vários jornais usando, além do nome Zeferino Brazil, vários pseudônimos, dentre eles, conforme o próprio autor: Nilo Castanheira, João Simplício, Lúcifer, Til, João da Ega, Eça de Oliveira, Brás Patife Júnior, José dos Cantinhos, Zézinho, Tic, Tac e Diabo Coxo, Celino Délio, Vasco de Montarroyos, Phoebus de Montalvão e Diávolo e Luiz Deniz. 

Membro e posteriormente Presidente de Honra da Academia Literária Sul-rio-grandense e da Academia Riograndense de Letras; 

Membro da comissão de lexicografia da Academia de Letras do Rio Grande do Sul; 

Presidente de honra do Cenáculo Literário Porto Alegrense; 

Presidente de Honra da Casa do Intelectual Brasileiro; 

Foi homenageado por um grupo de jovens de Santiago do Boqueirão, que fundou, em 02/09/1919, um grêmio denominado Grêmio Literário Zeferino Brazil, e também por um grupo de jovens de Encruzilhada, que criou, em 15/05/1942, um centro de cultura denominado Ateneu Zeferino Brazil. 

O poeta Zeferino Brazil, o príncipe dos poetas rio-grandenses, faleceu em 03 de outubro de 1942, em Porto Alegre, à margem do Guaíba, deixando a esposa, filhos, netos e bisnetos, além de uma legião de amigos que manifestaram sua dor e reconhecimento numa série de artigos publicados na imprensa local. 

Fragmento, extraído do Diário Carioca, de 04/10/1942: “Ele viveu para as letras. O cargo público que exercera mal lhe dava o pão de cada dia. Todo o seu tempo, os seus dias, os seus minutos eram voltados para as coisas do espírito. Com elas viveu e com elas morreu.”

Começou a escrever muito cedo, deixando publicadas nove obras poéticas, dois romances e um livro de crônicas, na seguinte ordem:

Alegros e surdinas (versos dos 15 anos) – 1891;
Traços cor de rosa (verso) – 1892;
Comédia da Vida – 1896-1897;
Juca, o letrado (estudo da psicologia mórbida) – 1900;
Vovó musa – 1903;
Visão do ópio – 1906;
Torre de marfim – 1910,;
Comédia da vida. Versos alegres para gente triste. 2ª série. – 1914;
O meio: psicofisiologia do alcoolismo – 1922;
Teias do luar – 1924;
Bohemia da Penna (prosa velha) – 1932;
Alma gaúcha – 1935;

Como dramaturgo, escreveu a comédia Ester, (apresentada pela Sociedade dramática de Porto Alegre, no Teatro São Pedro em 21 de julho de 1902); o drama O outro, em 1904, (também apresentada pela Sociedade Dramática) e a comédia de um ato O Homem de gênio, encenada, mas sem menção da companhia teatral. 

Fonte:
Pontífice Universidade Católica do Rio Grande do Sul.

Contos e Lendas do Mundo (Portugal: Lenda do Bolo-Rei)


O Bolo-Rei é o bolo tradicional natalício português por excelência. A sua origem tem várias raízes. A ideia de um bolo misturado com fruta cristalizada terá surgido na corte do rei Luís XIV, em França, que com os tempos foi-se espalhando pelo resto da Europa. Chegada a Portugal a receita foi adaptada, adquiriu a forma de coroa com que é vendido atualmente e passou a ser associado à época natalícia. A introdução da fava vem no tempo dos Romanos, em que era costume durante as festividades eleger-se o “rei da festa” colocando-se uma fava num bolo. Já a introdução do brinde como recompensa (ficando o perdedor com a fava) é uma criação portuguesa, embora este costume tenha sido, à uns anos, passado a ser proibido por apresentar risco de sufoco, sobretudo para as crianças.

Apesar do nome “Bolo-Rei” não vir, como erroneamente se pensa, do dia de Reis – a nomenclatura “Rei” é apenas uma indicação da riqueza de ingredientes com que é feito, tornando-o no bolo “maior” das festividades – isso não impediu a tradição oral de o associar aos Reis Magos, havendo inclusive uma lenda portuguesa que lhes atribui a origem do bolo e lhe dá simbologia. Segue-se a história:

Conta a lenda que num país distante viviam três homens sábios que analisavam e estudavam as estrelas e o céu. Estes homens sábios chamavam-se Gaspar, Melchior e Baltazar, a que a tradição deu a nomeação de “três Reis Magos”.

Numa noite, ao analisarem o céu, viram uma nova estrela, muito mais brilhante que as restantes, que se movia pelo céu, e interpretaram-na como um aviso de que o filho de Deus nascera. Resolvidos a segui-la, levaram consigo três presentes: incenso; ouro e mirra, para poder presentear o Messias recém nascido.

Chegados à cidade de Belém, já perto da gruta onde estava o menino Jesus, os Reis Magos depararam-se com um dilema: Qual deles teria o privilégio de oferecer  primeiro o seu presente? Esta pergunta gerou a discussão entre os três.

Um artesão que por ali passava ouviu a conversa e propôs uma solução para o problema de maneira a ficarem todos satisfeitos. Pediu à sua mulher que fizesse um bolo e que na massa colocasse uma fava. Mas a mulher não se limitou a fazer um simples bolos e arranjou forma de ali representar os presentes que os três homens levavam. Desta forma fez um bolo cuja côdea dourada simbolizava o ouro, as frutas cristalizadas simbolizavam a mirra e o açúcar de polvilhar simbolizava o incenso. Depois de cozido o bolo foi repartido em três partes e aquele a quem saiu a fava foi efetivamente o primeiro a oferecer os presentes ao menino Jesus.

Fonte:
Contos de Natal Portugueses: Coletânea de histórias, textos, lendas e poemas. 
Disponível em: http://www.luso-livros.net/

quinta-feira, 8 de novembro de 2018

Antonio Brás Constante (Vivendo entre Duas Amantes)


Tenho duas amantes. O sonho da maioria dos homens. Elas são caprichosas e cada uma possui os seus encantos. Uma delas está comigo agora, incendiando minha imaginação, enquanto a outra espera deitada ao meu lado, para que eu descubra os seus segredos.

A primeira é a escrita, que revela o que há de melhor e de pior em mim. Somos ligados por seus símbolos e simbolismos, comungando uma paixão a cada novo texto. Invento os seus caminhos, deixando neles a minha marca de autor. Ela me seduz como obra; é mais uma amiga querida, do que uma amante desejada.

A escrita é uma parte de mim, a transformação de pensamentos abstratos em formas concretas, traduzindo as percepções que me cercam em realidades impressas e expostas ao mundo através de revistas, e-mails, sites e jornais. O desejo de escrever é uma luz que invade a janela onde se encontra minha alma. Por meio dela, cada pensamento pode virar uma nova frase, um novo parágrafo, uma nova narrativa, um novo começo. Somos parceiros no mais íntimo dos momentos de um ser humano: o momento da criação.

Minha outra amante é a leitura, repousando em forma de livro ao lado de minha cama, sempre cheia de conhecimentos, aflorando emoções, alterando minhas compreensões. Ela chega até mim repleta de saborosas ideias ou de amargos dissabores. Algumas vezes me enfeitiçando com seu fascinante enredo, outras vezes me decepcionando com a cruel realidade retratada no seio de suas palavras. Quando nos encontramos, passamos a pertencer a um só momento localizado nas páginas de suas histórias. Vamos para todos os lugares juntos. Quando me percebo já estou viajando com meus olhos por seu delicioso corpo de mistérios. Quem nos vê ao longe, não nota o gozo advindo dos momentos que ela me proporciona. A cada leitura, um novo romance se inicia, uma incrível aventura nasce do nada, com personagens que vão surgindo e dançando em irresistíveis cenas vistas apenas por mim. Irrefutável. 

Ao ler, acabo me envolvendo nos encantos de uma amante escrita por outro autor. Da mesma forma que vejo minhas composições deleitando os olhares de outros que delas se aproximam. Orgias literárias, nas quais essas amantes textuais se tornam fontes de prazer indelével a vários leitores e escritores que a elas se entregam voraz e totalmente.

As duas são faces distintas de uma só moeda, almas gêmeas de uma mesma concepção. Filhas da mãe inspiração, que entra de forma imperceptível nos recantos da mente (frágil mente), inicialmente em busca de mãos onde possa se expressar. Mãos que vão aos poucos tecendo e nutrindo as formas desejadas por ela para suas criações. A inspiração é deusa sussurrante e maliciosa, que envolve e se desenvolve no cérebro do escritor, se desnudando em toda sua glória como singela história, fabricando para si um novo corpo que possa vestir, recheado de letras, para então seguir cumprindo seus desígnios de amante, saindo das mãos dos escritores, para enfim cair nos braços de inúmeros leitores.

Fonte:
Constante, Antonio Brás.  Hoje é o seu aniversário! “Prepare-se” : e outras histórias. 
Porto Alegre, RS : AGE, 2009.

Caldeirão Poético XV

ESTAÇÕES

Nós, duas almas que desabrochavam,
começavam viver os bons momentos,
cheios de grande amor, encantamentos
que em arroubos de ardor se enamoravam.

Braços, que ao sabor, já se entrelaçavam,
seguindo, os corações, os batimentos,
a mesma comunhão de sentimentos,
desnudos, nossos corpos que se amavam.

Primaveras, outonos... Estações,
velhos costumes,, sem as emoções
dia a dia a verdade que me ensina.

Nosso futuro, que nos corações,
se anunciavam, cheios de paixões.
agoniza no chão desta rotina.


 
A MÃO...
        Ao Dr. Claudino dos Santos

Tantas vezes, bem sei, e eu ouço, quando cismo,
Meu coração bater depressa, não o nego,
Mão invisível tem-me salvo, a mim, um cego,
Rolando como se rolasse num abismo...

Babilônias de horror, e montanhas de lodo,
E torres de Babel, sangrentas como lava,
Eu mais afoito do que um jovem deus, mais doido,
Eu passei sem saber por onde é que passava...

Sorrindo pelo ar, miraculosa e a esmo,
Tudo pôde abrandar, os ventos, e a mim mesmo,
Por um prodígio enfim que eu não explico, ateus!

...Donde veio essa mão nervosa, que me arranca
Dos abismos do mal, a Mão ideal e branca,
A mim, que nem sequer mais acredito em Deus?...




E É QUASE DIA...
Glosando Wanda de Paula Mourthé

MOTE:
No talvez da quase noite,
quando a espera me angustia,
horas batem feito açoite...
Tu não vens...e é quase dia...


GLOSA:
No talvez da quase noite,
eu me perco em devaneios
e temo que a dor se amoite
e se instale nos meus seios!

O pranto cai devagar
quando a espera me angustia,
sentindo – não vais chegar,
morre em mim toda a alegria!

A tristeza faz pernoite
no meu pobre coração...
horas batem feito açoite...
sem nenhuma compaixão!

Quando a solidão aumenta,
a noite perde a magia
e minha alma não aguenta,
tu não vens...e é quase dia...



ÚNICA

Fruto efêmero e hostil de um efêmero gozo,
Esta vida que arrasto, efêmera e improfícua,
Sinto-a embalde, e, debalde, entre pasmado e ansioso,
Sondo-a, palpo-a, examino-a, estudo-a, verifico-a.

E tudo quanto empreende o espírito curioso,
E tudo quanto apreende a análise perspícua,
É o falso, é o vão, é o nulo, é o mau, é o pernicioso,
Por menos que a razão seja perversa ou iníqua.

Logo, por que pensar? Logo, por que no Sonho
Não havemos deixar correr a vida fátua,
Obrigando o Destino a ser calmo e risonho?

Por que só não amar: É culpa? Eis-me: resgato-a
Agora que a teus pés todo o meu ser deponho,
Como um vil pedestal à tua excelsa estátua!. . .



BERIMBAU

Ariranha arranha a presa,
Aranha tricota a teia,
Faz charme a moça bonita,
Faz crochê a mulher feia.

Quando o dia se apressa
O homem acende a candeia,
A pecadora confessa,
O padre impõe muita reza:
O fogo dela incendeia.

Araruta faz polvilho
E dele faz-se o mingau,
Vaca dá leite ao novilho
No cocho lambendo o sal.

Surubim sobe a represa
Indo em busca do canal,
Mulher de saia rodada,
Não dança o mineiro-pau.

O coração machucado
Bate em ritmo anormal,
O homem que é afobado
Come cru e passa mal.

Eu fico aqui matutando
Para encontrar um final,
Nesses versos que eu te fiz
Sob o som do berimbau.



SONETOS COMO UM PÁSSARO

Criar sonetos como um pássaro
Que canta por cantar e abrir o bico
Ou porque tendo já descido ao tártaro
Subiste e sem culpa nem um tico.

E então ao leitor lembrar Camões
Sem poderem dizer que o imitas
Pela forma pouco lusa que compões
Ou pelos dois olhos com que fitas

A tua realidade que é só tua
Sendo outrossim de toda gente
Que persegue a palavra que flutua

Ao léu, por aí, no espelho astral
Onde o mundo então seja diferente
Mas nunca invertidos bem e mal...




O BIBLIOTECÁRIO BÊBADO

Parece que
do topo das estantes
vocês ficam olhando para mim...
O que querem que eu faça?
Que abra as mãos
e tente
segurar a Poesia?
Eu a sinto
 invisível pelo ar...

E se eu erguesse as mãos
por um acaso
tentando capturar
toda a Poesia
latente
na atmosfera desta sala
e condensasse
os versos em absinto,
eu viveria embriagado deles?

Isabel Furini (Mudando a Perspectiva)


Em literatura há uma técnica chamada “mudança de perspectiva”. Os personagens falam, ou pensam, ou algo acontece, e o leitor descobre uma nova perspectiva de um assunto. É muito interessante descobrir que isso é simplesmente uma maneira de levar a visão do homem para o universo literário. Muitas vezes nossa perspectiva sobre um assunto muda ao conhecer algum fato, ou descobrimos que sustentávamos uma visão errada sobre uma pessoa.

Lamentavelmente o ser humano não tem raio-x para ver os pensamentos dos outros. Somos facilmente enganados pelas aparências. Um rosto bondoso pode ser na realidade uma máscara para não despertar suspeitas. O sorriso pode esconder raiva ou ressentimento. O olhar doce pode não ser espontâneo, pode ser resultado de algum curso de teatro. A elegância nas palavras, às vezes, nasce da artimanha de seduzir os outros. Além disso, temos os chamados “sintagmas significativos”, ou seja, palavras ou frases que podem ser usadas com a finalidade de manipular os outros.

Em um mundo no qual a imagem impera, nunca sabemos se quando alguém fala de seu passado está revelando uma verdade escondida, ou está criando uma imagem para ser aceito, amado ou aplaudido. Só conseguimos ver a cor da pele, dos olhos, dos cabelos, não conseguimos saber quais são as intenções das pessoas.

E, como nada é tão horrível ao mundo contemporâneo quanto à honestidade, usamos máscaras. Se as coisas continuarem desse jeito, corremos o perigo de chegar em casa depois de uma festa na qual mentimos - desculpem, fomos gentis e dissemos que os doces dos quais não gostamos eram maravilhosos, excelente o livro recém lançado por algum autor que desprezamos em silêncio, além de elogiar o horrível vestido da anfitriã, chegar em casa e caminhar até o espelho para tirar a máscara e descobrir que sob essa máscara há outra. Tirar a segunda máscara e descobrir mais uma... Ao final, quem poderá dizer que conhece o seu rosto autêntico?


quarta-feira, 7 de novembro de 2018

Vidal Idony Stockler (1924 - 2014)


Abraço, linda maneira
de transmitir o calor
da bela luz verdadeira
cheia de paz e de amor!

A cabana do sertão
tem na mesa um bom café,
batata, farinha e pão...
oração e muita fé!

A cabocla Maringá,
a mais bela do sertão,
deu ao rico Paraná
nome à cidade-canção.

A esperança não se vê,
é pura imaginação...
e eu me pergunto: - Por que
sobrevive essa ilusão?

Ante aplausos da menina,
na restinga do sertão,
rolam as águas da mina,
cantado suave canção.

A paciência domina
impulsos de afobação,
clarividência que ensina
as veredas da Razão.

A tão frequente saudade,
na caminhada da vida,
retrata felicidade
de outra época vivida...

A tapera que, outro dia,
só vivia festejada,
hoje curte nostalgia...
só cantar... da passarada.

Até o fogo se consome,
quando lhe falta alimento
e, morrendo, troca o nome:
a cinza será o rebento.

A velhice, sem temores,
fala dos dias passados,
quando sempre havia flores,
amigos... e namorados.

Canta o galo no terreiro,
corre o cavalo na raia;
na mata grita o ferreiro...
as águas lambem a praia.

Consulto meu travesseiro,
a forte insônia me diz:
- Sonha, sonha, companheiro,
querendo ser bem feliz!

Criança, mimo de gente,
remetendo rara luz,
pela sua alma fluente
em que a beleza seduz.

Detesto toda maldade,
não comungo com a dor.
Meu nome é felicidade,
empunho a taça do amor.

E canta água na cascata,
tropeiro segue o caminho,
no mar desliza a fragata,
as aves dormem no ninho.

Em suave visão seleta
de bom sonho encantador,
brilham luzes ao poeta,
distribuindo paz e amor!

E na festa da colheita,
com alegria encantada,
lavrador vê, na receita,
o fruto da terra amada.

E seja ou não coincidência,
luz de vela é como a fé:
Durante a sua vivência,
queima, queima e morre em pé.

Ilumine sua estrada
praticando sempre o bem,
e torne a vida encantada...
com anjos dizendo Amém!

Memórias... um lindo achado,
para que eu possa externar
as trovas do meu agrado,
frutos do alegre pensar.

Na caminhada da vida
escuros há, e claridade...
Vencer espaços da lida
encerra felicidade.

Na grandeza do universo,
feitura do Criador,
verte a leveza do verso,
nasce a beleza da flor.

Na manjedoura, só paz...
nasce o Menino Jesus!
Quanta alegria Ele traz,
quanta fé, perdão e luz...

Na paz de Deus vivo, sim,
numa perfeita harmonia,
caminhando sempre assim,
sustentado na alegria.

Na leveza do meu sonho,
imensa felicidade!
Acordado, eu me componho...
só faltou continuidade.

No caminho, a ribanceira
impõe drástica parada;
fala bem perto a palmeira:
- Por ali tem outra estrada...

No jardim a branca palma,
de perfume tão profundo...
Beija-flor, com toda calma,
inspira... Sou rei do mundo!

Nossa terra, nossa gente,
sob o céu de puro anil,
num espaço continente,
somos o lindo Brasil!

O rico e belo pinheiro
das terras do Guairacá,
com seu porte vanguardeiro:
símbolo do Paraná!

O São Francisco de Assis
seguiu seus próprios caminhos,
teve fé e foi feliz...
amigo dos passarinhos.

O sapo, quieto, feioso,
não aparenta valor...
mas há o lado valoroso:
Mata os insetos da flor!

O tempo constante passa,
leva passagens queridas;
é fogueira com fumaça,
a corroer nossas vidas...

Ouça o murmurar das águas
e o cantar da suave brisa,
jogue fora suas mágoas
e tenha a paz por divisa.

Para uns a noite é sonho,
para outros sonho é dia.
Com sorriso, até suponho:
- Tudo é fina melodia.

Poesia é forma de escrita,
mas elaborada em verso:
Vem da inspiração do artista
e brilha em todo o Universo!

Procurei sempre o saber,
em uma escala crescente...
e a vida ensinou-me a ver
o poder de Deus presente.

Realce não pude ser
nas áreas do trovador,
mesmo assim, passo a fazer
a trova.... com muito amor!

Saudade - recordação
de uma luz que não morreu,
que mora no coração,
onde sempre ali viveu.

Seja estrela sorridente,
na maneira de viver,
e com força transcendente
faça o bem acontecer!

Sinta a ternura da paz,
a beleza que produz...
Na harmonia que se faz,
todo escuro vira luz!

Turismo, doce cultura,
irmana-se à educação,
rico evento que assegura
estreitamento e união.

Viaja, viaja, caminhando,
viandante maltrapilho,
no sol ou chuva... sonhando
ter um dia com mais brilho.

Voltar a tempo passado,
impossível... só vontade.
O que tudo foi marcado,
vislumbra-se na saudade...

Fonte:
União Brasileira dos Trovadores Seção de Porto Alegre-RS. Trovas de Vanda Fagundes Queiroz e Vidal Idony Stockler. Coleção Terra e Céu LXV. Cachoeirinha/RS: Texto Certo, 2016.

Carlos Drummond de Andrade (Caso de Secretária)


Foi trombudo para o escritório. Era dia de seu aniversário, e a esposa nem sequer o abraçara, não fizera a mínima alusão à data. As crianças também tinham se esquecido. Então era assim que a família o tratava? Ele que vivia para os seus, que se arrebentava de trabalhar, não merecer um beijo, uma palavra ao menos!

Mas, no escritório, havia flores à sua espera, sobre a mesa. Havia o sorriso e o abraço da secretária, que poderia muito bem ter ignorado o aniversário, e entretanto o lembrara. Era mais do que uma auxiliar, atenta, experimentada e eficiente, pé de boi da firma, como até então a considerara; era um coração amigo.

Passada a surpresa, sentiu-se ainda mais borocoxô: o carinho da secretária não curava, abria mais a ferida. Pois então uma estranha se lembrava dele com tais requintes, e a mulher e os filhos, nada? Baixou a cabeça, ficou rodando o lápis entre os dedos, sem gosto para viver.

Durante o dia, a secretária redobrou de atenções. Parecia querer consolá-lo, como se medisse toda a sua solidão moral, o seu abandono. Sorria, tinha palavras amáveis, e o ditado da correspondência foi entremeado de suaves brincadeiras da parte dela.

— O senhor vai comemorar em casa ou numa boate?

Engasgado, confessou-lhe que em parte nenhuma. Fazer anos é uma droga, ninguém gostava dele neste mundo, iria rodar por aí à noite, solitário, como o lobo da estepe.

— Se o senhor quisesse, podíamos jantar juntos — insinuou ela, discretamente.

E não é que podiam mesmo? Em vez de passar uma noite besta, ressentida — o pessoal lá em casa pouco está me ligando —, teria horas amenas, em companhia de uma mulher que — reparava agora — era bem bonita. Daí por diante o trabalho foi nervoso, nunca mais que se fechava o escritório.

Teve vontade de mandar todos embora, para que todos comemorassem o seu aniversário, ele principalmente. Conteve-se, no prazer ansioso da espera.

— Aonde você prefere ir? — perguntou, ao saírem.

— Se não se importa, vamos passar primeiro em meu apartamento. Preciso
trocar de roupa.

Ótimo, pensou ele; faz-se a inspeção prévia do terreno e, quem sabe?

— Mas antes quero um drinque, para animar — ela retificou.

Foram ao drinque, ele recuperou não só a alegria de viver e de fazer anos como começou a fazê-los pelo avesso, remoçando. Saiu bem mais jovem do bar, e pegou-lhe do braço.

No apartamento, ela apontou-lhe o banheiro e disse-lhe que o usasse sem cerimônia. Dentro de quinze minutos ele poderia entrar no quarto, não precisava bater — e o sorriso dela, dizendo isto, era uma promessa de felicidade.

Ele nem percebeu ao certo se estava se arrumando ou se desarrumando, de tal modo os quinze minutos se atropelaram, querendo virar quinze segundos, no calor escaldante do banheiro e da situação. Liberto da roupa incômoda, abriu a porta do quarto. Lá dentro, sua mulher e seus filhos, em coro com a secretária, esperavam-no atacando “Parabéns pra você”.

Fonte:
Carlos Drummond de Andrade. 70 Historinhas. 
São Paulo: Companhia das Letras, 2009.

segunda-feira, 5 de novembro de 2018

Odenir Follador (Relatos de uma Avó)


Certo dia, eu e meu marido estávamos sentados na sala, ele lendo as notícias do jornal, e eu o meu livro, que interrompia de tempo em tempo, para tricotear um conjuntinho de lã para minha pequena neta Fabíola. Estavam para chegar ainda àquela tarde. Parei por uns instantes com meus afazeres, divagando meus pensamentos, lembranças e saudades que de súbito se fizeram presentes, quando aqui estiveram no ano passado.

Como estará a minha neta? Agora com quatro anos, mais alta e mais bonita, com certeza. Tenho saudades do seu sorriso e de suas correrias pela casa. Sempre irrequieta e curiosa, e quando parava um pouco, corria a se sentar no meu colo, me fazendo muitas perguntas: se eu era parecida com sua mãe quando mais nova, se ela ficaria com os cabelos brancos e com muitas rugas como eu... Enfim, eram tantas as perguntas, mas que eu adorava responder e ainda enfeitava um pouco, alongando minhas respostas em pequenas histórias. E a embalando com minhas antigas cantigas de ninar, que ela gostava, e aos poucos começa a adormecer, abrindo um pouquinho um dos olhos, para ver se era eu que continuava ali, e com um doce sorriso adormecia.

Voltei a ler mais um pouco e a tricotear a seu conjuntinho... Já estava quase pronto, talvez ainda terminasse antes da sua chegada. E novamente comecei a pensar... Parece ter sido ontem quando eu fazia estas mesmas coisas aos meus filhos, e hoje estou aqui, repetindo tudo novamente com a minha netinha. Então eu percebo o quanto os nossos netos são importantes para os avós. Eles possuem um pouquinho de nossos filhos, mas também de nós, seus avós, é claro, são sangue do nosso sangue. Por vezes, me vejo no jeitinho deles sorrirem, no olhar, ou até mesmo no modo de falarem.

Não estamos sempre com os netos, não somos nós que passamos as noites ao seu lado e que os alimentamos; só temos estes únicos momentos, para abraçá-los, de pegá-los no colo para uns afagos ou para lhes contar algumas histórias e também, para fazer aquelas guloseimas tão esperada por eles... Isso representa tão pouco; mas é o suficiente para nos deixar feliz e realizado por tê-los tão juntinho de nós, mesmo que seja por um pequeno espaço de tempo.

Fonte: Texto enviado pelo autor

Martins Fontes (Poemas Recolhidos)


OLHOS, ESPELHO DA ALMA

Adeus. O teu amor me torturava:
era uma rosa que, se às vezes, tinha
no perfume, a candura que eu sonhava,
também espinhos infernais continha.

Contra a própria vontade é que eu te amava,
sem a esperança de que fosses minha.
Por teu orgulho, não serás escrava.
Por meu orgulho, não serás rainha.

Adeus. Beijo-te a mão, tendo a certeza
de que procuras, disfarçando o pranto,
não demonstrar a mínima tristeza.

E ambos sorrindo, e pálidos de espanto,
em nossos olhos vemos, com surpresa,
que é por capricho que sofremos tanto!

A VERDADE É MAIS ESTRANHA QUE A FICÇÃO

Beijei-te. Acabo de sonhar contigo.
E, ainda meio dormindo e mal desperto,
para minha saudade e meu castigo,
sinto-me longe, quando estavas perto.

Sonho! Mais que a verdade que investigo,
e em ti somente tenho descoberto,
tu, que és de fato o verdadeiro amigo,
menos enganas, sendo embora incerto.

Se a vida ilude, distinguir quem há de,
na aparência de tudo quanto veja,
se o sonho é mais falaz do que a verdade?

A boca da mulher que se deseja
da-nos sempre a ilusão, na realidade,
de que apenas sonhando é que se beija.

SE EU FOSSE DEUS

Se eu fosse Deus seria a vida um sonho,
Nossa existência um júbilo perene!
Nenhum pesar que o espírito envenene
Empanaria a luz do céu risonho!

Não haveria mais: o adeus solene,
A vingança, a maldade, o ódio medonho,
E o maior mal, que a todos anteponho,
A sede, a fome da cobiça infrene!

Eu exterminaria a enfermidade,
Todas as dores da senilidade,
E os pecados mortais seriam dez...

A criação inteira alteraria,
Porém, se eu fosse Deus, te deixaria
Exatamente a mesma que tu és!

EU JÁ TE AMAVA

Antes de conhecer-te, eu já te amava.
Porque sempre te amei a vida inteira:
Eras a irmã, a noiva, a companheira,
A alma gêmea da minha que eu sonhava.

Com o coração, à noite, ardendo em lava
Em meus versos vivias, de maneira
Que te contemplo a imagem verdadeira
E acho a mesma que outrora contemplava.

Amo-te. Sabes que me tens cativo.
Retribuis a afeição que em mim fulgura,
Transfigurada nos anseios da Arte.

Mas, se te quero assim, por que motivo
Tardaste tanto em vir, que hoje é loucura,
Mais que loucura, um crime desejar-te?

OTELO

Quem minha angústia suportar, prefira
a morte, redentora, à desventura
de não poder, nas vascas da loucura,
distinguir a verdade da mentira.

Infrene dúvida, implacável ira,
esta que me alucina e me tortura!
— Ter ciúmes da luz, formosa e pura,
do chão, da sombra e do ar que se respira!

Invejo a veste que te esconde! a espuma
que, beijando teu corpo, linha a linha,
toda do teu aroma se perfuma!

Amo! E o delírio desta dor mesquinha,
faz que eu deseje ser tu mesma, em suma,
para ter a certeza de que és minha!

INCONTENTADO

Quando em teus braços, meu amor, te beijo,
se me torno, de súbito, tristonho,
é porque às vezes, com temor, prevejo
que esta alegria pode ser um sonho.

Olho os meus olhos nos teus olhos... Ponho,
trêmulo, as mãos nas tuas mãos... E vejo
que és tu mesma, que és tu! E ainda suponho
Ser enganado pelo meu desejo.

Quanto mais, desvairado de ansiedade,
do teu corpo, meu corpo se avizinha,
mais de ti, junto a ti, sinto saudade...

- E o meu suplício atroz não se adivinha,
quando, beijando-te, o pavor me invade
de que em meus braços tu não sejas minha!

Fonte:
J. G. de Araújo Jorge. Os Mais Belos Sonetos que o Amor Inspirou. 1. ed. Rio de Janeiro, 1963.

Martins Fontes (1884 - 1937)


José Martins Fontes nasceu em Santos, 23 de junho de 1884 e faleceu na mesma cidade em 25 de junho de 1937. É considerado o melhor poeta de sua geração na lusofonia, e um dos dez melhores na língua portuguesa; os outros nove são Camões, Bocage, António Nobre, Guerra Junqueiro, Fernando Pessoa, Castro Alves, Olavo Bilac, Raimundo Correia e Alberto de Oliveira (o brasileiro).

Martins Fontes, o "Zezinho Fontes", nasceu na casa 4 da praça José Bonifácio, filho de Isabel Martins Fontes e do Dr. Silvério Martins Fontes. Frequentou os principais colégios de seu tempo. Em sua vida de estudante em Santos, teve como professor Tarquínio da Silva, ao qual prestou homenagem posteriormente. Mais tarde vai estudar no Rio de Janeiro.

Aos oito anos de idade, Martins Fontes publicou seus primeiros versos num jornalzinho denominado "A Metralha", dando os primeiros sinais do grande poeta que viria a ser durante sua vida, do qual foram publicados 9 números aos domingos e cujo cabeçalho em três cores era feito por seu avô, o coronel Francisco Martins dos Santos. A 1° de maio de 1892, estreia recitando um hino a Castro Alves. Com dezesseis anos, ele lê uma ode de sua autoria na inauguração do monumento comemorativo ao quarto centenário do Descobrimento do Brasil, levantado próximo à biquinha em São Vicente.

Em 1908, defendeu tese de doutorado na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, tornando-se médico sanitarista, tendo convivido com poetas como Olavo Bilac, Coelho Neto, Emílio de Meneses e outros. Depois de formado foi médico da Comissão das Obras do Alto Acre, interno da Santa Casa do Rio de Janeiro, auxiliar de Oswaldo Cruz na profilaxia urbana, médico da Santa Casa de Misericórdia de Santos, médico da Beneficência Portuguesa de Santos, inspetor sanitário em Santos e Diretor do Serviço Sanitário.

Também foi médico da Sociedade Humanitária dos Empregados no Comércio, da Companhia Segurança Industrial, da Companhia Brasil, da Repartição de Saneamento e da Casa de Saúde de Santos.

Durante a epidemia de gripe de 1918 tornou-se um dos beneméritos da cidade, desdobrando-se para socorrer os bairros do Macuco e Campo Grande e estendendo sua ação para a localidade de Iguape. Como médico, notabilizou-se como conferencista e foi tisiologista da Santa Casa de Misericórdia de Santos e destacado humanista, lutou junto com Oswaldo Cruz em defesa sanitária da cidade de Santos. Em seu consultório particular tratava de pessoas sem poder aquisitivo, não cobrando as consultas.

Fundou com Olavo Bilac uma agência publicitária para serviços de propaganda dos produtos brasileiros na Europa e em outros países. Em 1924 tornou-se correspondente da Academia das Ciências de Lisboa. Quando Júlio Prestes, governador do Estado de São Paulo e candidato à presidência da República, partiu em viagem para percorrer os países da Europa e EUA, Martins Fontes foi convidado para acompanhá-lo como médico da caravana. Devido ao seu trabalho como conferencista conheceu o Brasil de norte a sul, e ainda a Argentina, o Uruguai, os Estados Unidos, a França, a Inglaterra, a Espanha, a Itália e Portugal.

Colaborou literariamente com os jornais A Gazeta e o Diário Popular em São Paulo, e para o Diário de Santos e o Cidade de Santos, além de inúmeros periódicos do Rio de Janeiro e outras cidades.

Foi titular da Academia das Ciências de Lisboa e, ao longo de sua vida, recebeu os títulos de comendador da Ordem de São Tiago da Espada, Cavaleiro da Espanha, Par da Inglaterra entre outras distinções. É patrono da cadeira n.° 26 da Academia Paulista de Letras.

Morreu na cidade natal e está ali sepultado no Cemitério de Paquetá.

Sua obra literária é bastante volumosa, chegando atualmente a cinquenta e nove títulos publicados, em poesia e prosa.

Algumas publicações:
Verão. Santos, 1917.
A Dança. Santos, 1919.
O Mar. São Paulo,, 1922.
As Cidades Eternas. Santos, 1923.
O Colar Partido. Santos, 1927.
Poesias. Santos, 1928.
O Mar, A Terra e o Céu. Santos, 1929.
Canções do Meu Vergel. São Paulo, “Revista dos Tribunais”, Fevereiro de 1937.

Fonte:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Martins_Fontes