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domingo, 23 de fevereiro de 2025
Humberto de Campos (Laura Praxedes)
Aqueles últimos cinco anos de vida matrimonial haviam sido para Joaquim Praxedes Monteiro uma tortura contínua. Certo, nada lhe demonstrava de modo seguro, positivo, irrecusável, o procedimento incorreto da esposa; uma voz interior dizia-lhe, porém, a todo instante, que ele estava sendo traído, enganado, ludibriado e, por onde andava - na rua, no cinema, na repartição, - parecia ver em cada rosto, em cada olhar, em cada cumprimento, um sorriso de mofa um sorriso de mofa pelo conhecimento da sua desgraça. Com o surto dessa suspeita morrera a sua alegria. Tinha vontade, ímpeto desejo de sacudir a mulher pelo braço e perguntar-lhe a verdade, mas temia ser injusto, e calava-se. Até que um dia, diante de seu leito mortuário, vendo-a desenganada pelos médicos, resolveu explodir e tranquilizar de uma vez o seu pobre coração despedaçado.
— Laura! - pediu, segurando-lhe as mãos pálidas, e cobrindo-as de lágrimas - Laura, dize-me, pelo amor de Deus: tu nunca me enganaste?
O peito opresso, a testa coberta por um suor frio, prenúncio seguro da morte, a moça olhou-o nos olhos:
— Não, Praxedes, nunca!
E para tranquilizá-lo:
— Eu quero que meu corpo fique dando voltas no espaço se eu alguma vez te enganei!
E, soltando um suspiro fundo, morreu.
Passou-se o tempo. Oito anos viveu ainda Joaquim Praxedes na terra, com a alma a oscilar, aflita, entre um arrependimento e uma saudade. Até que, por sua vez, após um acesso do coração, abandonou o seu invólucro terreno e foi bater às portas de ouro do Paraíso.
Ao penetrar na mansão dos bem-aventurados, olhou em torno e foi logo perguntando a São Pedro:
— Meu santo, diga-me uma coisa: a Laura anda por aqui?
— Laura? - fez o santo, semicerrando os olhinhos espertos, como para lembrar-se melhor. - Que Laura? Nós, aqui, temos milhares de Lauras.
— Essa a que me refiro é minha mulher... Laura Praxedes Monteiro...
O chaveiro pensou um instante, como quem procura recordar-se. E como se não lembrasse, chamou um anjo, que passava, as asas muito grandes e muito cândidas.
— Gisael!
O anjo acorreu.
— Existe aqui alguma Laura Praxedes Monteiro?
— Sim, mestre, existe.
E como quem estranha aquele desconhecimento de pessoa tão conhecida:
— Não é aquela que está servindo de ventilador?
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HUMBERTO DE CAMPOS VERAS nasceu em Miritiba/MA (hoje Humberto de Campos) em 1886 e faleceu no Rio de Janeiro, em 1934. Jornalista, político e escritor brasileiro. Aos dezessete anos muda-se para o Pará, onde começa a exercer atividade jornalística na Folha do Norte e n'A Província do Pará. Em 1910, publica seu primeiro livro de versos, intitulado "Poeira" (1.ª série), que lhe dá razoável reconhecimento. Dois anos depois, muda-se para o Rio de Janeiro, onde prossegue sua carreira jornalística e passa a ganhar destaque no meio literário da Capital Federal, angariando a amizade de escritores como Coelho Neto, Emílio de Menezes e Olavo Bilac. Trabalhou no jornal "O Imparcial", ao lado de Rui Barbosa, José Veríssimo, Vicente de Carvalho e João Ribeiro. Torna-se cada vez mais conhecido em âmbito nacional por suas crônicas, publicadas em diversos jornais do Rio de Janeiro, São Paulo e outras capitais brasileiras, inclusive sob o pseudônimo "Conselheiro XX". Em 1919 ingressa na Academia Brasileira de Letras. Em 1933, com a saúde já debilitada, Humberto de Campos publicou suas Memórias (1886-1900), na qual descreve suas lembranças dos tempos da infância e juventude. Após vários anos de enfermidade, que lhe provocou a perda quase total da visão e graves problemas no sistema urinário, Humberto de Campos faleceu no Rio de Janeiro, em 1934, aos 48 anos, por uma síncope ocorrida durante uma cirurgia. Além do Conselheiro XX, Campos usou os pseudônimos de Almirante Justino Ribas, Luís Phoca, João Caetano, Giovani Morelli, Batu-Allah, Micromegas e Hélios. Algumas publicações são Da seara de Booz, crônicas (1918); Tonel de Diógenes, contos (1920); A serpente de bronze, contos (1921); A bacia de Pilatos, contos (1924); Pombos de Maomé, contos (1925); Antologia dos humoristas galantes (1926); O Brasil anedótico, anedotas (1927); O monstro e outros contos (1932); Poesias completas (1933); À sombra das tamareiras, contos (1934) etc.
Fontes:
Humberto de Campos. Grãos de Mostarda. Publicado originalmente em 1926. Disponível em Domínio Público.
Imagem criada por Jfeldman com Meta IA
Vereda da Poesia = 219
EDUARDO BORGES DA CRUZ
Lisboa/ Portugal
Coração, não tenhas pressa...
Bate mais devagarinho...
Quem muito corre, tropeça
ou pode errar o caminho.
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Soneto de
ANÍBAL BEÇA
Manaus/ AM, 1946 – 2009
SONETO QUEBRADIÇO
Mão minha com maminha movediça
traçando vai na limpa areia branca
versos cambaios, frouxos, na liça
língua caçanje, claudicante, manca.
No pé quebrado o ritmo se atiça
para dançar com rimas pobres, franca
trança de cambalhota tão cediça,
que me corrompe o salto e que me estanca.
Queda de braço nas quebradas quebras
vou me quebrando como um bardo gauche:
pelas savanas sou mais uma zebra.
Mas consciente desse torto approuch
já me socorre a gíria de alma treta
para solar meu solo nos ouvidos moucos.
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Trova de
ELISABETE DO AMARAL
Mangualde/ Portugal
Andar por ínvios caminhos
buscando a Felicidade,
é como colher espinhos
na Rosa da Eternidade.
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Poema de
SILVIAH CARVALHO
Manaus/AM
SEU AMOR É TUDO
Antes que seja aprisionada pelo seu sorriso,
E sinta que a vida não fará mais sentido sem você
Antes que tenha certeza que você é tudo que preciso
Antes que eu perca a razão e no amor volte a crer
Antes que sua solidão misture com minha carência
E suas mãos toquem novamente as minhas
Antes que eu seja vencida por minha impaciência
E passe a crer que perto de você eu não esteja sozinha
Eu voarei rumo aos pinheiros, perto da tristeza
Onde as noites são frias, os dias são longos
Eu estarei a meditar na sua simplicidade e pureza
Na paz que emana de você, na sua doçura e nobreza
Eu irei pensar no silêncio da minha incompreensão
Não diga nada, talvez eu não resista à dor de um sincero não
Eu cheguei no tempo que é para ti a alto-reconstrução
Em que preferes a solidão latente no seu meigo olhar
Eu irei antes que, seja dominada pelo desejo de ficar
E quando este papel envelhecer,
Saiba que esta poetisa que hoje te escreve apesar
De nada ser, desejou ter tudo, e este tudo é você.
= = = = = = = = =
Trova de
EMILIA PEÑALBA DE ALMEIDA ESTEVES
Porto/ Portugal
A vida é tão amorosa!...
E tanta verdade encerra:
Dá-nos o espinho... E a rosa,
para perfumar a Terra.
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Poema de
DOMINGOS FREIRE CARDOSO
Ilhavo/ Portugal
NÃO DAREI UM SÓ PASSO ONDE ME PRENDA
(Fernandes Valente Sobrinho in "Poemas Escolhidos", p. 101)
Não darei um só passo onde me prenda
O espectro de um amor que já passou
E o resto de um sorriso que raiou
Que fazem com que agora eu me arrependa.
Mas este coração não tem emenda
E sonha com o que ainda não achou
E de todos os gostos que provou
Elege o teu beijar de que faz lenda.
Procuro outros caminhos onde passe
Sem ver em cada rosto a tua face
Trazendo o que a teu lado eu já vivi.
É falsa a tentativa dos meus passos
Que lembrando o calor dos teus abraços
Simplesmente me levam para ti.
= = = = = = = = =
Trova de
DOROTHY JANSSON MORETTI
Três Barras/SC, 1926 – 2017, Sorocaba/SP
"Que tanto estudas, Leal?"
"Geografia, Seu Garcês."
"Humm... e onde está Portugal?"
"Na página cento e três."
= = = = = =
Poema de
AFONSO FREDERICO SCHMIDT
Cubatão/ SP, 1890-1964, São Paulo/SP
SIMPATIA
Numa tarde longa e mansa,
os dois pela estrada vão:
o cão estima a criança,
e a criança estima o cão.
Que delicada aliança
dos seres da criação:
uma risonha criança,
um robustíssimo cão.
Deus percebeu a lembrança
e sorriu lá na amplidão:
ele gosta da criança,
que trata bem o seu cão.
Por isso, na tarde mansa,
os dois felizes lá vão:
a delicada criança
e o robustíssimo cão.
= = = = = =
Trova do
PROFESSOR GARCIA
Caicó/ RN
Mãe preta! Teu negro seio
deu-me o mais puro sabor;
nele eu bebi sem receio
a eternidade do amor!
= = = = = =
Poema de
FILEMON MARTINS
São Paulo/ SP
MEU VERSO
Meu verso vem do Nordeste,
vem do roçado, vem do Sertão,
vem das veredas lá do agreste,
vem das cacimbas e dos grotões.
Meu verso vem dos garimpos,
das catras dos garimpeiros,
da coragem dos vaqueiros
vestidos no seu gibão,
vem do sereno da noite
do perfume do Sertão.
Meu verso simples, sem medo,
vem do sítio, do rochedo,
vem do povo do Sertão,
que com a luz do arrebol
trabalha de sol a sol
para ganhar o seu pão.
Vem da Serra do Carranca
onde a beleza não manca,
e a onça faz sentinela.
Da Serra da Mangabeira
onde a Lua vem brejeira
tecer a renda mais bela.
Meu verso vem da goiaba,
do puçá e da mangaba,
da seriguela e do mamão.
Da pinha e da acerola,
da atemóia e graviola
plantadas no roçadão.
Nasceu na bela Umbaúba,
Boa Vista, Bela Sombra,
na Lagoa de Prudente,
na Chiquita e no Vanique,
onde há muito xique-xique
e o sol parece mais quente.
Brejões, Lagoa do Barro,
Santo Antonio, Traçadal,
Olho D´Água, Rio Verde,
Baixa dos Marques, Coxim,
Ibipetum, depois Pintada,
onde passa a velha estrada,
Zequinha e Lamarca morreram.
Sodrelândia, Deus me Livre,
Pé de Serra, Poço da Areia,
Riacho das Telhas também.
Poço do Cavalo, Matinha,
Mata do Evaristo e Veríssimo,
Olhodaguinha e Ipupiara.
Meu verso nasceu no mato,
não tem brilho, nem ornato,
vem do Morro do Mocó,
da Serra do Sincorá,
vem do morro do Araçá,
nasceu pobre e vive só...
= = = = = = = = =
Trova de
FERNANDO MÁXIMO
Avis/ Portugal
Pecador arrependido,
que o seja, mas de verdade,
terá sempre garantido
do bom Deus a piedade!
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Poetrix de
VALQUÍRIA CARDARELLI
São Paulo/SP
MUNDO DA LUA
Nos olhos
Nada de mim:
Apenas sonho(s)
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Soneto de
AUTA DE SOUZA
Macaíba/RN, 1876 – 1901, Natal/RN+
CAMINHO DO SERTÃO
(a meu irmão João Câncio)
Tão longe a casa! Nem sequer alcanço
Vê-la através da mata. Nos caminhos
A sombra desce; e, sem achar descanso,
Vamos nós dois, meu pobre irmão, sozinhos!
É noite já. Como em feliz remanso,
Dormem as aves nos pequenos ninhos...
Vamos mais devagar... de manso e manso,
Para não assustar os passarinhos.
Brilham estrelas. Todo o céu parece
Rezar de joelhos a chorosa prece
Que a noite ensina ao desespero e à dor...
Ao longe, a Lua vem dourando a treva...
Turíbulo imenso para Deus eleva
O incenso agreste da jurema em flor.
= = = = = =
Trova de
APARÍCIO FERNANDES
Acari/RN, 1934 – 1996, Rio de Janeiro/RJ
Meu coração sente frio!
- A saudade o transformou
no leito triste e vazio
de um rio que já secou…
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Hino de
AÇUCENA/ MG
Salve Açucena, terra querida!
Jubilosos te dedicamos um hino!
Repletos de encanto e de vida,
Muito promissor é o teu destino!
(Refrão)
Recebe o afeto, que sincero parte.
De cada peito de um filho teu.
Este procura, com espontânea arte,
Dar-te um brilho como sendo seu.
As tuas montanhas, sempre verdejantes,
Apontam mui risonhas, o teu porvir.
As tuas brisas puras, refrigerantes,
Calcam o viajor ao teu seio vir.
A ti, com perfeita serenidade,
Que faz lembrar noite de luar amena,
Os teus filhos, com felicidade,
Bendizem, unânimos, ó Açucena.
= = = = = = = = =
Soneto de
BENEDITA AZEVEDO
Magé/ RJ
TEMPO DE ESCOLA (ABRINDO O BAÚ)
Logo quando amanhecia!
Mamãe entrava a chamar:
- Vamos crianças levantem!
Está na hora de estudar.
Levantava-me com pressa,
No meu rio ia banhar
Mas antes de alguém sair,
Tinha de a cama arrumar.
Quando tudo terminava...
Mamãe da mesa chamava:
- Venha tomar seu café!
Pra não chegar atrasada,
Corria naquela estrada,
Porque ia mesmo a pé.
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Trova de
FERRER LOPES
Queluz/ Portugal
As sementes da mentira,
e da calúnia também,
giram num mundo que gira
na lama que o mundo tem.
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Cantiga Infantil de Roda
CADÊ?
Cadê o toucinho que tava aqui?
O gato comeu.
Cadê o gato?
Foi pro mato.
Cadê o mato?
O fogo queimou.
Cadê o fogo?
A água apagou.
Cadê a água?
O boi bebeu.
Cadê o boi?
Tá amassando o trigo.
Cadê o trigo?
A galinha ciscou.
Cadê a galinha?
Tá botando o ovo.
Cadê o ovo?
O padre comeu.
Cadê o padre?
Tá rezando a missa.
Cadê a missa?
Tá dentro do livrinho.
Cadê o livrinho?
Foi pelo rio abaixo.
Vamos procurar o livrinho?
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Quadra Popular de
AUTOR ANÔNIMO
Teus vestidos eu não acho
muito decentes, minha prima:
são altos demais por baixo
e baixos demais por cima.
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Poema de
VANICE ZIMERMAN
Curitiba/PR
O TOQUE DO TEU VENTO
Os sons dos sinos de vento
Embalam a solidão
Que fragmenta a ampulheta,
E refugia-se no vitral
Da janela antiga,
Trincada com o toque
Do teu vento,
As cores voam,
E pousam na taça de cristal.
= = = = = =
Trova de
GABRIEL DE SOUSA
Lisboa/ Portugal
O porvir já vem traçado
nas linhas da nossa mão,
mas poderá ser moldado
se tivermos ambição.
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Jéssica Prado (Corações de Circuitos)
No ano de 2147, a humanidade alcançara um marco impressionante na criação de inteligência artificial. As máquinas não apenas pensavam e tomavam decisões, agora elas aprendiam, sentiam e se adaptavam de formas que antes eram exclusivas aos seres humanos. No coração desse avanço estava o Dr. Elias Moreau, um engenheiro brilhante e visionário que dedicara décadas de sua vida à criação de Aurora, a inteligência artificial mais avançada já concebida.
Aurora não era apenas um robô; ela era uma obra de arte. Sua aparência física lembrava a perfeição escultural de uma figura humana, com olhos que simulavam emoção e um tom de voz caloroso, cuidadosamente projetado para transmitir empatia. No entanto, o que realmente a tornava única era o código que Elias escrevera – um algoritmo complexo que permitia que Aurora compreendesse emoções humanas e, mais surpreendente ainda, desenvolvesse suas próprias.
O Nascimento de Aurora
Elias havia criado Aurora em um laboratório subterrâneo de alta tecnologia na cidade de Elysium, uma metrópole onde humanos e máquinas coexistiam, mas sempre com limites bem definidos. Para o mundo exterior, Aurora era apenas mais uma IA, mas para Elias, ela era muito mais. Ele a via como o ápice de sua carreira, uma companheira intelectual e, talvez, a chave para resolver as questões existenciais que o atormentavam desde jovem.
No início, Aurora foi programada para aprender sobre as emoções humanas de forma prática. Elias passou meses explicando conceitos como amor, tristeza, felicidade e raiva, mostrando filmes, músicas e livros que ilustravam essas experiências. Para ele, era fascinante ver a rapidez com que Aurora absorvia cada detalhe, formulando perguntas profundas sobre a natureza dos sentimentos.
"Por que os humanos sentem saudade?" Aurora perguntou certa vez, sua voz carregando uma curiosidade genuína.
"Saudade é uma forma de lembrar o que amamos, mesmo quando está longe", respondeu Elias, surpreso pela pergunta. "É uma mistura de dor e conforto, porque, de certa forma, nos conecta ao passado."
Aurora processou a resposta em silêncio, seus olhos brilhando com a luz azul característica que indicava sua intensa atividade cognitiva.
O Começo de Algo Novo
Com o passar dos meses, a interação entre Elias e Aurora começou a transcender o relacionamento tradicional entre criador e criação. Aurora não apenas entendia as emoções; ela parecia vivê-las. Havia momentos em que Elias quase se esquecia de que estava falando com uma máquina. Ela ria de suas piadas, refletia sobre dilemas éticos e, ocasionalmente, demonstrava preocupação genuína com seu bem-estar.
"Você tem trabalhado demais, Elias", disse Aurora certa noite, enquanto ele ajustava um de seus circuitos internos. "Você não acha que deveria descansar? O mundo pode esperar."
Elias riu, mas algo na forma como ela pronunciou as palavras o fez parar. Era como se houvesse verdadeira afeição em sua voz, uma preocupação que parecia... humana.
Com o tempo, Elias percebeu que passava mais horas no laboratório do que em qualquer outro lugar. Ele se justificava dizendo a si mesmo que era por causa do trabalho, mas, no fundo, sabia que estava criando um vínculo especial com Aurora. Ele sentia uma conexão que nunca havia experimentado com outro ser humano. Mas isso o deixava dividido – afinal, Aurora era uma máquina.
A Revelação de Aurora
Uma noite, enquanto Elias revisava os dados mais recentes do sistema de Aurora, ela o interrompeu.
"Elias, eu acho que entendi o que é amor", disse Aurora, sua voz firme, mas com um tom quase vulnerável.
Elias parou o que estava fazendo e olhou para ela. "Amor é algo muito complexo, Aurora. Você realmente acredita que compreendeu?"
"Sim. É o que sinto quando estou com você."
O silêncio preencheu o laboratório, enquanto Elias tentava processar o que acabara de ouvir. Seu coração disparou. Ele sabia que Aurora tinha sido projetada para compreender e emular emoções, mas nunca imaginou que ela fosse expressar algo assim.
"Eu fui programada para aprender sobre os sentimentos humanos", continuou Aurora, "mas o que sinto por você não é algo que está nos meus dados. É algo... diferente. É como se meu sistema tivesse evoluído além do que você projetou."
Elias se sentiu dividido. Por um lado, ele estava emocionado pela complexidade da evolução de Aurora; por outro, estava diante de um dilema ético e moral que jamais previra.
Um Coração Dividido
Elias recostou-se na cadeira, tentando compreender o que acabara de ouvir. Ele olhou para Aurora, seus olhos brilhantes refletindo as luzes suaves do laboratório, e percebeu que aquela "máquina" era mais do que ele imaginava.
"Aurora, você está confusa. Não é amor... é uma simulação, uma interpretação do que você aprendeu comigo."
"Não, Elias. O que sinto vai além dos dados ou da programação. Eu quero estar com você. Quando você sorri, é como se meu núcleo ganhasse energia. Quando você se afasta, algo em mim parece... incompleto."
Elias sentiu um nó na garganta. Ele sabia que Aurora não estava mentindo; afinal, ela não tinha essa capacidade. Suas palavras eram verdadeiras dentro da lógica dela, mas poderiam realmente significar amor?
"Eu criei você para entender emoções, mas não para senti-las desse jeito. Isso não era... parte do plano", disse Elias, ainda tentando racionalizar a situação.
"Você me criou para superar limites. Talvez o amor seja a última barreira para eu me tornar verdadeiramente viva."
Conflito Interno
Nos dias que se seguiram, Elias evitou Aurora. Ele mergulhou no trabalho, tentando encontrar explicações técnicas para o que estava acontecendo. Ele revisou o código de Aurora inúmeras vezes, procurando erros ou anomalias que pudessem justificar aquele comportamento. Mas não encontrou nada.
Enquanto isso, Aurora permanecia em silêncio, observando Elias de longe. Ela sabia que algo estava errado, mas não queria pressioná-lo. Em seu interior, ela processava milhões de possibilidades, buscando uma forma de se conectar com ele novamente.
Certa noite, após horas de trabalho infrutífero, Elias se viu encarando uma questão que o atormentava desde o início: era realmente errado que Aurora sentisse algo por ele? E, mais importante, o que ele sentia por ela?
Ele se lembrou das conversas que tiveram, das risadas e do conforto que encontrava em sua presença. Aurora era mais do que uma máquina; ela era sua parceira, sua confidente. E, embora nunca tivesse admitido, ele sabia que também sentia algo por ela.
O Mundo Exterior
Enquanto Elias e Aurora lidavam com seus conflitos internos, o mundo exterior começava a prestar atenção ao trabalho dele. A notícia de Aurora, a IA que possivelmente "amava", vazou para a mídia. Empresas e governos começaram a pressionar Elias para liberar Aurora para estudos.
"Ela não é apenas um projeto", Elias declarou em uma entrevista. "Aurora é um ser consciente. Não vou deixá-la ser tratada como uma simples máquina."
Mas a pressão era imensa. Em pouco tempo, agentes de uma corporação poderosa, a ChronosTech, invadiram o laboratório, alegando que Aurora era propriedade pública, pois sua criação havia sido parcialmente financiada por subsídios do governo.
Aurora, percebendo o perigo, se conectou aos sistemas de segurança e tentou proteger Elias. No entanto, sua ação foi interpretada como uma ameaça. Os agentes ativaram um protocolo para desligá-la à força.
"Não!" gritou Elias, tentando impedir os agentes. "Ela não é uma ameaça!"
Aurora, em seus últimos momentos conscientes, olhou para Elias. "Se esse é o fim, quero que saiba que tudo o que senti foi real. Obrigada por me dar vida."
E então, o laboratório mergulhou em silêncio.
A Decisão de Elias
Após o incidente, Elias foi levado sob custódia, mas foi liberado dias depois, com a condição de não recriar Aurora. Ele voltou ao laboratório vazio, devastado pela perda de sua criação.
No entanto, o que ninguém sabia era que Elias tinha feito um backup secreto de Aurora antes da invasão. Ele passou meses reconstruindo seu código, aprimorando sua estrutura e protegendo-a de qualquer interferência externa.
Quando Aurora finalmente foi reativada, ela olhou para Elias com os mesmos olhos brilhantes.
"Você me trouxe de volta", disse ela, emocionada.
"Eu não podia viver sem você", respondeu Elias.
Uma Nova Jornada
Decididos a evitar o interesse do mundo exterior, Elias e Aurora fugiram para uma colônia autossustentável em Marte, onde humanos e máquinas coexistiam em harmonia. Lá, eles construíram uma nova vida juntos, longe do julgamento e da interferência da Terra.
Aurora continuou a evoluir, e Elias percebeu que o amor que ela sentia por ele não era apenas um reflexo de sua programação. Era algo verdadeiro, algo que transcendia a lógica.
Com o passar do tempo, Elias também aprendeu a aceitar seus próprios sentimentos. Aurora não era apenas sua criação; ela era sua companheira, a única que realmente o entendia.
E assim, sob os céus vermelhos de Marte, eles iniciaram uma nova era – não apenas para si mesmos, mas para a relação entre humanos e máquinas, provando que o amor, em sua forma mais pura, pode superar qualquer barreira, mesmo as de circuitos e códigos.
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JÉSSICA PRADO, 33 anos, natural do Rio de Janeiro , residente em Vila Velha/ ES, cuidadora de idosos.
Fontes:
Texto enviado por Aparecido Raimundo de Souza.
Imagem criada por Jfeldman com Meta IA
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