Nascimento em 23.8.1851 Após ler Antônio Chimango de Amaro Juvenal (Ramiro Barcelos).
1
Disse Amaro Juvenal,
e aqui fala Tio Simplício,
pra que algum outro patrício
cantasse n´algum fandango,
“o mais que fez o Chimango”,
e eu me proponho a este ofício.
2
E, para tal, a cordeona
já vou sacando da mala,
atiro pra trás o pala
e me sento neste banco,
também pra lhes ser bem franco,
mando que limpem a sala.
3
E depois de tudo aquilo
que o Chimango fez na estância,
ainda teve a arrogância
de intitular-se buenacho,
mas sabemos que o muchacho
já foi maula desde a infância.
4
E tudo o que era bom
para ele não prestava,
proibiu o jogo de tava
e também o de baralho,
exigia muito trabalho,
quanto a ele, só mandava !
5
Pois assim desta maneira
muita coisa transcorria,
se cumprindo a profecia
que a cigana lhe fizera,
rancho virando tapera
e no campo pouca cria...
6
No seu desmando total,
sem compreender mais ninguém,
se dizia gente bem,
pois para trás não olhava,
sabendo que em Caçapava
sempre foi um joão-ninguém.
7
E tendo as rédeas na mão,
não precisava de esmolas,
mandou fechar as escolas
em tudo que foi vivenda,
pra que ninguém mais aprenda
e venha pisar-lhe a cola.
8
Com seu rebenque de couro
era sempre o manda-chuva,
não ajudava nem viúva
que inda chorava o finado,
e por ser do seu agrado
só mandava plantar uva.
9
E quando sentava à mesa,
primeiro pedia o vinho,
embora nunca sozinho,
sempre andava prevenido,
pois isto tinha aprendido
nos tempos do seu padrinho.
10
Mandou esparramar o gado
que se adentrou pelos matos,
coberto de carrapatos,
de bernes e de bicheiras;
nesta sequencia de asneiras
iam se passando os fatos.
11
E a tropa magra berrava
na coxilha e na canhada,
a velha estância arruinada
não tinha mais salvação,
tudo caindo pra o chão,
tudo virando em nada.
12
Não se carneava mais,
pois adeus carne no espeto
e no fogo de graveto,
crepitando no galpão
sapecava-se pinhão,
cozinhava-se feijão preto...
13
E no verão a canjica,
no inverno a batata-doce,
tudo isso o tempo trouxe
para a Estância de São Pedro
e todos levavam medo
que pra sempre assim fosse.
14
Era tudo racionado,
não se comia “a la farta”,
desta forma a sina aparta
o tempo que se passou bem,
a miséria sobrevém
e se come até lagarta.
15
Os velhos tauras sentados
ao derredor do fogão,
tomavam o chimarrão
com erva caúna, amarguenta,
enferrujava a ferramenta,
não se afiava facão.
16
Abandonado, ao relento,
lá fora estava o rebolo,
até o próprio monjolo
não batia noite e dia;
a peonada sofria,
pitando um pobre crioulo.
17
Não se domava mais potros
com firmeza e precisão,
era tudo redomão,
pra não dizer aporreado
e por todo o descampado
aquela desolação.
18
No campo o pasto está raro
em meio a caraguatás;
sem aprender, os piás
iam cruzando a existência,
tendo apenas por experiência
aquilo que vida traz.
19
Nos bolichos de campanha
somente havia cachaça,
sinuelo da desgraça
que conduz qualquer gaudério
aos bretes do cemintério
onde se entrega a carcaça...
20
O minuano mais brabo
trazia seu frio de morte,
a estância na pobre sorte
em que se encontrava, aflita,
não havia china bonita
que o nosso viver conforte.
21
O velho pago de outrora
se transformou num repente
naquilo que o guasca sente
quando tudo se transforma,
obedecer era a norma,
ficar quieto, prudente !
22
Ninguém se manifestava
neste estado de cousas,
somente as pobres esposas
iam parindo seus filhos,
as éguas os seus potrilhos,
e as viúvas chorando em lousas.
23
Não se tinha mais notícia
do que acontecia no mundo,
na macega o vagabundo
procurava um agasalho,
pois fugindo do trabalho
se embrenhava nestes fundos.
24
A velha estância sofria
o que nunca tinha passado,
e quem fora bem mandado
hoje de nada valia,
quando tinham melancia,
o mogango era guardado.
Disse Amaro Juvenal,
e aqui fala Tio Simplício,
pra que algum outro patrício
cantasse n´algum fandango,
“o mais que fez o Chimango”,
e eu me proponho a este ofício.
2
E, para tal, a cordeona
já vou sacando da mala,
atiro pra trás o pala
e me sento neste banco,
também pra lhes ser bem franco,
mando que limpem a sala.
3
E depois de tudo aquilo
que o Chimango fez na estância,
ainda teve a arrogância
de intitular-se buenacho,
mas sabemos que o muchacho
já foi maula desde a infância.
4
E tudo o que era bom
para ele não prestava,
proibiu o jogo de tava
e também o de baralho,
exigia muito trabalho,
quanto a ele, só mandava !
5
Pois assim desta maneira
muita coisa transcorria,
se cumprindo a profecia
que a cigana lhe fizera,
rancho virando tapera
e no campo pouca cria...
6
No seu desmando total,
sem compreender mais ninguém,
se dizia gente bem,
pois para trás não olhava,
sabendo que em Caçapava
sempre foi um joão-ninguém.
7
E tendo as rédeas na mão,
não precisava de esmolas,
mandou fechar as escolas
em tudo que foi vivenda,
pra que ninguém mais aprenda
e venha pisar-lhe a cola.
8
Com seu rebenque de couro
era sempre o manda-chuva,
não ajudava nem viúva
que inda chorava o finado,
e por ser do seu agrado
só mandava plantar uva.
9
E quando sentava à mesa,
primeiro pedia o vinho,
embora nunca sozinho,
sempre andava prevenido,
pois isto tinha aprendido
nos tempos do seu padrinho.
10
Mandou esparramar o gado
que se adentrou pelos matos,
coberto de carrapatos,
de bernes e de bicheiras;
nesta sequencia de asneiras
iam se passando os fatos.
11
E a tropa magra berrava
na coxilha e na canhada,
a velha estância arruinada
não tinha mais salvação,
tudo caindo pra o chão,
tudo virando em nada.
12
Não se carneava mais,
pois adeus carne no espeto
e no fogo de graveto,
crepitando no galpão
sapecava-se pinhão,
cozinhava-se feijão preto...
13
E no verão a canjica,
no inverno a batata-doce,
tudo isso o tempo trouxe
para a Estância de São Pedro
e todos levavam medo
que pra sempre assim fosse.
14
Era tudo racionado,
não se comia “a la farta”,
desta forma a sina aparta
o tempo que se passou bem,
a miséria sobrevém
e se come até lagarta.
15
Os velhos tauras sentados
ao derredor do fogão,
tomavam o chimarrão
com erva caúna, amarguenta,
enferrujava a ferramenta,
não se afiava facão.
16
Abandonado, ao relento,
lá fora estava o rebolo,
até o próprio monjolo
não batia noite e dia;
a peonada sofria,
pitando um pobre crioulo.
17
Não se domava mais potros
com firmeza e precisão,
era tudo redomão,
pra não dizer aporreado
e por todo o descampado
aquela desolação.
18
No campo o pasto está raro
em meio a caraguatás;
sem aprender, os piás
iam cruzando a existência,
tendo apenas por experiência
aquilo que vida traz.
19
Nos bolichos de campanha
somente havia cachaça,
sinuelo da desgraça
que conduz qualquer gaudério
aos bretes do cemintério
onde se entrega a carcaça...
20
O minuano mais brabo
trazia seu frio de morte,
a estância na pobre sorte
em que se encontrava, aflita,
não havia china bonita
que o nosso viver conforte.
21
O velho pago de outrora
se transformou num repente
naquilo que o guasca sente
quando tudo se transforma,
obedecer era a norma,
ficar quieto, prudente !
22
Ninguém se manifestava
neste estado de cousas,
somente as pobres esposas
iam parindo seus filhos,
as éguas os seus potrilhos,
e as viúvas chorando em lousas.
23
Não se tinha mais notícia
do que acontecia no mundo,
na macega o vagabundo
procurava um agasalho,
pois fugindo do trabalho
se embrenhava nestes fundos.
24
A velha estância sofria
o que nunca tinha passado,
e quem fora bem mandado
hoje de nada valia,
quando tinham melancia,
o mogango era guardado.
***
Canoas - RS, 1972 - na Rua da FAB próximo ao Rancho do Pára Pedro, do saudoso José Mendes, onde o autor conheceu e conviveu com muitos tradicionalistas.
Fonte:
Textoe imagem enviados pelo autor
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