Vamos agora ao último aspecto da classificação de trovas:
o da origem. Sob este ângulo, podemos situar a trova em três categorias:
literária, popularizada e popular anônima.
A trova
literária é aquela de autor identificado, isto é, cuja autoria não padece
dúvida, pelo menos para aqueles que se interessam de alguma forma pelo
Movimento Trovadoresco ou pela literatura brasileira. É quase sempre assinada
por trovadores atuantes e/ou de certo renome. Devido a isto, alguns a chamam
também de erudita; preferimos, porém, a outra designação, por julga-la mais
apropriada, embora talvez não seja ainda a ideal. Eis alguns exemplos de trovas
literárias:
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Há tantos burros mandando
em homens de inteligência,
que às vezes fico pensando
que a burrice é uma ciência...
SYMACO DA COSTA
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Tanto se canta e enaltece,
do seu mal tanto se diz,
que saudade até parece
um modo de ser feliz.
ZÁLKIND PIATIGORSKY
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Quanta alegria semeia
quem vive sempre contente:
– A felicidade alheia
também faz feliz a gente.
OCTÁVIO BABO FILHO
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Que o verde é a cor da esperança
vê-se logo que é mentira,
quando o nosso olhar alcança
o céu azul de safira.
MERCÊS MARIA MOREIRA LOPES
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Ame a vida, cante e ria,
da mágoa não seja réu,
que a verdadeira alegria
tem o endereço do céu!
PEDRO GUEDES
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Podendo-se
apontar os autores dessas trovas, que são indubitavelmente aqueles cujos nomes
figuram sob as mesmas, e sendo essa autoria de domínio público, comprovada
através da publicação em livros, jornais e revistas, além da divulgação em
programas radiofônícos, podemos seguramente classificar essas trovas como sendo
literárias.
Passemos
agora às trovas poupularizadas. São aquelas que, caindo no gosto
popular, são decoradas e repetidas pelo povo, incorporando-se praticamente ao
folclore. O autor, como acontece sempre nestes casos, vai aos poucos ficando
esquecido, pois o povo quer saber mesmo é da quadrinha, sem se preocupar em
associar à mesma o nome de quem a compôs. A glória do anonimato é a paradoxal
consagração do trovador. Os autores das trovas popularizadas são geralmente
identificados pelos estudiosos mais atentos do trovismo. Todavia, mesmo entre
os trovadores, são frequentes as controvérsias quanto à autoria de determinadas
trovas popularizadas. Eis dois exemplos de trovas popularizadas:
Até nas flores se encontra
a diferença da sorte:
– umas enfeitam a vida,
outras enfeitam a morte.
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Parece troça, parece,
mas é verdade patente:
– a gente nunca se esquece
de quem se esquece da gente.
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A primeira
destas quadrinhas é de autoria do cigano brasileiro Jerônimo Guimarães, que
viveu no século XIX, e a segunda é do poeta pernambucano Jáder de Andrade.
Milhões de brasileiros conhecem de cor estas duas trovas, mas, desses, quantos
saberão os nomes dos autores? Em se tratando de trovas popularizadas, devemos
ainda dizer que às vezes o povo
resolve modificá-las, por conta
própria, trocando palavras ou adulterando um ou mais versos; quando essas
modificações são bem feitas e não atentam contra a metrificação, pode até mesmo
acontecer que, com o passar do tempo, já não se tenha mais certeza de como era
a trova originalmente.
Na trova de
Jáder de Andrade, por exemplo, o verso inicial, "Parece troça,
parece", já tem sido modificado para “Parece incrível, parece", ou
ainda "É incrível e não parece", enquanto que o resto da trova
permanece o mesmo. Poderíamos citar ainda, como exemplo de trova popularizada,
a conhecidíssima quadrinha de Bastos Tigre:
Saudade, palavra doce
que traduz tanto amargor!
Saudade é como se fôsse
espinho cheirando à flor.
continua… Trovas populares anônimas
Fonte: Aparício Fernandes. A Trova no
Brasil: história & antologia. Rio de Janeiro/GB: Artenova, 1972
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