sábado, 14 de agosto de 2010

Rogério Salgado (Poeminha Próximo de uma Fábula)

Aparecido Raimundo de Souza e Silviah Carvalho (Perdão)


É como se fosse um poço profundo
é como se a questão maior do mundo
fosse apenas o fim do poço

No poço sem fundo, um mundo sem poço
um sem fim de mundo mas tudo é simples...
só o fim do mundo no fundo do poço,
tudo faz parte da vida do sofrimento

Até a alegria o espaço finito
entre dois sentimentos
é o burburinho misterioso
de todos os outros momentos

E todos os momentos
também passam e tem fim
infinita é apenas a eternidade

Mas inexorável é a vida
posto que tudo voa de repente
alucinadamente, irrevogavelmente
mas eu te perdôo

“Eu também te perdôo
por que fostes embora
deixando este vazio em mim
saiu pelo mundo a fora”

Eu te perdôo
por teres me dado a vida
me teres feito frágil e covarde

eu te perdôo
por teres mostrado a mim
apenas coisas da natureza
e no misterioso universo
te escondeu de mim

É pouco...? Mas eu te perdôo

Por teres me feito guloso e insaciável
por viveres tão oculta
e não me teres revelado tantos
segredos que quero desvendar

Mas eu te perdôo
sobretudo e principalmente
por me teres deixado
te amar

“Palavras que me dão liberdade
eu,
você
e nunca nós e, eu também te perdôo
por ter me feito acreditar
na felicidade, na existência do amor

E agora não creio mais
todas as possibilidades você me tirou
mas eu também te perdôo”

Então moça...
canta vitória
com riso chorado
e mata a vitima de amor

“Quem é a vitima?”

Eu...

“Se falasse comigo agora
não saberia quem sou
posto que de tanto amor por ti
minha vida evaporou”

Por isso moço...
meu coração te perdoou.

Fonte:
Silviah Carvalho.

Laé de Souza (Coragem de Optar pela Arte)



Há quem diga que a responsabilidade maior foi do pai, que numa viagem ao nordeste o presenteou com um berimbau. Outros acham que a culpa foi da mãe que, enjoada do din-din-din-don , trocou o instrumento por um violão de plástico e cordas de náilon. Embora. muitos acreditem que ele já tenha vindo de nascença com um parafuso a menos e que essas coisas não tenham influenciado em nada. O que é certo, e concorde a todos, é que o Gertulino não tem um pingo de juízo.

Os pais, coitados, na verdade a gente sabe que fizeram de tudo para que ele se endireitasse, mas foi perda de tempo. Arrumaram uma vaga num escritório de contabilidade, mas qual nada. Na mala de boy , levava suas revistas de partituras e letras que cantarolava no ônibus e na fila do banco. No guichê, enquanto o caixa autenticava, ele tamborilava com uma bic no vidro do balcão. Não reclamava do salário, mas chiava quando tinha de catar milho na Olivetti para preencher de uma guia e também não queria nem saber de débito/crédito. O contador lhe apontava exemplos de quem entrou pequeno e agora era chefe de departamentos e ele, nem aí. Já bem crescido foi despedido por faltas. Trabalhava um, faltava dois dias. Arrumaram-lhe um emprego numa metalúrgica . Na prensa, com o pé livre batia duas vezes no chão e no do pedal batia uma, em ritmo de valsa. Puseram-no para rebitar , e o chefe o dispensou por não agüentar mais o bater compassado e a quarta batida mais forte, sempre.

Daí para a frente só fez bicos. Na maioria das vezes era encontrado em casa, fechado no quarto com seu violão , repetindo várias vezes a mesma música e descobrindo as notas de um solo. Começou tocar nuns barzinhos e até recebia acanhados aplausos. Quando perguntado pelo filho, seu Agildo, respondia que ele estava trabalhando. Mas quem ouvia os acordes vindos do quarto, dava uma risadinha e dizia que o Gertulino não tinha jeito mesmo.

Seu Agildo também achava que não era certo o proceder do filho, mas saiu a investigar se era só ele quem tinha filho doido.

O filho do padeiro era encafifado com negócio de pegar pedaços de pau e ficava horas e horas esculpindo. Às vezes até que fazia alguma coisa bonita, da qual o pai ignorava a beleza para não estimular a loucura. O filho do açougueiro era metido com coisas de teatro e vivia correndo atrás de roupas velhas. Perdia horas e horas em ensaios inúteis, fazendo cenários de papelão, perucas, narizes e, de vez em quando, junto com outros doidos dava um show na praça. O filho de um seu Geraldo ficava horas e horas como que fora do mundo, pintando um quadro. O filho da professora , era poeta e não fazia outra coisa senão rabiscar um caderno espiral de capa gasta. Assim, seu Agildo viu tantos malucos pelas noites que chegou a duvidar se era mesmo loucura.

Ele descobriu que existiam outros doidos e tentou adivinhar que espécie de doença é essa que ataca a mente, fazendo abandonar futuros planejados, por caminhos incertos. E nós, até com certa inveja, perguntamos de onde nasce essa força tão grande que faz com que alguns tenham coragem de optar pela arte.

Fonte:
http://www.projetosdeleitura.com.br/cronica04.html

Ialmar Pio Schneider (Baú de Trovas IV)


A manhã surge radiante,
envolvendo de esplendor,
na alegria contagiante
toda a natureza em flor.

Andei por árduo caminho
no qual não quero andar mais;
e voltei para o meu ninho
como voltam os pardais...

Ao tentar criar poemas
para contar minha história,
me deparei com dilemas
na fase contraditória...

Aquela que um dia fez
meu coração palpitar,
hoje não saiba, talvez,
desta saudade sem par.

Busco na trova a harmonia
para equilibrar a vida;
é o resumo da poesia
em quatro linhas contida.

Consegues viver sozinha,
enfrentando a solidão?!
Recorda que “uma andorinha
sozinha não faz verão...”

Contigo no pensamento,
eu vou compondo esta trova,
porque neste sentimento
minha paixão se renova.

Coração aventureiro,
vive sonhando um amor,
que pode ser verdadeiro,
infeliz ou enganador.

Entre amar e ser amado,
eu não sei o que é melhor;
porém, viver desprezado,
é, sem dúvida, o pior!

Eras bonita... Eu tão feio...
mas nos queríamos tanto,
que num mesmo devaneio
nos amamos por encanto...

É tão tarde... a madrugada
daqui a pouco vai raiar;
e pensando em minha amada
quero dormir e sonhar...

Eu já vou me convencendo
que nada sei pra ensinar;
amei tanto e não compreendo
o que significa amar.

Eu te quis com tanto afã,
não pude te conquistar;
pela tentativa vã,
peço perdão por te amar...

Houve sempre um sentimento
que nunca teve igualdade,
pois surge a qualquer momento,
e que se chama saudade.

Mágoas de amor não tem preço:
tudo pode acontecer;
um final sem ter começo,
impossível entender...

Mas antes que a chuva caia,
prefiro sentir o vento
levantando a tua saia
para meu contentamento.

Meu coração se enternece
quando vejo os passarinhos,
no instante que a noite desce,
retornarem aos seus ninhos.

Meu coração treme ainda
ao lembrar-te com saudade,
porque por seres tão linda
eras a felicidade!

Não me compreendes agora
porque no teu lindo rosto
nenhuma lágrima chora
ao saber do meu desgosto.

Neruda... Grande Neruda,
da “Canção Desesperada”,
careço de tua ajuda
pra cantar a minha amada!

No coração de quem ama
não morre nunca a saudade,
porquanto é qual uma chama
com fogo da eternidade...

Nosso amor em decadência
foi findando pouco a pouco;
você com sua demência
e eu me tornando mais louco.

O amor que nasce de um beijo
até pode fracassar,
mas se nasce de um desejo
vai permanecer no olhar...

O amor, sem paz nem sossego,
também merece louvor;
mas se não traz aconchego,
impossível ser amor.

Pelas trovas benfazejas
que solitário componho,
peço que ditosa sejas
e concretizes teu sonho.

Pelos caminhos do amor
quantos sonhos e ilusões;
e o que causa dissabor
são as nossas frustrações.

Pelos momentos vividos
longe de ti que me encanta,
meus soluços reprimidos
vão morrendo na garganta.

Penso em ti de vez em quando
e se não posso te amar,
quero somente, sonhando
teus olhares recordar.

Porque já chegou o outono
e foi embora o verão,
vou ficando no abandono
e minhas folhas cairão...

Por te querer me atormento
e de te amar não desisto;
para tanto sofrimento,
antes não te houvesse visto.

Por viver apaixonado
me chamam de sonhador;
porém, se amar é pecado,
sou o maior pecador.

Quando em pensamento a beijo
não sinto felicidade,
porque, afinal, meu desejo
é beijá-la de verdade.

Quando te vi deslumbrante
com teus olhares fatais,
eu notei naquele instante
que era então tarde demais.

Quantas noites mal dormidas,
pensando em que não me quer;
são as ilusões perdidas
por causa de uma mulher!...

Quem ama por conveniência
não conhece a sensação
que causa em nossa existência
o fogo de uma paixão.

Queres me amar, eu aceito
teu bem-querer de bom grado,
porque vivo insatisfeito
por nunca ter sido amado.

Saudade!... palavra viva
do que ficou no passado;
és o bem que nos cativa
para sempre ser lembrado!

Se eu não sentisse saudade
daquela que tanto quis,
talvez a felicidade
não me fizesse infeliz.

Segura o pouco que tens
e amanhã podes ter mais,
porque de todos teus bens
preponderam ideais.

Se leres os versos soltos
neste livro de lamentos,
que não te assaltem revoltos,
infelizes sentimentos...

Sendo um simples aprendiz
de saber da trova o enredo,
sinto que não sou feliz
e me condeno em segredo.

Se o amor não tem futuro
e vive só da esperança,
é qual um tiro no escuro
e sem querer você “dança”.

Se tens amor não escondas,
muito sofri por contê-los;
ele surge como as ondas
e foge ao não ter desvelo...

Simples trova mensageira
de mil recados de amor;
e por isto a vida inteira
desejo ser trovador.

Sócia de dor é paixão,
sem ter reciprocidade,
porque nos traz ilusão
e nos deixa na orfandade.

Tenho saudade da areia
sob o sol a cintilar
e as noites da lua cheia
clareando as águas do mar...

Tuas mãos nas minhas mãos
numa ternura incontida,
sinto que não foram vãos
esses momentos na vida.

Vai romper a madrugada
neste começo do outono,
e sem pensar mais em nada
quero me entregar ao sono...

Vens à noite de mansinho
e trazes junto contigo
a saudade do carinho
que olvidar eu não consigo.

Vou fazer-lhe uma proposta,
pense bem no que lhe digo:
se disser que não me gosta,
quero ser só seu amigo!

Fonte:
O Autor

Joyce Cavalcante (Lançamento do Livro "Longos Trechos de Dias Líquidos")

Antonio Cândido (Literatura e Sociedade: A Literatura na Evolução de uma Comunidade) Parte 2


1— Um grupo virtual

O primeiro agrupamento de escritores eminentes participando de valores comuns, procurando construir uma obra em torno deles e agindo em função de um estímulo recíproco, parece haver-se esboçado no intercâmbio e na produção de Pedro Taques de Almeida Paes Leme, na do seu parente frei Gaspar da Madre de Deus e na de Cláudio Manuel da Costa. Os dois primeiros eram amigos, comunicavam-se nos estudos, valiam-se em mais de um transe. A circunstância que os aproximou do terceiro, nascido em Minas, onde viveu, foi a Academia Brasílica dos Renascidos, da qual foram acadêmicos supranumerários Cláudio e frei Gaspar, e que, da sua sede baiana, deitou laços de congregação sobre outras Capitanias, num primeiro arremedo de consciência literária comum. O paulista e o mineiro talvez nunca se tenham visto, e não restou correspondência escrita de um a outro. Entre ambos, porém, forma elemento de ligação Pedro Taques e, mais ainda, como veremos, o sentimento comum de paulistanismo à busca de expressão intelectual.

Na resposta à comunicação de que fora eleito para os Renascidos, e aceitando a incumbência de escrever a história do Bispado de São Paulo, pondera frei Gaspar: "Se o Sargento-mor Pedro Taques de Almeida Paes, natural daquela cidade e nela morador, fosse nosso sócio, ajudar-me-ia muito, ainda mais que escreveu as Memórias para a História Secular da dita Capitania" etc. O nome do linhagista andou, portanto, nas cogitações da Academia, e decerto teria sido eleito se ela não acabasse tão depressa.

Assim, Cláudio, frei Gaspar e Taques estiveram congregados espiritualmente a certa altura, além de terem mantido, a seguir, um intercâmbio que podemos inferir por vários motivos. No FUNDAMENTO HISTÓRICO do seu poema Vila Rica (terminado depois de 1770), diz Cláudio: "O sargento-mor Pedro Taques de Almeida Paes Leme, natural (…) da cidade de São Paulo, e ali morador, de estimável engenho e de completo merecimento, remeteu ao autor desde aquela cidade todos os documentos que conduziram ao bom discernimento desta obra" etc.

Esta relação é da maior importância, pois estes três homens foram os primeiros a dar expressão intelectual coerente ao sentimento localista dos naturais de São Paulo, e não apenas tiveram consciência disso, mas colaboraram neste sentido em alguns casos.

Antes de entrar em contacto com os outros, Cláudio já se manifestara ufano da tradição paulista em 1759, nos APONTAMENTOS PARA SE UNIR AO CATHALOGO DOS ACADÊMICOS DA ACADEMIA BRAZILICA DOS RENASCIDOS, que Lamego divulgou, e cujo manuscrito se encontra na Biblioteca Central da Faculdade de Filosofia da Universidade de São Paulo. Declinando a filiação, é flagrante a diferença de importância que atribui à linhagem paterna e à linhagem materna:

"Seus avós por parte paterna: Antônio Gonçalves e Antonia Fernandez, moradores que forão no lugar das Arêas, Freguezia de S. Mamede das Talhadas, Bispado de Coimbra. Pela parte materna: O capitão Francisco de Barros Freire e D. Izabel Rodrigues de Alvarenga, moradores que foram na Freguezia de N. S. de Guarapiranga, Comarca do Ribeirão do Carmo, hoje cidade de Marianna, vindos de S. Paulo onde tem a sua ascendência de Famílias mui distinctas".

Esta prosápia o liga a Pedro Taques e a frei Gaspar, e ele a exprime poeticamente no poema épico Vila Rica, sugerido talvez pela epopéia perdida de Diogo Grasson Tinoco em louvor a Fernão Dias. Encarando em conjunto as obras dos três homens, veremos que elas representam a elaboração de um sistema de valores, difusos na sociedade paulista e reforçados tanto pelo conflito com os Emboabas quanto pelo encerramento do ciclo bandeirante. Figuremos essa sociedade limitada na sua expansão geográfica, privada da riqueza efêmera das minas, sangrada de certo modo pela dispersão de muitos dos seus filhos, obrigada a buscar novo amparo na agricultura sedentária. Figuremo-la, ainda, já estruturada por um sistema estável de vilas e freguesias, e, na cidade capital, com certo desenvolvimento da civilização. A consciência heróica do passado, emergindo do sentimento nativista, aparece como recurso de integração; como justificação de uma sociedade em crise de reajustamento das suas atividades. Daí o recurso à história, por meio da qual se cristaliza a tradição, projetando no plano ideológico os valores grupais, que deste modo se organizam.

Este processo se manifesta pela criação de uma consciência de estirpe, na Nobiliarquia, de Pedro Taques; pela definição de uma sequência histórica, nas Memórias, de frei Gaspar; pela transfiguração épica, no Vila Rica, de Cláudio Manuel.

Debruçados sobre o passado da terra, os três homens procuram traçar a sua projeção no tempo, irmanados pelo sentimento de orgulho ancestral e a consciência de dar estilo aos duros trabalhos que plasmaram metade do Brasil. A verdade e a fantasia irmanam-se igualmente no seu labor, e dele sairá a primeira visão intelectual coerente da grande empresa bandeirante.

Contrariando as informações dos jesuítas, e de vários reinóis, acentuam a lealdade, a magnanimidade, a nobreza dos aventureiros de Piratininga, traçando-lhes o perfil convencional que passou à posteridade.

Vê os Pires, Camargos e Pedrosos, Alvarengas, Godóis, Cabrais, Cardosos, Lemos, Toledos, Pais, Guerras, Furtados, E os outros, que primeiro assinalados Se fizeram no arrojo das conquistas, Ó sempre grandes, ó imortais Paulistas! brada Cláudio Manuel em versos que parecem transpostos da Nobiliarquia; Cláudio, cujo amor tão vivo à sua terra mineira fundava-se na consciência de ser ela devida ao esforço do bandeirismo:

Dos meus Paulistas honrarei a fama.
Eles a fome e sede vão sofrendo,
Rotos e nus os corpos vêm trazendo,
Na enfermidade a cura lhes falece,
E a miséria por tudo se conhece;
Em seu zelo outro espírito não obra
Mais que o amor do seu rei: isto lhes sobra.

Pedro Taques, do seu lado, dourava e redourava linhagens, procurando ajeitar às convenções européias o destino mameluco e americano desse povo errante, guindando os "modestos fidalgotes portugueses companheiros da travessia aventurosa de Martim Afonso de Sousa" (Taunay).

Nesta ordem de idéias, mencionemos a valorização do antepassado vermelho, feita pelos três à maneira do que faziam, para Pernambuco e Bahia, Jaboatão e Borges da Fonseca.

Afirmar o Autor, que da mistura do sangue saiu uma geração perversa, é supor que o sangue dos índios influiu para a maldade, suposição que muito desonra, senão a crença, ao menos o juízo de um sábio católico:

porquanto nem a Divina Graça perde a sua eficácia, nem a natureza se perverte, ou a malícia adquire maiores forças, quando o sangue europeu se ajunta com o brasílico. Pelo contrário, a experiência sempre mostrou, que os indivíduos nascidos desta união, reluzem aquelas belas qualidades, que caracterizam em geral o indígena do Brasil.

Nesta excelente refutação a Charlevoix, frei Gaspar lança as bases de um argumento que será por excelência romântico. Dando um passo a mais, Pedro Taques aristocratiza as Bartiras criadeiras do planalto, promovendo-as a "princesas do sangue brasílico" e fazendo grande cabedal da sua ancestralidade. Cláudio, recorrendo largamente ao índio para o maravilhoso e o romanesco do seu poema, culmina traçando amores ideais entre Garcia Paes e uma silvícola, tão mimosa, Que à vista sua desmaiava a rosa.

Vê-se, pois, que o "paulistanismo" aparece ideologicamente configurado, norteando as obras desses três escritores e nutrindo as suas relações, além de adquirir nelas as tonalidades características, que serviriam para definir a consciência do paulista moderno, e que operariam como poderosa arma de sentimento de classe, de um lado, e assimilação dos forasteiros, de outro.
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continua.... 2 - Um Grupo Real
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Fonte:
CANDIDO, Antonio. Literatura e Sociedade. 9. ed. RJ: Ouro Sobre Azul, 2006
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Rogério Salgado (Poemas Escolhidos)


CONCEITO
Para Otávio de Campos

Sou o que representa
a febre, a dor
a expressão exata
a corda que desata
todos os nós acorrentados
aos conceitos do que
querem que a poesia seja.

Canto a canção ferida
daquilo que é doído

tenho olhos de vidros partidos
e a imensidão de compor.

Não me estabeleço
amanheço, entardeço, anoiteço
na forma mais concreta.

PIVETE

Vivo
do cheiro dessa cola.

Ando
na cola desse cheiro.

QUARTO DE HOTEL

Na solidão dessa insônia
não conto carneirinhos:
conto estrelas
uma a uma
expostas feito um quadro
na moldura da janela.

CONCERTO PARA LÁ MAIOR
(entre as nuvens)

Meus amigos estão todos indo embora
e eu, por enquanto
vou ficando por aqui
com aquela sensação de vazio
preenchendo-me os poros
as artérias, a alma, os versos.

Revejo catedrais que outrora
pensei um dia, edificar
entanto, o tempo escorre pelas mãos
entra pelos ralos
sem que ao menos, possa segurá-lo.

Alguns recitam versos lá
outros cantam entre nuvens
e cá, ficamos nós, desatando nós
nessa insegurança tão imperfeita.

Meus amigos estão todos indo embora
embora seja verdade, devo aceitar
aguardando que um dia
numa viagem menor
eu possa ver estrelas, constelações
e desvendar enfim, os mistérios dessa vida.

A PALAVRA

É necessário cantar
quando a palavra nos soa
poética
triste e sem limitações
feito sussurros de um poeta

e na claridade do verso
habita o sol
que brilha e cega
quando a rima
machuca.

E além da vida
sobrevive a palavra
mas o poeta
acaba

QUESTÃO DE LINGUAGEM

Todos os dias buteco
(pretérito mais que perfeito
do verbo embebedar)
sento à mesa
e entre um substantivo e outro
o tampo passa
calmo sob as estrelas.

Entre os dedos bêbedos
o poema surge tonto
embriagado de palavras
mas, despercebida de outros bêbedos
que discutem futebol
na mesa ao lado.

O poema é isso:
descompromissado
por isso surge lúcido
ou alcoolizado
(depende das circunstâncias)
sendo impresso em papéis
e distribuído entre tantos
que nem atentos percebem
a fragilidade do poeta.

Por isso, todos os dias poeto
(presente do subjuntivo
do verbo sofrer)
e entre um copo e outro
faço versos livres
que germinarão sementes silábicas
e serão plantadas
em papéis comuns
para que poucos apreciem:
— Assim é a sensibilidade!

INFÂNCIA

Quando garoto
em todos os natais, Irene
— babá de minha infância —
presenteava-me com um cartão
bem bonito.

E os meses se passavam
um, dois, três... doze
e este menino aguardava ansioso
pelo melhor presente
que nada mais era
que meras palavras escritas
pela minha babá, Irene.

Havia o ano novo
dia de aniversário
dias das crianças
mas dia nenhum era assim
tão esperado
como o dia de Natal.

Irene não escrevera
naquele ano.
Dias depois soube
que Irene falecera
por causa d'uma diabete.
Bem que eu dissera:
Como era doce a minha Irene!

O PIANO QUE MAMÃE TOCAVA

Venderam o piano que mamãe tocava
a sala hoje, encontra-se vazia.

No tempo do tempo do tempo
havia no canto de nossa velha casa
da Rua Doutor Mattos
além do criado mudo e móveis mais
a canção e a vida, na viagem
do piano que mamãe tocava.

— Quase tudo tem seu preço.
O piano que mamãe tocava
Não tinha preço: tinha valor —

A tristeza e a alegria
na história dessa senhora
e o toque sutil de suas mãos
tão calejadas e sofridas
faziam todas as canções, belas.

Hoje, o canto encontra-se vazio
mas a nostalgia embala a criança
que amadureceu criança
nas lembranças daquele tempo.

Acordaram todos os sonhos
a velha senhora se foi
e a canção desencantou-se
no dia em que venderam
o piano que mamãe tocava.

Fonte:
http://www.germinaliteratura.com.br/

Rogério Salgado


Rogério Salgado nasceu em Campos dos Goytacazes (RJ). Passou sua infância e parte da adolescência vendo com frequência, sua mãe, a pianista Glória Salgado, tocar piano. Aos sete anos, seu pai veio a falecer, deixando-lhe de herança, uma grande biblioteca.

Em 1974 participou do Teatro Escola de Cultura Dramática, onde descobriu a arte.

Em 1975 escreveu seu primeiro poema.

Participou de muitos festivais de música em sua terra natal.

Em 1979 criou com os poetas Fernando Leite Fernandes, Guilherme Fernandes e Anthony Garotinho o Grupo Abertura de Artes e Estudos, escrevendo a peça teatral Retorno a 200 metros, em parceria com eles.

Em 1980, com a morte da mãe, mudou-se para Belo Horizonte/MG.

Em 1983 criou com Ecivaldo John e Virgínia Reis, a revista Arte Quintal, um dos mais importantes veículos culturais da época.

Em 1993 criou o projeto In/Sacando a Poesia, que consistia em colocar poemas dentro de saquinhos de embalar pães nas padarias, recebendo pelo projeto, o Prêmio Capital Nacional-Categoria Poesia, em Aracaju/SE, em 1998.

Em 1994 teve um conto de sua autoria, adaptado para o extinto programa Você Decide, da Rede Globo de Televisão.

Em 2000 foi editor e orientador de pesquisa do livro Uai Poético Pesquisando as Raízes e Veias Poéticas, de Virgilene Araújo, uma reunião de poetas atuantes na capital mineira. Neste mesmo ano, criou com Wal Souza e outros poetas, o Sarau da Lagoa do Nado, dando inicio a efervescência poética que iria crescer nos próximos anos na capital mineira.

É idealizador e realizador, juntamente com Virgilene Araújo, do Belô Poético-Encontro Nacional de Poesia de Belo Horizonte e Poesia na Praça Sete, este realizado com os benefícios da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de BH, já em sua 3ª edição.

Figura em muitas antologias, entre elas: A Poesia Mineira no Século XX (Imago Editora-1999), organizado por Assis Brasil.
Tem publicado mais de 20 livros.

Em 2008 Virgilene Araújo Publicou o livro Trilhas, uma seleção de 70% de toda a obra poética de Rogério Salgado.

Fonte:
http://www.psiupoetico.com.br/blog/rogerio-salgado/

Cássio Pantaleoni (Ciclo de Palestras "QUATRO VEZES 8" em Porto Alegre)


"Biografia, Autobiografia e Criação Literária" (Robertson Frizero) _ 19 de agosto _ quinta-feira _19h

"As Falácias do Livro Digital" (Cássio Pantaleoni) _ 27 de agosto _ sexta-feira _19h

Sapere Aude! Livros – rua Lopo Gonçalves, nº 33, lojas 1 e 2 – Cidade Baixa – Porto Alegre

Inscrições: gratuitas pelo e-mail 8inverso@8inverso.com.br

Desde sexta-feira, 6, às 19h, a Sapere Aude! Livros – rua Lopo Gonçalves, nº 33 –, em Porto Alegre, ocorre o Ciclo de Palestras "QUATRO VEZES 8", sobre criação literária e o mundo dos livros, promovido pela Editora 8INVERSO em comemoração ao seu 1º aniversário.

"Filosofia e Criação Literária", tema da segunda palestra da programação gratuita que se estende até o dia 27 de agosto, será conduzido pelo mestre em Filosofia, escritor, e sócio-diretor da 8INVERSO, Cássio Pantaleoni. No encontro, voltado a novos autores e interessados em geral, os participantes terão um panorama sobre como os grandes temas da filosofia podem contribuir para o enriquecimento do processo de criação literária. Inscrições gratuitas e mais informações pelo e-mail 8inverso@8inverso.com.br ou pelo telefone 51-3221-0203.

As vagas são limitadas.

A 8INVERSO foi fundada pelo escritor e filósofo Cássio Pantaleoni, a Editora 8INVERSO busca recuperar aquilo que o mercado editorial parece aos poucos deixar de lado – o aspecto de elegância na forma e no conteúdo da obra escrita, como referência aos tempos em que o livro era um item colecionável. Voltada aos livros de literatura, ciências humanas, artes e ensaios em geral, a Editora 8INVERSO tem por missão oferecer um repertório de obras de valor inquestionável que justifique seu lema: Livros que você não vai querer emprestar.

Fonte:
http://www.artistasgauchos.com.br/portal/?nid=2722

Valter Martins de Toledo (A Ira de Deus)


Li recentemente o livro “A Ira de Deus”, de Edward Paice – Editora Record – janeiro de 2010, que disserta sobre o grande terremoto de Lisboa, em 1º de novembro de 1755 – Dia de Todos os Santos – deixando aquela capital em completa ruína, ceifando a vida de um quarto de sua população. Terremoto de 9 (nove) pontos na escala Richter, seguido de tsunami e, depois, de um pavoroso incêndio, “uma destruição sem paralelo na história anterior da Europa”, só igualado ao de Londres.

Tragédias, nestes últimos séculos, ocorreram e não passaram despercebidas; para não citar uma enorme lista, ficamos com a primeira e a segunda guerras mundiais, o genocídio comunista que dizimou mais que as duas grandes guerras, o terremoto do Haiti e as últimas inundações.

O que chama atenção naquele terrível episódio da natureza e listado em primeiro lugar, não desprezando a intensidade e malefício dos demais, não está tão somente na tragédia causada em si, mas a discussão das duas principais religiões da época – catolicismo e protestantismo, aquele, em Lisboa, em maioria, culpando estes, em minoria. Em Londres, ao inverso, prosperava e ainda como dantes, o protestantismo, na sua maioria, culpando o outro em minoria, pelo acontecido.

Passados 255 anos, com o avanço do humanismo, da tecnologia, da educação ao alcance de todos, era de supor que isso poderia ter mudado de rumo, pois houve considerável aumento do conhecimento, antes reservado para poucos. Ledo engano! Para espanto de quem observa a evolução do animal bípede – chamado “ser humano”, não houve evolução, não, como naquela época de D. José, Rei de Portugal, e do Ministro Pombal (Sebastião José de Carvalho e Melo – primeiro Conde de Oeiras e Marquês de Pombal – Lisboa, 13 de maio de 1699 – Pombal, 8 de maio de 1782 – Secretário de Estado, depois, Primeiro Ministro – iluminista), mas continua ele preso aos preconceitos e vivências de uma sociedade de consumo cheia de crueldade, entorpecida pela maciça propaganda diária dos veículos de comunicação de vários matizes. Uma coletividade doente pelo estresse nauseante de um trânsito caótico e uma competição ferrenha e desigual.

Ninguém tem compromisso a não ser consigo mesmo; o egoísmo (e outros “ismos”) tomou conta do cérebro e entorpeceu a consciência do ser humano, desta primeira quadra do século XXI.

E o que fazer para reverter esta situação calamitosa? Parece-me, depois de uma breve reflexão, agora no albor da terceira idade, que temos de concordar, urgentemente, com Confúcio que há mais de 500 anos a.C., pregava que, enquanto não retificarmos nosso coração, não poderemos retificar o dos outros – como diz a Bíblia – “Ver nos olhos dos outros e não ver a trave nos seus” (Provérbios).

Ora, o difícil de curar um mal que nos aflige é primeiramente conhecê-lo e, após isso, encontrar o medicamento adequado, tomando-o regularmente pelo prazo necessário para restabelecer a saúde.

Conclusão: Se conhecemos o mal que nos aflige e o medicamento que não tenha efeito colateral, não há mais por que esperar para solucionar nossos grandes males.

Então, vamos combater com vigor e com tenacidade, primeiramente o consumismo, não esquecendo de abraçar a ética como se ela fosse escapar e adotar a virtude como meta. Vamos passar a olhar o horizonte de forma tal a recuperar nossas forças e daí passarmos a direcioná-lo verticalmente para o completo restabelecimento da paz social, uma vez que não podemos esperar pelo retorno de D. Sebastião e nem exaltar o sebastianismo.
--------------------------
Valter Martins de Toledo – magistrado aposentado e jornalista diplomado pela UFPR – fundador da Academia Paranaense de Letras Maçônicas, sendo seu presidente no período de 1996/2006. Membro do Centro de Letras do Paraná, da Academia de Cultura do Paraná, com sede em Londrina, portador das condecorações de Membro Honorário da Força Aérea Brasileira e Medalha do “Mérito Santos Dumont” igualmente da FAB. Atualmente Conciliador voluntário do Núcleo de Conciliação do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Paraná.

Fonte:
O Autor

Semana do Escritor e do Livro de Sorocaba continua recebendo inscrições para exposição de livros


Escritores interessados podem participar gratuitamente

O escritor que ainda não inscreveu sua obra para expor durante a 6ª Semana do Escritor e do Livro de Sorocaba, tem até o dia 20 de agosto para preencher e enviar a ficha de inscrição e os exemplares dos livros à comissão organizadora do evento.

Para quem quer realizar sua inscrição pela internet, basta baixar a ficha de inscrição através do site www.semanadoescritor.com.br , depois enviar para o e-mail contato@semanadoescritor.com.br .

Os interessados em fazer a inscrição pessoalmente, devem comparecer com 10 exemplares do livro na FUNDEC, das 14h às 18h, de 16 a 20 de agosto.

A Semana do Escritor e do Livro será realizada de 24 a 28 de agosto, das 14h às 22h, na FUNDEC, com entrada gratuita.

A 6ª Semana do Escritor de Sorocaba conta com o apoio da Prefeitura Municipal.

Serviço:

6ª Semana do Escritor e do Livro de Sorocaba

Data: 24 a 28 de agosto de 2010

Horário: das 14h às 22h com entrada gratuita

Local: FUNDEC - Rua Brigadeiro Tobias, 73 Sorocaba/SP.

Laé de Souza (Palestra na Bienal do Livro: Experiências em Projetos de Leitura)



No dia 17 de agosto (terça-feira), às 18h, o escritor e produtor cultural Laé de Souza irá ministrar uma palestra no Auditório da PNLL – Plano Nacional do Livro e Leitura, voltado a educadores, escritores, bibliotecários e produtores culturais.

Na ocasião Laé de Souza abordará o tema “Experiências em Projetos de Leitura” transcorrendo sobre a sua experiência em doze anos de projetos de incentivo à leitura e diversos aspectos práticos e legais para execução de projetos culturais subsidiados por leis de incentivo à cultura e abrirá espaço para perguntas da plateia.

Laé de Souza é coordenador do Grupo Projetos de Leitura, que atua em todo território desde 1998, e autor de vários projetos de incentivo à leitura aprovados pelo Ministério da Cultura e Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo, dirigidos a diversos públicos. Só o projeto “Ler é Bom, Experimente!”, contou neste ano com mais de cem mil alunos participantes, de varias regiões do país.

Além de projetos em escolas, outros são desenvolvidos em hospitais, grupos de terceira idade, parques, ônibus, metrô e praças públicas. O escritor é autor de obras infantis, juvenis e adultos, entre elas, Acontece..., Coisas de Homem & Coisas de Mulher, Quinho e o seu cãozinho – um cãozinho especial, Nos Bastidores do Cotidiano. São de sua autoria os projetos "Lendo na Escola", "Leitura no Parque", Viajando na Leitura", "Caravana da Leitura", "Minha Escola Lê", Dose de Leitura", entre outros.

O Auditório do PNLL, está localizado na Rua “O”, do Pavilhão de Exposições do Anhembi, onde acontece a 21ª Bienal Internacional do Livro de São Paulo.

A palestra é gratuita, está aberta ao público e a inscrição será realizada no próprio local.

Mais informações no site e-mail: contato@projetosdeleitura.com.br , ou telefone (11) 2743-9491.
http://www.projetosdeleitura.com.br/

Fonte:
Colaboração de Laé de Souza

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Ialmar Pio Schneider (Soneto)


Será que ela virá? Onde estaria,
quando pensando nela, tristemente,
eu me deixo a ficar, no claro dia,
como se tudo fosse indiferente?!

Sem este pensamento o que seria
de minha vida agora inconsequente,
buscando procurar na fantasia
alguém que me conforte ternamente?

Por isto vivo e sonho com saudade
do amor que alimentei na mocidade
que então me suscitava outrora alguém!

Preciso me livrar desta quimera,
pois a que amava já não sei quem era
e parece que não amei ninguém!

Porto Alegre, RS, Tristeza,
27/06/2010

Fonte:
O Autor

Marcos Vinícius Almeida (Madalena)


O vidro da porta estremece. Silêncio. Ouve passos afobados no passeio, e batidas firmes na janela. É o agiota, tem certeza. Conhece esse jeito de chamar. Onde iria arranjar trezentos contos? A janela de aço bambeia. Sapatos picotando no cimento do alpendre. E ela bem quieta. A terceira vez nessa semana, e a semana só tem sete dias. Se o João descobrir ela se ferra. É caso daquelas brigas onde ela sabe que chora. E põe a culpa na filha, que é gastadeira, danada, desmiolada; faz contas nas lojas e depois ela tem que cobrir. Lavando roupa pra fora, faxineira e até uns salgados. Mas o dinheiro é miúdo. É luz, e mantimento e o telefone cortado. “Cê não põe freio nessa menina, tem que por freio nessa menina” – ele avisa quando vira a cara pro canto e suspira.

Barulho na porta. Antes isso que a loja, ela pensa. O homem da loja é encrenqueiro. E falador. Um fofoqueiro. Coisa mais feia do mundo é homem fofoqueiro. Seu Carlos? Não. De jeito nenhum. Agiota que dá com a língua nos dentes perde dinheiro. Seu Carlos é muito discreto. Sabe fazer negócio. Sempre que precisa pode contar com ele. Quantas vezes? Muitas, muitas vezes... Cada sufoco!... E ela sabe que vai precisar de novo. Cedo ou tarde. As contas sempre aumentam, ela sabe muito bem. O dinheiro do João só encurta. A menina depois de moça dá muito gasto.

— Madalena! — grita a voz lá fora.

Agora não tem dúvida. E fica quieta espiando a sombra de pernas esgueirando—se debaixo da porta. Vai ter que atender, não tem jeito.

Abre a porta.

— D. Madalena. Tudo bem?
— É o senhor, Seu Carlos, vamo chega, uai!
— Já tem dias que venho aqui, mas não encontro a senhora...
— Pois é, Seu Carlos... É essas faxinas que faço pra fora, né? Senta, Seu Carlos. Aceita um café?

Ele senta e aceita o café. E quando ela deixa a sala, com seu vestido branco de florzinha amarela, ele espia as batatas das pernas parrudas que ela depilou hoje pela manhã.

— O café, Seu Carlos – na xícara de porcelana que ganhou da avó no casamento.

Ela senta e cruza as pernas.

— Cafezinho da senhora é uma beleza, D. Madalena... A Joana não acerta na mão, sabe?
— Sei, Seu Carlos...
— Quase não tomo café. Não dá nem gosto... Mas esse café da senhora, é uma beleza!
— Ai, obrigada... Desde pequena que eu faço. Acabei pegando o jeito, né?... O senhor aceita um pão-de-queijo?
— Não, muito obrigado. Vou ficar só no cafezinho mesmo.

Ficam em silêncio. E ela imagina uma desculpa bem boa pra dar. Pensa em falar que não recebeu um dinheiro que tinha pra receber. Que a filha ficou doente e foi obrigada a gastar o dinheiro que tinha separado pra ele.

— A situação tá feia, né, D. Madalena? — ele diz repousando a xícara no colo.
— É essa crise Seu Carlos... Todo mundo anda apertado — e baixa os olhos.
— Nunca vi crise assim, D. Madalena. E se não fosse por isso, eu não viria aqui falar com a senhora.
— E se já não bastasse a crise, ainda acontece cada coisa com a gente, né?... Minha filha ficou doente esses dias, e remédio anda tão caro...
— Anda mesmo, mas doença não pode esperar. Em primeiro lugar a saúde, D. Madalena.
— Ah, sim... A saúde em primeiro lugar.
— Mas o quê que ela teve?

Ela hesita.

— Como que é mesmo... Um nome complicado... Tem hora que eu me esqueço...
— Mas é grave?
— Se tratar no começo, o doutor disse que não... Mas remédio anda tão caro, Seu Carlos... Tava com o dinheiro do senhor aqui separadinho, mas a menina adoeceu e eu tive que gastar. Tenho dinheiro pra receber por conta de faxina, mas o povo atrasa, sabe?
— Sei como é essas coisas, D. Madalena. Mas a menina tá melhor?
— Mais ou menos...
— Esses trem de saúde são muito complicado mesmo... A Joana, minha esposa, também tá doente. Teve internada, fez um monte de exame e eu não paguei o hospital até hoje, D. Madalena. Estão me mandando cobrança em cima de cobrança... E eu não sei o que eu faço. Porque do jeito que a Joana tá, periga deu ter que internar ela de novo, aí não sei como é que vou fazer...
— Complicado demais...
— Muito complicado.
— Acontece que eu não tenho mesmo... Não tenho de onde tirar.
— Seu marido não tem?
— Meu marido nem sabe do nosso negócio, Seu Carlos... Ele me vigia muito nos gastos, já expliquei isso pro senhor...
— Sim, eu lembro...
— Pra mim pedir dinheiro pra ele, tenho que falar pra quê que é... E ele não me passa o dinheiro, ele mesmo vai lá e paga... O João é muito sistemático... E se ele souber que eu devo o senhor. Nossa senhora...
— Eu compreendo... Mas acontece que eu preciso desse dinheiro, D. Madalena — diz meio sem graça.
— Eu entendo o senhor, mas se não fosse essa doença da minha filha... Aceita mais um café?

Ele aceita. E quando ela levanta, ele vê a calcinha branca aparecendo sem que ela perceba
.
— Cafezinho bom...
— Mas como eu tava falando... Se não fosse a doença da minha filha...
— E eu ainda tenho passado por outros problemas, D. Madalena...
— Que problemas, Seu Carlos?
— Ah, a Joana não anda muito bem comigo... Ainda mais com a doença agora...
— E que doença ela tem?
— Não anda bem da cabeça... Tem a conta do hospital.... E esses médicos de cabeça são muito caros, e tudo à vista, a senhora sabe... Tratamento demorado... Mas com isso a gente até que se vira, pula de um lado pro outro e acaba dando um jeito de pagar... Mas essas coisas de marido e mulher é muito difícil... Já tem bem tempo que a gente não faz nada, a senhora entende?
— Entendo...
— Eu fico muito sozinho...

Silêncio. E ele baixa a cabeça. Ela olha nos sapatos dele. Sapatos bem novos. E depois nas mãos sem calo.

— A gente tem umas fases meio difíceis mesmo, Seu Carlos... A vida é dura.
— É, a vida é dura...

Ele olha no pé dela, no chinelo havaiana balançando. No joelho redondo e lembra dela menina. E conta uns casos de antigamente, de fulano e ciclano, de quem casou com quem e separou de quem: isso dura uns vinte minutos.

— Quando a gente é novo tudo é mais simples, né?
— É sim, Seu Carlos... Ah, mas é porque era a gente que dava problema... Agora é a gente que resolve. Eu não tive problema de saúde não, mas era bem danada — e sorri.
— Não era não, D. Madalena... Era uma moça bem direita.
— Ah, mas minha mãe ficava no pé... Eu tinha era medo... Ela só queria meu bem, né?
— A gente até deu umas namoradas naquele tempo, a senhora se lembra?

Ela ri. E mexe o corpo no sofá.

— Foi mesmo, Seu Carlos. Eu bem que lembro... Eu era bem rapariga. Não sabia das coisas.
— Ah, a senhora sempre foi muito bonita, D. Madalena.

Ela se inclina um pouco pra trás. Mexe no cabelo preso. E olha pra ele.

— Ando tão descuidada...
— Mas continua bonita... Com todo respeito.

Ela olha nas roupas bem novas do homem. E no rosto dele bem conservado pra quarenta e poucos anos.

— O senhor acha?
— Sim, continua bonita como naquele tempo.
— Seu Carlos, Seu Carlos...
— O quê, D. Madalena?
— O senhor, falando essas coisas...
— Mas é a verdade, com todo respeito.
— Sei...
— Aliás, não me esqueço daquele dia...
— Eu era muito nova... E tinha medo das coisas...
— Ainda tem medo?
— Seu Carlos, Seu Carlos... O senhor não vai conseguir... — sorri.
— Conseguir o quê, D. Madalena?
— Isso que o senhor está pensando... Não sou dessas... Tenho marido, tenho filha...
— Eu também tenho esposa...

Ficam em silêncio. Meio sem graça.

— Se o João descobre... — ela sussurra.

Fonte:
Revista Bula.
http://www.revistabula.com/posts/contos/madalena
Imagem =
http://idasevindasdavida.blogspot.com

Marcus Vinicius Almeida (Livro “Inércia”)


Percorrer as páginas de Inércia, romance de estreia de Marcos Vinícius Almeida, é, antes de mais nada, movimentar-se. Movimentar-se pelas frases diretas e certeiras do autor, sem dúvida, mas movimentar-se também pelos caminhos enviesados do narrador Juan, por seus desejos, sonhos, pensamentos, bebedeiras, hesitações, ousadias. É deixar The Cure e Joy Division tocando na cabeça para mergulhar no mundo desse estudante de filosofia capaz tanto de discutir Schopenhauer numa manhã de ressaca quanto de atrair um “ombrinho branco” ou a atenção da garota mais disputada da cidade. É acompanhar o vai-e-vem de um namoro-casamento um tanto quanto falido, é acompanhar o moleque magricela e orelhudo por seus porres noite adentro. É acompanhar Juan até onde der. Com cerveja barata, conhaque, pinga com refrigerante, baseados, cigarros vagabundos, pelas ruas de São João Del Rey ou da pequena cidade de Luminárias, no pequeno mundo de Juan, nos seus amigos de infância e de faculdade, na inconstância das meninas, nas salas de aula ou no bar da família.

"Todo corpo permanece em seu estado de repouso ou de movimento retilíneo e uniforme, a menos que seja obrigado a mudar seu estado por forças a ele impressas." Assim dizia Newton, e assim Marcos Vinícius Almeida pergunta ao leitor: meu personagem está parado ou em movimento? Mover-se por esse universo de Juan, é isso “estado de repouso”? é “movimento retilíneo e uniforme”? Para onde vai meu personagem? Caminha ao acaso? Ou, tal qual um Sísifo mineiro do século XXI, apenas arrasta suas pedras até o cume dos morros para vê-las cair e recomeçar o trabalho? Pois a vida de segunda e terça e sábado é isto: “Conversar com o pessoal. Beber. Falar de coisas inúteis. Ouvir Joy Division e esperar o dia amanhecer. É realmente a melhor opção.” É isso, até que uma força exterior a ele impressa o obrigue a mudar seu estado, a tomar outro rumo. Aí a vida de Juan quem sabe vai por uma nova direção, ou quem sabe o que lhe espera não é mais um desses infinitos estados inerciais.

Imóvel ou em movimento, Juan e sua história gritam a nós, leitores. “Porque você é só um pronome de tratamento; então eu grito bem alto, mas o som não se propaga no vácuo...” Se o som não se propaga no vácuo, é preciso estar próximo a Juan para ouvir sua voz. E por isso os capítulos de Inércia nos chamam, nos querem por perto, presos, acompanhando cada frase. Ao lado de Lúcia ou de Tati, na casa de Éder ou vendendo cervejas e uísque no bar do qual seu pai é proprietário, bebendo até cair ou perdendo a partida na sinuca, esta é a vida que Juan nos convida a viver. Porque ler a primeira frase do livro é aceitar a força por ele impressa, ou seja, é dar início a um movimento que não vai mais parar até a última frase. E se o romance se fecha com reticências, é porque sua leitura ainda vai deixar margem para reflexões posteriores. Afinal, até que se diga o contrário, o movimento continua.
texto de Victoria Saramago.

"Inércia retrata os dramas e sonhos de Juan, um jovem estudante de filosofia que precisa repensar suas escolhas, a adolescência passada em Luminárias e o casamento um pouco frustrado que vive em São João del Rei. Apesar das coincidências entre o personagem e o autor, o livro não é uma autobiografia."
(Jornal O Tempo - BH)

"Dotado de um aspecto embrionário, e cheio de surpresas, Inércia é o romance de estreia de Marcos Vinícius Almeida. Ele, mineiro de Luminárias, faz de seu ofício algo raro e essencial: seduzir o leitor desde a primeira linha com uma proximidade e identificação em relação aos personagens.

Lançado pela Multifoco há alguns meses, Inércia também denota caminhos, mostra possibilidades e gera expectativa. Não é fácil escrever um romance de relativo fôlego aos 20 e poucos anos (que seria lançado tempos depois). No livro, apresenta-se Juan, que assim como o autor se vê às voltas com situações corriqueiras e relacionamentos cotidianos. Há ai um Q de biográfico, responsável por envolver leitor a partir de pontos como identificação e proximidade
" ( Solmão Terra, OPPERAA - MONDO CULT)

O que sobressai no romance de Almeida é o senso de humor. É um livro divertido, narrado em primeira pessoa por Juan, estudante de filosofia, universitário que gosta de beber, fumar e que está em meio a uma crise de consciência, e por isso conta seus sabores e dissabores amorosos.(...) O autor se refere a si mesmo como 'jovem caipira' dono de uma 'inerente falta de talento.' É claro que a inteligência de cada um, na perspectiva do autoexame, outorga ao sujeito a possibilidade de se achar sem determinadas qualidades. Mas neste caso, parece mais modéstia em excesso, no que diz respeito à falta de talento." Leituras do Giba - Gilberto G. Pereira - Jornalista. (Tribuna do Planalto-GO) e Diário do Comércio (SP), revistas Superinteressante e Época).
––––––––––––––––––-
Marcus Vinicius Almeida nasceu em 1982 na grande SP; vivendo sempre em Luminárias-MG. Publicou alguns contos em antologias, sites e revistas como a Cult, Suplemento Literário de MG e Cronópios; um romance: Inércia (Ed. Multifoco: 2009). Editor do Selo Terceira Margem e colunista da Revista Bula.

Selecionado na Oficina de Criação Literária (2010) do escritor Assis Brasil, do Programa de Pós-Graduação em Letras da PUC-RS.

Fontes:
O Autor
Comentários (http://www.quebracorpo.com.br/home/livro)
http://portalliteral.terra.com.br/perfis/marcos-vinicius-almeida

Concurso para Criação da Letra do Hino à Bandeira da União Brasileira dos Trovadores (UBT)


(Divulgado no Boletim Nacional nº 505)

Dados Importantes

- A UBT possui um emblema que tem por base uma rosa vermelha – símbolo do lirismo, e, quatro linhas douradas, que representam os quatro versos da trova.
O verde simboliza o Brasil.
O branco simboliza a paz.
A rosa vermelha é o símbolo do lirismo e da UBT.

A idéia da Bandeira foi de Luiz Otávio.

Quem desenhou a Bandeira da UBT, foi grande Trovadora Iraci Nascimento Silva.

Agora só está faltando um Hino à nossa Bandeira.

CONCURSO PARA CRIAÇÃO DA LETRA DO HINO À BADEIRA DA UBT.
REGULAMENTO:

ENDEREÇO PARA REMESSA:
Para o e-mail: mariastinglin@hotmail.com
OU:
A/C de Mª da Graça Stinglin de Araújo - Rua Petit Carneiro, nº734 aptº301 - Bairro Água Verde- CURITIBA - PR- CEP: 80.040-050.

OBS nº1 - A letra do Hino deverá ser composta em 06 Trovas, sendo que a última Trova deverá ser composta para servir de estribilho do Hino.

Máximo de uma composição por trovador.

OBS nº 02-Enviar a letra com a identificação e um pseudônimo. A Coordenadora do Concurso enviará a letra do Hino, apenas com o pseudônimo, para a Comissão Julgadora composta pelo Presidente Nacional e Conselho Nacional.

OBS nº 03-Verificada a letra vencedora e o seu respectivo autor, a Coordenadoria do presente Concurso tratará da composição musical do Hino.

A divulgação e a apresentação oficial do Hino acontecerão durante as festividades dos J. Florais de Balneário Camboriú- SC -que por motivos de ser ano eleitoral foram adiadas para 15, 16, e 17 de abril de 2011.

PRAZO: 15-09-2010

Agradecemos aos Irmãos Trovadores e esperamos suas participações.

Maria da Graça Stinglin
UBT Curitiba
Presidente

Fonte:
UBT/PR - Seção Curitiba

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Pedro Ornellas (Refúgio)


Todo poeta tem, por ser poeta,
um mundo à parte, pleno de magia!
Só ele sabe a porta, que é secreta,
fronteira entre o real e a fantasia.

Ali depõe a mágoa que o alfineta,
se o mundo o fere, ali se refugia...
É ali que encontra a paz e se completa
quando conversa, a sós, com a poesia.

Nesse lugar que a mente humana cria
o Amor é a lei, o bem a ordem-do-dia,
o idioma é a Paz e quem governa é a Arte!

Não é um lugar nas dimensões terrenas,
mas um estágio ao qual se eleva apenas
quem da Poesia faz seu mundo à parte!

Fontes:
O Autor

Ruth Rocha (As Coisas que a Gente Fala)


As coisas que a gente fala
saem da boca da gente
e vão voando, voando,
correndo sempre pra frente.
Entrando pelos ouvidos
de quem estiver presente.
Quando a pessoa presente
É pessoa distraída
Não presta muita atenção.
Então as palavras entram
E saem pelo outro lado
Sem fazer complicação.

Mas ás vezes as palavras
Vão entrando nas cabeças,
Vão dando voltas e voltas,
Fazendo reviravoltas
E vão dando piruetas.
Quando saem pela boca
Saem todas enfeitadas.
Engraçadas, diferentes,
Com palavras penduradas.

Mas depende das pessoas
Que repetem as palavras.
Algumas enfeitam pouco.
Algumas enfeitam muito.
Algumas enfeitam tanto,
Que as palavras - que
Engraçado!
- nem parece as palavras
que entraram pelo outro
lado.

E depois que elas se espalham,
Por mais que a gente procure,
Por mais que a gente recolha,
Sempre fica uma palavra,
Voando como uma folha,
Caindo pelos quintais,
Pousando pelos telhados,
Entrando pelas janelas,
Pendurada nos beirais.

Por isso, quando falamos,
Temos de tomar cuidado.
Que as coisas que a gente fala
Vão voando, vão voando,
E ficam por todo lado.
E até mesmo modificam
O que era nosso recado.

Eu vou contar pra vocês
O que foi que aconteceu,
No dia em que a Gabriela
Quebrou o vaso da mãe dela
E acusou o Filisteu.

- Quem foi que quebrou meu vaso?
Meu vaso de ouro e laquê,
Que eu conquistei no concurso,
No concurso de crochê?
- Quem foi que quebrou seu vaso?
- a Gabriela respondeu
- quem quebrou seu vaso foi...
o vizinho, o Filisteu.

Pronto! Lá vão as palavras!
Vão voando, vão voando...
Entrando pelos ouvidos
De quem estiver passando.
Então entram pelo ouvido
De dona Felicidade:
- o Filisteu? Que bandido!
que irresponsabilidade!
As palavras continuam
A voar pela cidade.
Vão entrando nos ouvidos
De gente de toda idade.
E aquilo que era mentira
Até parece verdade...

Seu Golias, que é vizinho
De dona Felicidade,,
E que é o pai do Filisteu,
Ao ouvir que o filho seu
Cometeu barbaridade,
Fica danado da vida,
Invente logo um castigo,
Sem tamanho, sem medida!
Não tem mais festa!
Não tem mais coca-cola!
Não tem TV!
Não tem jogo de bola!
Trote no telefone?
Nem mais pensar!
Isqueite? Milquicheique??
Vão acabar!

Filisteu, que já sabia
Do que tinha acontecido,
Ficou muito chateado!
Ficou muito aborrecido!
E correu logo pro lado,
Pra casa de Gabriela:
- Que papelão você fez!
Me deixou em mal estado,
Com essa mentira louca
Correndo por todo lado.
Você tem que dar um jeito!
Recolher essa mentira
Que em deixa atrapalhado!

Gabriela era levada,

Mas sabia compreender
As coisas que a gente pode
E as que não pode fazer;
E a confusão que ela armou,
Saiu para resolver.

Gabriela foi andando.
E as mentiras que ela achava
Na sacola ia guardando.
Mas cada vez mais mentiras
O vento ia carregando...
Gabriela encheu sacola,
Bolsa de fecho de mola,
Mala, malinha, maleta.

E quanto mais ia enchendo,
Mais mentiras ia vendo,
Voando, entrando nas casas,
Como se tivessem asas,
Como se fossem - que coisa!
- um milhão de borboletas!

Gabriela então chegou
No começo de uma praça.
E quando olhou para cima
Não achou a menor graça!
Percebeu - calamidade!
- que a mentira que ela disse
cobria toda a cidade!

Gabriela era levada,
Era esperta, era ladina,
Mas, no fundo, Gabriela
Ainda era uma menina.
Quando viu a trapalhada
Que ela conseguiu fazer,
Foi ficando apavorada,
Sentou-se numa calçada,
Botou a boca no mundo,
Num desespero profundo...

Todo mundo em volta dela
Perguntava o que é que havia.
Por que chora Gabriela?
Por que toda esta agonia?
Gabriela olhou pro céu
E renovou a aflição.
E gritou com toda força
Que tinha no seu pulmão:
- Foi mentira!
- Foi mentira!

Com as palavras da menina
Uma nuvem se formou,
Lá no alto, muito escura,
Que logo se desmanchou.
Caiu em forma de chuva
E as mentiras lavou.

Mas mesmo depois do caso
Que eu acabei de contar,
Até hoje Gabriela
Vive sempre a procurar.
De vez em quando ela encontra
Um pedaço de mentira.
Então recolhe depressa,
Antes dela se espalhar.
Porque é como eu lhes dizia.
As coisas que a gente fala
Saem da boca da gente
E vão voando, voando,
Correndo sempre pra frente.

Sejam palavras bonitas
Ou sejam palavras feias;
Sejam mentira ou verdade
Ou sejam verdades meias;
São sempre muito importantes
As coisas que a gente fala.
Aliás, também têm força
As coisas que a gente cala.
Ás vezes, importam mais
Que as coisas que a gente fez...
"Mas isso é uma outra história
que fica pra uma outra vez..."

Fonte:
http://www2.uol.com.br/ruthrocha/

Aparecido Raimundo de Souza (Chuva e Saudade)


Cai a chuva... é triste o dia...
A manhã é cinzenta e baça...
E eu mudo vejo a chuva fria,
A correr de leve na vidraça...

E a chuva cai... cai e não passa...
Nem sequer a chuva estia...
Para que um pouco se desfaça,
A saudade de quem eu tanto queria!...

Qual essa vidraça, está meu rosto...
E meus olhos não querem desanuviar...
É por demais sofrido o meu desgosto...

Aumenta a chuva e com ela a minha dor...
Soluço qual criança perdida, sem cessar,
Na incerteza de ao menos rever-te amor!...

Fonte:
http://umcoracaoqueama.blogspot.com/

Roza de Oliveira (Poemas Avulsos)


PRIMAVERA

Todo ser tem seu tempo de expressão.
Baila a ave se a vida é movimento,
E canta quando a vida é uma canção,
Seja na alegria ou no tormento.

A primavera é um festival de vida.
Da planta sai poesia colorida:
Poesia-flor que transborda docemente
O prazer de ser fruto e ser semente.

Cada flor tem seu verso e sua rima
Nas florestas, nas praças e nas casas,
Do amor é poesia cristalina!

E na expressão que vitaliza esse planeta
Se, de repente as flores criam asas…
Não é verso-fantasma! – é borboleta!

VERSOS LIVRES

INSTANTÂNEO

Sempre que me inauguro
em teu sorriso
sinto tocar de leve
o Paraíso

METAMORFOSE

Dentre as setas
com que me feres
eu forjarei a Agulha
com que bordarei a tela
da minha noite escura.
Nela tecerei
a Estrela que nos guia
com mãos de ternura

RELÓGIO DE SOL

Relógio de sol
Eu sou.
Nuvens e trevas
Rejeitando vou…
Só registro as horas
Em que o sol brilhou

CASA ONÍRICA

Bem no pico dos meus sonhos
construí minha morada,
sem paredes, sem telhados,
sem limites nos seus lados.

Bem que o telhado varia.
Varia conforme o dia:
há telhado de gaivotas,
de estrelas, de andorinhas!

Minha cama é uma nuvem,
minha mesa - a lua cheia.
O vento - é o meu cavalo!
Sou turista do infinito!

RELÂMPAGOS DIVINOS

Relâmpagos luzindo em noite escura
em seus corcéis de luz aurifulgente,
anunciais de forma rica e pura
um mágico saber - clarividente!

Telegramas de luz cuja linguagem
computador nenhum pode gravar
e, presciente dessa luz-imagem,
só o poeta a sabe decifrar.

Bendito seja tal conhecimento
que em seus raios de luz, força e verdade
emerge dos arcanos de uma alma.

E, assim sendo, relâmpagos divinos
trazeis da criação a tempestade
que me compensará com paz e calma.

Elisa Meirelles (Literatura do 6º ao 9º ano: ensine a teoria sem deixar de lado as práticas de leitura)



Nos anos finais do Ensino Fundamental, ler sobre os livros é tão importante quanto ler os livros. A turma precisa começar a entender os diferentes estilos e recursos linguísticos usados pelos autores, sem deixar de lado as práticas de leitura

Chegou a hora de (além de ler para ampliar o repertório de obras e autores) começar a estudar a literatura. Nos anos finais do Ensino Fundamental, o ideal é que a turma analise os recursos linguísticos, os detalhes das histórias e as diferentes características dos textos literários sem se esquecer do hábito de ler (aquilo que os especialistas chamam de práticas sociais de leitura). É importante apresentar textos mais complexos aos alunos e lançar mão de conhecimentos teóricos para entendê-los melhor.

POR QUE LER E ENSINAR LITERATURA

Para ir além do simples hábito de ler. Quando lemos um livro de poesias, elas nos emocionam e nos fazem refletir, buscar interpretações possíveis e tirar conclusões. E se alguém contar que essa obra foi escrita durante uma guerra, por exemplo, quando todos os escritores eram perseguidos? Ou chamar a nossa atenção para a estrutura do poema e nos fizer pensar por que o autor usa cada palavra, cada figura de linguagem? Com certeza, nossa visão sobre a obra vai mudar e vamos entender melhor aquele conjunto de versos. É isso que acontece quando você alia o ensino da literatura às práticas de leitura. Os alunos aproveitam a teoria para ampliar o olhar sobre os livros.

QUEM LÊ

Nessa etapa da escolarização, o jovem precisa se acostumar à leitura autônoma. Mas algumas atividades coletivas podem ser mantidas (um bom exemplo é a leitura, pelo professor, de um texto de difícil compreensão, com o objetivo de ajudar na interpretação). Seu papel passa a ser o de orientador, que apresenta novidades e levanta questões para o desenvolvimento do senso crítico, sempre valorizando a opinião de todos. As atividades individuais de leitura são essenciais para criar uma relação pessoal com os livros, que se mantém pelo resto da vida.

COMO LER

"Um segredo para formar leitores é misturar os momentos de leitura íntima, silenciosa e pessoal com outros de troca sobre como cada aluno se relaciona com o que leu", escreveu recentemente num artigo a argentina Nora Solari, especialista em Didática da Língua e da Literatura. Levar os jovens a falar sobre textos literários com os colegas é uma boa maneira de manter e ampliar seus hábitos leitores. Ao fazer com que os estudantes se aproximem de um livro que querem ler, você os coloca diante de um desafio. A turma terá de discutir e confrontar ideias para construir significados em relação à obra, terá de procurar as respostas escondidas nas entrelinhas (e esse prazer de entender melhor os livros é um dos grandes baratos da literatura).
QUANDO LER

A leitura continua sendo uma atividade permanente do 6º ao 9º ano. Cabe a você organizar o planejamento para incluir tanto as obras obrigatórias, estudadas nas aulas de teoria literária, como os textos escolhidos livremente pelos alunos.

ONDE LER

A exemplo do que já foi dito em relação aos anos iniciais do Ensino Fundamental, não há espaços específicos para ler. O aluno que tem o hábito da leitura busca os próprios cantos.

O QUE LER

Na hora de ajudar a turma a escolher os livros, é importante conhecer o repertório e os interesses dos estudantes (coisas que cada um curte fazer nos fins de semana, assuntos que lhes interessam). Com base nisso, fica mais fácil sugerir leituras que farão sucesso. Segundo Rildo Cosson, autor de Letramento Literário: Teoria e Prática, indicar uma obra que dialogue com um jogo de videogame é um meio poderoso de atrair a garotada para a história. Além disso, a consolidação dos hábitos de leitura permite explorar textos mais difíceis e desafiadores, bem como conhecer novos autores e estilos (confira no quadro abaixo algumas indicações para os estudantes do 6º ao 9º ano).

OS ERROS MAIS COMUNS

- Analisar só os aspectos gramaticais. Deixar de lado as interpretações de um livro está muito longe de ser uma boa forma de desenvolver comportamentos leitores na turma.

- Separar forma e conteúdo. Colocar em discussão apenas os temas tratados no livro e deixar de lado a forma é um problema recorrente nas aulas de Língua Portuguesa. A interpretação completa de uma obra depende não só do que é dito, mas de como é dito. Até porque todo mundo sabe que um poema é diferente de uma crônica ou conto.

Fonte:
Revista Nova Escola. n. 384 - agosto 2010.

Apparicio Silva Rillo (Romance do João da Gaita)


Sempre a tocar o cavalo
João da Gaita se criou.

Nem sabia o que buscava
- se estrela, estrada, horizonte.
Andava como os arroios
que desprendidos da fonte
procuram seu próprio curso
pelos acasos do chão.

O claro clarim dos galos
cada nova madrugada
já o encontrava encilhando
para a invenção de outro rumo.
E as nazarenas cantavam
em contraponto aos cochichos
- elas também dois galitos
armados em couro e prata,
com esporões de treze pontas
sonorizando as manhãs.

Quando a noite era mais clara
e o caminho parecia
um longo rio preguiçoso
entordilhado da lua,
João da Gaita e seu cavalo
lembravam, pelo perfil,
um barco a vela fugindo
pelas pratas deste rio ...

Se alvorotavam as estâncias
quando o gaudério chegava
no seu jeitão despachado
de índio caminhador.
Na garupa a oito-baixos
que só faltava falar,
e na garganta as notícias
do mundo velho largado
por onde houvera cruzado
na sua sina de andar.

Eram novas de peleias,
de mercancias e cambichos,
de sucessos em bolichos,
conchas de tava e carreiras,
e tudo à sua maneira
de entender o assucedido,
filosofando comprido
como um rábula sabido
em tricas de tribunal.

À noite, rente do fogo,
o andarengo abria a gaita
como quem abre um missal.
Oficiante extraordinário
que das pautas do hinário
só repicava aleluias
para o concerto ritual.

Quando estirava os dois braços
abrindo os foles da gaita,
o celebrante do ofício
recordava Jesus Cristo
no lenho do sacrifício
no seu Dia da Paixão...

E o fogo bordava rendas
no bastidor estirado
do santa-fé do gaipão.
E a cuia fazia roda
na ciranda centenária
da volta do chimarrão.
E a gaita velha chorava
que nem china candongueira
que enfrenou para carreira
o flete do coração.

Cantava o primeiro galo.
Mais um mate, e o andarengo
sentava os recaus no pingo
para a jornada do dia.

Quando o sol aparecia,
João da Gaita, lá da estância,
lembrava, já mui longito,
no pala branco abanando
algum joão-grande voando
na direção do infinito ...

Um dia, no pampa largo,
clarins de guerra tronaram
chamando à revolução.
Pelas estâncias e vilas
caudilhos juntavam gente
pra o entrechoque iminente
jogando irmão contra irmão.

João da Gaita, o andarengo,
mesmo pouco percebendo
qual o sentido da luta
também foi na reculuta
como vaqueano da tropa.

Quando os caudilhos gritavam
pela coragem dos tebas,
nas cargas de espada e lança
os cascos da cavalhada
multiplicavam tambores
no couro tenso do chão.

Era a luta - transformando
cada local de combate
num campo-santo onde as cruzes
eram o "esse" das adagas
espetadas contra o céu.

Nos fogões de acampamento,
pelos alces dos combates,
a velha gaita se abria
num responso varonil.

E a indiada lembrando bailes,
surungos de trocar passo,
ia marcando o compasso
na coronha do fuzil.

E João da Gaita pensava
olhando as mãos nas hileiras
que aquelas manoplas largas
por tempos de paz e guerra
tinham distinta função.

Pelos combates e encontros
empunhando adaga e lança,
semeando a destruição,
e nos descansos da luta
puxando a gaita manheira
nas comunhões de alegria
das rodas de chimarrão.

La fresca, não entendia
por que sina Deus lhe dera
duas funções tão distintas
para o mesmo par de mãos.
Porque a lo largo entendia
que pelear estava errado
quando no campo da luta
justava irmão contra irmão.

- Ah, se pudesse algum dia
ver a querência irmanada
sem que faltasse nenhum
num grande baile comum
à sombra de uma ramada
E ele de gaita estirada
que nem cobra em ressolana,
compassando a meia-canha
das polcas de relação ...

Lá um dia percebeu,
para o seu entendimento
de índio meio bagual,
que o que chamavam "ideal"
era apenas, bem pensando,
ambição pura de mando
dos chefões da capital.

... daqueles que concitando
a gauchada ao combate
ficavam tomando mate
peleando só por jornal...

... desses que sonham, afinal,
por chegar de qualquer jeito,
seja forçando um direito,
seja quebrando um acordo,
ao saleiro de boi gordo
da governança estadual.

Numa noite muito escura
atou a gaita nos tentos
e, pingo pelo buçal,
largou-se do acampamento
três horas antes do dia
para mandar-se a la cria
direito à Banda Oriental.

Desertor? Talvez o fosse,
fazia pouca questão.
Mas desertor por consciência,
ficasse bem entendido
- soldado não é bandido
para abater um amigo
só porque manda o chefão...

Nunca mais se soube dele,
porque nunca mais voltou.
Quem sabe pra não ouvir
pelas charlas de galpão
a tristeza dos assuntos
lembrando os louras defuntos
sacrificados em vão.

Quem sabe pra não ouvir
sua história mal contada
por quem jamais a entendeu.
Por quem apenas colheu
de um gesto todo razão
a mentirosa aparência
de ter negado a querência
como covarde e fujão...

Morreu, decerto, sem ter
realizado o seu sonho,
que é a impossível miragem
dos puros de coração:

Ver a querência irmanada
sem que lhe falte nenhum
num grande baile comum
à sombra de uma ramada ...

Fontes:
http://www.paginadogaucho.com.br/poes/lista.htm
Imagem = http://sanguegaucho.blogspot.com/

Antonio Cândido (Literatura e Sociedade: A Literatura na Evolução de uma Comunidade) Parte 1


Se não existe literatura paulista, gaúcha ou pernambucana, há sem dúvida uma literatura brasileira manifestando-se de modo diferente nos diferentes Estados. Neste artigo, não interessa, por isso mesmo, delimitar produções e autores segundo o critério estrito do nascimento, mas segundo o critério mais compreensivo e certo da participação na vida social e espiritual da cidade de São Paulo. Esta apresenta algumas características, e é compreensível que a sua influência marque literariamente os que nela vivem, de modo mais forte que as do lugar onde nasceram.

Com efeito, entendemos por literatura, neste contexto, fatos eminentemente associativos; obras e atitudes que exprimem certas relações dos homens entre si, e que, tomadas em conjunto, representam uma socialização dos seus impulsos íntimos. Toda obra é pessoal, única e insubstituível, na medida em que brota de uma confidencia, um esforço de pensamento, um assomo de intuição, tornando-se uma "expressão". A literatura, porém, é coletiva, na medida em que requer uma certa comunhão de meios expressivos (a palavra, a imagem), e mobiliza afinidades profundas que congregam os homens de um lugar e de um momento, para chegar a uma "comunicação".

Assim, não há literatura enquanto não houver essa congregação espiritual e formal, manifestando-se por meio de homens pertencentes a um grupo (embora ideal), segundo um estilo (embora nem sempre tenham consciência dele); enquanto não houver um sistema de valores que enferme a sua produção e dê sentido à sua atividade; enquanto não houver outros homens (um público) aptos a criar ressonância a uma e outra; enquanto, finalmente, não se estabelecer a continuidade (uma transmissão e uma herança), que signifique a integridade do espírito criador na dimensão do tempo.

Segundo este critério, só há literatura em São Paulo depois da Independência, e notadamente depois da Faculdade de Direito. Mas antes, na segunda metade do século XVIII, já se esboçavam aquelas condições. Manifestações literárias, — que é coisa diferente, — isto houve desde os autos e poemas de José de Anchieta.

Nem podia ser de outra maneira. Que meio seria o paulistano, para permitir a atividade intelectual? No século XVIII, quando os costumes principiam a civilizar-se, sabemos que não havia por aqui homens de letras senão os clérigos, e um ou outro civil. Grandes paulistas como Alexandre de Gusmão, Teresa Margarida, Matias Aires, Lacerda e Almeida são na verdade portugueses pela inteligência, não chegando a contribuir diretamente para as luzes da pátria. O ambiente era culturalmente tão pobre, que em 1801 o governador Antônio Manuel de Melo Castro e Mendonça oficiava do seguinte modo ao agitado D. Rodrigo de Sousa Coutinho, dando conta dos resultados da sua política cultural:

Recebi o Avizo n° 19 de 6 de agosto de 1800, e com elle a relação de alguns Impressos com a importância de 165$780 rs. cujos Impressos já chegarão a esta Capitania; mais como nella há tanta falta de compradores, quanta é a negligência, e descuido q' tem havido em se cultivar as Artes e as sciencias não há que se anime a comprar hum só livro, de maneira que muitos dos que se tem espalhado, tem sido dados por mim etc.

As letras compareciam de maneira oficial, em sentido puramente comemorativo, como verso e prosa de circunstância, nas solenidades públicas. Artur Mota cita um manuscrito pertencente a Ian de Almeida Prado, onde se compendia a parte literária das solenidades em homenagem a Sant'Ana, por ordem do Morgado de Mateus no ano de 1770 — a cargo de clérigos e professores na maior parte. De que maneira o poder público incorporava a literatura, geralmente pífia, às suas comemorações, podemos ver, por exemplo, no ofício do governador Franca e Horta, datado de 10 de março de 1808, "Pa. os Professores de Philozofia, Retórica e Gramática", no ensejo da chegada da Família Real:

No detalhe das Festas, — q' se vão apromptar pa. festejarmos a feliz chegada de S.A.R., e de sua Augusta Família a Capital do Ro. de Janro. está determinado, q' nas três noites de Encamizadas, q' hão de fazer os Cavalleiros Milicianos e nas três noites de fogos dados pelo Corpo do Negocio, os Estudantes de todas as classes darão hum Carro de Parnazo com Oi-teiro em q' se repitão, e facão obras aluzivas a tão sublime assumpto: o q' participo a V. Mces. não só pa. q. assim o facão saber aos seus respectivos alunos, mas tão bem pa. os derigirem não só em o do. festejo mas tão bem nas mmas. Compuzições Poéticas afim de poderem ser todas aplaudidas pelo Povo. Não devo recommendar-lhes a Importância desta Matteria, pr. q' conto com as suas vontades, ainda mais amplas q' os meus desejos.

Outra via de manifestação literária seriam as verrinas contra o governo. Em Minas, — onde a vida urbana bastante intensa permitiu floração brusca e magnífica nas artes — elas eram de qualidade invulgar, haja vista as Cartas chilenas. Seriam bem menos polidas as de São Paulo, como as que escarneciam o Morgado de Mateus em 1767, "chamando-me de destruhidor do Povo (…) carreiro (…) fidalgo de aldeya, e de meya tigela, e outros impropérios indignos". E que proliferavam também nas vilas, como se vê pela repreensão de Franca e Horta ao Juiz Ordinário de Cananéia, em 1804, por não haver providenciado contra os que lá se afixaram.

Fora daí, as letras existiriam como atividade privada de um ou outro homem culto, — frade bento, vigário, mestre régio, magistrado, — não dando lugar a relações intelectuais capazes de caracterizar, uma literatura, de acordo com o critério acima proposto.
* * *

Este estudo pretende sugerir o papel das formas de sociabilidade intelectual, e da sua relação com a sociedade, na caracterização das diferentes etapas da literatura brasileira em São Paulo. Escolhendo um ângulo de visão — o sociológico — tentará reconhecer no seu processo evolutivo cinco momentos, socialmente condicionados, desde estes primórdios toscos até a atividade intensa dos nossos dias. Trata-se, para isto, de analisar rapidamente os tipos de associação entre escritores, os valores específicos que os norteiam e a sua posição em face dos valores gerais e da organização da sociedade. Não é uma interpretação estética, portanto, nem se deseja apresentá-la como única, pois é de alcance voluntariamente delimitado. Parece, todavia, que não há outra mais adequada para esclarecer a ligação orgânica entre produção literária e vida social.
--------------
continua...

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Fonte:
CANDIDO, Antonio. Literatura e Sociedade. 9. ed. RJ: Ouro Sobre Azul, 2006
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Concurso Literário O Pensador IV – Lindolf Bell - 2010 (Classificação Final)



A Academia Itapemense de Letras tem o prazer de divulgar a relação dos trabalhos premiados em seu Concurso Literário O PENSADOR IV – Lindolf Bell - 2010. Aberto a participantes de todo o Brasil, recebemos 201 (duzentos e um) textos, distribuídos entre contos, crônicas e poesias, em 3 faixas etárias: infanto-juvenil, juvenil e adulto.

Todos os textos tiveram 4 leituras, e foram avaliados dentro de critérios literários previamente estabelecidos.

Os premiados foram:

Infanto-juvenil

Conto:

1º lugar
A GRAVATA
Luiza Silva Brito, Brasília, DF

2º lugar
UM DIA NO PARQUE
Vitória Luiza Anacleto, Bombinhas, SC

3º lugar
MINHA DESCOBERTA
Ana Paula de Lima, Itapema, SC

Crônica:

1º lugar
ADOLESCÊNCIA
Kimberly Gustóvam Mendes, Itapema, SC

Poesia:

1º lugar
SINTAS...
Ellen Sibilla Reis Klix, Itapema, SC

2º lugar
FLUTUANDO NO MAR
Ana Luísa Borba Wilhelm, Itapema, SC

3º lugar
O COMPASSO
Rafaela Pinheiro dos Santos, Itapema, SC

Juvenil

Conto:

1º lugar
REVERSO
Thiago Emmanuel Luzzi Galvão, São Paulo, SP

2º lugar
DOIS AMIGOS UNIDOS PELA MORTE
Luan Almeida Ganzala, Itapema, SC

3º lugar
À PROCURA DE UM AMOR
Gabriela Sanguina da Silva, Itapema, SC

Poesia:

1º lugar
AMANHÃ EU ESPERO...
Jocielen Regina Fischer, Itapema, SC

2º lugar
PRIMEIRAS LETRAS
Theo Gonçalves Negreiro de Braga, Caçapava, SP

3º lugar
GÊNEROS
João Paulo Lopes de Meira Hergesel, Alumínio, SP

Adulto

Conto:

1º lugar

A MAÇÃ
Eni Allgayer, Sapucaia do Sul

2º lugar
UMA ROTINA DIFERENTE
José Henrique Gomes Gondim, Natal, RN

3º lugar
UM CERTO DOMINGO
Luna Villas-Bôas Lobão, Valinhos, SP

Crônica:

1º lugar

LER É SEMPRE UMA EMOÇÃO
Mauro Darcy Spinato, Ijuí, RS

2º lugar
LER PRIMEIRO A ÚLTIMA PÁGINA
Adilar Signori, Canoas, RS

3º lugar
NO MEU TEMPO
Alinne Patrícia de Andrade Carvalho e Silva, Natal, RN

Poesia:

1º lugar
QUARTO SEM SOMBRA
Isabel Florinda Furini, Curitiba, PR

2º lugar
GUARDADOS
Rosana Banharoli, Santo André, SP

3º lugar
CALEIDOSCÓPIO
Tatiana Alves Soares Caldas, Rio de Janeiro, RJ

Os autores premiados estão sendo comunicados via mensagens eletrônicas e telefonemas. A Sessão festiva de entrega dos prêmios será realizada em 18 de setembro do corrente ano, juntamente com as comemorações do 10º aniversário da Academia, às 19 horas, no plenário da Câmara Municipal de Itapema.

Agradecemos a todos pela participação e divulgação.

Pedro de Quadros Du Bois
Presidente

Fonte:
Pedro Du Bois