sábado, 15 de dezembro de 2018

Vanice Zimerman (Poemas Escolhidos)


VENTO MENINO

Vento menino
Despenteia meus cabelos
Brinca de Destino
E espalha as reticências...
Vento Menino
Faz com que eu viaje em sonhos
E reencontre meu  Amor...

AS LINHAS MÁGICAS DO AMOR

Observo as linhas que o vento desenha nas águas do lago,
Os desenhos das ondulações  lembram seus braços
E o aconchego de seus abraços que não mais me pertencem...
As linhas do coração são fortes, laços tecidos com fios mágicos,
Coloridos de amor e saudades,
Impossíveis de serem desfeitos,
Com o tempo, suavizam a tramas, porém continuam firmes,
Presença que se esconde, se disfarça, mas não desocupa seu lugar em meu coração.
Encontro-o só em meus sonhos...

MANDALAS DE FOLHAS

Em uma das mãos seguro
Uma folha  do Plátano
Lembranças do Outono...
Na fragilidade da folha,
Ainda sinto o toque das tuas mãos,
E, de um tempo em que fazíamos
Mandalas de folhas...
E depois ficávamos juntinhos,
Observando a brisa
Acariciar as folhas,
E as cores do pôr do sol.
Não resisto e...
As lágrimas escapam.

O PORTÃO E O VENTO

Num piscar de olhos
Distancia-se o pensamento,
Busco encontrar-te
Em cada folha do Plátano
E pétalas de rosa que guardei...
Imagino que esteja próximo a esquina
Vindo em minha direção,
Mas, num piscar de olhos.
Você retorna aos meus sonhos,
E o portão abre-se com o vento...

O ABRIDOR DE CARTAS

O antigo abridor de cartas,
Ainda guarda o calor da tua mão.
Há tantos caminhos
Nas linhas das tuas mãos
Que ficaram suavemente impressos
Em meu corpo e alma...
Saudade que se aconchega,
Buscando respirar  a tua presença
Em cada objeto,
Cada sorriso,
E nas palavras de amor,
Que ainda sobrevivem a distância,
Lembram páginas
De  um perfumado pergaminho
Feito de pétalas de rosas...

CALEIDOSCÓPIO

Noite de setembro,
Num canto da sala
As peças do jogo de xadrez,
Apenas observam...
O silêncio desenha tuas lembranças,
Feito um caleidoscópio surreal,
Repleto de saudade...

JAZZ E NOSTALGIA

Noite de setembro
Ao som do Jazz
Inesquecível, teu olhar,
Nostalgia em notas musicais...
E na janela,
A companhia das gotas d'água
Num bailado surreal
Envolvem a última rosa vermelha
Que, quase sem vida, ainda sonha
Com tua volta...

A MÁQUINA DE ESCREVER

Noite de abril,
À meia-luz.
Uma fresta na janela espia
A antiga máquina de escrever
Que em tons de sépia
Permanece em silêncio,
Silêncio repleto das carícias da tua voz...
Uma fresta na janela observa
Os móveis da sala,
O autorretrato inacabado, ainda no cavalete,
E as rosas imóveis no vaso de cristal,
Vermelhas pétalas que perfumarão
Um livro de poesias...
Uma fresta na janela espia
E curiosa, não entende as lágrimas,
Quando olho tua fotografia
E a aconchego em meu coração.
Uma fresta na janela não imagina
O significado da Saudade
Da tua ausência, do Amor tão distante,
E da outra xícara de café vazia...

Fonte:

Vanice Zimerman (Cadeira n. 16 da AVIPAF)


Vanice Elizabeth Zimerman Ferreira, nasceu em Curitiba/PR, em 1962. Escritora, Artista Plástica e Fotógrafa. Em 2010 concluiu o Curso de Letras (FTC-EAD) da Faculdade Machado de Assis - FAMA, na capital paranaense. 
Escreve crônicas, contos e poemas. Trabalha com Leitura de Imagem, desenho e pintura de quadros inspirados nas crônicas que escreve. 

Estuda Artes Visuais na Escola de Música e Belas Artes do Paraná (EMBAP).

Membro de: 
- Academia Virtual Internacional de Poesia, Arte e Filosofia - AVIPAF, Cadeira n. 16, Patrono: Mário Quintana
- Academia Poética Brasileira (APB)
- Centro de Letras do Paraná
- International Writers and Artists Association

Prêmios:
- Troféu Revista Carlos Zemek Arte e Cultura (Curitiba), destaque em Poesia.
- Certificado da Editora Mágico de Oz
- Medalha Monteiro Lobato - 2015, na Casa das Beiras, no Rio de Janeiro.
- Certificado "Amigo da Arte, da Poesia, da Vida e da Paz". 
- Movimento Paz e Poesia de Belo Horizonte.

Participação em Exposições de Arte.

Poemas, Crônicas e Contos  publicados em dezenas de livros.

Blogs:
http://vaniceferreira.blogspot.com.br/
http://arvoredossentimentos.blogspot.com.br/
Biblioteca Virtual dos Escritores:
http://escrita.com.br/escrita/leitura.asp?Texto_ID=15078

Fonte:

Mário Quintana Em Prosa e Verso 2


DATA E DEDICATÓRIA

Teus poemas, não os dates nunca... Um poema
Não pertence ao Tempo... Em seu país estranho
Se existe hora, é sempre a hora extrema
Quando o Anjo Azrael nos estende ao sedento
Lábio o cálice inextinguível...
O que tu fazes hoje é o mesmo poema
Que fizeste em menino,
É o mesmo que,
Depois que tu te fores,
Alguém lerá baixinho e comovidamente,
A vivê-lo de novo...
A esse alguém,
Que talvez nem tenha ainda nascido,
Dedica, pois, teus poemas,
Não os date, porém:
As almas não entendem disso…

NOTURNO

Apenas, aqui e ali, uma janelinha de arranha-céu... Perdida... Enquanto, do fundo do único terreno baldio, um grilo insiste em transmitir, na sua frágil Morse de vidro, não se sabe que misteriosa mensagem às estrelas ausentes.

INTERIOR

As persianas, entrefechadas, deixam passar uma réstia de sol, onde zumbe uma mosca. Silêncio.

Somente, na última prateleira, há um velho boião que diz: " Viva Dom Pedro Segundo!" - única nota exclamativa neste silêncio tecido (e não interrompido) pelo zumzum da mosca em seu vaivém. Tudo é definitivo, tudo é tão agora que até o relógio, o velho bruxo, está parado.

CAMINHO DA FONTE

A linha casimiriana da poesia brasileira começou antes, em Tomás Antônio Gonzaga. É um regato límpido, por vezes interrompido aparentemente, mas que reponta sempre, quando tudo parecia perdido

QUANDO ME PERGUNTAM

Quando me perguntam por que não aderi a essa história de "estória", respondo (e não evasivamente) que é simplesmente porque, para mim, tudo é verdade mesmo. Acredito em tudo. Acreditar no que se lê é a única justificativa do que está escrito. Ai do autor que não der essa impressão de verdade! Que é uma história? É um fato - real ou imaginário - narrado por alguém. O contador de histórias não é um contador de lorotas. Ou, para bem frisar a diferença, o contador de histórias não é um contador de estórias. E depois, por que hei de escrever "estória" se eu nunca pronunciei a palavra desse modo? Não sou tão analfabeto assim. Parece incrível que talvez a única sugestão infeliz do mestre João Ribeiro tenha pegado por isso mesmo... Também um dia parece que Eça de Queirós se distraiu e o Conselheiro Acácio, por vingança, lhe soprou esta frase pomposa: "Sobre a nudez forte da verdade, o manto diáfano da fantasia". Tanto bastou para que lhe erguessem um monumento, com a citada frase perpetuada em bronze! Pobre Eça...

O mundo é assim.

LIMITES DA CONVERSAÇÃO

Há certas coisas que não haveria mesmo ocasião de as colocarmos sensatamente numa conversa - e que só num poema estão no seu lugar. Deve ser por esse motivo que alguns de nós começaram, um dia, a fazer versos. Um modo muito curioso de falar sozinho, como se vê, mas o único modo de certas coisas caírem no ouvido certo.

Fonte:
Mário Quintana. Caderno H. Porto Alegre/RS: Globo, 1973.

Vanice Zimerman (A Gaveta Entreaberta)


É madrugada, num canto da sala, o pinheiro enfeitado ainda aguarda a estrela ser colocada no galho mais alto. Quem o observa é a gaveta de uma antiga mesa de madeira branca, que está entreaberta, algumas florezinhas que parecem flocos de neve permanecem nesse espaço, e no silêncio da gaveta, antigos cartões de Natal, ainda sobrevivem, mantendo as cores dos sinos, das árvores repletas de bolinhas, e rostos rechonchudos de Papai Noel envolvidos por luzes das velas, impressas com beleza nos cartões.

As lembranças dos Natais passados, dos sons e aromas da casa, dos sorrisos das crianças dialogam com cada detalhe das imagens, num tempo mágico contido na textura do papel e na tinta da caneta, tingindo as mensagens de “Boas Festas!” Em letras desenhadas com carinho com votos de amor à vida, paz e felicidades.

Há mistério em encanto nessas sensações de voltar no tempo de vivenciar o Espírito do Natal, que ele possa permanecer vivo nas gavetas entreabertas dos nossos corações e sonhos...

Fonte:

Contos e Lendas do Mundo (China: O Homem que vendia fantasmas)

(Do "Soushenchi", século IV) 
__________________________

Quando Sung Tingpo, de Nanyang, era ainda rapaz estava passeando certa noite quando encontrou-se com uma fantasma. Perguntou à aparição quem era e ela respondeu que era um fantasma. 

- "Quem é você ?" perguntou por sua vez o fantasma. 

Tingpo mentiu e respondeu 

- "Eu também sou um fantasma." 

O fantasma então quis saber para onde ele ia e Tingpo informou 

- "Estou a caminho para a cidade de Wanshih." 

- "Também vou para lá!" - afirmou a aparição. 

Assim puseram-se a caminhar juntos. Após uma milha, se tanto, o fantasma disse que era estupidez estarem andando ambos quando um podia carregar o outro, por turnos. 

- "Ótima idéia," achou Tingpo. 

O fantasma pôs Tingpo às costas e depois de ter andado uma milha disse 

- "Você é pesado demais para um fantasma. Tem certeza de que é um fantasma mesmo ?" 

Tingpo explicou que ainda era um fantasma novo e que, por conseguinte, ainda pesava um pouco. Tingpo, por sua vez, pôs-se a carregar o fantasma, mas esse era tão leve que tinha a impressão de não estar carregando nada. Assim foram caminhando, revezando-se, até que Tingpo perguntou ao companheiro qual era a coisa que metia mais medo aos fantasmas. 

- "Os fantasmas têm um medo horrível da saliva humana", afirmou o fantasma. 

Assim foram andando, andando até que chegaram a um rio. Tingpo deixou que o fantasma fosse adiante e observou que ele não fazia barulho algum ao nadar, mas quando ele entrou n’água, o fantasma ouviu o estalar na água e pediu-lhe uma explicação. 

Tingpo explicou novamente: - "Não se surpreenda, pois ainda sou muito novo e não estou ainda acostumado a atravessar a correnteza." 

No momento em que se aproximavam da cidade, Tingpo começou a carregar o fantasma nas costas apertando-o fortemente. O fantasma pôs-se a gritar e a chorar lutando para apear-se, porém Tingpo o apertou com mais força ainda. Ao chegar às ruas da cidade, soltou-o e o fantasma se transformou num bode. Tingpo cuspiu no animal a fim de que não pudesse transformar-se outra vez, vendeu-o por mil e quinhentos dinheiros e foi para casa. 

Eis a razão do ditado de Shih Tsung: "Tingpo vendeu um fantasma por mil e quinhentos dinheiros.”

Fonte:
http://www.capparelli.com.br/contos.php

sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

Concurso Nacional de Poesias Carlos Drummond de Andrade 2017 (Poesias Vencedoras)


Natália Alves Drummond
(Itabira/MG)

O CORAÇÃO FALA AO POETA

Montanhas de ferro, baixada da serra,
jabuticaba, manguito, banana da terra.
O tempo quer ser cavalo manso, sussurra o coração ao menino Drummond,
quer ser bodoque, bola de meia, gangorra de vaivéns,
andar no chão de pedra brilhante, brincar na Fazenda dos Doze Vinténs.
Fogem-se as horas, tem pressa o tempo, já não se deixa arrear,
acabou a brincadeira, faz pirraça, não quer esperar.
Passa, perpassa, ameaça:
chegou a hora, Drummondzinho, de se agigantar.

Drummond, Drummond...
Bate e repica o seu coração.
Drummond, Drummond...
O destino faz a rota, aponta a mira,
leve em tuas mãos as bênçãos de Itabira.
Saudade é lembrança, é memória, impregna, ninguém tira.

Drummond, Drummond...
Esse é o som que cutuca o seu peito, acorda o seu dom.
Liberte as palavras, sem altivez,
viaje no improvável, marque o tom, desfaça a sensatez.
Denuncie o mundo, ria, sopre a ferida, fale da vida.

O homem Drummond e o seu coração,
às vezes se entendem, às vezes não.
Mas intrépidos seguem a procurar
as palavras certas para contar
o que vem de fora para dentro e de dentro para qualquer lugar.

Só Deus sabe as voltas que essa vida pode dar,
e a Minas de tropeiros, oratórios e belos horizontes,
dá as mãos à terra do Santo Guerreiro, salve Rio de Janeiro!
Drummond pausa a cidade: boa prosa, tarde inteira,
Mário e Oswald de Andrade, Vinícius de Morais e Manoel Bandeira.
(A poesia a lhe elevar).
José! Amar!
No meio do caminho...
(A poesia a lhe eternizar).

Calmaria de alma inquieta.
Rosto de fácil desenho, singularidade.
Olhar saudoso, sorriso de lado, coração poeta,
Para sempre, Carlos Drummond de Andrade.

Conceição Ribeiro de Araújo

UM BRINDE, POETA!

Poeta,
Vem brindar conosco tua eternidade!
A infância emoldurada no tempo onde passeiam sonhos
renascem pessoas, causos, contos, cacos,
hiatos.
Vem percorrer teu vasto mundo
em cuja memória habitam histórias,
o ranger de portas e porteiras
que guardam as lembranças mais profundas
de um tempo onde pairam as fazendas,
bois, carrapatos e contendas.
O estalar dos chicotes,
o mugido do garrote, e o cheiro bom do café
preto como a preta velha a embalar gerações.

Vem!
Ainda tocam os sinos
é hora de acordar.
Ouve, então, as badaladas
esse sonoro cantar das notas mais afinadas
que conduzem os fiéis
até mesmo os infiéis
para as graças do Senhor
ou para um Anjo encontrar.
Então, toma as mãos do Anjo
visita, também, os arcanjos
não apenas os mais puros que tocam os seus flautins.
Mas, aquele em cujas asas a luz do sol se furtou.
Porque as palavras guardadas anunciadas estão.
Escuta o som das trombetas
é hora do anúncio, afinal.
Carlos, o gauche no tempo
atravessa gerações
que mostram as sete faces
e a fragmentação.

Ah, poeta...
Que linguagem perspicaz!
E isto é modernidade que consagrada estará.
E dizem que morto estás.
Como pode-se acreditar?
Seus versos mais que perfeitos
comovem, instigam, enfurecem,
outros com eles adormecem
porque se de fel se enchem
de mel também se preenchem.

Cabem todos no espaço de um branco ou manchado papel
vão delineando vidas, pedras no meio do caminho,
confidências, esperanças, rosas que brotam no asfalto,
apitos dos guardas ou trens, as flores mais belas de maio,
e do nascer ou morrer
o ensaio.
Cabem as paixões humanas que permanecem no tempo
os encantos do cinema e as belezas de Ipanema.
Cabe o grito mais profundo que dita a norma perene
do sentimento do mundo.
Levantemos, então, a taça
brindemos o infindável
que retrata os teus dizeres:
“E como ficou chato ser moderno.
Agora serei eterno”

Sílvia Tatiana Miranda

CARTA AO POETA

A sua ausência ainda é saudade
É falta instalada no silêncio da máquina de escrever,
É Memória na coluna do Jornal, por suas crônicas da vida.
O poema declamado no noticiário ainda ecoa...
“E agora José”? Mas você, você nunca morreu.

Dos poemas mais famosos aos livros póstumos;
Seu mundo infantil,
Povoado por paquidermes em histórias de circo;
As entrevistas, fotos pessoais;
Tudo é ouro da herança que nos deixaste.

A imprensa faz notícia em cima de seus versos.
Críticos Literários publicam pesquisas.
São inúmeras Discussões: Drummond x Sua pedra no caminho.
Correspondências com outros escritores,
Memórias da Infância,
Tudo veio à superfície pública.

As suas palavras ressaltam
Os poemas viram Música, Teatro e Cinema.
Copacabana tem hoje uma réplica, de sua presença na praia.
Belo Horizonte fechou um quarteirão,
Para celebrar seu encontro com Pedro Nava.
Itabira é ainda pequena, mas, existem os “Caminhos Drummondianos”.

No Teatro com Paulo Autran,
Perguntei sobre Carlos, o amigo que ele relembrava.
E me emocionei ao ouvir histórias do amigo,
Que te conheceu de perto,
Dizendo sobre suas sinceras manifestações
Confirmando sua timidez.

E eu continuo a procurar respostas
Para as perguntas que você fazia ao José;
Ao mundo que os ombros suportam;
A Itabira de ferro, aos burocratas, a culpa de Deus.
Mas minhas indagações não cabem aqui,
Pois você Drummond,
Você é um poeta insondável.
É um poema de infinitas respostas.

Também não cabe na classificação de Modernista ou Cronista
Um observador do cotidiano simples;
Da vida que passa, para virar poesia.
Mesmo sem encontrar todas as suas respostas,
É maravilhoso deparar com as marcas Drummondianas,
Que deixastes nos versos desta vida.
Obrigada,
Carlos Drummond de Andrade

Fonte:

Isabel Furini (O Nerd)


Todas as sextas-feiras, à tardinha, depois de sair do trabalho, a turma reunia-se no bar da esquina para beber e contar piadas. Arnaldo era o rei. Entre cervejinhas e batatas fritas divertia o grupo, contando piadas com o jeitinho de Ary Toledo.

Essa sexta-feira o escritório estava agitado. Na segunda-feira chegaria um cara novo, indicado pela diretoria. Um novo gerente, inteligente, jovem e inovador.

Segunda-feira de manhã, logo cedo, o estacionamento já estava lotado. 

Quando a porta do elevador abriu-se… - Meu Deus! Esse cara foi colega de escola… Nós o chamávamos de nerd… nerd… nerd Ental… “nerdental”!.. Porque era um verdadeiro nerd. Gostava de ler história, arqueologia, filosofia, sei lá, essas baboseiras… Esse cara vai ser o diretor da empresa? Quem diria!..

O dia passou rápido. Arnaldo percorreu todas as escrivaninhas falando: - Coitado do Zulmar, o novo diretor, tinha medo de falar com meninas. Coitado do Zulmar, o novo diretor…

Três dias depois, os funcionários foram chamados para falar com o diretor. Quando Zulmar foi dar-lhe a mão, Arnaldo esquivou-se e lhe deu dois soquinhos no ombro para mostrar que era o dono da situação. O diretor, em silêncio, pegou a ficha.

- Há cinco anos que você tem o mesmo cargo.

- Sim, mas se me quer nomear chefe estou disposto a chefiar a empresa - brincou.

- A empresa vai entrar um novo ritmo de trabalho. Lamentavelmente, você não se adapta bem a mudanças.

- Não, não é isso, “Nerdental”!.. falou rindo Arnaldo.

O diretor não riu. 

- Pode passar pelo RH.

- Não! Escute! Só falei Nerdental para lembrar dos velhos tempos. Não precisa… Não… 

O diretor, impassível, pediu para a secretária chamar outro funcionário. Teve que obedecer e falar com o gerente do RH. Lá começaram os problemas.

- Sabe por que está aqui? - perguntou a psicóloga.

- Sim! - gritou Arnaldo - porque esse nerd miserável, cretino, foi nomeado diretor e se acha o dono do mundo e… Arnaldo ficou quase uma hora falando mal do diretor. A psicóloga entendeu que Arnaldo tinha raiva reprimida, não apreciava o triunfo alheio e tinha problemas de relacionamento.

- Com a turma da cerveja, dou-me muito bem! - gritou o Arnaldo para defender-se.

A psicóloga olhou-o atrás de suas lentes grossas. “Predisposição para alcoolismo” - escreveu em seu caderno de notas.

Arnaldo foi rebaixado para auxiliar. Começou a frequentar o bar todos os dias, até que chegou ao trabalho bêbado, quase caiu sobre o computador, derrubou alguns papéis… O chefe do setor falou em despedi-lo, mas o novo diretor, com muita calma, explicou que alcoolismo é doença e pediu para o encarregado ser paciente e falar com o RH para achar uma solução.

A notícia se espalhou, e todos ficaram comovidos. Comentavam que o novo diretor era um homem justo e queria ajudar os funcionários problemáticos.

- Esse cara é um vitorioso, comentavam os funcionários.

Uma noite, Arnaldo chegou à casa de sua irmã, quase bêbado e gritou durante vinte minutos seu ódio contra o novo diretor da empresa.

Paulino, o cunhado, tranquilo, disse para Arnaldo aceitar a realidade. - Talvez o novo diretor o esteja sacaneando. Se o diretor tem um plano para prejudicá-lo, ele o está fazendo com tanta classe, que ninguém enxerga a verdade. Arnaldo, você deveria seguir o que falam as pessoas bem sucedidas. Não conhece essa frase do famoso empresário Bill G., que está rolando na Internet?

- Não!.. Qual frase?

- Bill G. disse para um grupo de estudantes: “Nunca zombe de um nerd, pois um deles será seu chefe”.

Fonte:

Trova 334 - JB Xavier


Contos Tradicionais Portugueses (Maria Mantela)



Na igreja matriz de Chaves existiu, em tempos, uma lápide, no colateral direito, com o seguinte epitáfio: 
«Aqui jaz Maria Mantela 
Com sete filhos ao redor dela».

Diz a lenda que rememora Maria Mantela que certa vez, era ela ainda menina, criticou severamente uma pobre que lhe pediu esmola, levando ao colo dois gêmeos. Anos mais tarde Maria Mantela casou e, passado tempo, engravidou.

Iniciado o trabalho do parto, quando a parteira lhe disse, depois de ter nascido o primeiro filho, que se esforçasse para sair o segundo, e o terceiro, e o quarto, e por aí fora até ao sétimo, a mulher ficou louca de vergonha.

Assim que recuperou o ânimo, pagou muito bem à parteira para que escondesse o fato de ter tido sete filhos gêmeos e entregou os recém-nascidos à serva que assistira aos nascimentos para que os deitasse ao rio. A criada, cheia de pena dos meninos, meteu-os num cesto e pôs-se a caminho do rio para cumprir o que lhe tinha sido ordenado. Não replicou ante a desumanidade do seu mandado porque bem sabia que isso só lhe podia valer aborrecimentos. Além de que a ama, no estado de espírito em que se encontrava, não lhe daria ouvidos, sendo provável até que lhe desse o mesmo fim que aos meninos.

Perto das Caldas de Chaves, assim entregue a estes pensamentos e com a asa do cabaz enfiada no braço, a serva encontrou o marido da sua senhora Maria Mantela, o qual lhe perguntou o que levava no cesto. Apanhada de surpresa, a pobre rapariga, depois de titubear umas palavras incompreensíveis, acabou por achar a solução:

- São cachorrinhos que eu vou deitar ao rio, senhor.

O amo, ou por curiosidade ou por já desconfiar de qualquer coisa, levantou a cobertura e percebeu. Pegou no cesto, pô-lo sobre o cavalo e disse à rapariga que fosse dizer à ama que estava cumprida a ordem.

Dali partiu com os filhos em busca de amas que os criassem. Deixou cada um em sua aldeia e durante muito tempo Maria Mantela não desconfiou que os meninos estavam vivos e se iam criando e educando.

Diz a lenda, ao mesmo tempo que especifica os nomes das igrejas, que estes sete meninos foram ordenados padres e viveram a sua vida em sete aldeias circunvizinhas de Chaves. E Maria Mantela viveu o resto da sua vida grata ao marido por ter aceite aqueles sete filhos de um só parto. E tanto os amou que exigiu descansar juntamente com os sete, no seu leito de eternidade:

«Aqui jaz Maria Mantela 
Com sete filhos ao redor dela.»

Poderá parecer estranho ao nosso entendimento de homens do século XX o problema posto nesta lenda em que se fala de gêmeos que por serem devem morrer. Creio não errar ao dizer que o problema se funda em antigas crenças segundo as quais as mulheres honestas só podiam, e deviam, ter um filho de cada vez do seu marido. O fato de lhes nascer mais do que um filho no mesmo parto deveria pressupor desonestidade no seu comportamento e consequente desonra do marido.

Fonte:
Lendas Portuguesas da Terra e do Mar, Fernanda Frazão, disponível em Estúdio Raposa

quarta-feira, 12 de dezembro de 2018

Domingos Freire Cardoso (Poemas Escolhidos) II


COMO QUEM NÃO TEM MAIS ONDE IR
(verso de Ana Margarida da Silva Ferreira)

Como quem não tem mais para onde ir
Fui buscar nas palavras o acalanto
Que lavem as poeiras do quebranto
Que me deram os anos de existir.

Qual bálsamo, poção ou elixir
As palavras trouxeram-me o encanto
Que eu havia perdido num recanto
Do canteiro que não chegou a abrir.

As palavras me envolvem como um véu
E do chão levam-me ao azul do céu
Num crescendo de sons e de magia.

E os dias, em fortuna, tão avaros
Fazem-se mais ridentes e mais claros
Quando me beija a sombra da Poesia.

O QUE SOMENTE UM LOUCO HÁ-DE SONHAR
(Verso de Fernando Valente Sobrinho)

O que somente um louco há-de sonhar
Uma criança alegre há-de sorrir
Um pobre velho e triste há-de pedir
E um gênio criativo há-de inventar.

Só o que um braço forte há-de alcançar
Uma vontade férrea há-de exigir
Um coração fraterno há-de servir
E a Virgem milagrosa há-de escutar.

Só irei confiar ao meu poema
O brilho puro que há num diadema
E o bem maior que houver dentro do peito.

Mas como é grande a minha pequenez
E de engenho é maior inda a escassez
O poema nunca há-de ser perfeito.

CAÍRAM, UMA A UMA, PELO CHÃO
(Verso de Glória Merreiros)

Caíram, uma a uma, pelo chão
As perlas que eu chorei e tu choraste
Nessa hora em que, triste, me abraçaste
Fugindo ao mundo vil da solidão.

Tão frágil, a sofrer, teu coração
Batia no teu peito feito haste
Ao vento dessa dor que recusaste
E punha o teu olhar na escuridão.

De amor puxei teu corpo contra o meu
E quando a força usada me doeu
Eu cri que os nossos braços deram nó.

Mais forte do que nunca o nosso abraço
Deixou entre nós dois tão pouco espaço
Que eu soube que no amor somos um só.

SINTO O SANGUE GELAR-SE-ME NAS VEIAS
(Verso de José Barreto)

Sinto o sangue gelar-se-me nas veias
Quando no peito morre uma esperança
Ou se solta um cabelo de uma trança
Onde o ouro brilhava sem ter peias;

E quando a luz que havia nas ideias
Se extingue sem deixar qualquer herança
Que no futuro seja uma lembrança
Dos povos que cantaram epopeias.

E o meu corpo minado pelo frio
Ganha a dureza gélida de um rio
A que os polos dão alma de glaciar.

Sou branca massa de água deslizando
Que sobre um mar de mágoa abominando
Onde eu não sou capaz de me afogar.

Fonte: 
CARDOSO, Domingos Freire. Por entre poetas. 
Aveiro/Portugal: Edição do autor, 2016
(livro gentilmente enviado pelo poeta)

Júlio Brandão (Lenda de Natal)

Certo homem, já velho, viu chegar o Natal, e pôs-se a pensar na melancolia, no desamparo da sua vida. Dos filhos, uns tinham-lhe morrido, outros tinham-no abandonado... Estava só no mundo, com os pés para a cova, e cheio de desilusões, de ingratidões e de pobreza. Entretanto não havia ambições vis nem rancores no seu coração. Tinha saudades. Por esse lento caminho da vida, hoje ermo de afetos, algumas consolações tivera a sua alma.

Recordava-se, às vezes com os olhos orvalhados, postos no horizonte esfumado do dia triste. Agora era um farrapo, que tinham de levar os redemoinhos da morte. À noite (era a nostálgica noite de Consoada) sentiu duas longas lágrimas a molharem-lhe o rosto. Ele mesmo foi fazer um caldo para a ceia. Os piornos ardiam na lareira do casebre esburacado. O velho encolheu-se ao lume, com os olhos fixos na labareda avermelhada.

Todos estavam, àquela hora, nos lares amorosos. Ele lembrava-se do riso das crianças, desse amoroso e cândido florir de venturas; avivava-se-lhe o passado, claro e benéfico, cuja árvore do Natal era cheia de estrelas, cantada de esperanças, e agora, há quantos anos, um negro e frio cipreste! Para ali estava, sem uma fala amiga, sem um rosto amado, ouvindo a ventania nos soutos (bosques). E pensava que era como esses troncos velhos e partidos, por cima dos quais o enxurro (enxurrada) espumava, e onde nunca mais nasceria flor, ou cantaria ave...

Fez um exame de consciência: fora bom, fora simples. A mulher morrera-lhe ainda na flor da vida; a filha fugira-lhe para a mãe, quando estava noiva. Antes assim, pensava. A filha era uma santa, e o mundo era ruim... Mais tarde, já trôpego, dois filhos roubaram-no, e nunca mais apareceram. Como ele se lembrava! Fora numa noite como aquela, negra e ventosa. Os dois, quando ele dormia, arrombaram-lhe a arca, e levaram-lhe a meia dúzia de peças que tinha guardadas no escaninho, para algum ano sáfaro (improdutivo, agreste), de mais negra fome. Afinal tudo era para os filhos, dizia consigo; os filhos lho levaram... Mas nem roupa lhe deixaram, no Inverno impiedoso, para o cobrir. Tinham sido perversos, os filhos que ele tanto amara! Depois começou de entrevar; os braços não podiam; e onde o trabalho míngua, vai crescendo a miséria. Ficou com uma horta, donde comia o caldo, onde colhia uma cesta de fruta. Pouco lhe bastava, afinal. O compadre, a quem ele tanto ajudara, por quem tantos sacrifícios fizera, fora para o Brasil. Por lá acabara, certamente...

Estava escorraçado como um cão, pobre como Job. Apesar disso, na consciência não se apagara a claridade que sempre lha iluminara. Ela era semelhante a um suave rio bucólico, cuja transparência deixa ver na areia loira a sombra de um cardume prateado. Ele sentia-se bem naquela miséria, naquele abandono — com essa leveza e essa graça dos que olhando para a vida inteira não têm nunca a desviar os olhos de uma torpeza ou de uma mentira.

Curvado sobre as brasas crepitantes, o velho lançou os olhos para o banco chamuscado, que lhe ficava em frente. E de repente ficou estático. O queixo  tremia-lhe fortemente. Santo Deus! Que via ele?! Era inacreditável! A filha e a mulher, a fiarem nas suas rocas, com um sorriso tão suave, uma serenidade tão bela! Jesus, Jesus, eram elas! Que alegria a sua! O velho estremeceu, o coração bateu-lhe como quando era jovem, balbuciou:

— Ó Maria, ó Luísa, vocês vieram?!

Elas sorriram-se mais docemente, sempre a fiar nas suas rocas. E o velho, com os olhos pregados nelas, sentia as pálpebras umedecidas de uma felicidade sobre humana.

— Ó Maria, ó Luísa!...

Assim correram alguns instantes celestes. Ele olhava-as embevecido. Elas resplandeciam, como envoltas num vago luar. Nunca as vira tão lindas, com mais lindo sorriso. E como não falavam, o velho calou-se também num êxtase.

Elas continuavam a sorrir, continuavam a fiar. O vento, fora, soprava rijo nos sobros, assobiava. A noite ia passando a uivar, feia e longa; mas as horas voavam para aquele velho embelezado nas visões. As duas já tinham espiado as rocas. A porta ouviram-se três pancadas.

Truz, truz, truz!

— Quem me procura?! — tartamudeou o velho, como despertando de um sonho imenso.

Truz, truz, truz!

Arrastou-se trôpego, abriu a porta. As duas tinham desaparecido. Na treva espessa e lúgubre, distinguiu a figura doutro velho de grandes barbas, com uma sacola ao ombro.

— Sou eu, compadre, sou eu!

— Será possível! Que felicidade!

E abraçaram-se, num antigo e comovente abraço. O viandante pousou a sacola, sacudiu a neve do capote, e foi-se esquentar ao lume.

— Hás de vir gelado, Manuel!

Vinha, na verdade. Tinha andado muito, a noite estava má, nevava. Mas há quantos anos ele tinha querido vir passar ali o Natal! E contou, ao estalar das raízes secas no lume, naquela paz religiosa e bíblica, a sua crua sorte. 

Os velhos sentaram-se um em frente do outro. Enquanto o caminheiro espalmava as mãos sobre o braseiro, ia narrando a sua vida dura, por terras longínquas e ásperas, à busca de fortuna. Trabalhara muito, sofrera muito. E sempre, através de tormentos, a saudade do seu velho amigo lhe aparecia... A vida tinha-lhe ensinado muitas coisas; mas sobretudo que a felicidade está dentro de nós, vive conosco, e que todo aquele que semeia o bem, há de colher o bem...

O outro escutava-o silencioso, com a vista úmida.

— Acredita que toda a minha pena, compadre, era não poder abraçar-te!

— E eu julgava que tu, por tão longe, nunca mais te lembrarias...

— Pode lá esquecer quem é santo, compadre!

E contou que na volta, mar alto, começou, em pleno dia, a escurecer o céu. A marujada adivinhara a tormenta. Amainaram as velas, fecharam escotilhas, preveniram tudo. Minutos depois o vento rugia, o mar bramia. O navio dançava nos abismos revoltos, fulgentes de relâmpagos. Andaram perdidos, com o leme despedaçado, na água brava. Tiveram fome e sede — e a tempestade a jogar com eles, como com um grão de areia. Nos lábios das crianças, das mulheres, de todos, abrira a flor divina de uma oração. E a dele pedia a Deus que o deixasse vir à sua terra, para ver ainda o seu velho companheiro sem arrimo.

— E Deus ouviu-me. Aqui estou.

O velho atiçou o braseiro, deitou mais lenha ao fogo. O viajante ergueu-se, abriu a sacola, e foi tirando, para cima da masseira velha e carunchosa, os víveres que trazia, as ameixas, as passas, uma garrafa de vinho loiro.

— Não me esqueci da ceia, compadre.

— Assim vejo, Manuel. Deus te pague!

E cearam, como tantos anos antes, quando na aldeia havia alegria e fartura. Foram conversando, pela noite dentro, com a alma abrindo numa inflorescência misteriosa. Depois o viandante perguntou por todos, por tudo. E vieram as tristezas, as recordações pungentes: os filhos maus, a filha amada, a mulher morta!...

De novo o velho olhou para o banco da lareira, e manteve-se estático, com os olhos iluminados.

— Que tens, compadre?

— Olha, estão ali!

— Ah!... — disse o outro, sem surpresa, olhando em torno.

— Também vieram, Manuel, também vieram!...

De feito, o velho lá via de novo as duas, sorrindo-lhe angelicamente, cheias de graça. Uma trança de lírios luminosos tocava-as, o mesmo luar de há pouco as envolvia, como se emergissem, pálidas, de um grande sonho místico.

— A Maria, a Luísa, tão lindas!... — balbuciou o velho. 

O viandante respondeu simplesmente:

— Os que se amam nunca nos abandonam. Estão dentro de nós, vivem conosco.

O velho nem comia, enlevado nas aparições suaves. Via os cabelos loiros da filha, o seu ar virgem e esbelto; a mulher, como no dia em que partira, com os fundos olhos tristes, a boca airosa, onde jamais houvera o veneno da mentira.

— Vê tu que de mais longe vieram elas fazer-te companhia; não fui eu só, compadre.

A cara do viandante estava aureolada agora de uma irradiação magnética. Seguiu-se um diálogo de velhos que padeceram, que nobremente souberam amar, e que em certa hora suprema dizem, num murmúrio de almas, as suas confissões. Parábolas que lembram o mar, lembram estrelas... Belas e tristes como sepulcros, onde puseram flores, à lua cheia. É a lenda dos homens — sombras vagas, que uma luz vaga para sempre desfaz...

— Agora, compadre, vamos descansar. Venho quebrado de fadiga. Dormiremos juntos.

— Pois sim, eu não tenho outra enxerga (colchão).

As visões tinham fugido. E os dois adormeceram, noite alta, quando um galo cantava, como arauto da luz.
* * *

Mas de madrugada, quando pelas frestas entrava um fulgor dourado, o velho perguntou:

— Onde estás, compadre?

Ninguém respondeu. Uma grande paz enchia a casa. O velho procurou com os olhos, sentou-se na cama. Ninguém! Apenas na enxerga e no travesseiro de estopa ficara resplandecendo docemente a figura do compadre, como se fosse um brilho de nebulosas...

O velho ergueu-se, rezou de mãos postas. O dia de festa alvoreceu sem nuvens. Um sol pálido e terno enchia toda a terra de ouro. Da horta emperolada de orvalho reluzente, o velho veio ainda contemplar longamente a concha azul do céu misterioso e plácido...

Fonte:
Vários Autores. Contos de Natal Portugueses