sábado, 27 de agosto de 2011

A. A. de Assis (Trovas Ecológicas) - 4


Antonio Brás Constante (Interjeições E Semelhantes Assemelhados)


As palavras nem sempre são confiáveis. Muitas vezes fala-se algo de forma mentirosa, utilizando as palavras para enganar seu interlocutor, ou interlocutores, ou ainda algum conhecido deles que esteja passando férias juntinho de você, e por isso esteja escutando o que você anda dizendo a eles. Com as interjeições isto dificilmente acontece. Elas são por natureza mais verdadeiras, visto que as interjeições exprimem nossos estados emocionais em sua forma mais espontânea.

Quando alguém lhe diz um “Oh! Oh!” (não confunda com o “Ho! Ho!” do Papai Noel), é porque algo não deu certo. Se ele chegar a pronunciar um “Ih!” Ou um “Xi!”, corra e não olhe para trás. Deu tudo errado, e dependendo da intensidade do som do “i” a coisa ainda vai ficar ainda pior. Nestes casos o “Ih” acaba funcionando como uma sirene, sinalizando, por exemplo, que aquilo que você falou do seu chefe foi ouvido por ele e que ele está vindo tomar satisfações.

Os sons que as pessoas emitem têm origens nas mais diversas causas, como no caso dos sustos, que utilizam sons como o “Uh!” dos fantasmas (e das torcidas que vaiam quem lhes desagrada) para aterrorizar ou infernizar, enquanto outros soltam um “Oh!” demonstrando que estão assustados, mesclado a esses sons uma cara de surpresa e horror, dessas que a gente faz quando o time do coração toma um gol.

Quando os seres humanos utilizam determinadas expressões, elas podem indicar e até muitas vezes identificar de qual região é o dito cidadão. Se ele disser um “Bah” ou “mas Bah”, seguido de um “Tchê!”, com quase toda certeza ele será provavelmente um gaúcho (ou não). Caso pronuncie um “Uai!” é porque o cabra é, foi, ou tem vontade de ser das bandas de Minas Gerais – Se realmente for de lá, você perceberá que de zero a noventa e nove por cento das frases que ele pronunciar terão as palavras “trem” e/ou “sô” embutidas no que for por ele dito, maldito ou até bendito.

Quanto mais espontânea for a expressão proferida mais autêntica e confiável ela será. Afinal quantos “Uau!” Você já viu alguém dizer ao ver passando uma paisagem feia (entenda-se o significado da tal “paisagem” do jeito que você quiser) ou um carro velho, detonado e sem condições de buzinar uma bela canção.

A função destas formas de comunicação é justamente declarar que algo intenso e verdadeiro aconteceu. Só dizemos “Ufa!” Quando conseguimos nos sair bem em casos extremos, como quando temos um ataque estomacal agudo, no meio do trânsito, por exemplo. Algumas pessoas chegam a soar frio nesses momentos. Toda concentração é pouca para conseguir dissuadir nosso sistema digestivo a não cumprir aquilo para que foi projetado desde o nosso nascimento.

Contamos os segundos que nos separam do nosso mais novo, momentâneo e vital objeto de desejo: O banheiro. Pode passar a mulher mais linda do mundo do nosso lado, que mesmo assim olhamos para ela com cara de poucos amigos. Fato que pode fazê-la sofrer de um profundo abalo em sua auto-estima de mulher desejada, ou sair dali pensando inverdades sobre nossa masculinidade (o contrário também se aplica no caso de ser a mulher nessa situação e o reverso do oposto contrário também).

Por fim chega-se aquele “oásis” rodeado de vasos de porcelana e rolos de papel higiênico por todos os lados (ou pelo menos que tenha um deles ali em condições de uso, ou múltiplo uso se for também o caso), nos permitindo sentar confortavelmente naquele assento convidativo e soltar entre outros sons menos agradáveis um extasiante “Uuuuuffaaaaaaaaaa!”, relaxando todo nosso corpo para deixar o fluxo dos acontecimentos seguir seu curso natural, como deveria acontecer com todos aqueles que tomam Activia.

Realmente as interjeições e seus assemelhados conseguem demonstrar de forma simples, as vontades e sentimentos de nós, seres humanos. A propósito, já que estamos falando em sons, você sabe qual a diferença de uma pessoa que cai do vigésimo andar de um prédio e outra que cai do segundo andar? É que a pessoa que cai do vigésimo andar faz o seguinte barulho: AHHHHHHHHHHHHHHHHH!!! BUM (som textual de uma pessoa batendo no chão depois de cair vinte andares, se não acredita em mim faça você mesmo o teste, de preferência arremessando seu próprio corpinho pela janela). Já a pessoa que cai do segundo andar faz assim: Bum! Ahhhhh!!. (E a vida continua...).

Fonte:
Texto enviado pelo autor

Lima Barreto (A Doença do Antunes)


A fama do doutor Gedeão não cessava de crescer.

Não havia dia em que os jornais não dessem noticia de mais uma proeza por ele feita, dentro ou fora da medicina. Em tal dia, um jornal dizia: "O doutor Gedeão, esse maravilhoso CLÍNICO e excelente goal-keeper, acaba de receber um honroso convite do Libertad Football Club, de São José de Costa Rica, para tomar parte na sua partida anual com o Airoca Football Club, de Guatemala. Todo o mundo sabe a importância que tem esse desafio internacional e o convite ao nosso patrício representa uma alta homenagem à ciência brasileira e ao football nacional. O doutor Gedeão, porém, não pôde aceitar o convite, pois a sua atividade mental anda agora norteada para a descoberta da composição da Pomada Vienense, específico muito conhecido para a cura dos calos."

O doutor Gedeão vivia mais citado nos jornais que o próprio presidente da república e o seu nome era encontrado em todas as seções dos cotidianos. A seção elegante de O Conservador, logo ao dia seguinte da noticia acima, ocupou-se do doutor Gedeão da seguinte maneira: "O doutor Gedeão Cavalcanti apareceu ontem no Lírico inteiramente fashionable. O milagroso clínico saltou do seu coupé completamente nu. Não se descreve o interesse das senhoras e o maior ainda de muitos homens. Eu fiquei babado de gozo.

A fama do doutor corria assim desmedidamente. Deixou em instantes de ser médico do bairro ou da esquina, como dizia Mlle. Lespinasse, para ser o médico da cidade toda, o lente sábio, o literato ilegível à João de Barros, o herói do football, o obrigado papa-banquetes diários, o Cícero das enfermarias, o mágico dos salões, o poeta dos acrósticos, o dançador dos bailes de bom-tom, etc., etc.

O seu consultório vivia tão cheio que nem a avenida em dia de carnaval, e havia quem dissesse que muitos rapazes preferiam-no, para as proezas de que os cinematógrafos são o teatro habitual.

Era procurado sobretudo pelas senhoras ricas, remediadas e pobres, e todas elas tinham garbo, orgulho, satisfação, emoção na voz quando diziam:—Estou me tratando com o doutor Gedeão.

Moças pobres sacrificavam os orçamentas domésticos para irem ao doutor Gedeão e muitas houve que deixavam de comprar o sapato ou o chapéu da moda para pagar a consulta do famoso doutor. De uma, eu sei que lá foi com enormes sacrifícios para curar-se de um defluxo; e curou-se, embora o doutor Gedeão não lhe tivesse receitado um xarope qualquer, mas um específico de nome arrevesado, grego ou copta, Anakati Tokotuta.

Porque o maravilhoso clínico não gostava das fórmulas e medicamentos vulgares; ele era original na botica que empregava.

O seu consultório ficava em uma rua central, bem perto da avenida, ocupando todo um primeiro andar. As antesalas eram mobiliadas com gosto e tinham mesmo pela parede quadros e mapas de coisas da arte de curar.

Havia mesmo, no corredor, algumas gravuras de combate ao alcoolismo e era de admirar que estivessem no consultório de um médico, cuja glória o obrigava a ser conviva de banquetes diários, bem e fartamente regados.

Para se ter a felicidade de sofrer um exame de minutos do milagroso clínico, era preciso que se adquirisse a entrada, isto é, o cartão, com antecedência, às vezes de dias. O preço era alto, para evitar que os viciosos do doutor Gedeão não atrapalhassem os que verdadeiramente necessitavam das luzes do célebre clínico.

Custava a consulta cinqüenta mil-réis; mas, apesar de tão alto preço, o escritório da celebridade médica era objeto de uma verdadeira romaria e toda a cidade o tinha como uma espécie de Aparecida médica.

José Antunes Bulhões, sócio principal da firma Antunes Bulhões & Cia., estabelecido com armazém de secos e molhados, lá pelas bandas do Campo dos Cardosos, em Cascadura, andava sofrendo de umas dores no estômago que não o deixavam comer com toda liberdade o seu bom cozido, rico de couves e nabos, farto de toucinho e abóbora vermelho, nem mesmo saborear, a seu contento, o caldo que tantas saudades lhe dava da sua aldeia minhota.

Consultou mezinheiros, curandeiros, espíritas, médicos locais e não havia meio de lhe passar de todo aquela insuportável dorzinha que não o permitia comer o cozido, com satisfação e abundância, e tirava-lhe de qualquer modo o sabor do caldo que tanto amava e apreciava.

Era ir para a mesa, lá lhe aparecia a dor e o cozido com os seus pertences, muito cheiroso, rico de couves, farto de toucinho e abóbora, olhava-o, namorava-o e ele namorava o cozido sem animo de mastigá-lo, de devorá-lo, de engoli-lo com aquele ardor que a sua robustez e o seu desejo exigiam.

Antunes era solteiro e quase casto.

Na sua ambição de pequeno comerciante, de humilde aldeão tangido pela vida e pela sociedade para a riqueza e para a fortuna, tinha recalcado todas as satisfações da vida, o amor fecundo ou infecundo, o vestuário, os passeios, a sociabilidade, os divertimentos, para só pensar nos contos de réis que lhe dariam a forra mais tarde do seu quase ascetismo atual, no balcão de uma venda dos subúrbios.

À mesa, porém, ele sacrificava um pouco do seu ideal de opulência e gastava sem pena na carne, nas verduras, nos legumes, no peixe, nas batatas, no bacalhau que, depois de cozido, era o seu prato predileto.

Desta forma, aquela dorzita no estômago o fazia sofrer extraordinariamente. Ele se privava do amor; mas que importava se, daqui a anos, ele pagaria para seu gozo, em dinheiro, em jóia, em carruagem, em casamento até, corpos macios, veludosos, cuidados, perfumados, os mais caros que houvesse, aqui ou na Europa; ele se privava de teatros, de roupas finas, mas que importava se, dentro de alguns anos, ele poderia ir aos primeiros teatros daqui ou da Europa, com as mais caras mulheres que escolhesse; mas deixar de comer —isto não! Era preciso que o corpo estivesse sempre bem nutrido para aquela faina de quatorze ou quinze horas, a servir o balcão, a ralhar com os caixeiros, a suportar desaforos dos fregueses e a ter cuidado com os calotes.

Certo dia, ele leu nos jornais a notícia que o doutor Gedeão Cavalcanti tinha tido permissão do governo para dar alguns tiros com os grandes canhões do "Minas Gerais".

Leu a notícia toda e feriu-lhe o fato da informação dizer: "esse maravilhoso clínico e, certamente, um eximio artilheiro.. . "

Clínico maravilhoso! Com muito esforço de memória, pôde conseguir recordar-se de que aquele nome já por ele fora lido em qualquer parte. Maravilhoso clínico! Quem sabe se ele o não curaria daquela dorzita ali, no estômago? Meditava assim, quando lhe entra pela venda adentro o Senhor Albano, empregado na Central, funcionário público, homem sério e pontual no pagamento.

Antunes foi-lhe logo perguntando:

— Senhor Albano, o senhor conhece o doutor Gedeão Cavalcanti?

— Gedeão—emendou o outro.

— Isto mesmo. Conhece-o, Senhor Albano?

— Conheço.

— E bom médico?

— Milagroso. Monta a cavalo, joga xadrez, escreve muito bem, é um excelente orador, grande poeta, músico, pintor, goal-keeper dos primeiros...

— Então é um bom médico, não é, Senhor Albano?

— E. Foi quem salvou a Santinha, minha mulher. Custou-me caro... Duas consultas... Cinqüenta mil-réis cada uma... Some.

Antunes guardou a informação, mas não se resolveu imediatamente a ir consultar o famoso taumaturgo urbano. Cinqüenta mil-réis! E se não ficasse curado com uma única consulta? Mais cinqüenta...

Viu na mesa o cozido, olente, fumegante, farto de nabos e couves, rico de toucinho e abóbora vermelha, a namorá-lo e ele a namorar o prato sem poder amá-lo com o ardor e a paixão que o seu desejo pedia.Pensou dias e afinal decidiu-se a descer até à cidade, para ouvir a opinião do doutor Gedeão Cavalcanti sobre a sua dor no estômago, que lhe aparecia de onde em onde.

Vestiu-se o melhor que pôde, dispôs-se a suportar o suplício das botas, pôs o colete, o relógio, a corrente e o medalhão de ouro com a estrela de brilhantes, que parece ser o distintivo dos pequenos e grandes negociantes; e encaminhou-se para a estação da estrada de ferro.

Ei-lo no centro da cidade

Adquiriu a entrada, isto é, o cartão, nas mãos do continuo do consultório, despedindo-se dos seus cinqüenta milréis com a dor do pai que leva um filho ao cemitério. Ainda se o doutor fosse seu freguês... Mas qual! Aqueles não voltariam mais...

Sentou-se entre cavalheiros bem vestidos e damas perfumadas. Evitou encarar os cavalheiros e teve medo das damas. Sentia bem o seu opróbrio, não de ser taberneiro, mas de só possuir de economias duas miseráveis dezenas de contos... Se tivesse algumas centenas—então, sim! —ele poderia olhar aquela gente com toda a segurança da fortuna, do dinheiro, que havia de alcançar certamente, dentro de anos, o mais breve possível.

Um a um, iam eles entrando para o interior do consultório; e pouco se demoravam. Antunes começou a ficar desconfiado... Diabo! Assim tão depressa?

Teriam todos pago cinqüenta mil-réis?

Boa profissão, a de médico! Ah! Se o pai tivesse sabido disso... Mas qual!

Pobre pai! Ele mal podia com o peso da mulher e dos filhos, como havia ele de pagar-lhe mestres? Cada um euriquece como pode...

Foi, por fim, à presença do doutor. Antunes gostou do homem. Tinha um olhar doce, os cabelos já grisalhos, apesar de sua fisionomia moça, umas mãos alvas, polidas...

Perguntou-lhe o médico com muita macieza de voz:

— Que sente o senhor?

Antunes foi-lhe dizendo logo o terrível mal no estômago de que vinha sofrendo, há tanto tempo, mal que desaparecia e aparecia mas que não o deixava nunca. O doutor Gedeão Cavalcanti fê-lo tirar o paletó, o colete, auscultou-o bem, examinou-o demoradamente, tanto de pé como deitado, sentou-se depois, enquanto o negociante recompunha a sua modesta toilette.

Antunes sentou-se também, e esperou que o médico saisse de sua meditação.

Foi rápida. Dentro de um segundo, o famoso clínico dizia com toda segurança:

— O senhor não tem nada.

Antunes ergueu-se de um salto da cadeira e exclamou indignado:

— Então, senhor doutor, eu pago cinqüenta mil-réis e não tenho nada! Esta é boa! Noutra não caio eu!

E saiu furioso do consultório que merecia, da cidade, uma romaria semelhante à da milagrosa Lourdes.

Fonte:
Fonte:
BARRETO, Lima. A Nova Califórnia - Contos. São Paulo: Brasiliense, 1979.
Texto proveniente de: A Biblioteca Virtual do Estudante Brasileiro A Escola do Futuro da Universidade de São Paulo

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 316)


Uma Trova Nacional

Perguntei ao macumbeiro
qual seria o meu Futuro.
Ele respondeu, ligeiro":
- Um buraco fundo e escuro!...
–HERMOCLYDES S. FRANCO/RJ–

Uma Trova Potiguar

Sai de mim, mulher ranzinza,
tua insistência me atrasa.
Se o nosso amor virou cinza
foi só porque mandei brasa.
–J. REVOREDO NETO/RN–

Uma Trova Premiada

2007 - Bandeirantes/PR
Tema: PIRRAÇA - M/E.

A esposa numa pirraça
diz ao marido “rueiro”:
- Se “de graça” não tem graça,
me passa a grana primeiro.
–WANDIRA FAGUNDES QUEIROZ/PR–

Uma Trova de Ademar

O que a mulher não entende
é o seu marido na cama;
seu fogo nunca se acende,
enquanto ela vive em chama!!!
–ADEMAR MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram

Não tenha medo de nada,
fique à vontade, meu bem;
quem tem idade avançada
já não avança em ninguém.
–ANTÔNIO CARLOS T. PINTO/DF–

Simplesmente Poesia

Consagração
–PEDRO MELLO/SP–

Cansado do "jejum" que a sua idade
lhe impôs à atividade sexual,
o vovô se animou com a novidade
de que o Viagra não faria mal...

Cheio de amor pra dar e de Ansiedade,
Alfredo foi pular o Carnaval...
E na Sapucaí, uma beldade
fê-lo sentir-se forte e jovial...

Mas na hora "H"... seu coração se abate...
Alfredo é posto fora de combate,
mas sucumbe feliz nosso ancião:

É velado com grande galhardia
e, escondendo o "tamanho" da alegria,
flores a mais enfeitam seu caixão...

Estrofe do Dia

É vadia e pirangueira
e não procura trabalho,
vive só de quebra galho
toda moça caroneira,
topa qualquer gafieira
depende só do momento;
até carona em jumento
eu já vi uma pegar,
e de tanto vadiar
tem um calo no acento.
–AUGUSTO MACÊDO/RN–

Soneto do Dia

Nordestino
–GLAUCO MATTOSO/SP–

Caba da peste, a quilo roxo, óxente,
Vixe, arretado, vôte, macaxêra,
baião de dois, olê mulé rendêra,
nêga fulô, forró, seca, sol quente.

Nordeste é cor, sabor, cheiro de gente,
um universo inteiro numa feira,
um cego cantador, um Zé Limeira,
António Conselheiro, axé, repente.

Cabeça-chata ou pau-de-arara é o mote
que o Sul aplica quando os deprecia.
Mas eu prefiro a sola chata, o xote!

O cangaceiro quando xaxa! Um dia
vou ser capacho deles num magote,
só pra sentir o que é supremacia!

Fonte:
Textos e imagem enviados pelo autor

Ialmar Pio Schneider (Brique Da Redenção)


Cada domingo é uma festa para os que têm o privilégio de frequentá-lo. Pessoas de todas as idades e ideologias passeiam ao largo da avenida, conversando, paquerando, olhando as estantes e perscrutando as mil e uma bugigangas expostas. Tudo tem o seu valor, tudo tem o seu preço. Muitos são os objetos antigos em oferta: móveis, louças, panelas, caçarolas, livros, discos, etc.

Por outro lado, existem também as obras de arte (quadros de pinturas diversas, a óleo), aquarelas, e o artesanato (cuias, estojos, barricas para erva-mate), enfim, apetrechos para o chimarrão.

São tantas coisas, até imprevisíveis ou estapafúrdias, que aparecem para permuta ou venda - moedas antigas, selos velhos, fogareiros, ferros de passar a carvão, vitrolas... Há os colecionadores ávidos de encontrar antiqualhas originais que tanto apreciam.

Surgem também os criadores de cães e gatos, das mais variadas raças, que vendem os filhotes a quem os queira adquirir, e não são poucos os que os compram, pois um animalzinho de estimação sempre faz parte do cotidiano daqueles que os podem manter.

A banca do mel é muito freqüentada, já que a oferta de um produto puro desperta o interesse de quantos apreciam esse manjar saboroso e tão completo. Os que ali chegam recebem uma prova para sentirem sua essência (eucalipto, laranjeira, florada silvestre, etc.).

De repente, um aglomerado de gente: é uma apresentação musical. Alguém cantando na manhã ensolarada; e as frases da canção enchendo o ar - “Felicidade foi-se embora e a saudade ainda mora...”, a evocar Lupicínio Rodrigues, o poeta inesquecível.

Lá mais adiante estão os bugres vendendo seus balaios multicoloridos, eles que são os mais legítimos filhos desta terra brasileira, uma vez que aqui se encontravam quando da chegada dos descobridores lusos e espanhóis. Hoje tão escassos resistem à civilização imposta, sofrivelmente.

Também não é difícil imaginar quantos encontros amorosos ou de amigos que não se viam há tempo, aconteceram aqui, nesses 20 anos! E daqueles quantos não frutificaram?

Os pais que trazem seus filhos a fim de espairecerem, os casais de namorados que desfilam de braços dados, os idosos enfrentando a velhice com resignação, todos parecem seguir seus destinos de maneira salutar na esperança de novos dias.

Certamente que a vida seria mais triste se não houvesse um local tão aprazível para preencher as horas de lazer nas manhãs dos domingos porto-alegrenses.

Eis um simples esboço do Brique da Redenção, decantado em prosa e verso, que já se transformou em uma tradicional referência para nossa altaneira cidade que desperta ao sorriso das águas do Guaíba !
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Poeta e cronista
Publicado em 27 de outubro de 1998 - no Diário de Canoas.

Fontes:
Texto enviado pelo autor
Imagem =http://www.aredencao.com.br/brique.htm

Curso de Contador de Histórias, em Mogi Guaçu


CURSO DE CONTADOR DE HISTÓRIAS

Início: 10 de setembro de 2011

Local: Biblioteca João XXIII – Centro Cultural
Endereço: Avenida dos Trabalhadores, 2.651 – Mogi Guaçu /SP - CEP: 13.840.195
Tel.(019)3861-4225
e-mail sc-biblioteca@mogiguacu.sp.gov.br.

A Biblioteca está com inscrição para o Curso de Contador de Histórias, gratuito; será nos dias 10/09 17/09 e 24/09, das 09:00 às 12:00 horas:

Monitora: Patricia Cristiana Vitor De Oliveira

Carga Horária: 09 H

Cronograma

Objetivos

- Explorar O Recurso De Contar Histórias Como Instrumento De Compreensão, Interpretação
E Expressão Da Realidade Vivida E Imaginada;

- Selecionar E Apropriar-Se De Narrativas Orais, Reconhecendo-As Como Patrimônio Cultural De Um Povo;

- Contar Histórias, Utilizando Recursos E Alternativas Metodológicas Que Propiciem
Oportunidades De Entretenimento E Aprendizagem.

Conteúdos

1. Dramatização, Como Recurso Para O Contador De Histórias;
2. A Contação De Histórias A Partir Do Recurso Do Fantoche;
3. Contar Histórias Com Objetos;
4. Diferentes Recursos Usados Pelos Contadores De Histórias.

Metodologia

Aulas Práticas, Com Discussões Coletivas.
Exercícios Em Grupo

Inscrição na Biblioteca, ou pode ser através do e-mail.

Fonte:
Olivaldo Junior

Origem de Algumas Expressões Populares


Erro crasso
Significado: Erro grosseiro.

Origem: Na Roma antiga havia o Triunvirato: o poder dos generais era dividido por três pessoas. No primeiro destes Triunviratos , tínhamos: Caio Júlio, Pompeu e Crasso . Este último foi incumbido de atacar um pequeno povo chamado Partos. Confiante na vitória, resolveu abandonar todas as formações e técnicas romanas e simplesmente atacar. Ainda por cima, escolheu um caminho estreito e de pouca visibilidade. Os partos, mesmo em menor número, conseguiram vencer os romanos, sendo o general que liderava as tropas um dos primeiros a cair.
Desde então, sempre que alguém tem tudo para acertar, mas comete um erro estúpido, dizemos tratar-se de um "erro crasso ".

Ter para os alfinetes
Significado: Ter dinheiro para viver.

Origem: Em outros tempos, os alfinetes eram objecto de adorno das mulheres e daí que, então, a frase significasse o dinheiro poupado para a sua compra porque os alfinetes eram um produto caro. Os anos passaram e eles tornaram-se utensílios, já não apenas de enfeite, mas utilitários e acessíveis. Todavia, a expressão chegou a ser acolhida em textos legais. Por exemplo, o Código Civil Português, aprovado por Carta de Lei de Julho de 1867, por D. Luís, dito da autoria do Visconde de Seabra, vigente em grande parte até ao Código Civil actual, incluía um artigo, o 1104, que dizia: «A mulher não pode privar o marido, por convenção antenupcial, da administração dos bens do casal; mas pode reservar para si o direito de receber, a título de alfinetes , uma parte do rendimento dos seus bens, e dispor dela livremente, contanto que não exceda a terça dos ditos rendimentos líquidos.»

Do tempo da Maria Cachucha

Significado: Muito antigo.

Origem: A cachucha era uma dança espanhola a três tempos, em que o dançarino, ao som das castanholas, começava a dança num movimento moderado, que ia acelerando, até terminar num vivo volteio. Esta dança teve uma certa voga em França, quando uma célebre dançarina, Fanny Elssler, a dançou na Ópera de Paris. Em Portugal, a popular cantiga Maria Cachucha (ao som da qual, no séc. XIX, era usual as pessoas do povo dançarem) era uma adaptação da cachucha espanhola, com uma letra bastante gracejadora, zombeteira.

À grande e à francesa
Significado: Viver com luxo e ostentação.

Origem: Relativa aos modos luxuosos do general Jean Andoche Junot, auxiliar de Napoleão que chegou a Portugal na primeira invasão francesa, e dos seus acompanhantes, que se passeavam vestidos de gala pela capital.

Coisas do arco-da-velha
Significado: Coisas inacreditáveis, absurdas, espantosas, inverosímeis.

Origem: A expressão tem origem no Antigo Testamento; arco-da-velha é o arco-íris, ou arco-celeste, e foi o sinal do pacto que Deus fez com Noé: "Estando o arco nas nuvens, Eu ao vê-lo recordar-Me-ei da aliança eterna concluída entre Deus e todos os seres vivos de toda a espécie que há na terra." (Génesis 9:16)

Arco-da-velha é uma simplificação de Arco da Lei Velha, uma referência à Lei Divina.

Há também diversas histórias populares que defendem outra origem da expressão, como a da existência de uma velha no arco-íris, sendo a curvatura do arco a curvatura das costas provocada pela velhice, ou devido a uma das propriedades mágicas do arco-íris - beber a água num lugar e enviá-la para outro, pelo que velha poderá ter vindo do italiano bere (beber).

Dose para cavalo
Significado: Quantidade excessiva; demasiado.

Origem: Dose para cavalo, dose para elefante ou dose para leão são algumas das variantes que circulam com o mesmo significado e atendem às preferências individuais dos falantes.
Supõe-se que o cavalo, por ser forte; o elefante, por ser grande, e o leão, por ser valente, necessitam de doses exageradas de remédio para que este possa produzir o efeito desejado.
Com a ampliação do sentido, dose para cavalo e suas variantes é o exagero na ampliação de qualquer coisa desagradável, ou mesmo aquelas que só se tornam desagradáveis com o exagero.

Dar um lamiré
Significado: Sinal para começar alguma coisa.

Origem: Trata-se da forma aglutinada da expressão «lá, mi, ré», que designa o diapasão, instrumento usado na afinação de instrumentos ou vozes; a partir deste significado, a expressão foi-se fixando como palavra autonoma com significação própria, designando qualquer sinal que dê começo a uma actividade.
Historicamente, a expressão «dar um lamiré» está, portanto, ligada à música (cf. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa).

Nota: Escreve-se lamiré , com o r pronunciado como em caro .

Memória de elefante
Significado: Ter boa memória; recordar-se de tudo.

Origem: O elefante fixa tudo aquilo que aprende, por isso é uma das principais atrações do circo .

Lágrimas de crocodilo
Significado: Choro fingido.

Origem: O crocodilo, quando ingere um alimento, faz forte pressão contra o céu da boca, comprimindo as glândulas lacrimais. Assim, ele chora enquanto devora a vítima.

Não poder com uma gata pelo rabo
Significado: Ser ou estar muito fraco; estar sem recursos.

Origem: O feminino, neste caso, tem o objectivo de humilhar o impotente ou fraco a que se dirige a referência. Supõe-se que a gata é mais fraca, menos veloz e menos feroz em sua própria defesa do que o gato. Na realidade, não é fácil segurar uma gata pelo rabo, e não deveria ser tão humilhante a expressão como realmente é.

Mal e porcamente
Significado: Muito mal; de modo muito imperfeito.

Origem: «Inicialmente, a expressão era "mal e parcamente". Quem fazia alguma coisa assim, agia mal e eficientemente, com parcos (poucos) recursos.
Como parcamente não era palavra de amplo conhecimento, o uso popular tratou de substituí-la por outra, parecida, bastante conhecida e adequada ao que se pretendia dizer. E ficou " mal e porcamente", sob protesto suíno.»1

Fazer tijolo
Significado:Morrer.

Origem: Segundo se diz, existiu um velho cemitério mouro para as bandas das Olarias, Bombarda e Forno do Tijolo. O almacávar, isto é, o cemitério mourisco, alastrava-se numa grande extensão por toda a encosta, lavado de ar e coberto de arvoredo.

Após o terramoto de 1755, começando a reedificação da cidade, o barro era pouco para as construções e daí aproveitar-se todo o que aparecesse.

O cemitério árabe foi tão amplamente explorado que, de mistura com a excelente terra argilosa, iam também as ossadas para fazer tijolo. Assim, é frequente ouvir-se a expressão popular em frases como esta: 'Daqui a dez anos já eu estou a fazer tijolo '.

Fila indiana
Significado: enfiada de pessoas ou coisas dispostas uma após outra.

Origem: Forma de caminhar dos índios da América que, deste modo, tapavam as pegadas dos que iam na frente.

Andar à toa
Significado: Andar sem destino, despreocupado, passando o tempo.

Origem: Toa é a corda com que uma embarcação reboca a outra. Um navio que está "à toa" é o que não tem leme nem rumo, indo para onde o navio que o reboca determinar.

Embandeirar em arco
Significado: Manifestação efusiva de alegria.

Origem: Na Marinha, em dias de gala ou simplesmente festivos, os navios embandeiram em arco , isto é, içam pelas adriças ou cabos (vergueiros) de embandeiramento galhardetes, bandeiras e cometas quase até ao topo dos mastros, indo um dos seus extremos para a proa e outro para a popa. Assim são assinalados esses dias de regozijo ou se saúdam outros barcos que se manifestam da mesma forma.

Cair da tripeça
Significado: Qualquer coisa que, dada a sua velhice, se desconjunta facilmente.

Origem: A tripeça é um banco de madeira de três pés, muito usado na província, sobretudo junto às lareiras. Uma pessoa de avançada idade aí sentada, com o calor do fogo, facilmente adormece e tomba.

Fazer tábua rasa
Significado: Esquecer completamente um assunto para recomeçar em novas bases.

Origem: A tabula rasa , no latim, correspondia a uma tabuinha de cera onde nada estava escrito. A expressão foi tirada, pelos empiristas, de Aristóteles, para assim chamarem ao estado do espírito que, antes de qualquer experiência, estaria, em sua opinião, completamente vazio. Também John Locke (1632 1704), pensador inglês, em oposição a Leibniz e Descartes, partidários do inatísmo, afirmava que o homem não tem nem ideias nem princípios inatos, mas sim que os extrai da vida, da experiência. «Ao começo», dizia Locke, «a nossa alma é como uma tábua rasa, limpa de qualquer letra e sem ideia nenhuma. Tabula rasa in qua nihil scriptum . Como adquire, então, as ideias? Muito simplesmente pela experiência.»

Ave de mau agouro

Significado: Diz-se de pessoa portadora de más notícias ou que, com a sua presença, anuncia desgraças.

Origem: O conhecimento do futuro é uma das preocupações inerentes ao ser humano. Quase tudo servia para, de maneiras diversas, se tentar obter esse conhecimento. As aves eram um dos recursos que se utilizava. Para se saberem os bons ou maus auspícios (avis spicium) consultavam-se as aves. No tempo dos áugures romanos, a predição dos bons ou maus acontecimentos era feita através da leitura do seu voo, canto ou entranhas. Os pássaros que mais atentamente eram seguidos no seu voo, ouvidos nos seus cantos e aos quais se analisavam as vísceras eram a águia, o abutre, o milhafre, a coruja, o corvo e a gralha. Ainda hoje perdura, popularmente, a conotação funesta com qualquer destas aves.

Verdade de La Palisse

Significado: Uma verdade de La Palice (ou lapalissada / lapaliçada ) é evidência tão grande, que se torna ridícula.

Origem: O guerreiro francês Jacques de Chabannes, senhor de La Palice (1470-1525), nada fez para denominar hoje um truísmo. Fama tão negativa e multissecular deve-se a um erro de interpretação.
Na sua época, este chefe militar celebrizou-se pela vitória em várias campanhas. Até que, na batalha de Pavia, foi morto em pleno combate. E os soldados que ele comandava, impressionados pela sua valentia, compuseram em sua honra uma canção com versos ingénuos:
"O Senhor de La Palice / Morreu em frente a Pavia; / Momentos antes da sua morte, / Podem crer, inda vivia."
O autor queria dizer que Jacques de Chabannes pelejara até ao fim, isto é, "momentos antes da sua morte", ainda lutava. Mas saiu-lhe um truísmo, uma evidência.
Segundo a enciclopédia Lello, alguns historiadores consideram esta versão apócrifa. Só no século XVIII se atribuiu a La Palice um estribilho que lhe não dizia respeito. Portanto, fosse qual fosse o intuito dos versos, Jacques de Chabannes não teve culpa.

Nota: Em Portugal, empregam-se as duas grafias: La Palice ou La Palisse.

Ter ouvidos de tísico
Significado: Ouvir muito bem.

Origem: Antes da II Guerra Mundial (l939 a l945), muitos jovens sofriam de uma doença denominada tísica, que corresponde à tuberculose. A forma mais mortífera era a tuberculose pulmonar.

Com o aparecimento dos antibióticos durante a II Guerra Mundial, foi possível combater este doença com muito maior êxito.

As pessoas que sofrem de tuberculose pulmonar tornam-se muito sensíveis, incluindo uma notável capacidade auditiva. A expressão « ter ouvidos de tísico » significa, portanto, «ouvir tão bem como aqueles que sofrem de tuberculose pulmonar».

Comer muito queijo
Significado: Ser esquecido; ter má memória.

Origem: A origem desta expressão portuguesa pode explicar-se pela relação de causalidade que, em séculos anteriores, era estabelecida entre a ingestão de lacticínios e a diminuição de certas faculdades intelectuais, especificamente a memória.
A comprovar a existência desta crença existe o excerto da obra do padre Manuel Bernardes "Nova Floresta", relativo aos procedimentos a observar para manter e exercitar a memória: «Há também memória artificial da qual uma parte consiste na abstinência de comeres nocivos a esta faculdade, como são lacticínios, carnes salgadas, frutas verdes, e vinho sem muita moderação: e também o demasiado uso do tabaco».
Sabe-se hoje, através dos conhecimentos provenientes dos estudos sobre memória e nutrição, que o leite e o queijo são fornecedores privilegiados de cálcio e de fósforo, elementos importantes para o trabalho cerebral. Apesar do contributo da ciência para desmistificar uma antiga crença popular, a ideia do queijo como alimento nocivo à memória ficou cristalizada na expressão fixa « comer (muito) queijo».

Acordo leonino
Significado: Um «acordo leonino» é aquele em que um dos contratantes aceita condições desvantajosas em relação a outro contratante que fica em grande vantagem.

Origem: «Acordo leonino» é, pois, uma expressão retórica sugerida nomeadamente pelas fábulas em que o leão se revela como todo-poderoso.

Que massada*!
Significado: Exclamação usada para referir uma tragédia ou contra-tempo.

Origem: É uma alusão à fortaleza de Massada na região do Mar Morto, Israel, reduto de Zelotes, onde permaneceram anos resistindo às forças romanas após a destruição do Templo em 70 d.C., culminando com um suicídio colectivo para não se renderem, de acordo com relato do historiador Flávio Josefo.

Passar a mão pela cabeça
Significado: perdoar ou acobertar erro cometido por algum protegido.

Origem: Costume judaico de abençoar cristãos-novos, passando a mão pela cabeça e descendo pela face, enquanto se pronunciava a bênção.

Gatos-pingados
Significado: Tem sentido depreciativo usando-se para referir uma suposta inferioridade (numérica ou institucional), insignificância ou irrelevância.

Origem: Esta expressão remonta a uma tortura procedente do Japão que consistia em pingar óleo a ferver em cima de pessoas ou animais, especialmente gatos. Existem várias narrativas ambientais na Ásia que mostram pessoas com os pés mergulhados num caldeirão de óleo quente. Como o suplício tinha uma assistência reduzida, tal era a crueldade, a expressão " gatospingados " passou a denominar pequena assistência sem entusiasmos ou curiosidade para qualquer evento.

Meter uma lança em África
Significado:Conseguir realizar um empreendimento que se afigurava difícil; levar a cabo uma empresa difícil.

Origem: Expressão vulgarizada pelos exploradores europeus, principalmente portugueses, devido às enormes dificuldades encontradas ao penetrar o continente africano. A resistência dos nativos causava aos estranhos e indesejáveis visitantes baixas humanas. Muitas vezes retrocediam face às dificuldades e ao perigo de serem dizimados pelo inimigo que eles mal conheciam e, pior de tudo, conheciam mal o seu terreno. Por isso, todos aqueles que se dispusessem a fazer parte das chamadas "expedições em África", eram considerados destemidos e valorosos militares, dispostos a mostrar a sua coragem, a guerrear enfrentando o incerto, o inimigo desconhecido. Portanto, estavam dispostos a " meter uma lança em África".

Queimar as pestanas
Significado:Estudar muito.

Origem:Usa-se ainda esta expressão, apesar de o facto real que a originou já não ser de uso. Foi, inicialmente, uma frase ligada aos estudantes, querendo significar aqueles que estudavam muito. Antes do aparecimento da electricidade, recorria-se a uma lamparina ou uma vela para iluminação. A luz era fraca e, por isso, era necessário colocá-las muito perto do texto quando se pretendia ler o que podia dar azo a " queimaras pestanas".

Tertúlia
Significado: Tertúlia é a expressão utilizada para denominar um grupo de pessoas que se reune para debater um determinado assunto ou tema.

Origem: O nome provém dos usos do erudito Quinto Séptimo Florente Tertuliano, cartaginês, destacado defensor do cristianismo, cujos discursos públicos eram ricos em jogos de palavras. Às pessoas que se reuniam para debater as suas convicções e posições, apelidavam-se de "Tertulianos" e a essas reuniões depressa passaram a denominar-se "Tertúlias".

Advogado do Diabo
Advogado do Diabo é efetivamente uma profissão existente. Tomada como expressão que designa uma tarefa que ninguém por regra deseja, por ir contra a convicção geral, o "advocatus Diaboli" é a designação de um membro da Igreja Católica que é encarregue de levantar objecções em todas as argumentações documentadas num processo de canonização. Na facção oposta, o membro do clero recebe a designação "advocatus Dei".

Para Inglês ver
Significado: é uma expressão portuguesa usada para mostrar algo apenas pela aparência, algo que não se deve levar a sério pois é fabricado ou encenado para uma dada ocasião.

Origem: Dizem os entendidos que existem várias possibilidades para a origem do dito, uma no Brasil, outra em território na altura sob domínio português (S. Tomé e Príncipe), mas ambas relacionadas com a época final do tráfico de escravos. Quando a Inglaterra promulgou o fim do tráfico esclavagista fez acompanhar a promulgação da lei de algumas directrizes económicas tendentes a embargar o comércio com países que ainda adoptassem a prática. No caso português, a empresa Cadbury, a maior compradora da noz de cacau São Tomense, chegou mesmo a suspender as suas aquisições desta matéria-prima em virtude de nas plantações ser utilizada mão de obra escrava. As inspecções formais da Cadbury, pré-anunciadas, levavam os fazendeiros a encenar o emprego de população não escrava, possivelmente "para inglês ver" com o efeito tranquilizador do comprador assegurar ele mesmo que cumpria os requisitos exigidos. Algumas leis brasileiras emitidas pelo Governo da Regência em 1831, que nunca chegaram a ser levadas à prática, que proibiam "para inglês ver" o tráfico de escravos acabaram por ser letra morta para a realidade económica. Uma segunda lei, datada de 1852 e promulgada pelo Imperador D.Pedro II veio erradicar definitivamente o uso económico da escravatura.

Ficar a ver navios
Significado: Diz-se de alguém que ficou decepcionado por não ter alcançado os seus objetivos.

Origem: Há registradas duas origens para esta expressão. A mais antiga, após a batalha de Alcácer-Quibir e a alegada morte de D.Sebastião, é atribuída ao mito do sempre adiado regresso a Portugal do Rei desaparecido. Lugar privilegiado para a observação da barra do Tejo, dizia-se que muita gente subia ao Alto de Santa Catarina na esperança de avistar a nau que haveria de fazer o Rei de volta. Ir a Santa Catarina e "ficar a ver navios" era por isso mesmo uma decepção. A segunda teoria que visa estabelecer uma origem para a expressão está relacionada com a primeira invasão francesa. O General Junot que pretendia chegar a Lisboa a tempo de aprisionar a Família Real, conseguiu de facto chegar a Lisboa à frente de dois regimentos em muito má condição. A 30 de Novembro de 1807, Junot estava em Lisboa, mas a Família Real partira para o Brasil precisamente na véspera tendo alegadamente Junot "ficado a ver navios".

Sem eira nem beira Significado: pessoas sem bens, sem posses.

Origem: Eira é um terreno de terra batida ou cimento onde grãos ficam ao ar livre para secar. Beira é a beirada da eira. Quando uma eira não tem beira, o vento leva os grãos e o proprietário fica sem nada. Na região nordeste este ditado tem o mesmo significado mas outra explicação. Dizem que antigamente as casas das pessoas ricas tinham um telhado triplo: a eira, a beira e a tribeira como era chamada a parte mais alta do telhado. As pessoas mais pobres não tinham condições de fazer este telhado , então construíam somente a tribeira ficando assim "sem eira nem beira".

Isso são favas contadas
Significado: É uma expressão usual para definir o resultado de algo cujo resultado é esperado e previsível.

Origem: A expressão terá tido início no uso romano de utilizar esta leguminosa seca para efectuar operações aritméticas e proceder a votações, sendo distribuídas ao votante ou decisor duas favas de cor distinta, uma branca e uma negra, fava que o mesmo depositava numa bolsa onde se misturaria com os restantes votos de aprovação ou de negação consoante fosse na bolsa introduzida a variante negra. A contagem das favas brancas face às suas congéneres pretas decidia assim a votação da questão a pleito. Esta versão de votação com base nas cores branco e preto ainda hoje é utilizada em algumas decisões de aprovação, com o uso de bolas de cores distintas, permitindo assim a manutenção de total anonimato de votação.

Tirar o cavalinho da chuva
Significado: É uma expressão que nos nossos dias significa que alguém está a informar o interlocutor de que não valerá a pena insistir em determinado assunto, indicando-lhe que deve desistir do seu intento.

Origem: Não terá sido sempre esse o respectivo significado. Na era pré-automóvel, as deslocações maiores ou mais difíceis faziam-se maioritariamente a cavalo. Nas estalagens ou pontos de descanso, existiam como ainda hoje é visível nas construções mais antigas, locais específicos para se amarrarem os cavalos (argolas) enquanto o respectivo cavaleiro se ocupava no interior da construção durante uma breve paragem. Se a estada fosse mais prolongada era normal que o cavalo fosse abrigado dos elementos num estábulo destinado a repouso e alimentação do animal. "Podes tirar o cavalinho da chuva" implicava aconselhar o cavaleiro a resguardar o animal em virtude do tempo que ia eventualmente demorar.

Fontes:
'Dicionário de Expressões Correntes' ; Orlando Neves
A Casa da Mãe Joana, de Reinaldo Pimenta, vol. 1 (Editora Campus, Rio de Janeiro)

Perpétua Gonçalves (Livro: A Génese do Português de Moçambique)


Impr. Nacional-Casa da Moeda, 2010

Em A Génese do Português de Moçambique, Perpétua Gonçalves descreve o atual processo de nativização do português moçambicano, em estreito contato com as línguas bantas. O enquadramento geral é o da investigação sobre a relação da mudança linguística com a aquisição da linguagem, associada à discussão da emergência das variantes não nativas das línguas coloniais.

Constituída por oito capítulos, a obra foca três áreas de mudança que definem tendências de diferenciação da variedade moçambicana em relação às outras variedades do português: a realização do argumento beneficiário, na qual se neutraliza o contraste entre objeto direto e objeto indireto — «os pais escondem os filhos a verdade», «Tiram aquele dinheiro entregam dono», «Despedimos ao professor fomos nas nossas casas», «Começou a me bater enquanto não lhe provoquei», «Eu expliquei o diretor nacional», «Ordenou os seus soldados para que fossem lá», «Os pais já não prendem tanto aos filhos», «É triste ver-lhe andar pelas ruas»—; os argumentos locativos e direcionais — «Já saiu na escola, ir lutar», «Vai lá em casa tirar os cabritos», «Disseram levar a criança para no hospital», «Nós corremos, fomos jardim», «Cheguei aqui Maputo», «Está a sair no estúdio», «Eu não paro nenhum sítio», «Vinham carros lá na escola» —; e os conetores de subordinação — em orações completivas como «Viram de que afinal o coelho é mais esperto», «Perguntou que lhes conhecia o nome dela» e em orações adverbiais do tipo «Descansaram até chegou um leão», «Embora que sou mais novo mas sou diferente», «Mal que me viu fugiu».

Em síntese, trata-se de um livro destinado a um público universitário, cuja clareza de exposição permite, no entanto, que também o público interessado possa distinguir o perfil da língua portuguesa falada pelos moçambicanos da contemporaneidade.

Fonte:
http://www.ciberduvidas.com/montra.php

Afrânio Peixoto (A Língua Portuguesa no Brasil )


A maior surpresa de quem estuda a história do Brasil deve ser como o pequeno povo português, distraído aliás por interesses maiores nas Índias, conseguiu contra Franceses, Flamengos, Ingleses e Espanhóis, manter por três séculos a continuidade da posse e a unidade territorial de um domínio estendido por 39 graus de latitude e outros tantos de longitude, grande de oito milhões de quilômetros quadrados e exposto em oito mil quilômetros de costas às invasões marítimas.

A Espanha não o soube e não o pôde, com o império colonial quebrado e repartido na dúzia e meia de nações que dele resultaram. Nem o caso dos Estados Unidos, hoje tão extensos como nós, é no nosso comparável: cresceram por justaposição, de compra e de conquista, as treze colônias inglesas da Independência formavam menos de um terço de todo o território atual...

Nós fomos assim, desde 1500, achados, possuídos, principalmente conservados como somos, pelos Portugueses. Se o maior mérito de José Bonifácio e Pedro I, nos dias da Independência, foi de nos manter coesos; se o de Caxias foi de nos combater, contra nós mesmos, nas tentativas de desagregação, não faltemos com a justiça e o louvor àqueles que por três séculos antes nos defenderam das ambições forasteiras soltas no mundo, e que nos deram desde os primeiros tempos coloniais um espírito nacional, com o qual os lográmos ajudar e pudemos enfim sobreviver.

Outra surpresa, quase igual, é a nossa ingratidão, por vezes, a estes e outros benefícios recebidos, tanto mais grave, quanto ela é não raro ilógica e até ridícula. Quando foi da Independência, a reação nativista se exerceu renegando não só a verdade histórica, como a própria voz do sangue, que assim traíamos. Éramos filhos de portugueses: tínhamos pois uma ilustre prosápia, de glorioso povo antigo que, depois de bater os infiéis, repelidos para África, onde continuaram a ser rechaçados, se lançara ao mar tenebroso, contornara o continente negro, tocara a América, alcançara as Índias, atingira o Japão, devastara a Oceânia, e não havendo mais mundo, porque se «houvera lá chegara», tirou-o em prova, dando a volta ao mesmo mundo.

Pois bem, quando a vaidade dos civilizados, ricos e pobres pretende procurar parentes entre os Cruzados, nós que os temos, de facto, entre os da Terra Santa e os da Terra inteira, nós renegávamos os pais que tínhamos, e, não ousando nos gloriar dos negros africanos, invocávamos os selvagens brasileiros. Portugueses é que não queríamos ser. É simbólico aquele caso, entre tantíssimos, de delírio nativista, de um Francisco Gomes Brandão, que passou a ser Francisco Gé Acaiaba de Montezuma, até que a Coroa lhe corrigiu a paternidade, ingratamente repudiada, dando-lhe fictícia nobreza, no título de Visconde de Jequitinhonha, gratificação merecida dos talentos e serviços de patriota e estadista.

Não sabíamos, e talvez ainda não o sabemos todos, que este selvagem brasileiro é dos povos ínfimos da terra, na escala mais baixa da civilização, que tem estudado a Sociologia, mais atrasados e bárbaros que os feitos africanos a quem demos maior desdém e tamanha ingratidão.

Mais ainda. Estes portugueses fizeram uma formosa língua, irmã das línguas romances, derivadas do latim, trabalhada e polida pelo maior Épico dos tempos modernos, por uma legião de prosadores que se contrastam com os mais considerados da Europa inteira. Com efeito, uma autoridade, porque é de estrangeiro, o sr. Edgardo Prestage, da Universidade de Manchester, onde ensina a literatura portuguesa, o afirma: «Não há país, por mais rico que seja o seu pecúlio literário, que não se ufanasse de contar entre os seus filhos cronistas como Fernão Lopes, historiadores como João de Barros e Diogo do Couto, raconteurs como Fernão Mendes Pinto, biógrafos como Frei Luís de Sousa, escritores asiáticos como o padre Manoel Bernardes, moralistas como Frei Heitor Pinto, oradores sagrados como o padre António Vieira, homens inspirados de Deus como Frei Tomé de Jesus, que, no cativeiro de Marrocos, compôs a obra de devoção inigualável, Trabalhos de Jesus. E cita-os todos, para reservar o maior louvor a esse incomparável D. Francisco Manoel do Melo.

Pois bem: deu-nos Portugal esta casta e sonora, forte e sólida língua portuguesa, para a honrarmos e acrescentarmos, na divulgação do grande povo que havemos de ser, e aparecem por aí umas vozes, graças a Deus discordantes, felizmente sem alcance e sem eco, a reclamar, em nome do nativismo, os abusos de prosódia, os erros de sintaxe, os solecismos intencionais, os desleixos de estilo, porque com isso, dizem eles, ou o pensam consigo, faremos uma língua brasileira, tristíssimo dialeto começado assim no erro, não do povo, o que seria de se escusar, mas de letrados, o que apenas é de sorrir. A língua brasileira seria como a parentela brasileira, que alcançou o nosso desvario.

Felizmente, assim como a gente não escolhe os seus parentes e, mercê de Deus, os nossos foram ilustres, também não escolhe a linguagem que balbucia no berço, e bem-aventurados os brasileiros, porque essa é a ilustre língua portuguesa.

É estultícia cuidar em fazer uma língua, sequer um dialeto, obra difícil e longa de um povo inteiro, em muitos séculos, e não decisão política de alguns patriotas descontentes.

Depois, para os consolar, basta que tenham paciência e o tempo lhes dará insensivelmente a variação que desejam, tanto em Portugal como no Brasil, a que a vida impõe, a vida de que a linguagem é a expressão pensada e articulada. Não há muito, um sábio mandado pela a Academia Francesa ao Canadá, para assistir a festas seculares de lá voltava maravilhado por ter ouvido falar – os ouvidos não queriam crer – o francês de grande século, língua de Pascal e de Racine, que já não tem curso em França, e conservara a fidelidade da antiga colônia. No Maranhão, como na Bahia, estão conservados vocábulos e locuções, ainda em uso no Minho ou em Trás-os-Montes, e que Lisboa e o Rio de Janeiro desaprenderam.

O tempo, que faz isso, fará felizmente cada vez menos isso, graças a essa incessante comunicação humana que é a vantagem do nosso tempo. Outrora cantinho de terra, numa Suíça, havia lugar para três línguas e trinta dialetos, insoados nos vilarejos, ninhos alpestres de gente, no regaço dos valados e povoações lacustres, os quais, próximos pela distância, idênticos de raça, entretanto se não entendiam. Hoje, em imensos países, como os Estados Unidos ou o Brasil, de um recanto longínquo ao outro extremo do território, a mesma língua é falada e compreendida por todos os seus milhões de habitantes. Pequenas variações prosódicas, que o clima e o meio social solicitam, vocabulário e expressões pitorescas, que a vida regional diferente inventa e propaga, disseminam-se por todo o país na difusão pronta da imprensa, do correio, do telégrafo, e das gentes que incessantemente se comunicam.

A língua varia assim insensivelmente, mas continuamente, e só a disciplina da educação e da instrução da linguagem lhe põe impecilhos aos desmandos e degeneração, para a glória de sua manutenção e perfeição.

Não faz o lavrador uma árvore; mas, plantada a tempo, adubado e regado o terrão, protegida por tutor quando ainda vergôntea, podada mais tarde dLinke ladrões, esgalhos e demasias de folhagem, dará bela árvore, então sombria, florida e frutuosa.
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Biografia do autor
http://singrandohorizontes.blogspot.com/2011/01/afranio-peixoto-1876-1947.html

Fontes:
De uma conferência pedagógica, da série promovida pelos inspectores escolares do Rio de Janeiro, em 1919, publicada na revista "A Escola Primária", Rio, Junho a Setembro de 1919, in "Paladinos da Linguagem", vol. II. :: 12/02/199
Imagem = Embaixada de Portugal no Brasil

Monteiro Lobato (O Saci) XV – O Boitatá; XVI – O Negrinho


XV – O Boitatá

— Eu ouço falar na Iara e no Boitatá. Será que poderei ver um deles hoje? — perguntou Pedrinho.

— A Iara pode — respondeu o saci — porque há uma que mora por aqui, em certo ponto do rio; mas Boitatá, não. Só existe lá pelo sul.

— Como é?

— Pois o Boitatá é um monstro muito interessante. Quase que só tem olhos — uns olhos enormes, de fogo. De noite vê tudo. De dia não enxerga nada — tal qual as corujas. Dizem que certa vez houve um grande dilúvio em que as águas cobriram todos os campos do sul, e o Boitatá, então, subiu ao ponto mais alto de todos. Lá fez um grande buraco e se escondeu durante todo o tempo do dilúvio. E tantos anos passou no buraco escuro que seu corpo foi diminuindo e os olhos crescendo — e ficou como é hoje, quase que só olhos. Afinal as águas do dilúvio baixaram e o Boitatá pôde sair do buraco, e desde esse tempo não faz outra coisa senão passear pelos campos onde há carniça de animais mortos. Dizem que às vezes toma a forma de cobra, com aqueles grandes olhos em lugar de cabeça. Uma cobra de fogo que persegue os gaúchos que andam a cavalo de noite.

— Eu sei dessa história. É o fogo-fátuo. Vovó já nos explicou que esses fogos são fosforescências emitidas pelas podridões. No sul também existe a célebre história do Negrinho do Pastorejo. Conhece? Não será uma espécie de saci dos Pampas?

— Não. Trata-se de coisa muito diferente. Esse negrinho foi apenas um mártir. Sofreu os maiores horrores dum senhor de escravos muito cruel; morreu e virou santinho.

— Conte a história dele. E o saci contou.

XVI – O negrinho

— Havia um fazendeiro, ou estancieiro, como se diz lá no sul, que era muito mau para os escravos — isso foi no tempo em que havia escravidão neste país. Uma vez comprou uma ponta de novilhos para engordar em seus pastos. Era inverno, um dos piores invernos que por lá houve, de tanto frio que fazia.

— Negrinho — disse o estancieiro para um molecote da fazenda, que andava por ali. — Estes novilhos precisam acostumar-se nos meus pastos, por isso você vai tomar conta deles. Todas as tardes tem de tocar a ponta inteira para o curral, onde dormirão fechados, depois de contados por mim. Tome muito tento, hein? Se faltar na contagem um só que seja, você me paga.

O pobre molecote só tinha catorze anos de idade; mesmo assim não teve remédio senão ir para o campo tomar conta do gado. Era gado arisco, ainda não querenciado naquela fazenda, de modo que, para começar, logo no primeiro dia um dos novilhos faltou na contagem.

O estancieiro não quis saber de explicações. Vendo que o número não estava certo, botou o cavalo em que estava montado para cima do negrinho e deu-lhe uma tremenda sova de chicote. Depois disse:

— E agora é ir procurar o novilho que falta. Se não me der conta dele, eu dou conta de você, seu grandessíssimo patife!

E lept! — outra lambada por despedida.

O moleque, com as costas lanhadas e em sangue, montou no seu cavalinho e saiu pelos campos atrás do novilho. Depois de muito procurar, encontrou por fim o fujão, escondido numa moita.

“E agora?”, pensou consigo. “Tenho de laçar este novilho, mas meu laço está que não vale nada, de tão velho, e eu estou tão escangalhado pela sova que ainda valho menos que o laço. Mas não há remédio. Tenho que ir até o fim...”

E, aproximando-se com muito jeito, laçou o novilho.

Se fosse só laçar, estaria tudo muito bem. Mas tinha de trazer o boizinho por diante, até o curral. Teria ele forças para isso? O laço agüentaria?

Não agüentou. Com meia dúzia de sacões o novilho desembaraçou-se do laço, arrebentando-o, e lá se foi pelos campos afora na volada.

E agora? Voltar para casa sem novilho e sem laço? O furor do estancieiro iria explodir como bomba.

Voltou.

— Que é do novilho? — indagou o patrão assim que o negrinho apareceu no terreiro.

— Escapou, patrão. Lacei ele, mas o laço estava podre e não agüentou, como sinhô pode ver por este pedaço.

Se o estancieiro não fosse um monstro de maldade, convencer-se-ia logo, vendo, pela ponta do laço, que o negrinho andara direito. Quando o laço arrebenta, a culpa da presa escapar não é do laçador, sim do laço. Não pode haver nada mais claro no mundo. Mas o estancieiro, que tinha comido cobra naquele dia, em vez de dar-se por convencido, mais colérico ainda ficou.

— Cachorro! — exclamou, espumando de raiva. — Você vai ter o castigo que merece.

O dito, o feito. Agarrou o negrinho, amarrou-o pelos pés com a ponta do laço e depois de bater nele com o cabo do relho até cansar, teve uma idéia diabólica: botá-lo num formigueiro para ser devorado vivo pelas formigas.

Assim fez. Arrastou-o para um sítio onde existia um enorme formigueiro de formigas carnívoras, arrancou as roupas do coitadinho e deixou-o amarrado lá.

No dia seguinte foi ver a vítima, com a idéia de continuar o castigo, caso o grande criminoso não estivesse morto e bem morto. Chegando ao formigueiro, levou um grande susto. Em vez do negrinho, viu uma nuvem que se erguia da terra e logo se sumiu nos ares.

A notícia desse acontecimento correu mundo. Os homens daquelas bandas começaram a considerar o negrinho como um mártir que tinha ido direito para o céu.

Com o tempo virou um verdadeiro santo. Quem quer qualquer coisa, na campanha do Rio Grande, antes de pedi-la a Santo Antônio ou a outro santo qualquer, pede logo ao Negrinho do Pastorejo.

— E ele faz?

— Está claro que faz — sempre que pode. Como sofreu muito, sabe avaliar os apertos dos outros e ajuda-os no possível.
____________
continua... XVII - Meia-noite; XVIII – Saída dos sacis
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Fonte:
LOBATO, Monteiro. Viagem ao Céu & O Saci. Col. O Sítio do Picapau Amarelo vol. II. Digitalização e Revisão: Arlindo_Sa

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

A. A. de Assis (Trovas Ecológicas) - 3


Roza de Oliveira (Relâmpagos Divinos)


Relâmpagos luzindo em noite escura
em seus corcéis de luz aurifulgente,
anunciais de forma rica e pura
um mágico saber - clarividente!

Telegramas de luz cuja linguagem
computador nenhum pode gravar
e, presciente dessa luz-imagem,
só o poeta a sabe decifrar.

Bendito seja tal conhecimento
que em seus raios de luz, força e verdade
emerge dos arcanos de uma alma.

E, assim sendo, relâmpagos divinos,
trazeis da criação a tempestade
que me compensará com paz e calma.

Fonte:
Simultaneidades

Celso Sisto (Atravessando o Tempo)


SILVA, Maria Teresa dos Santos.Contos do arco-da-velha 2. Textos adaptados por Eduardo Brandão. Ilustrações de José Miguel Ribeiro. São Paulo, Companhia das Letrinhas, 2010. 64p.

Há histórias teimosas, que insistem em atravessar o tempo. Com isso vão ficando cada vez mais conhecidas e conquistando um público cada vez maior. Na verdade ninguém sabe quem as inventou ou onde elas surgiram pela primeira vez. Isso acontece com histórias as quais chamamos de mitos, lendas, fábulas e até contos populares.

Esse livro vem de Portugal e precisou ser adaptado para o português do Brasil. São 4 histórias neste volume 2: O velho, o garoto e o burro; Dona Baratinha; A raposa e o galo; Os macacos. Não dá pra dizer que essas histórias são portuguesas, elas são do mundo. Aqui são muito conhecidas, exceto a última. Dizem que chegaram com os colonizadores. É possível. Mas os colonizadores aprenderam essas histórias com quem? Mistérios que costumam persistir quando se trata de histórias de domínio público. É como se perguntar, quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha?

Em “O velho, o garoto e o burro” a polêmica é “quem deve ir montado no burro que vai ser vendido na feira”? Em “Dona Baratinha”, tudo gira em torno de “quem vai se casar com a Dona Baratinha, que é bonitinha e tem dinheiro na caixinha, achado enquanto varria o chão da cozinha”? Em “A raposa e o galo” a questão é: a raposa vai conseguir almoçar o galo, com sua desculpa de que agora reina a paz entre os animais? E em “Os macacos” o leitor quer saber onde foram parar os gorros vermelhos da mala do mercador, enquanto ele dormia?

Essas histórias, conhecidas desde as fábulas de Esopo e La Fontaine, aparecem aqui em versos, rimados, gostosos, divertidos. Com isso, recuperam, de certo modo, a forma “original” das fábulas, que eram em versos. Por serem em versos, as histórias são enxutas e vão direto ao ponto, ao conflito, sem muito desvio ou enfeite. A tônica geral é a mesma: o primeiro verso rima com o terceiro; e o segundo verso rima com o quarto.

A moral da história, que desde o princípio acompanha as fábulas é inserida no texto de uma forma leve e única, sem parecer que está fora do texto. Em geral, essa “mania” de terminar uma história para crianças com um ensinamento provocou uma necessidade, quase que obrigatória na literatura infantil, mas nem sempre com bons resultados literários. Virou vício, mas felizmente, os escritores hoje abandonaram essa regra que transforma literatura em cartilha! Moral em forma de pergunta, como faz o avô da história “do burro” é mais democrática: “Você percebeu, meu netinho? Não há ninguém tão esperto, tão sensato e perspicaz, que cale as bocas do mundo!”. Esse tipo de moral é muito menos impositiva! Funciona!

Mas o livro ganha mais força ainda com as ilustrações de José Miguel Ribeiro. Seu traço, tendendo para o estilizado, é único. Suas imagens de página dupla, seus contornos de linhas grossas e falhadas, seu colorido de tinta acrílica, com predomínio de cores frias, sem saturação e com muito branco fazem os olhos do leitor ficarem deslumbrados.

24/08/2011

Fonte:
Artistas Gaúchos

Ialmar Pio Schneider (O Dilema)


Aguardava, ansiosamente, que alguma novidade pudesse acontecer. Não tinha certeza de que tudo estivesse perdido. Nesta dúvida se assentava o pensamento de Cândido, abandonado pela mulher, após doze longos anos de convivência, que lhe deixou marcas indeléveis para o resto da vida.

Contanto que houvesse progredido financeiramente, sua ingenuidade o fizera acreditar que era aceito, mas agora sentia que não tinha vencido no amor. De fato, Sayonara o traía com Ernesto, quando ele ia exercer seu cargo de guarda-livros em uma firma de beneficiamento de madeiras.

Nas longas tardes de verão, enquanto ele se esfalfava no escritório, ela se encontrava com o amante às margens do rio dos Sinos, onde outrora, quando ainda não era tão poluído, existia um local que denominavam “a prainha”. Lá permaneciam algum tempo, conversando com certo disfarce e depois saíam no carro de Ernesto rumo da casa de Marlene que alugava quartos para encontros amorosos.

Era um dos rendez-vous da cidade, tido como dos mais sigilosos, então existentes. Chegavam e pediam um quarto por duas horas, o que já era de praxe. A empregada da casa lhes entregava a chave e eles seguiam por um corredor até dar a uma porta, nos fundos, onde havia uma cama de casal, um roupeiro, uma cadeira, uma bacia para higiene pessoal e uma jarra com água. O banheiro, naquela época, ficava no corredor e era coletivo. Não existiam os modernos motéis de hoje em dia. Então, após se desnudarem, deitavam e faziam amor: ele impacientemente e ela fogosa, sem qualquer pejo, uma vez que sentia haver trocado o Cândido por Ernesto há algum tempo.

De repente, Ernesto rompe o silêncio e diz:

- Sayô, meu bem, quando poderemos estar juntos, sem nos preocupar com os outros ? Já estou ficando aborrecido de ter que estar fingindo, disfarçando nosso amor. Que me dizes ?

- Ora, Néstinho, tem paciência... Estou bolando uma maneira de deixar o Cândido, mas me falta, talvez, coragem. Sei que não vai demorar, pois não aguento mais viver assim.

Depois desse dia, Sayonara parece ter avivado em seu espírito o desejo de abandonar o marido que não a fizera feliz. Chegava em casa à tardinha e se parava diante do espelho a pensar: “Estou envelhecendo e presa a este casamento sem graça... Até quando?!” Procurava uma ocasião para dar o fora. Não achava nada fácil fazê-lo.

Entretanto, passado algum tempo apresentou-se-lhe a oportunidade. Cândido tivera que viajar a serviço da empresa para São Paulo, a fim de fazer um curso rápido de contabilidade e adquirir, ao mesmo tempo, algumas máquinas para o escritório.

Sayonara aproveitou. Encheu duas malas e uma sacola de roupas e sapatos e se dirigiu para a rodoviária em Porto Alegre onde tomou um ônibus para Pelotas. Antes disso, porém, combinou com Ernesto que a esperasse na rodoviária daquela cidade. Assim foi feito. À noitinha ela chegou lá na Princesa do Sul e se encontrou com ele que aguardava-a, impacientemente. Não sabia o que poderia acontecer, mas, enfim, estariam agora juntos. Desfrutariam a Praia do Laranjal às margens da Lagoa dos Patos, tão famosa em todo o estado do Rio Grande do Sul, quase como se fosse uma praia de mar.

Finalmente Cândido voltou, após uma semana, e chegando em casa, qual não foi a sua surpresa, quando não encontrou a mulher. Apenas sobre a cama do casal havia um bilhete que dizia o seguinte:

Cândido, espero que compreendas minha atitude e me desculpes. De uns tempos para cá senti que o nosso casamento foi um fracasso. Não poderia mais continuar tapando o sol com a peneira, pois além de te iludir, eu me iludia a mim mesma. Amo outro e tenho certeza de que também sou amada por ele. Não queiras saber onde eu me encontro. Assim será melhor. Adeus!
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Publicado em 03 de março de 1999 - no Diário de Canoas.
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Fontes:
Texto enviado pelo autor
Imagem = Jornal O Rebate

Roberto de Paula (Dispersos Versos Errantes)


GRANDE NOITE

Agora me retraio
A luz me corrompe
As idéias são retalhos
Que diferem a cada dia
Se o meu sonho é pesadelo
Acordo e olho o silêncio
Se a luz está acesa
Procuro a escuridão
Se existem as estrelas
Então eu fecho os olhos
Porque é na noite
Que o calor dos pensamentos
Aquece meus sentidos
Agita meus músculos
E me faz sentir tão forte
E me faz pensar tão lúcido
Nesta errante procura
E quando surge a claridade
Me vejo numa cela
Entre fogos de artifícios
Sendo obrigado a aceitar
Quaisquer regras
Normas e sugestões
Passivo e pacífico
Se tento sair
Sou contido
Pelo brilho dos olhos
Ferozes e acusadores
Pela nobreza dos gestos
Finos e hipócritas
Pela força das palavras
Duras e impostas
A aspereza dos tempos
Afugentou minhas convicções
Dividiu minhas soluções
Criou dúvidas nos meus conceitos
Esta selva me fez fera acuada
Me caçando a todo instante
Alerta nos meus ruídos
Se assim me fizeram
Ou se assim me fiz
Farei meu mandamento
No dia serei sonâmbulo
Na noite acordarei a cidade
Chamando-a para viver

VIVOS E BELOS

Quem nos vê assim tão vivos
Não sabe o que corre além das veias
Quem nos vê assim tão belos
Não sabe o que vai nas cabeças

Quem nos olha não nos vê
Quem nos toca não nos sente
E nas nossas faces sorridentes
O bem e o mal se dão bem

Refletidos diante do espelho
Calamos para não denunciar
Nossos medos e culpas
Ou nossas forças e poderes

Diante desta vida temerosa e atrevida
Vemos passar o nosso filme impróprio
Estampado nas faces e gestos
Destes homens tão vivos e belos

VIVOS E BELOS - (VERSÃO 2)

Quem me vê assim tão vivo
Não sabe o que corre além das veias
Dos músculos, órgãos e massas
Quem me vê assim tão belo e plácido
Não sabe o que está por trás deste sorriso torto
Destes olhos míopes e destas palavras soltas
Quem me olha não me vê
Quem me toca não me sente
Nesta face sorridente
O bem e o mal se dão bem
Para bens, para males
O pensamento é um bicho solto
De possibilidades enormes
A vida é um sorriso torto
Visto por olhos disformes
Em mim tudo vive, nada é morto
Tudo pulsa, nada dorme

ANTEPAROS

Faz do trago
O consolo
No cigarro
Sobe com a fumaça
Faz do choro
O encosto
Para não prosseguir

No sono
Desliga martírios
Libera sonhos
Reprimidos
Faz da rua
A esperança de se perder

Na cabeça
Mora a vontade
De fugir
Sem saber pra onde
Onde não será cobrado
Sem rótulo
Sem marca registrada
Fiel a seu comando

Imperando
Esta fantasia
Está tudo certo
Está tudo bem
É mais um meio
De se esconder

UM PONTO

Parado diante do mundo
Contando horas
Sons que não ouço
Celas que invento
Este sol tão forte
Este lamento

Tempo quente
Não estou neste presente
Passos que não dou
Era e sou um rosto
Um ponto a mais
Ou menos
Entre tantos

Faço uma história
Versos despedaçados
Vou, voo cego
No desencontro
Me entrego

O SOL

Depois
As luzes
Sou só e não me encontro
Sou só um ponto

SAÍDA

A bebida
Antes de descer
Já subiu
À cabeça

Para que se esqueça
O que é imposto
Qualquer gosto
É válido

Tempo árido
Enchendo
Se esvazia
Escapando
Até outro dia

LIBERDADE DOS PÁSSAROS

Não me olhe de frente
Não me cumprimente
Não beba comigo
Não me detenha
Mantenha distância

Estou fechado
Sou meu companheiro
Sou meu prisioneiro

Não pergunte meu nome
Não me telefone
Não pergunte da vida
O que penso ou faço

Meu riso é fel
Envolto em ironias
Meu canto é gemido

Fim de tarde
Pássaros voam
Meu voo é sem asas
Com portas fechadas

Estou comigo
Passos trôpegos
Braços caídos
Penso em liberdade
Liberdade dos pássaros

MAIS UM OU MENOS UM

Esconderijos
São as avenidas
Sou mais um
Ou menos um

Multidão de rostos
Não me perseguem
Não me percebem

Medos retraídos
Passos firmes
Olhos brilhantes
Irradiação da alma

Levo o corpo
Ou ele me leva
Neons me iluminam
Energia canalizada

Vou sem pressa
Voo sem força
Solidão que se foi
E a avenida a percorrer

RELEMBRANÇAS

Um resto de luz
Tinge a vidraça
E timidamente clareia
O minúsculo quarto

O corpo cansado
Cigarro já no filtro
Fumaça se espalhando
Espalhando lembranças

Nos delírios carnais
Ela está presente
Forte e ditadora
Bela e inalcançável

Nervos e músculos
Se contorcem
A mente rabisca
Algo real

É impossível
Para cada razão
Há muitas razões
Para sonhar

Mistura de tédio
E solidão
Claro mistério
Entre quatro paredes

Este filete de luz
Insistindo em alertar
Que lá fora
A vida continua

Agora vem o silêncio
O infinito silêncio
Comprimindo a cabeça
Derramando lágrimas

Gemidos
Tremores
Outro cigarro
Outras lembranças

FREQUÊNCIA MOTIVADA


Os temores nas nossas faces
As vozes abafadas
Saindo das gargantas roucas
Tremendo de medo
Trancamos as portas
E nos escondemos
Nos nossos lençóis
Outra noite invariavelmente
Silenciosa e massacrante

No dia vamos tilintar copos
Enchendo nossa mesa
Quando o milagre do álcool
Completará nossas cabeças
Na conversa revigorante
Giraremos ao nosso redor
Até podermos conhecer
Ou inventar nossa fortaleza

Nossos pavores unidos
E nosso terror sob controle
Hão de nos confortar
Somaremos os tristes sentimentos
Para poder de novo continuar

ÁRIDOS TEMPOS

Áridos tempos
Tragicômicas faces
Mortes asfálticas
Jornais de papel
Ou eletrônicos
Borbulhando sangue

Fé ambulante
Vendida pelos salvadores
Estéreis campos
Fechados para produção
Férteis mulheres
Fabricando famintos

Sentimentos abortados
Desencontradas ligações
Mentiras nos púlpitos
Nas tribunas e altares
Manchetes criando o caos
E o homem a dizer amém

Nebulosos e tensos dias
Arrastando as horas
Procissão de males
Na avenida do tédio
Nesses áridos tempos

SÓ UM SONHO

Meu sonho sai do quarto
E voa pela cidade
Se detém nas amarguras
Mas logo segue em frente
O voo continua

Meu sonho se entrega aos desejos
Se embriaga nas paisagens
Mas segue em frente
A fantasia continua

Contrastes e uniformidades
Crianças e flores
Velhos e jardins
Casas e lares
Sol e neon
Verdes e celestes
Rubros e nebulosos
Bares e escritórios
Casos fatais
Assuntos banais

Meu sonho se distrai
Segue em frente
E nada mais

EU

Nada do que sei é certeza
Viajei sem sair do lugar
Nada do que vi me satisfez
Distribui amores sem nada levar

Saí buscando razões
Me perdi em evasivas
Aumentaram as interrogações
Acabaram minhas teses conclusivas

Sou corpo, alma e coração
Risos, lágrimas, abraços e adeus
Um a mais buscando explicação
Um ser, uma voz, uma vida, eu.

O TEMPO E O CORAÇÃO


Minha boca
Já não beija tanto
Meu abraço
Já não é tão forte
Mãos nervosas
Passos inseguros
Solidão agora
Chega ligeira
Fica num canto
Parceira
Sorriso pálido
Olhar sem brilho
O tempo
É um relógio preguiçoso
Muitas badaladas de dor
Poucas de gozo
O coração maquinal
Nem bem
Nem mal
No vai-e-vem
Da cadeira de balanço
Olho o céu e a terra
Descanso

Fonte:
http://www.dispersosversoserrantes.blogspot.com/

Olivaldo Junior (Violãozinho; Vontade)


VIOLÃOZINHO

Não era só meu,
mas era um caminho.

Nem era um caminho,
mas era por Deus.

Nem era por Deus,
mas era um carinho.

Nem era um carinho,
mas era como eu.

Nem era como eu,
mas o “meu” violãozinho,
assim, tão sozinho,
vai ser sempre só: só meu...

23/08/2011

VONTADE

E era sempre a vontade de ter amigo,
de cantar em dupla, de virar bem-te-vi.

E era sempre um coração bem antigo,
com estrelas e lua, num canteiro que ri.

E era sempre eu mesmo, sem amigos,
sem asas, na rua, sempre só, aqui e ali.

Porque todos têm seus companheiros,
alguém que os chame pra cantar e sair,
que o mundo é rir, brincar, se divertir,
quando existem dois ou três canteiros
onde se pôr e ficar.

Fiquei só, porque sou só, sem amigo.
Quando penso que vem, logo se esvai,
e eu, sem razão,
busco o amigo lá,
tocando violão.

12/08/2011

Fonte:
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