Atualmente essa expressão serve para qualificar uma narrativa ou alguma coisa que é extemporânea, absurda, improvável, extraordinária e que não parece verdadeira. Quem não conhece as histórias do “arco-da-velha” ou as coisas do “arco-da-velha", para indicar algo remoto, muito antigo, do tempo do ronca. Mas como surgiu essa expressão tão corriqueira?
Ainda do século XIX, “arco-da-velha” era empregado para descrever o arco-íris. E a própria Bíblia narra como surgiu o primeiro arco-íris. Em Gênesis 9:16, Deus afirma que o arco-íris “serve como lembrança de uma aliança feita por Deus com o homem, aliança que indicava que Ele não voltaria a enviar um dilúvio para destruir a vida na Terra”.
E “velha”, qual seria o motivo? O que uma senhora em idade provecta tem a ver com esse fenômeno meteorológico? Ainda é a Bíblia que subentende que o termo “velha” representa a velha e indissolúvel aliança que Deus firmou com o homem, razão pela qual o arco-íris também é conhecido como arco-da-aliança.
Em suas origens portanto, “arco-da-velha” não queria dizer que algo ou um episódio é muito antigo, mas que é incrível, fantástico, surreal, pois abstraindo sua explicação bíblica, o arco-íris, com sua incrível e multifária (multiforme) beleza, sempre se cercou de fabulações delirantes, como a do pote de ouro, ou que ele está bebendo água - quando seus extremos tocam a superfície do mar, de um rio ou de um lago - ou até a suposta e fantasiosa mudança instantânea de sexo de quem o vê bem de perto, resultando dessa última assertiva, sua utilização como símbolo mundialmente aceito das opções sexuais do ser humano.
Há quem especule no sentido de que o correto seria “arca-da-velha” porque “arca” e “baú” possuem o mesmo significado, bastando lembrar que nossas avós e bisavós guardavam seus pertences, suas relíquias e os seus tesouros pessoais ou familiares em suas arcas de madeira, “fechadas a sete chaves”.
Uma história do arco-da-velha seria, portanto, uma narrativa tirada “do baú de uma anciã”. O conhecido “conto da carochinha” era usado com essa mesma intenção, neste caso, derivado de “carocha”, expressão do regionalismo português que significa feiticeira, uma mulher velha e assustadoramente feia. Daí o sentido de muito antigo, com que se invoca “Arco-da-Velha”, que oscila entre a Bíblia e o paganismo, sem que se possa atribuir a sua origem a um, com exclusão completa do outro. Mas é induvidoso que ambas as fontes contribuíram no decorrer do tempo, para o absoluto sucesso dessa expressão.
Existe uma copiosa produção literária, principalmente de livros infantis, contando as histórias do “arco-da-velha”, sendo uma das mais antigas o livro editado em 1913 pela Quaresma e Cia. Livreiros Editores, do escritor Viriato Padilha, assim como denominações em músicas, livrarias, brechós, antiquários, cafés e demais estabelecimentos comerciais onde se vendem antiguidades, encontrados em qualquer cidade brasileira.
Arco da Velha dá nome a uma das melhores bandas de fado portuguesas e isso demonstra a popularidade da expressão, aqui e na terra de Camões. Mas o que melhor se extrai da expressão são mesmo as muitas histórias “do arco-da-velha” que contam por aí, algumas com pouca ou nenhuma verossimilhança com a realidade.
Quem já foi a Caxias do Sul teve a possibilidade de visitar a excelente Livraria e Café “Do Arco da Velha” um local muito bonito, famoso pelo atendimento impecável e pela infinita variedade de livros, temas e gêneros, tudo isso com a possibilidade de saborear um excelente café, desses ambientes acolhedores e convidativos, onde o cliente é capaz de passar o dia todo.
Na música, o Grupo Arco da Velha é um sucesso com seu repertório de consagrados cantores da MPB com o CD do mesmo nome e a playlist da Kboing com famosos interpretes internacionais. É algo que vale a pena ouvir. Finalmente, o livro infantil da escritora Elida Ferreira denominado “Histórias do arco-da-velha” (Bagaço, 3.ª edição, ano 2019), ricamente ilustrado, dá conta que dona Iaiá, que transformava tudo que chegava às suas mãos em brinquedo, encantava a todos contando lindas e antigas histórias. Quem de nós não ouviu tantas delas, na nossa saudosa infância?
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CÉLIO SIMÕES DE SOUZA é paraense, advogado, pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho, escritor, professor, palestrante, poeta e memorialista. É membro da Academia Paraense de Letras, membro e ex-presidente da Academia Paraense de Letras Jurídicas, fundador e ex-vice-presidente da Academia Paraense de Jornalismo, fundador e ex-presidente da Academia Artística e Literária de Óbidos, membro da Academia Paraense Literária Interiorana e da Confraria Brasileira de Letras (Floresta/PR). Foi juiz do TRE-PA, é sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, sócio correspondente do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, fundador e membro da União dos Juristas Católicos de Belém e membro titular do Instituto dos Advogados do Pará. Tem seis livros publicados e recebeu três prêmios literários.
Fontes:
Texto enviado pelo autor.
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing
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