sábado, 2 de agosto de 2025

José Feldman (Um Parque de Diversões não muito divertido)

Era uma tarde ensolarada quando Jorge decidiu levar seus dois filhos, Lucas e Ana, ao parque de diversões. Ele havia prometido isso há semanas, mas, para ser sincero, não estava tão animado quanto eles.

Lucas: — Papai, vamos no trem fantasma primeiro?

Ana: — Não! Eu quero ir na roda-gigante!

Jorge: — (pensando) Roda-gigante… tudo bem. Vamos começar por lá.

Ao chegarem, as crianças ficaram deslumbradas com as luzes e os sons do parque.

Ana: — Olha, papai! A roda-gigante é enorme!

Lucas: — E as montanhas-russas! Vamos nelas depois?

Jorge: — (sorrindo nervosamente) Primeiro a roda-gigante, então. Isso é… tranquilo.

Depois de uma longa fila, eles finalmente subiram na roda-gigante. Enquanto subiam, Lucas estava radiante, mas Jorge começou a suar frio.

Lucas: — Olha, papai! Estamos lá em cima!

Jorge: — (engolindo em seco) Sim, muito alto… Lindo, não é?

Quando chegaram ao topo, Lucas estava extasiado, mas Jorge olhava para baixo, imaginando o que aconteceria se ele caísse.

Lucas: — Papai, olha a vista!

Ana: — (pulando de alegria) É incrível!

Jorge: — (murmurando) Incrível… sim… muito bom…

Assim que desceram, Lucas estava pulando de alegria, enquanto Jorge respirava aliviado, pensando “Nunca mais quero ir na roda-gigante!”

Ana: — Vamos no algodão-doce!

Jorge: — (suspirando) Algodão-doce é bom. Vamos lá!

Na barraca de doces, Jorge pediu um algodão-doce gigante e dois sorvetes.

Vendedor: — Isso vai te custar caro!

Jorge: — Caro?  Porque? É só açúcar!

Vendedor: — Exatamente! E açúcar custa caro!

Enquanto pagava, Lucas e Ana estavam distraídos com um palhaço que fazia malabarismos.

Lucas: — Papai, eu quero aprender a fazer isso!

Jorge: — Primeiro, você precisa de um pouco de prática… e coragem!

Com as guloseimas em mãos, foram para a área de jogos. Jorge decidiu tentar a sorte em um jogo de arremesso de argolas.

Jorge: — Vou ganhar um prêmio para vocês!

Ele arremessou as argolas, mas errou todas.

Ana: — Papai, você não sabe jogar!

Lucas: — Deixa eu tentar!

Lucas pegou as argolas e, com toda a sua força, lançou uma. Acertou em cheio, mas não foi na garrafa, foi na cara do homem da barraca.

Lucas: — O que foi isso? Eu só queria ganhar um urso!

Homem da barraca: — E eu tenho cara de urso?

Jorge: — Desculpe, senhor. Vamos tentar mais uma vez, mas tenta não acertar este senhor… quem sabe?

Após várias tentativas, conseguiram ganhar um pequeno peixinho de pelúcia.

Ana: — Que lindo! Vamos dar um nome a ele!

Lucas: — Que tal “Nemo”?

Ana: — Não, “Peixinho Alegre”!

Lucas: — “Peixinho Alegre” é ótimo! Agora, que tal uma volta na montanha-russa?

Os olhos de Jorge se arregalaram.

Jorge: (pensando) Montanha-russa… será que eu consigo?

Lucas: — Papai, vem com a gente!

Relutante, ele decidiu acompanhar os filhos. Ao subir na montanha-russa, seu coração estava batendo mais rápido do que o trem.

Ana: — Isso vai ser incrível!

Lucas: — Vamos gritar juntos!

Quando o trem começou a descer, Jorge gritou mais alto do que todos, enquanto Lucas e Ana riam.

Jorge: (gritando) Isso é uma loucura!

Ao final do passeio, Lucas e Ana estavam gritando de alegria, mas seu pai estava mais pálido que um avental de médico.

Lucas: — Papai, você gostou?

Jorge: — (ofegante) Gostei… um pouco… talvez… nunca mais!

Ana: — Vamos de novo!

Jorge: — (com um sorriso forçado) Sério????

Lucas: — Que tal outra roda-gigante?

Após mais algumas voltas na roda-gigante, finalmente era hora de ir para casa. As crianças estavam exaustas, mas cheias de alegria.

Jorge: — E então, o que vocês acharam do dia?

Lucas: — Foi o melhor dia de todos!

Ana: — Podemos voltar no próximo fim de semana?

Jorge: — (sorrindo) Claro! Desde que a gente evite a montanha-russa…

Os três riram juntos enquanto caminhavam para o carro, já planejando novas aventuras, e Jorge pensava que, apesar do medo, o sorriso dos filhos valia cada grito e cada centavo gasto.
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JOSÉ FELDMAN, poeta, trovador, escritor e gestor cultural. Formado em patologia clínica trabalhou por mais de uma década no Hospital das Clínicas. Foi enxadrista, professor, diretor, juiz e organizador de torneios de xadrez a nível nacional durante 24 anos; como diretor cultural organizou apresentações musicais. Morou na capital de São Paulo, em Taboão da Serra/SP, em Curitiba/PR, Ubiratã/PR, Maringá/PR. Consultor educacional junto a alunos e professores do Paraná e São Paulo. Pertence a diversas academias de letras, como Academia Rotary de Letras, Academia Internacional da União Cultural, Confraria Luso-Brasileira de Trovadores, Academia de Letras de Teófilo Otoni, etc, possui os blogs Singrando Horizontes desde 2007, e Pérgola de Textos, um blog com textos de sua autoria, Voo da Gralha Azul (com trovas do mundo). Assina seus escritos por Floresta/PR. Dezenas de premiações em poesias e trovas no Brasil e exterior.
Publicações de sua autoria “Labirintos da vida” (crônicas e contos); “Peripécias de um Jornalista de Fofocas & outros contos” (humor); “35 trovadores em Preto & Branco” (análises); e “Canteiro de trovas”.. No prelo: “Pérgola de textos” (crônicas e contos) e “Asas da poesia”

Fontes: 
José Feldman. Peripécias de um jornalista de fofocas & outros contos. Maringá/PR: Plat.Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul.
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Rachel de Queiroz (O Amistoso)

Os visitantes ou adversários, convidados para aquela partida amistosa do chamado esporte bretão, chegaram festivamente num caminhão ornado de arcos e guirlandas. Sim, no começo tudo são flores. Flores e palmas, discursos, garrafas de cerveja, e os cartolas, que se distinguem dos demais presentes pelos bonitos ternos domingueiros, gravatas, chapéus de seda, como convém a legítimos paredros.

Não havendo no campo instalações de vestiário, os craques descem do carro já devidamente uniformizados — camisa de azul-turquesa, meias e chuteiras, sim, chuteiras regulamentares, que isso é jogo de fato e não pelada de moleques. Deficiências, se as há, é no campo propriamente dito, que seria ótimo se não sofresse de uma depressão bem no seu centro geométrico, exatamente onde se costuma riscar aquele grande círculo de giz. E como essa praça de esportes se situa numa baixada, sempre que chove apresenta o aspecto de um prato fundo cheio de água — e quando não é água é lama.

Naquele dia, felizmente, era apenas lama, e pouca. E sob os aplausos da assistência, tanto mais animada porque gratuita (ainda é um problema a resolver, esse da assistência em campo aberto, sem possibilidades de bilheteria). Juiz, jogadores, cartolas, reúnem-se um pouco de lado, pois que os paredros (dirigentes, líderes) estão de sapatos novos e aquela supracitada lama os assusta um pouco; faz-se o jogo, os visitantes pegam o lado sul que é o melhor, o presidente dos locais dá graciosamente o primeiro chute. Começou a partida!

1.° TEMPO

Xaveco, mulato, brevilíneo de canelas arqueadas, revela imediatamente a sua classe de grande artilheiro: tem fôlego, tem velocidade, tem cada tiro direito ou canhoto — tanto faz — que arranca aplausos frenéticos da torcida. Outra grande figura em campo é o goleiro dos visitantes. E o jogo vai indo muito bem, bola para lá e para cá, passe, cabeçada, chute a gol, gol — não, gol não, passou por cima da trave. O couro vai para Bira, Bira perde para um galalau amarelo dos “estrangeiros”, o galalau perde para Zico, Zico passa para Lucas, que perde para o capitão dos visitantes, um louro de gorro de meia. Aí Xaveco interfere na raça, toma a bola, o louro tranca, Xaveco dá-lhe uma carga, o louro acha ruim, revida, o juiz apita, os dois se agarram e por trás chega Bira, que é gordo e violento, e larga um pontapé no terço inferior da coluna vertebral do louro. Fecha-se o tempo, o juiz apita, a assistência pula a cerca e invade o campo, o pau começa a comer, mormente nas costas dos forasteiros, o juiz retira-se e se encosta à cerca, aguardando aparentemente que os ânimos serenem. Quem interfere são os paredros, austeros e educados, com as suas gravatas ao vento, chamam asperamente os craques à ordem, expulsam a assistência, interpelam o juiz, que relutantemente volta ao seu posto; aos poucos os craques se acomodam, o juiz apita, os paredros recolhem-se. O jogo recomeça.

Mas parece que o incidente estimulou os visitantes, que dão para jogar milhões. São uns húngaros. O time local perde terreno, o galalau passa a marcar Xaveco, que não dá mais uma dentro. E o diabo do louro tornou-se proprietário do balão, marca um gol de saída, depois o seu “secretário”, um crioulinho ligeiro que é uma faísca, marca o segundo tento; e aí Xaveco, desesperado (talvez dentro da área penal), atira uma canelada terrível no galalau, derruba-o, avança no crioulo, larga-lhe o salto da chuteira por cima do dedão, o crioulo grita, o louro acode, Xaveco já completamente louco lhe dá um tapa na cara, o juiz apita, uns gritam falta outros gritam pênalti, e um engraçado diz que foi só mãos, já que Xaveco apenas meteu a mão na lata do loureba.

O juiz continua apitando, parece que vai mesmo marcar o pênalti. E um torcedor local puxa o revólver, dizendo que aquele pênalti só se for passando por cima de algum cadáver. O juiz nessa altura se declara cheio com a partida e larga o apito ali mesmo. Um paredro fala que ele será expulso do quadro de árbitros e o juiz dá troco, que quadro de árbitros uma ova. Mas um dos bandeirinhas voluntários logo se apossa do apito, passa a dirigir o pessoal com surpreendente autoridade e, quando se vê, o jogo começa outra vez. Vai macio, vai de valsa, é um minueto, até que consultados os cronômetros verifica-se que acabou o primeiro tempo, passando-se ao recesso para em seguida dar início ao

2 ° TEMPO

que não houve, segundo passo a expor. Pois não vê que no Distrito havia uma queixa contra Bira — queixa dada por certa donzela que deixara de o ser por artes do craque. Bira escondera-se e só agora aparecia em público, atendendo a apelos da torcida, por tratar-se de amistoso importantíssimo. Mas a polícia, que não tem bandeira, aproveitara a ocasião e, antes que o réu pirasse, dava-lhe voz de “esteje preso”.

A assistência, entretanto, que de nada sabia, cuidou que a prisão se prendia à queixa dos visitantes por causa do pontapé de há pouco. E vendo Bira ser arrastado campo a fora, irrompeu num sururu dos diabos, vaiando as visitas com buus e nomes feios; as quais visitas, que tomavam Coca-Cola encostadas à cerca, vendo-se atingidas não só pelos doestos (provocações) como por pedaços de pau e tijolo, revidaram com as garrafas de refrigerante. O tempo fechou outra vez. Os polícias largaram o preso e se meteram no conflito. E quando os de fora começavam a apanhar feio, o motorista deles teve uma ideia: encostou o caminhão bem perto e tocou a buzina. A turma entendeu logo (ou quem sabe já era manobra habitual em “amistosos”?) e de um em um foram deslizando da briga e subindo para o carro. O que sei é que, quando os locais deram pela coisa, os inimigos já partiam numa nuvem de poeira, abandonando na pressa um dos seus paredros, malferido, com o sangue escorrendo do nariz e o belo terno roto.

Bira, igualmente, aproveitara a confusão para ir saindo de manso; agachado numa moita, lá em cima do morro, ficou a espiar o tintureiro chegar, encostar e, de um em um, recolher os remanescentes da refrega. E só saiu do esconderijo tarde fechada, quando no campo completamente deserto uma garça vinda do Jequiá sobrevoava o alagado, bicando restos das flores do buquê ofertado pelos visitantes.
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RACHEL DE QUEIROZ foi uma das mais importantes escritoras brasileiras do século XX. Pertencente à geração modernista de 1930, também trabalhou como jornalista e foi a primeira mulher a ingressar na Academia Brasileira de Letras. Nasceu em Fortaleza, Ceará, em 1910 e ali viveu até os cinco anos de idade. Mudou-se com a família para o Rio de Janeiro em virtude da terrível seca que assolou o Ceará em 1915. Em 1917, mudou-se para Belém/PA e, em 1919, retornou para o Ceará, onde fixou residência. Iniciou sua carreira jornalística escrevendo para o jornal O Ceará quando tinha apenas 17 anos. Aos 19 anos, começou a escrever, em segredo, o romance que a tornaria conhecida como escritora: O Quinze. Com a publicação do livro, em 1930, a autora tornou-se nacionalmente conhecida e ganhou o prêmio da Fundação Graça Aranha. Em 1964, integrou o Conselho Federal de Cultura e o Diretório Nacional da Arena, partido político de sustentação do regime militar. Além do prêmio da Fundação Graça Aranha, a escritora também ganhou diversos outros prêmios, como o Prêmio Jabuti de Literatura Infantil, em 1970, e o Prêmio Camões, a maior honraria dada a escritores de língua portuguesa, em 1993. Rachel de Queiroz faleceu em 2003, no Rio de Janeiro, aos 92 anos de idade. 
No começo de sua carreira, nos romances O Quinze (1930) e João Miguel (1932), a autora alinha-se a escritores como Graciliano Ramos, José Lins do Rego e Jorge Amado, em uma escrita voltada para o regionalismo, denunciando a seca nordestina, a miséria, a desigualdade e indiferença dos poderosos diante da penúria do povo. Em 1937, escreveu Caminho de pedra, romance notadamente com inclinações políticas de esquerda, escrito enquanto a autora estava presa durante a ditatura de Vargas. No romance As três Marias (1939), a autora apresenta um estilo mais intimista, com uma narração voltada para o psicológico das personagens, tematizando a adolescência feminina. Além dos romances, a autora também escreveu peças de teatro, livros infantojuvenis e, principalmente, dedicou boa parte da vida escrevendo crônicas para jornais. Em 1992, Rachel de Queiroz publicou seu último romance, Memorial de Maria Moura, livro que conta a saga de uma cangaceira nordestina. Dois anos depois da publicação, a obra foi adaptada para uma série de televisão.

Fontes:
O Melhor da Crônica Brasileira. RJ: José Olympio, 2000.

José Francisco Cagliari (O Desabafo de um Lápis Preto)

– Olá, meu nome é John Faber; sou filho de dona Madeira e do senhor Grafite. O nome estrangeiro não é mania de grandeza não. Aliás, grandeza é o que eu não tenho. Além de ser magrinho, eu sou daquele tipo que ao nascer começa a ficar pequeno, ao invés de crescer.

Sou negro, mas não sofro com problemas de preconceito racial ou, pelo menos, não sofria até pouco tempo.

Meu avô sempre me contava suas histórias. Ele nascera e já começara a trabalhar num escritório. Lá ele fazia de tudo: escrevia cartas, fazia anotações, desenhos, contas. O que não fazia era assinar cheques; não tinha autoridade para isso. O pior, segundo ele, era trabalhar tanto e, quase sempre, a senhorita borracha desfazer tudo. Meu pobre avô se cansou e morreu. Depois de muitos “desapontamentos”, não aguentou e sucumbiu vítima de uma gilete. Ele, que sempre esteve com os papéis, acabou embrulhado no lixo. A senhorita borracha também faleceu, vítima do “desgaste” e do stress.

Eu, como sou novo ainda, não tenho emprego, mas creio que as coisas ainda vão piorar. Meu pai foi despedido. É que o chefe contratou uma lapiseira, e agora nós somos considerados obsoletos. Minha mãe está perdendo o lugar para o plástico. Minha irmã, a caneta, está passando muito mal. A tinta acabou e não há ninguém para doar para ela. Assim, a nossa geração está sendo “apagada” do mapa. E pensar que se não fossem meus ancestrais, Castro Alves não seria ninguém. É, a vida está dura. Bem que meu avô dizia: “ser um lápis é um risco”.

Fontes:
I Concurso Literário/ Associação Paulista do Ministério Público. 1.ed. São Paulo: Edições APMP, 2010. p.49
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Lino Mendes (Baú de Memórias) A Serração da Velha

Trata-se de uma tradição muito antiga, datada possivelmente do século XVII e que se festejava  na noite de quarta-feira da terceira semana da “Quaresma”.

Era, como se deduz uma festa pagã, hoje quase desaparecida no nosso país, festejava-se de maneira diferente de terra para terra, tendo como ponto comum, o “testamento”.

Mas, o que simbolizava  a “Serração da Velha”?

Dizem uns que com a mesma se pretende” celebrar o renascimento da Natureza e a expulsão dos demônios do inferno”, enquanto outros referem tratar-se de “um rito de expulsão da morte,” ou mesmo de “ um ritual de passagem mercado pelo desejo simbólico de renovação”.

Terras havia onde as “serradas” eram as velhas que acabavam de ser “avós” ou solteironas que ainda” queriam casar”. Na maioria as pessoas de idade  nem apareciam à janela e quando o faziam era para lhes dar troco, atirando-lhes com um balde água e não poucas vezes urina. Mas também havia quem lhes abrisse a porta, lhes oferecia qualquer coisa, evitando assim a “serração”. Claro que o boneco que simbolizava a velha era queimado no final.

Talvez possamos definir a “Serração da Velha”— nalguns lados também chamada de “ Serra da Velha” e “Serra das Velhas”—“como  o enterro do  Inverno e o início da Primavera”, que marca um interregno lúdico no calendário religioso.

E em Montargil, como era?

Não temos muitos elementos, diremos mesmo que temos poucos. Que me  lembre, não havia “boneca”, recordo-me vagamente, de uma “serração”, feita   há uns cinquenta /sessenta anos. A garotada fazia barulho, com matracas ou batendo em tábuas, ao mesmo tempo que diziam os seguintes versos:

Serre-se a velha “Barrinha”
lá do outro lado da ribeira,
Onde está a comer perna de burro
Pensando que é farinheira.

Mas o Freitas. Mais velho uns anitos, diz-nos que batiam em latas fingindo que iam a serrar, e lembra-se ainda de duas quadras:

Serre-se a Angélica do Zé Mestre
que ela está a roer num pau;
deixou tudo aos Bexigas
não deixou nada aos carapaus.

 Serre-se a velha Maria Luísa,
serre-se e torne-se a serrar,
porque ela tem ossos tão duros,
que nem a serra quer entrar.

Como se pode ver pela segunda quadra, a “serração” incidia algumas vezes em casos da vida real. Mas o que mais uma vez é evidente, certo que desconhecendo os costumes das terras vizinhas, é a enorme diferença em relação a outras terras.

Não há boneca que no final seria queimada, o que aqui acontecia durante a queima dos “compadres”  e das “comadres”; não havia testamento, o que por aqui se verificava no final do “Enterro do Entrudo”. E por falar em testamento, e quando não se fazia o “enterro”, o senhor “António Júlio” também aparecia no Outeiro apregoando as “ deixas” que de maneira satírica” contemplavam algumas figuras da terra.
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Lino Mendes é folclorista de Montargil/ Portugal. Administrativo responsável durante vários anos da Segurança Social em Montargil. Vereador do Município de Ponte de Sor. Diretor da rádio  em Montargil. Músico executante nas Bandas de Montargil e Abrantes. Delegado Distrital da Associação Portuguesa de Teatro de Amadores. Colaborador de dezenas de jornais e colaborador de diversas rádios, tendo sido cronista de Rádio Renascença (Évora). Colaborador do jornal Folclore.  Conselheiro Técnico Regional para Alentejo da Federação do Folclore Português e da Associação de Folcloristas  do Alto Alentejo. Realizou a investigação etnocultural da freguesia de Montargil. Diploma e Medalha Grau Ouro— como reconhecimento pela dedicação e fidelidade ao Folclore Português – 2009. Medalha da Câmara Municipal de Ponte de Sor. Medalha da Casa Portuguesa de TROYS – França. Prémio Excelência  do jornalismo por Serviços prestados ao jornal SOL PORTUGUÊS Toronto Canadá – 2010;2011;2012;2013 e 2014. 

Fonte:
Texto enviado pelo autor. 06.04.2013
Dados Biográficos = Edições Vieira da Silva 
Imagem = Wikipedia

Helena Parente Cunha (O Pai)

Aquele cansaço de existir, aquela gosma impregnando os ossos, os músculos, os tecidos, o sangue estagnado sob a pele desbotada, nem mesmo um gesto a se estender no ar, ela parada na porta, nem indo nem vindo, só ali, não se mexendo, há quanto tempo a última alegria? o último sorriso? cansaço, esforço inútil de respirar, gosma grudando o ar e a parca luz do quarto fechado, cada um na sua bolha fofa e fria, frágil fio por partir num sopro.

O pai parado na porta entre o quarto e agora. Por que você chegou tarde? Onde já se viu moça de família na rua a estas horas? Você sabe que horas são? Há anos são dez horas da noite, nunca mais amanheceu. Quem é aquele vagabundo que estava com você na saída da escola? A manhã inteira esfregando a saia de flanela azul pregueada no banco, o quadrado da hipotenusa é igual à soma do quadrado dos catetos, no universo nada se perde, tudo se transforma. Tudo se transforma em quê? Quem é aquele sacana que estava com você na saída da escola? A escola, sempre a escola. Professora ou aluna, sempre a escola. Diante da turma, que vontade de mandar todos os alunos para aquele lugar, que horror, de que adianta ensinar o teorema de Pitágoras? As meninas esfregando nos bancos as calças blue jeans, o que é cateto? Já pensou, o quadrado do cateto?

O pai parado na porta, entre o triângulo e a buzina do carro. Quem é aquele desgraçado que lhe deu carona? São dez horas da noite no universo inteiro e tudo se transforma em triângulos exatos. Quem é aquele… Pelo amor de Deus, pai, eu tenho quarenta anos, até quando você vai pedir satisfações de minha vida? Desculpe, pai, papaizinho, eu rasguei meu vestido brincando no quintal, desculpe.

O pai parado na porta, entre a boneca e a tarde. Quem é aquele menino que estava correndo na rua atrás de você? Você não sabe que é feio menina brincar com menino? E o muro? Você não sabe que menina não sobe em muro? Desculpe, papai, eu só queria ver o que havia do outro lado. Do outro lado do muro havia o havia. As meninas se encontravam com os meninos atrás do muro. Mas papai, eu quero tanto ir ao aniversário de Teresinha, não tem nada demais, eu já estudei, já fiz todos os deveres, estou cansada. Cansaço gosmento na cabeça, nos olhos inchados.

O pai parado na porta, entre o barulho dos ônibus e o tapa. Quem é aquele rapaz que estava conversando com você na esquina? Não tem nada de quinze anos nem nada, sua mãe nunca conversou comigo sozinha antes do casamento. Mas papai, a gente não mora na roça.

O pai parado na porta, entre o caixão que saía e o retrato da mãe vestida de noiva, o retrato pendurado na parede. De agora em diante, minha filha, você tem que tomar conta de seu pai, fazer companhia a ele, seja uma boa filha. Namorar? Quem é aquele miserável que quer desgraçar a sua vida? Você não tem pena de seu pai? Você sabe que horas são? Onde já se viu escola terminar a esta hora? Que reunião que nada. A escola, sempre a escola. Os ângulos de um triângulo somam 180°. Por quê? Nunca, mas nunca mesmo poderá mudar? Esta soma será eternamente mesma num universo onde nada se perde e tudo se transforma? Nada se perde, nem os dias nem os anos nem as horas, nada se perde, mas tudo se transforma num monturo de lembranças rançosas de tudo que não pôde ser no baile de formatura. Professora, sim, senhora, parabéns. A parentada toda despejou-se do interior, aqueles parentes tabaréus, as mulheres com o rosto todo caiado de pó de arroz, os homens com as cabeças engorduradas de brilhantina, todos atarantados junto dela, que vergonha, as tias e as primas enfiadas nos vestidos de tafetá chamalotado, cheios de franzidos, sem saberem se seguravam as bolsas ou os chapéus de palha enfeitados de flores as mais indefectíveis, ah que vergonha, os ternos desajeitados de casimira listrada dos tios e dos primos amarrados às gravatas de cores desgovernadas, sim senhora, parabéns, professora, a primeira aluna de toda a faculdade, vejam só, ela estudou na faculdade, pena que a mãe não esteja mais na terra pra ver, coitada.

Em todo o correr dos anos, tudo se transforma. Pitágoras, não, nem se perde nem se transforma, irredutível na sua exatidão geométrica, os alunos se transformam, os alunos esfregando os bancos, as calças cáqui de brim, os blue jeans, você é menino ou menina?

O pai paradíssimo na porta, entre um ano e outro ano. Quem é aquele sujeito que estava com você no ponto de ônibus? Ah! é uma amiga, este mundo está perdido e você ainda reclama porque eu me preocupo com você. Hoje nós vamos ao cinema juntos. Hoje nós vamos ao aniversário de sua tia. Por que você quer sair sozinha? Filha ingrata, eu faço tudo para lhe distrair e você fica aí toda emburrada. Domingo que vem nós vamos passar o dia em Itaparica na casa de seu padrinho (mas papai) você não quer ir por quê? Você tem que espairecer.

O pai parado na porta, entre um anúncio e um comprimido. Ainda bem que você chegou cedo, vamos ver a novela das oito na televisão. É boa esta novela, eu gosto muito de novela, você precisa ver novela, distrai muito. Sim, papai, de agora em diante, eu vou ver todas as novelas, a das seis a das sete a das oito a das dez, tem das onze? Não, é bom que não tenha porque a gente dorme cedo, você tem que acordar cedo para ir à aula. Por que você quer fazer curso de pós-graduação? Pra quê? Bobagem, minha filha, você já estudou muito, trabalha muito, já não é criança, de noite precisa descansar. Sim, o cansaço, tanto cansaço, torpor guardando os membros e os pés no chão, não quero sair não, papai, vamos ver televisão.

O pai parado na porta, entre a bengala e o catarro. Quem é aquele velho sem-vergonha que saiu com você da escola? Será possível que você não sabe o que os outros vão pensar? Mas papai.

O pai parado na porta, atravessado entre a hora de sair e a hora de nunca mais. Papai?

Cansaço. Cansaço de existir. Ela parada na porta, entre ficar e não sair, o corpo colado numa gosma nem fria nem quente, um amarrado nos ossos, um grude se enfiando pelos poros, alguém tocou a campainha? Ninguém entra ninguém sai, o teorema de Pitágoras demonstrando para sempre até as mais densas profundezas do cansaço essencial. O quadrado do sim é igual à soma dos quadrados de todos os nãos incendiados na medula. Cansaço de viver e não viver. Nada se perde nada se ganha. O universo inteiro transformado num atoleiro bolorento de esquecimentos do que nunca aconteceu em nenhum dia, em nenhuma hora, atrás do muro da escola, onde houve um menino e uma menina.
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Helena Gomes Parente Cunha nasceu em Salvador, 1930 e faleceu em 2023 . Formou-se em Letras pela Universidade Federal da Bahia em 1952. Dois anos depois, foi para Perúgia, para estudar língua, literatura e cultura italiana na Università Italiana Per Stranieri. Em 1956 começou a trabalhar como tradutora. Mudou-se em 1958 para o Rio de Janeiro, onde fez o mestrado na UFRJ. Prosseguiu a carreira acadêmica com o doutorado na UFSC e o pós-doutorado na UFRJ. Foi professora do curso de Letras da UFRJ até aposentar-se, em 1997, continuando a atuar como professora emérita ar do Departamento de Pós-Graduação em Letras (Ciência da Literatura) da mesma universidade, atuando na linha de pesquisa “Literatura comparada e imaginários culturais". Alguns livros publicados: 1968 - Corpo no Cerco (Poesia); 1980 - Maramar (Poesia); 1995 - O Outro Lado do Dia: Poemas de uma Viagem ao Japão (Poesia); 2005 - Cantos e Cantares (Poesia); 1980 - Os Provisórios (Conto); 1985 - Cem Mentiras de Verdade (Conto); 1996 - A Casa e as Casas (Conto); 1982 - Mulher no Espelho (Romance); 1989 - As Doze Cores do Vermelho (Romance); 2002 - Claras Manhãs de Barra Clara (Romance); 2003 - Marcelo e Seus Amigos Invisíveis (Infantil).

Fontes:
CUNHA, Helena Parente. Os provisórios. RJ: Antares, 1990
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sexta-feira, 1 de agosto de 2025

Guirlanda de Versos * 39 *

 

Renato Frata (Final de semana)

É sexta-feira, passa das cinco, minha vista se turva diante de um sol que tremelica enquanto pende a se esconder. Então, comparo-o com meu estado de resistência e vejo que sua aparência como a minha, é de cansaço.

Hora de arriar as velas, depor as tralhas e sossegar, afinal, nem o sol é de ferro. Ambos passamos o dia trabalhando.

Ele vagueando à potência máxima de iluminação e eu, por ter me atido às coisas da profissão e da família, em busca do necessário. A bem da verdade, admiro-o pela compostura séria, ereta, resistente, persistente, renhida com que tenta vencer todo o expediente sem demonstrar a indisposição do cansaço que sinto num fim de tarde, especialmente numa sexta.

Disfarça-se bem. Eu, já não consigo.

Porém, ao se enfiar no horizonte, noto que sua figura escurecida deixa a entender que o tremor da luz, ao se despedir, cobra-o de certa forma pelo esforço dispendido, o que torna, também, ao que parece, seu caminhar mais lento. Tal como o meu que a essa hora age como se eu tivesse acumulado gotinhas de chumbo nos pés, uma porção delas no arcar das costas e outras pela dificuldade de as venezianas dos olhos reterem o ardor emanado.

Olhos em brasa sem estar de fogo. Pode? A tela do computador fala que sim.

Olhando-o, porém, com esse enlevo pela visão displicentemente dirigida ao céu, noto que procura abrigo para se aninhar, e o faz sem pressa de indicar exatamente onde se encolherá, mas sabidamente num colo de montanha acinzentada, perdida pelo horizonte. E dali, como que em posição fetal, submergirá envolvido pelo vermelho enegrecido, a lhe servir de manto.

Magistralmente, nesse exato instante, a noite, a seu modo, assume o lugar espalhando raios lunares, e resplandece a paz que da lua brota.

 céu da sexta ganha um brilho especial porque ela, lua, na sua magnificência elementar, simplesmente clareia sem nos perguntar se estamos cansados ou não e, como tivesse mãos mágicas, põe em nossos pés vitalidade, nas costas o conforto, e congraçamento nos olhos a nos fazer de novo descansados para mais uma jornada, essa de lazer; afinal, sexta não é para se ficar em casa.

Não é sempre que aproveitamos a oportunidade de bisbilhotar o céu nesses tempos loucos em que o relógio obriga a que olhemos sem enxergar, sem distinguir contornos, saliências, reentrâncias e nuanças. Nesse caso, com ou sem lua, hibernamos, e não damos conta de que perdemos horas preciosas da vida que segue... sem que ocasiões retornem.

Perder a sexta é perder a semana.

A pressa que damos à vida, agindo como se disputássemos um lugar junto ao próprio sol procurando mais sombra, tira-nos a certeza de que teremos o sábado e o domingo para guardarmos nossa armadura, banhá-la, lustrá-la e deixá-la pronta até a próxima segunda quando poderemos, de novo, seguir o astro nas suas andanças livres, soltas e belas e fazer dos dias da semana a espera pela próxima sexta.
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Renato Benvindo Frata nasceu em Bauru/SP, radicou-se em Paranavaí/PR. Formado em Ciências Contábeis e Direito. Professor da rede pública, aposentado do magistério. Atua ainda, na área de Direito. Fundador da Academia de Letras e Artes de Paranavaí, em 2007, tendo sido seu primeiro presidente. Acadêmico da Confraria Brasileira de Letras. Seus trabalhos literários são editados pelo Diário do Noroeste, de Paranavaí e pelos blogs:  Taturana e Cafécomkibe, além de compartilhá-los pela rede social. Possui diversos livros publicados, a maioria direcionada ao público infantil.
Fontes:
Renato Benvindo Frata. Crepúsculos outonais: contos e crônicas.  Editora EGPACK Embalagens, 2024. Enviado pelo autor.
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing 

Tércia Montenegro (O Vendedor de Judas)

A cidade era outra. Pequena, habitantes escassos. Uma igrejinha só. Duas praças, a lagoa sinuosa e o casarão dos políticos. Não havia cadeia, que o povo era manso. Briga de desonra se resolvia entre famílias; com o boato fervilhando, tudo se ajeitava de pronto. Os crimes de faca nunca aconteciam antes da Serra Branca, fronteira a mais de légua.

Ele chegou; apeou-se. Janelas abriram-se, curiosas, a ver quem surgia de onde e para quê neste fim de mundo. As informações saíam lentas, cheias de reticências, com gosto de pergunta:

– Olhe… hotel aqui… O senhor só acha a pensão da Malvina. Naquela esquina, sabe? Pode ir que tem vaga. Quase ninguém aparece visitando este canto… Sabe?

Ele saiu no rumo indicado. Admiravam-lhe o cavalo de pelo marrom. Algumas mocinhas vieram à calçada, desfazendo tranças.

De manhã, D. Malvina a custo conseguiu atravessar a rua. A cidade inteira parecia rodeá-la, com vozes atabalhoadas de anseio. Quase gritou:

– Mas já disse que não sei de nada! O homem veio, trancou-se no quarto, jantou por lá mesmo. E acorda agorinha, se vocês não me param com esta zoeira!

Um mulato arriscou, por detrás de umas senhoras:

– E a mala? Um malão daquele tamanho! Ele disse o que tem dentro?

D. Malvina ia aborrecer-se; hesitou. A multidão eriçava com a pergunta. Mais um pouco e os ânimos subiriam à rebeldia.

– Disse que era coisa para vender. – E completou rapidamente: – Não faço ideia do que seja.

Alguns se dispersaram, satisfeitos com a dúvida. A maioria ainda quis acompanhar por uns metros a dona da pensão. O prefeito apareceu, voz grossa sob o farto bigode. Ordem geral: todos para seus afazeres e ele próprio para casa, indagar da esposa se ela adivinhava os detalhes do que já se fazia mistério.

O desconhecido continuou a provocar assunto, suscitar apostas. A hora do almoço no bar do Rufino era o momento mais esperado, tanto pelos homens, que lá iam tentar o fio da prosa com o forasteiro, como pelas jovens casadoiras, que arrastavam olhares e vestidos do lado de fora.

Ao fim de três dias, a notícia, dada pelo dito-cujo, ele mesmo, frente a várias testemunhas:

– Sou vendedor. Fabrico judas. É trabalho de ano inteiro. Antes de chegar a Páscoa, saio vendendo o estoque por esse interior. Cada boneco, uma cidade.

Decepção. Aquilo já era conhecido: a festa da queima do apóstolo traidor. Há décadas o velho Aníbal costurava uns espantalhos forrados de palha e os doava, simplesmente, para serem amarrados nas árvores. Agora teriam de comprar judas? Melhor não haver festa; Judas nunca valeu tostão furado.

O desconhecido parecia esperar aquela reação. Pediu que o acompanhassem ao hotel (assim ele chamava a pensão) para mostrar o produto de seus dons artísticos; obra-prima sempre destruída, no final das contas.

Maravilharam-se. O boneco era perfeito, de feições nítidas, esculpidas na madeira clara. Olhos e sobrancelhas eram pintados; o cabelo vinha em peruca, sem falha ou emenda. O judas se vestia com um paletozinho cáqui muito jeitoso, flor de plástico na lapela. Até sapatos tinha.

Daquele jeito, haveria de custar fortuna. O forasteiro explicou que fazia os bonecos em série – e mostrou outros dois, igualmente trabalhados –, o que barateava a compra de matéria-prima. Além disso, utilizava madeira oca e frequentemente apodrecida, com revestimento de pano. Tudo na aparência belo, mas, em verdade, feito para acabar numa só noite.

E mais um tanto de palavreado. O quarto sufocante; uma dúzia de homens. Quando o preço foi mencionado, não causou grande espanto. Pediriam fundos à prefeitura; afinal, era uma festa popular, para todo mundo. Devia ser bem comemorada.

O Sábado de Aleluia amanheceu em alvoroço. Grupos de mulheres congestionavam a praça, examinando o judas dependurado no cajueiro. Os homens repetiam as explicações do vendedor, gesticulando muito. Apareceu o velho Aníbal, cara fechada, acompanhando o prefeito. Deu umas apalpadelas no ventre do boneco. Comentou, na estranheza:

– Não está certo.

O prefeito assentiu, nariz torcido sobre o bigode.

– Também acho. Desperdício comprar um troço desses, tão bem-feito, justo para a fogueira.

Aníbal nem escutou. Cheirava a roupa do judas, batia-lhe com os nós dos dedos no corpo de madeira clara. Sacudiu o boneco; o galho ameaçou se quebrar. Alguns protestaram:

– Ó velho, cuidado! Desse jeito estraga o serviço.

Não adiantou tentar explicações. Em pouco tempo, todos levantaram a voz ao antigo vendedor, que este ano guardara os judas, rejeitados, de palha. Praticamente o expulsaram da praça:

– Vá, seu despeitado!

Aníbal desertou, olhos baixos. Ruminava para si, para seus pés cobertos de poeira:

– Não está certo… Não.

E, após o "Ite missa est", quando todos corriam de tochas acesas, o velho foi o único a ver, perto da Serra Branca, a minúscula figura do homem montado num cavalo marrom. Ia embora, à procura de outra cidade, que esta – ouvia-se pelo estrondo – explodia em nuvens de pólvora, guardadas no ventre de um boneco traidor.
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TÉRCIA MONTENEGRO nasceu em Fortaleza, Ceará, em 1976. Tem graduação em Letras, mestrado em Literatura Brasileira e doutorado em Linguística pela Universidade Federal do Ceará. Publicou os livros de contos O Vendedor de Judas (1998), que recebeu o prêmio Funarte, e Linha Férrea (2001), que recebeu a Bolsa para Escritores Brasileiros da Biblioteca Nacional e venceu o Prêmio Redescoberta da Literatura Brasileira, promovido pela Revista Cult, em 2000. Escreveu ainda o ensaio biográfico Oliveira Paiva (2003) e participou das antologias 25 mulheres que estão fazendo a nova literatura brasileira (2004), Contos Cruéis (2006) e Quartas Histórias – contos baseados em narrativas de Guimarães Rosa (2006). O livro de contos “O resto de teu corpo no aquário”, recebeu o Prêmio Secretaria da Cultura do Estado do Ceará em 2004. Em 2005, recebeu os prêmios Osmundo Pontes e Fran Martins, pela Academia Cearense de Letras. Tem dois livros infantis, Um pequeno gesto (2006) e O gosto dos nomes (2006).

Fontes:
MACIEL, Nilto. In Literatura sem fronteiras.
Biografia = http://contosbrasileiros.blogspot.com/. Acesso 16;11.2009 (blog removido)

Celia Musilli (Nas alturas)

Os aviões são meu sonho de Ícaro, as asas metálicas que tomo por empréstimo.

Por um destes acasos que não se explicam, sempre morei em locais que são rotas dos aviões. Em dois bairros onde vivi era assim e agora ouço os jatos logo de manhã, entre 7 horas e 8h30, vindos dos lados da UEL em direção ao aeroporto.

Adoro aviões e sei que muita gente tem medo de viajar neles. Eu não, considero este risco uma experiência necessária, uma aventura necessária, como o amor. Alguém aí tem cem por cento de segurança em matéria de voo? Alguém aí tem cem por cento de segurança em matéria de amor? Em qualquer um dos casos, decolem.

Os aviões são meu sonho de Ícaro, o transporte que me leva às nuvens, as asas metálicas que tomo por empréstimo como se eu mesma voasse. Porque voar pra valer não consigo e não teria despojamento nem coragem de me meter com asas-delta, porque nelas sim me sentiria vulnerável, sem o anteparo das paredes e das janelas, dos outros passageiros logo ali ao lado, das simpáticas aeromoças que perguntam: ”Água, suco ou refrigerante?” Não tive a felicidade de beber champanhe indo a Paris. Quem me dera. Mas cruzei céus indo a Manaus e Belo Horizonte, São Paulo, Curitiba, Rio, Fortaleza e São Luís do Maranhão. E, no litoral, a visão do mar dá a impressão de estarmos sobrevoando o paraíso, porque o paraíso, na minha cabeça, é líquido e azul. Se não líquido, pelo menos úmido e transparente.

Lá de cima, em vez de anjos, vemos os recortes das matas, das praias, das montanhas e isto basta para que a gente acredite em Deus. Alguém já disse que não vemos Deus, mas o sentimos. Eu sou do tipo que acredita muito mais no que sente, do que naquilo que vê, as imagens nos iludem.

Os aviões me lembram a ousadia de Santos Dumont, que não sei como teve a coragem de entrar naquele 14 Bis, tão frágil que até parecia um origami. Um origami voador, vejam só. Mas foi ele, um brasileiro, quem deslumbrou Paris quando deu a volta à Torre Eiffel para realizar o sonho de Ícaro sem queimar as asas. Construiu desta forma uma espécie de imortalidade, sendo, antes de tudo, um sonhador. Um sonhador que realizava.

Gosto das músicas que falam em avião, algumas falam também de amor: ”Foi por medo de avião, que eu segurei pela primeira vez a sua mão.” Lembram?

Mas de vez em quando, os acidentes aéreos nos assustam, colocando todo mundo em pânico, porque pra este tipo de acidente não tem saída, não tem meio termo, não tem volta. Raramente alguém sobrevive, só um em mil, então as pessoas sentem-se mais seguras nas rodovias do que no ar. Mas vou confessar uma coisa a vocês: me apavoram muito mais as estradas cheias, aqueles caminhões-tanque, os motoristas imprudentes, sobretudo nesta época do ano, quando todo mundo quer chegar ou partir, sabe-se lá pra onde e por que têm tanta pressa.

Sinto-me muito mais segura no ar, apesar dos acidentes sem volta. Porque morte por queda de avião é coisa rápida e urgente. Além disso, lá em cima as aeronaves raramente se chocam, ninguém derrapa na curva, ninguém compete em velocidade. Lá em cima, as nuvens parecem um colchão macio ou um rebanho de carneirinhos que só se insinuam e, um minuto depois, se desmancham. Então, que coisa mais lúdica e linda é estar entre as nuvens. Muito melhor do que respirar óleo diesel, sentir as freadas, revoltar-se com as imprudências, errar o caminho, não ver as placas.

Gosto de acordar ouvindo os aviões que decolam ou aterrissam, alguns passam até bem perto da minha janela, enquanto durmo ou agora, enquanto escrevo, porque assim também me sinto no ar. Estar no ar, além do sonho de Ícaro, é sonho de poeta, sonho de maluco, sonho de quem não vê Deus, mas o sente, e acredita Nele, lá nas alturas. E acho que assim o avião não cai.
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CÉLIA MUSILLI nasceu em Cornélio Procópio/PR em 1957 e reside em Londrina/PR. Graduou-se em Comunicação Social-Jornalismo pela Universidade Estadual de Londrina em 1988 e tornou-se mestre em Teoria e História Literária pela Universidade Estadual de Campinas em 2014. É jornalista e editora de Cultura da Folha de Londrina, tem textos, crônicas e poemas publicados nas revistas Agulha, Coyote, Celuzlose, Germina, Diversos e Afins, Jornal Cândido, Oceano de Letras, Poesia Sempre, InComunidades (Portugal), Revista da Biblioteca Nacional, etc. Publicou o livro Londrina Puxa o Fio da Memória, em parceria com Maria Angélica Abramo, e o livro de poesias Sensível Desafio (AtritoArt, 2006) e edita o blog de mesmo nome.

Fontes:
Folha de Londrina. Folha 2. 6 de dezembro de 2009. p.4
Dados biográficos = Universidade Estadual de Maringá
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Aparecido Raimundo de Souza (O que fazer diante do abismo que nos encara com olhos devoradores?)

 MEUS CAROS LEITORES, confesso que muitas vezes, em minha vida, me senti como se estivesse à beira de um abismo. E pior, me flagrei olhando diretamente para um fosso gigantesco com o rosto em pânico, assustado, temeroso, tudo por conta da imensidão que ele me mostrava, ou seja, um fantástico cenário que se estendia diante de meus receios com sinais tétricos e devoradores. Com isso, o amor que outrora não me sustentava a contento, de repente, do nada, me deu forças e me fez sentir vivo. Em dias de hoje, meu ontem me parece apenas uma lembrança distante. A dor da perda (não importa qual perda tenha sido) me acompanhava. Era como um peso insano que esmagava, tornando difícil as mínimas coisas, inclusive, o respirar. Nesses idos, me sentia como se estivesse, de fato, caindo, despencando sem rede de segurança, sem nada para me segurar naquele infausto mergulho.

A tal cissura se fazia de concepção profunda e escura, e eu, em certas horas, não atinava em como sair dela inteiro. Ao mesmo tempo, vejam que loucura —, me agasalhava uma estranha sensação de liberdade. Estava alforriado, e me via consciente, para escolher o meu próprio caminho e dentro dele, decidir como seguir em frente. O despenhadeiro podia ser um sujeito chato, pegajoso, fútil, maldoso, de semblante assustador, notadamente de espírito vulgar e sem precedentes, não nego, mas também, em oposto, se me apresentava como uma porta aberta e larga para o desafio. Nessas horas de puro aperreio, eu descobri que não estava sozinho. Que diabo, se não estava sozinho, com quem poderia contar? Com a minha força de superação, com a minha coragem à flor da pele, com a vontade férrea, ou com a ideia imorredoura de querer, com garra e ambição, alcançar os meus objetivos mais prementes. 

Muitas pessoas, tenho conhecimento, já passaram por isso antes de mim. E sobreviveram. Se elas conseguiram, por qual motivo eu não atingiria as minhas metas? Obviamente, nessas horas amargas, não fiquei à espera de um milagre, como John Coffey, (personagem vivido pelo magnífico Michael Clarke Duncan, no filme “À espera de um milagre”). Saí, como aliás, de fato, fui em busca, à procura e à caça de meus objetivos e o mais importante, tendo plena convicção de que encontraria uma maneira de me ver salvo daqueles “desassossegos agourentos”, e, ao final, me levantaria e seguiria vitorioso. Não deu outra.  A vida, bem sabemos, é cheia de altos e baixos, de momentos de alegrias e dores, de aflições e dissabores. E foi justamente no meio dessa mistura catastrófica de emoções as mais diversas e desordenadas, ou à flor da pele, que encontrei a verdadeira beleza da existência. 

Eu aprendi, meus caros amigos e leitores, aliás, tomei consciência diante da imensidão do meu “abismo”, e como superei as dores e descobri as belezas plenas que ainda existiam dentro de mim.  Elas (repetindo, as dores e as aflições) me subsidiaram forças hercúleas para me levantar, sacudir a poeira e marchar. Saibam que é do fundo do poço (ou do abismo) que a gente descobre a majestade e o primor do que conhecemos como “Fracasso” e diante dele, tomar controle, passar as mãos nas ferramentas, aplainar as arestas, desfazer os prós e remover os contras, superabundando os objetivos a serem englobados em nosso querer mais expressivo. E foi também na escuridão dessas horas mais tormentosas que me deparei, ou melhor dito, me encontrei tête-à-tête com a luz forte e majestosa que me guiaria (como diria Clark Kent, na pele do Superman no seriado Smallville) “Para o alto e avante”, em busca do Sucesso.  

Nesse tom belo e formoso, com determinação e coragem, segui, passo a passo, pela borda do tal abismo, até encontrar o outro lado, onde a Esperança me esperava radiante e carismática, esfuziante e o melhor de tudo, de braços abertos. E a Esperança —, indagarão vocês: como veio? Sem medo de errar, sinalizaria que ela chegou como um sorriso inesperado, que quebrou, de pronto, a escuridão reinante e me trouxe à claridade ideal e no ponto certo ao “meu eu”. Uma magnitude se apossou de mim como um toque gentil que por sua vez despertou a força interior e não deixou esquecer do que eu seria capaz de superar e ultrapassar meus próprios medos e incertezas. A Esperança veio, (ou melhor me expressando) VIROU e sempre virará, haja o que houver e acontecerá como um sopro benfazejo, igual um sussurro silencioso e calmo, tranquilo e acolhedor que me dirá constantemente ao pé do ouvido “Tudo ficará bem, as dores passarão e a sua alegria voltará mais coesamente inquebrantável e indestrutível”. 

Os meus amigos e leitores me perguntarão: diante desses percalços, como reconhecer esse “sussurro silencioso” ao qual me refiro?  E o mais intrigante. Se esse “sussurro é silencioso,” como identificá-lo? Simples como tirar um pacotinho de balas de uma criança sentada sozinha no portão da sua casa. O “sussurro silencioso” ao qual me referi, nada mais é que um sentimento de paz que entrará em cena no “oculto”, que mora dentro de cada um de nós. Ele se fará reconhecido, lado igual, como aquele toque de paz que surgirá no ausente de barulho, ou naquele momento de clareza que iluminará as nossas sendas. Talvez seja um alegrar interior, um sentimento de confiança que emergirá do mais profundo existente dentro de nós. Talvez seja um sinal sutil, como um raio de sol que atravessará as nuvens, ou poeticamente se assemelhará ao canto de um pássaro que devorará o mavioso embutido dentro do próprio som inexistente. 

Mais do que qualquer sinal externo, o “sussurro silencioso” se apresentará para nosso deleite, como um sentimento opulento que nascerá no recôndito de nosso âmago. É um saber, um sentir, um intuir anunciando que tudo ficará bem, sinalizando, outrossim, que sou forte o suficiente para superar os desafios (por maiores que sejam) e que, por fim, a tal sonhada e lúdica Esperança estará ao meu alcance. A Esperança veio, como uma brisa suave, um gesto que acariciaria a alma e iluminaria o caminho. Viria, como veio, da mesma forma, como um sorriso terno e inesperado, que quebrou, de imediato, a escuridão e trouxe a luz do Poder incandescente sobre a minha desilusão. O renovar bateu em minha porta como um toque gentil, que por seu turno despertou a força interior e me lembrou do que sou capaz de superar qualquer entrave. A esperança veio, ainda, como um presságio inconfundível que me sinalizaria que “tudo ficaria bem, que as dores passariam e que a alegria estaria sempre ao meu lado”. 

O abismo, meus caros amigos, o seu abismo tanto quanto o meu, pode ser superado, não necessariamente extinguindo, mas sim atravessando, rompendo ou...fechando. Como um ponto. O abismo, em resumo, é uma parte de nós mesmos, tipo uma sombra que nos acompanha, mas não nos define. Podemos aprender a conviver com ele, a entender as suas profundezas e encontrar a força motriz para aniquilar quaisquer contratempos. Mandar o abismo para longe não é uma questão de simplesmente eliminá-lo, todavia, uma forma de aprender a lidar com sua presença, a encontrar a incandescência da Paz que abarca as suas profundezas e descobre as raridades nostálgicas e “sempiternais” (tempos eternos) que se escondem em suas entranhas e sombras. É um processo de autoconhecimento, de cura e de transformação. Por isso, quando olho para o meu antigo abismo (quando ele teima em se fazer presente) com coragem e convicção, descubro, deslumbrado, que ele não é tão profundo e denso como parece, ou quando penso, sobretudo, passo a entender que o Foco de energia que emerge de dentro dele, (ou em outras palavras), de dentro de nós, é capaz de iluminar (e, de fato ilumina) até as sombras mais impertinentes e sisudas.

Em resumo, o que fazer diante do abismo que comumente nos encara? Conviver com ele, sem perder a noção do tempo, da vida e das coisas boas. O abismo, caros amigos e leitores, em repeteco, pode ser visto como uma metáfora para a profundidade e a complexidade da alma humana. Sua presença em nossa vida representa os momentos de crise, de desespero ou de perda, quando nos sentimos à beira de um precipício, (como eu descrevi no presente texto), sem saber como prosseguir. No cotidiano, o abismo se refere a uma formação geológica profunda e íngreme, como um “cânion ou uma fossa oceânica”. Esses locais podem ser impressionantes e intimidantes, mas também podem ser “habitats” e, de fato são, únicos e fascinantes para diversas espécies. Como sair deles? Acreditando piamente na “Força” e na “Fé” interiores que estão presente em cada um de nós. 
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Aparecido Raimundo de Souza, natural de Andirá/PR, 1953. Em Osasco, foi responsável, de 1973 a 1981, pela coluna Social no jornal “Municípios em Marcha” (hoje “Diário de Osasco”). Neste jornal, além de sua coluna social, escrevia também crônicas, embora seu foco fosse viver e trazer à público as efervescências apenas em prol da sociedade local. Aos vinte anos, ingressou na Faculdade de Direito de Itu, formando-se bacharel em direito. Após este curso, matriculou-se na Faculdade da Fundação Cásper Líbero, diplomando-se em jornalismo. Colaborou como cronista, para diversos jornais do Rio de Janeiro e Minas Gerais, como A Gazeta do Rio de Janeiro, A Tribuna de Vitória e Jornal A Gazeta, entre outras.  Hoje, é free lancer da Revista ”QUEM” (da Rede Globo de Televisão), onde se dedica a publicar diariamente fofocas.  Escreve crônicas sobre os mais diversos temas as quintas-feiras para o jornal “O Dia, no Rio de Janeiro.” Acadêmico da Confraria Brasileira de Letras. Reside atualmente em Vila Velha/ES.
Fontes:
Texto enviado pelo autor. 
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing  

Nery de Mello (O Poste)

Você já reparou aquele poste? Já observou suas utilidades? Caso não tenha feito te convido a não só observa-lo, mas também admira-lo. Sabe porque? Poste de concreto ou madeira, fixado no solo rochoso ou arenoso, não importa, ele está ali. Na esquina, vinte ou trinta metros um após outro, em fila lá está o poste. Poste grande ou pequeno ele é o poste. Ereto; 45 ou 180 graus para a esquerda ou para a direita não importa ele é o poste. Quem diria, ele foi instalado com dois objetivos: sustentar a rede elétrica e proporcionar iluminação pública. Dois objetivos? Estamos enganados! A sua majestade o poste me faz lembrar um velho ditado popular: “Fazer o bem sem olhar a quem”. E é verdade. Raciocine comigo.

Além de iluminar nossos passos na penumbra da noite, o poste mantém as linhas de energia esticadas para diversas direções. Os benefícios não são somente humanos, valem também para aves que aproveitam a estrutura para a construção de seus ninhos que vai de pequenos galhos e plumas até a sofisticação da casa de barro.

Imagine também que o poste tem um cheiro medicinal. Já reparou esta “qualidade”? Serve como alívio para a bexiga dos cães. Eles se aproximam…Dão uma cheirada…E fazem xixi. Recomendações não valem para os humanos. Mas se estiver apertado, fazer o que!

Faça chuva ou faça sol o poste está ali cumprindo seu ofício.

Contraria a lei da gravidade quando serve de refúgio para o desesperado felino que perseguido vê no poste o melhor amigo. Ufa!

Boêmios também reconhecem a qualidade do poste que por diversas vezes foram “socorridos” pelos tais. O benfeitor é até alvo de piada. Um desavisado caminhava pela calçada quando colidiu contra o poste e completou dizendo: “Meia noite não é hora de poste andar na rua”!

O poste é fonte de inspiração. Um jovem subiu até o topo do poste e lá colou um bilhete. Uma segunda pessoa foi tomada pela curiosidade e depois de alguns esforços chegou até lá para conferir a mensagem que dizia: “Fim de poste”!

Mas, tem mais. Recentemente testemunhei um fato envolvendo um veículo e um poste onde naquela situação inesperada o motorista engatou a marcha á ré e chocou-se com um poste. De quem é a culpa? Do poste! Disparou o condutor. Coitado do poste indefeso.

E saber que num passado bem recente ele andou ameaçado pelo apagão. Se a moda pegasse seria o fim dos dias do poste. Ou não.
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NERY DE MELO nasceu em Francisco Beltrão/PR, em 1970. Iniciou sua carreira na Rádio Cristal de Marmeleiro, em 1986 e trabalhou nas seguintes emissoras de rádio: São João, em São João/PR; Entre Rios, de Santo Antônio do Sudoeste; Princesa AM e FM de Francisco Beltrão/PR; Continental FM e Educadora AM de Francisco Beltrão/PR; Celinauta e TV Sudoeste e Rede Celinauta de Educação de Pato Branco/PR. É apresentador do programa. Plantão Parangolé. pela TV Sudoeste, desde 1996, de segunda a sexta feira. Membro da Academia Palmense de Letras e 1º Orador do Centro de Letras de Francisco Beltrão. Membro da Academia de Letras e Artes de Pato Branco (cadeira n.9). Colunista do Jornal de Beltrão; das Revistas Gente do Sul e Air Press, Revista de Paraquedismo com sede em São Paulo e circulação na América Latina. Cursou jornalismo na Faculdade de Pato Branco/PR.

Fontes:
Academia de Letras e Artes de Pato Branco. http://www.alap.org.br/
Imagem = http://www.opatifundio.com/