Ao anoitecer, o sogro convidou o genro para dormir e disse:
— Esta escuridão parece as trevas da cegueira.
O genro ficou triste porque era cego de uma vista, mas nada respondeu.
Noutra ocasião, de noite, ficaram a conversar. O genro disse;
— O luar está tão brilhante como uma careca luzidia e far-nos-á mal se ficarmos cá fora,
O sogro entrou em casa sem se despedir e o genro também se retirou.
Ao fim de três dias, o sogro consultou seis pessoas de respeito acerca do insulto recebido. Elas mandaram chamar o genro e o sogro.
Na presença de todos, o velho descreveu circunstanciadamente o motivo que originou o conflito. Ao concluir, disse:
— Permito-lhe que continue com a minha filha, mas não o considero mais como amigo. Sei que sou calvo, mas por que é que ele me atirou à cara esse insulto? Portanto, recuso a sua amizade.
O genro, convidado a falar, expôs:
— Eu não teria dito isso se o meu sogro não me tivesse insultado primeiramente. Fi-lo só depois de ele ter feito alusão à cegueira, propositadamente para me magoar, porque ele sabe que eu sou cego de uma vista. Agora os senhores decidam.
Os velhos responderam:
— Realmente foste insultado e não fizeste mais do que retribuir a ofensa. Assim não há motivo de desavença entre sogro e genro. Voltai a ser amigos, esquecendo ressentimentos. Tu, sogro não tens outro filho senão o teu genro e se, como mais velho, foste indelicado, ele como mais novo, seguiu o mau exemplo recebido. Não vale a pena continuarem a discutir por uma coisa já sem importância.
E foram beber à saúde de ambos, que voltaram a ser amigos.
Fonte: José Viale Moutinho (seleção). Contos populares de Angola: folclore Quimbundo. SP: Aquariana, 2012.
Nenhum comentário:
Postar um comentário