domingo, 29 de setembro de 2024

Jaqueline Machado (“Nascimento e morte da dona de casa”, de Paola Masino)

 
“Nascimento e morte da dona de casa” é um livro do século XX, escrito pela escritora italiana Paola Masino. 

Conta a história de uma menina que não se encaixava em seu ambiente familiar. A menina estava sempre empoeirada. E a mãe fazia chantagem emocional dizendo-lhe que ia morrer de desgosto. E a criança, sentindo-se culpada, procurava encontrar nos jornais, casos de gente, que por ventura, teria morrido de desgosto. Não queria ser a causadora da morte da própria mãe, mas não encontrou nenhum caso parecido.

Deitada num armário que tinha função de cristaleira, cama, mesa e quarto cheio de retalhos, farelos de pão, livros e detritos de funerais, como flores, pregos, véus de viúvas, pó que caía do teto...  Cobria-se com um cobertor mofado, ligava a lâmpada, lia, ou ficava a refletir sobre assuntos de morte.

Ela era diferente, tinha um estilo meio gótico e filosófico de ser. E por este motivo, era negligenciada pela mãe, que não lhe dava carinho. 

Tinha um sonho recorrente, em que teias de aranha ao redor e sobre ela a enredavam como se ela fosse a presa de uma aranha. Depois dormia encolhida e trêmula. Mas gostava de ficar dentro do baú. Ali, a menina podia ser ela mesma.

Com a cozinheira, ia ao supermercado, mas não prestava atenção nas prateleiras. Olhava para o chão, para os saltos das mulheres pisando nas frutas estragadas. E pensava nas antigas dinastias que ainda viviam ali embaixo.             

Observava os ventres dos bois pendurados em ganchos de ferro nas vigas dos açougues, com seus órgãos esvaziados, cravados nos metais que foram arrancados do ventre da terra. Ela via a violência do ser humano até no modo de alimentação.

A garota era uma filósofa nata, e devaneava sobre a natureza e a morte. - O céu e a terra também vivem e morrem. - Pensou na primeira vez que viu o próprio sangue (menstruação). Era um momento vermelho e dolorido. E o comparou ao pôr do sol, que também era vermelho e devia ser sofrido a cada encerramento de dia.

O tempo passou. E ela vendo o incessante desgosto da mãe, resolveu mudar, tomar banho, se vestir melhor, se comportar igual as outras jovens de sua idade, arranjar um noivo e casar. A mãe, feliz, foi em busca de pretendentes. Mas, por ser muito exótica, ninguém queria casar com ela. Até que alguém aceitou. E ela se tornou uma dona de casa. E em seu lar, seguindo todas as normas exigidas pela sociedade, viveu e morreu sem poder ser quem ela de fato era. 
Fonte: Texto enviado pela autora

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