domingo, 3 de agosto de 2025

Asas da Poesia * 63 *


Poema de
LAIRTON TROVÃO DE ANDRADE
Pinhalão/PR

Acalanto
"Como as tuas carícias são
deliciosas!"(Ct. 4.10)

Minh'alma está triste
Como aquele pombo,
Que na mata, ao longe,
Já perdeu seu ninho;
Se soluça o pombo
Seu amor perdido,
A minh'alma implora
Pelo teu carinho.

Doente está minh'alma
Qual ave ferida,
Que o mau caçador
Acertou-lhe o passo;
Infeliz, o pombo
Se apagando vai,
Eu, porém, protejo-me
No teu meigo braço.

Como aquele pombo,
Triste está minha alma,
Coração partido
A sangrar de dor;
Mas, serei feliz,
Neste dia atroz,
Se em teu seio puro
Repousar eu for.

Ficarei quietinho...
Secarás meu pranto...
Voltará a paz
Pra aquecer-me então...
Os teus lábios dóceis
Roçar-me-ão a face
E terei carícias
De uma leve mão.

Oh, delícia imensa!
Deixarei o mundo!
Fingirei dormir
No teu seio, ó linda!
E acordado, sim,
Sonharei contigo,
Sem eu crer que possa
Estar vivo ainda.
= = = = = = 

Trova de
IZO GOLDMAN
Porto Alegre/RS, 1932 – 2013, São Paulo/SP

És um arbusto florido...
Eu sou o vento que passa,
e, num delírio atrevido,
te despe e depois... te abraça…
= = = = = = 

Soneto de
LUIZ POETA
(Luiz Gilberto de Barros)
Rio de Janeiro/RJ

Testamento

Chegou o tempo inevitável da lembrança
...de repensarmos o que foi a nossa vida.
Se a mesma dor bate no amor, ele revida
com um sorriso necessário... de criança.

Doces memórias nos impelem a passados
...dourados... livres... onde os voos da inocência
ignoravam os arroubos da ciência
e preocupavam-se em criar sonhos alados.

Como brincávamos!!! ...tudo era tão bonito
movido apenas pela nossa ingenuidade
e hoje, imersos na leveza da saudade,
reinventamos nosso amor mais... infinito.

Na previsão de um infarto fulminante
ou de um mal súbito iminente e sem aviso,
nosso sorriso idiota e... tão preciso
ainda teima em enfeitar o nosso instante.

Nós insistimos em criar nossas gravuras
mais pueris... mais inocentes... caricatas,
que apenas contam histórias que nem têm datas,
mas apresentam seus momentos... de ternuras.

São versos... esse é o derradeiro patamar
mais expressivo... são os túneis de memórias,
para que alguém, ao estudar nossas histórias
entenda, ao menos, nosso tempo de sonhar.

As forças faltam, nossos corpos cambaleiam,
Mas nossas mãos ainda insistem: digitamos
Ou escrevemos e, assim, reeditamos
O que sonhamos, esperando que nos leiam.

Que tolos somos! Quem se importa com vivências?
...nossa aparência é um retrato desfocado
De um novo tempo que despreza o passado
Abominando nossas vãs experiências.

Nosso legado? Um objeto precioso,
algum dinheiro, um imóvel, a mobília,
Um carro novo, algum tesouro... e uma família
Tão dividida, querendo o mais valioso.

Noras e genros, retirando suas capas,
Filhos e netos, disputando, após o choro,
O que deixamos... cada um criando num coro
Traçando planos sórdidos, criando mapas.

É inevitável percebermos nossas lutas
Por um futuro mais feliz e promissor,
Mostrando tudo que ensinamos sobre o amor,
Findar em cenas lamentáveis de disputas.

Melhor seria procurarmos a alegria
Na fantasia e só deixarmos aos parentes,
Nossas histórias infantis e adolescentes,
E alguns romances.... fragmentos de poesia.

Quem sabe, um neto ou um filho mais sensato
E mais sensível compreenda, de verdade,
Que a nossa vida só buscou felicidade
Na liberdade mais feliz de cada fato?

Quem sabe, um deles, nos pesquise mais a fundo,
E estude a história de cada antepassado
E compreenda que a memória é o legado
Mais importante e verdadeiro que há no mundo.

E que os desejos pessoais e as manias
Naturalmente humanas e mais prazerosas
Não sejam teses imbecis, pecaminosos,
Dos que acusam com cruéis hipocrisias!

Que nossas mãos ganhem asas de passarinhos
E haja carinho em nosso último estertor,
Para que alguém encontre o mapa desse amor
Que cultivamos na rudeza do caminho.

Que nos editem... não há outra alternativa
Que imortalize nossos modos de sonhar
E que respeitem nosso jeitinho de amar
Para que nossa liberdade sobreviva.
= = = = = = 

Trova de
CIPRIANO FERREIRA GOMES 
São Paulo / SP

Da pedra bruta aos brilhantes, 
mãos calejadas, fiéis, 
servem às mãos elegantes
a vaidade dos anéis. 
= = = = = = 

Poema de
VANICE ZIMERMAN
Curitiba/PR

Livros e Saudade

Três quadros encostados na parede...
Em cima da mesa, desenhos por terminar.
Na estante, próxima à janela,
entre os livros, a saudade a espreitar...
= = = = = = 

Quadra Popular

Meu amor, vai pelo mundo:
ir pelo mundo é um bem;
o mundo também é regra
para aqueles que a não têm.
= = = = = = 

Soneto de
RAUL DE LEONI
Petrópolis/RJ, 1895-1926

Mefisto

Espírito flexível e elegante,
Ágil, lascivo, plástico, difuso,
Entre as cousas humanas me conduzo
Como um destro ginasta diletante.

Comigo mesmo, cínico e confuso,
Minha vida é um sofisma espiralante;
Teço lógicas trêfegas e abuso
Do equilíbrio na Dúvida flutuante.

Bailarino dos círculos viciosos,
Faço jogos sutis de ideias no ar
Entre saltos brilhantes e mortais,

Com a mesma petulância singular
Dos grandes acrobatas audaciosos
E dos malabaristas de punhais…
= = = = = = 

Trova de
A. A. DE ASSIS
Maringá/PR

Acaso fizeste a Lua? 
Acaso fizeste a rosa? 
Então que ciência é a tua, 
tão solene e presunçosa?…
= = = = = = 

Poema de
PAULO WALBACH PRESTES
Curitiba/PR, 1945 – 2021

Menino Ilha

Como uma ilha deserta, desperto no meio do mar...
Distante, sem eira e nem beira, mal posso sonhar.
O mar, quase amante com ondas infindas, constantes,
que vêm e que vão;
E todas melosas, molhadas me beijam, me afogam e voltam bailar.
O sol escaldante de dia me aquece, me queima, me atenta
e me faz flutuar...
E um solitário coqueiro com seus leques abertos
me dão o frescor no leve roçar...
E a sombra me cobre, se esquiva, vai embora,
sumindo no ar.
 
A noite silente, estrelas luzentes palpitam, desejam, rodeiam a ilha
num doce velar...
Vaidosa a lua me sonda, me espia; se olha, se mira no espelho do mar.
E eu tal uma ilha envolto em letras, que voam, saltitam na noite perdido
num mar de ilusão...
Palavras se juntam, ideias benditas me vêm à cabeça mas logo se vão.
Pensamentos acendem faíscas ligeiras, palavras arteiras...
Meu estro acorda, me deixa sonhar.
 
Sou ilha, sou homem, menino, poeta... Quem sou?...
Sou eu pequenino... no universo, um anão...
sou sol ou sou ilha... sou mar, sou luar, sou eu, sou você...
sou só...
Solidão!
= = = = = = 

Quadra de
IDEL BECKER
Porto Casares/ Argentina, 1910 – 1994, São Paulo/SP

Eu recuso mulher nova,
que é espelho dos enganos.
Quero uma velha bem velha
de vinte, ou vinte e dois anos.
= = = = = = 

Soneto de 
AMILTON MACIEL MONTEIRO
São José dos Campos/SP

Amor sem jaça

Nem pense em me deixar! Eu enlouqueço,
ou vou, por certo, entrar em depressão...
Não saberei viver sem tanto apreço,
com que você prendeu meu coração.

Por isso eu peço aos céus que, a qualquer preço
nos livre de qualquer separação,
que me poria num torpor espesso,
exterminando a minha inspiração!

Também jamais veria no futuro
alguma graça para o meu viver,
pois existir sem estro eu esconjuro!

Assim, meu bem, evite tal desgraça;
jamais me deixe só! Você vai ver
que é todo seu o meu amor sem jaça!
= = = = = = 

Trova de
LUIZ OTÁVIO
(Gilson de Castro)
Rio de Janeiro/RJ, 1916 – 1977, Santos/SP

Contradição singular
que angustia o meu viver:
a ventura de te achar
e o medo de te perder.
= = = = = = 

Soneto de
FLORBELA ESPANCA 
(Flor Bela de Alma da Conceição Espanca)
Vila Viçosa, 1894 – 1930, Matosinhos

O fado

Corre a noite, de manso num murmúrio,
Abre a rosa bendita do luar....
Soluçam ais estranhos de guitarra....
Ouço, ao longe, não sei que voz chorar...

Há um repouso imenso em toda terra,
Parece a própria noite a escutar....
E o canto continua mais profundo
Que uma página sentida de Mozart!

É o fado. A canção das violetas:
Almas de tristes, almas de poetas,
Pra quem a vida foi uma agonia!

Minha doce canção dos deserdados,
Meu fado que alivias desgraçados,
Bendito sejas tu! Ave Maria!…
= = = = = = 

Trova Funerária Cigana

Nem mesmo sei o que sou
pela dor que sinto agora.
Bem pareço a sombra escura
de um ser que viveu outrora.
= = = = = = 

Poemeto de 
SOLANGE COLOMBARA
São Paulo / SP

Ouvia-se os respingos
caindo inertes, sem emoção.
Não era chuva, orvalho,
tampouco pranto.
Somente borrifadas...
Talvez poesia,
talvez um nada no chão.
= = = = = = 

Trova de 
CÁSSIO MAGNANI
Santa Bárbara/MG, 1921 – 1990, Nova Lima/MG

Madama vai ao peixeiro:
– A senhora quer Robalo?
Ela, mostrando o dinheiro:
– Não, senhor, quero comprá-lo!
= = = = = = 

Poema de 
MOEMA TAVARES
Rio de Janeiro/RJ

Lágrimas  

Correm como um rio 
E me afogam... 
Gota a gota me descem pela face
Gota a gota formarão um lago, um rio
Cada lágrima é uma gota de aflição,
de saudade de algo que não aconteceu, 
de desejos não realizados, 
de sonhos apenas sonhados, 
não vividos...
As lágrimas inundam o presente 
porque não posso esquecer o passado
Idealizado, sonhado...
= = = = = = 

Trova de
ORLANDO WOCZIKOSKY  
Curitiba/PR, 1927 – 2019

A mulher é diferente
    no terreno da emoção:
- O homem diz sim e consente,
    ela consente e diz não!
= = = = = = 

Soneto de
LUCÍLIA ALZIRA TRINDA DECARLI
Bandeirantes/PR

Maravilha natural

Da lenda, a qual explica a sua origem,
um trecho sobre o amor malsucedido...
“Teve, um casal, seu plano interrompido:
- fratura em rochas... águas com vertigem!...”

Vindas da serra as águas se dirigem
ao cânion, onde o rio está estendido.
Cada turista observa, embevecido,
as gigantescas quedas, que coligem!

Nosso Brasil tem belas cachoeiras,
águas cantantes pelas ribanceiras,
e, cristalinas, vistas a olho nu...

Ressalto, aqui, aquelas impactantes,
maravilhosas, densas, sons vibrantes:
- As Cataratas (plenas) do Iguaçu!

(1° lugar no Concurso Literário-2023, pela Academia Literária do Oeste do Paraná)
= = = = = = 

Poetrix de
JUCINEIA GONÇALVES 
Belo Horizonte/MG

descompasso

meus caminhos
não singram mares
ah, essa minha continentalidade!
= = = = = = 

Soneto de
TOMÁS ANTÔNIO GONZAGA
Porto/Portugal, 1744 – 1810, Moçambique

Marília de Dirceu: Soneto II

Num fértil campo de soberbo Douro,
dormindo sobre a relva descansava,
quando vi que a Fortuna me mostrava
com alegre semblante o seu Tesouro.

De uma parte, um montão de prata e ouro
com pedras de valor o chão curvava;
aqui um cetro, ali um trono estava,
pendiam coroas mil de grama e louro.

Acabou (diz-me então) a desventura:
De quantos bens te exponho qual te agrada,
pois benigna os concedo, vai, procura.

Escolhi, acordei, e não vi nada:
comigo assentei logo que a ventura
nunca chega a passar de ser sonhada.
= = = = = = 

Trova de
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA
São Paulo/ SP

Chega tarde, o companheiro
e ao ver tanta grana, exclama:
- Como ganhaste o dinheiro ?!
Passas o dia na cama!!!
= = = = = = 

Poema de 
YORGOS SEFERIS
Esmirna/Grécia, 1900 – 1971

A Folha do Choupo

Tremia tanto que o vento a levou
tremia tanto como não a levaria o vento
lá longe
um mar
lá longe
uma ilha ao sol
e as mãos apertando os remos
morrendo no momento em que o porto apareceu
e os olhos fechados
em anêmonas do mar.

Tremia tanto tanto
procurei-a tanto tanto
na cisterna com os eucaliptos
na primavera e no verão
em todas as nuas florestas
meu Deus procurei-a.
(tradução: Joaquim Manuel Magalhães e Nikos Pratisinis)
= = = = = = 

Trova de
CAROLINA RAMOS
Santos/SP

Na penumbra, o berço é um templo,
ajoelho e em ternura enorme,
entre rendas eu contemplo
meu pequeno deus que dorme!
= = = = = = 

Hino de 
Arara/PB

Inspirada em uma ave
A tua história surgiu
A pujança de teus filhos
O teu nome difundiu
Reservando o teu espaço
Na História do Brasil.

Arara amada
terra querida
Confio a ti a minha vida.

O teu passado sofrido
Teu presente de certeza
É o prenuncio já vivido
De um futuro de grandeza
Terra plácida e venturosa
Dádiva da mãe natureza.

Arara amada
terra querida
Confio a ti a minha vida.

A tua fé incessante
Sempre enérgica e cristalina
Fruto do teu patriarca
O apóstolo Ibiapina
Faz superar obstáculos
Toda provação domina.

Arara amada
terra querida
Confio a ti a minha vida.

Dezembro mês escolhido
Para ser também o teu Natal
Harmonia, independência
Marcas do teu ideal
Trabalho e crescimento
Tua face natural.

Arara amada
terra querida
Confio a ti a minha vida.
= = = = = = 

Trova de
VANDA FAGUNDES QUEIROZ
Curitiba/PR

Se algum motivo incessante
sopra luz em tons diversos...
é a musa que vem, migrante,
pedir pouso em nossos versos!
= = = = = = 

Poema de 
PEDRO DU BOIS
Passo Fundo/RS, 1947 – 2021, Balneário Camboriú/SC

Nudez

Desnuda-te
demonstra
tua humanidade
na beleza
em claves
e palavras
onde mostra
aos tolos
que esperam
de ti o golpe
no movimento
de teu corpo nu

teu o arcabouço
no nascimento
e no abandono

no reencontro do corpo
ao encontro de outro
corpo nu como o teu.
= = = = = = 

Trova de
RITA MOURÃO 
Ribeirão Preto/SP

Nos meus embates medonhos
sempre enfrento os desafios,
quando a vida tece sonhos
e o tempo desfaz os fios.
= = = = = = 

Fábula em Versos
adaptada das Fábulas de Monteiro Lobato 
JOSÉ FELDMAN
Floresta/PR

Fábula do Urso e do Coelho 

Um urso forte, de grande tamanho, 
encontrou um coelho, com jeito de estranho. 
“Eu sou o rei, não tenha medo!” 
Disse o urso, com ar de enredo. 

O coelho, esperto, logo respondeu: 
“Reis são muitos, mas amigos são poucos, eu sou seu!” 
E assim, com risos, se tornaram aliados, 
mostrando que a amizade é o maior dos legados.
= = = = = = = = = 

A. A. de Assis (Ecopapo)

A natureza foi criada para sustentar a vida. O ser humano foi criado para cuidar da natureza, cultivá-la e dela se servir. Foi isso que nos ensinaram.  Então a gente está sempre a falar de natureza, ambiente, meio – uns entendendo do que falam, outros pensando que entendem, outros falando só por falar.

O tema é instigante e interessa a todos. Falando ou escrevendo, cada um dá suas receitas de como preservar o universo. Nesses tantos ecopapos, há questões que costumam aparecer com mais frequência. Lembro algumas:

· Você diz “natureza”, “ecossistema”, “ambiente” ou “meio”? E se “meio” e “ambiente” são a mesma coisa, por que alguns preferem o redundante “meio ambiente”?   

· O rio adorna e rega a cidade, até que de repente enche demais e põe em pânico a população. Aí perguntam: por que insistem em fazer casa à beira-rio?  

· Animal doméstico faz parte da natureza? Por que protegem mais os animais silvestres do que os domésticos? E por que você não come a onça, mas faz churrasco da vaca?

· Sim, sim, vacas e galinhas recebem maiores cuidados: vacinas, ração de primeira. Mas esse tratamento especial seria por amor ou por interesse do ser humano? Quanto mais bem-cuidados, melhores produtos nos oferecem.

· A natureza é briguenta: a onda contra o rochedo. O cipó contra a árvore. O gavião contra o sabiá. O vento contra a plantinha. Ou isso faz parte do enredo?

· Tem uns bichos assustadores, que nem a aranha e a cobra. Entretanto aprendemos que em nome da biodiversidade eles precisam ser preservados.

· Por que precisam existir seres tais quais barata, formiga, carrapato, cupim, pernilongo, piolho, gafanhoto?

· A natureza é contrastante: tem flor e espinho, remédio e veneno, aroma e fedor, tem doce e amargo.

· Tem coisas que nos deslumbram e ao mesmo tempo nos colocam em perigo: cataratas, florestas, altos picos, cavernas, vulcões, cânions. Mas temos mesmo necessidade de chegar perto desses lugares?

É complicado lidar com tais aparentes incongruências. Mas que tudo isso dá bom papo, dá. Entendendo ou não do assunto.
===============  
(Crônica publicada no Jornal do Povo – Maringá – 24-7-2025)
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A. A. DE ASSIS (Antonio Augusto de Assis), poeta, trovador, haicaísta, cronista, premiadíssimo em centenas de concursos nasceu em São Fidélis/RJ, em 1933. Radicou-se em Maringá/PR desde 1955. Lecionou no Departamento de Letras da Universidade Estadual de Maringá, aposentado. Foi jornalista, diretor dos jornais Tribuna de Maringá, Folha do Norte do Paraná e das revistas Novo Paraná (NP) e Aqui. Algumas publicações: Robson (poemas); Itinerário (poemas); Coleção Cadernos de A. A. de Assis - 10 vol. (crônicas, ensaios e poemas); Poêmica (poemas); Caderno de trovas; Tábua de trovas; A. A. de Assis - vida, verso e prosa (autobiografia e textos diversos). Em e-books: Triversos travessos (poesia); Novos triversos (poesia); Microcrônicas (textos curtos); A província do Guaíra (história), etc.
Fontes:
Texto enviado pelo autor.
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José Feldman (Nosso Shangri-Lá interior)


Após ler o texto publicado ontem por Carina Bratt neste blog, me senti impelido a uma reflexão.

Existe algo quase mágico em estar cercado pela natureza, em pisar na terra descalço, em ouvir o som das aves que parecem compor uma sinfonia para o amanhecer. É como se, nesses momentos, o mundo nos devolvesse uma parte de nós que havíamos esquecido. Um pedaço essencial, perdido entre o stress da cidade, os ruídos das avenidas e a constante necessidade de correr sem saber exatamente para onde.  

Estar em um lugar onde o tempo corre devagar é um presente raro. Um espaço onde os animais correm livres, as galinhas ciscam distraídas, onde o vento conversa com as árvores e o céu parece mais perto. É impossível não sentir que ali, naquele instante, somos parte de algo maior. O silêncio do campo não é vazio; é preenchido por uma calma que invade a alma e nos conecta ao que há de mais essencial.  

A natureza, com sua simplicidade, tem o dom de nos mostrar a perfeição do que é ser. Não há excessos, não há máscaras. O rio segue seu curso, as árvores crescem sem pressa, os animais vivem sem as complicações que os humanos insistem em carregar. E nós, ao nos colocarmos nesse cenário, somos lembrados de que a vida, em sua essência, é muito mais simples do que imaginamos.  

É impossível não pensar em Deus quando se está em um lugar assim. É como se a natureza fosse um reflexo direto de Sua presença, uma extensão de Sua criação. Os galhos que se curvam ao vento, as folhas que dançam ao som da brisa, os pássaros que cantam como se soubessem os segredos do universo – tudo parece nos sussurrar que não estamos sozinhos, que há algo maior cuidando de cada detalhe.  

E, ao nos colocarmos nesse cenário, algo dentro de nós muda. A pressa dá lugar à contemplação, a ansiedade se dissolve em gratidão, e a mente, tão cheia de pensamentos barulhentos, encontra um raro momento de serenidade. É como se, por um breve instante, pudéssemos ouvir não só o som da natureza, mas também a voz de Deus nos dizendo que tudo está bem.  

Esse contato com a terra, com o cheiro de mato depois da chuva, com os animais correndo livres, nos faz lembrar que fomos criados para isso: para viver em harmonia com o mundo ao nosso redor, para respeitar e cuidar do que nos foi dado.  

Há uma sabedoria que só a natureza pode ensinar. Não está nos livros, nem nos discursos grandiosos, mas nos pequenos detalhes. No jeito como o senhor Valdemar, com suas mãos calejadas, nos lembra que a verdadeira riqueza está no que se cultiva com amor; no sorriso de dona Diná, que fala mais do que mil palavras; na simplicidade do fogão à lenha, que aquece não só a comida, mas também o coração.  

Nesses lugares, percebemos que a vida não é sobre acumular, mas sobre pertencer. É sobre encontrar paz no silêncio, acolhimento no chão batido, e conexão nas pequenas coisas. Cada cheiro, cada som, cada cor carrega uma história que pulsa dentro de nós, como se aquele pedaço de terra fosse também parte de quem somos.  

Ao final de um dia assim, ao olhar para o céu tingido de laranja pelo pôr do sol, sentimos um agradecimento profundo. Não é apenas um lugar bonito – é um lugar que nos dá paz, que nos devolve a nós mesmos. É um pedaço de paraíso que nos lembra que, por mais que o mundo seja grande e barulhento, há sempre um canto de calmaria que nos espera.  

Estar na natureza é mais do que uma experiência; é um reencontro. Um momento em que percebemos que somos pequenos diante da grandiosidade do mundo, mas que, ao mesmo tempo, somos parte dele. E, nesse encontro, encontramos Deus. Não em palavras, mas no silêncio. Não em teorias, mas na simplicidade.  

Por mais que a vida nos leve para longe, para as metrópoles barulhentas e os compromissos incessantes, é reconfortante saber que sempre podemos voltar. Voltar para a terra, para as árvores, para os sons e cheiros que nos lembram quem somos. Porque, no fundo, todos temos um Shangri-Lá dentro de nós – um pedaço de chão que nos acolhe, nos sustenta e nos reconecta com o que há de mais puro em nossa essência.
* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * 
JOSÉ FELDMAN, poeta, trovador, escritor e gestor cultural. Formado em patologia clínica trabalhou por mais de uma década no Hospital das Clínicas. Foi enxadrista, professor, diretor, juiz e organizador de torneios de xadrez a nível nacional durante 24 anos; como diretor cultural organizou apresentações musicais. Morou na capital de São Paulo, em Taboão da Serra/SP, em Curitiba/PR, Ubiratã/PR, Maringá/PR. Consultor educacional junto a alunos e professores do Paraná e São Paulo. Pertence a diversas academias de letras, como Academia Rotary de Letras, Academia Internacional da União Cultural, Confraria Luso-Brasileira de Trovadores, Academia de Letras de Teófilo Otoni, etc, possui os blogs Singrando Horizontes desde 2007, e Pérgola de Textos, um blog com textos de sua autoria, Voo da Gralha Azul (com trovas do mundo). Assina seus escritos por Floresta/PR. Dezenas de premiações em poesias e trovas no Brasil e exterior.
Publicações de sua autoria “Labirintos da vida” (crônicas e contos); “Peripécias de um Jornalista de Fofocas & outros contos” (humor); “35 trovadores em Preto & Branco” (análises); e “Canteiro de trovas”.. No prelo: “Pérgola de textos” (crônicas e contos) e “Asas da poesia”

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Lendas e Contos Populares do Paraná - 25 - (Vila Velha) A Taça

Itacueretaba, antigo nome do que conhecemos hoje por Vila Velha, significa “a cidade extinta de pedras”.

Esse recanto foi escolhido pelos primitivos habitantes para ser o Abaretama, “terra dos homens”, onde esconderiam o precioso tesouro “itainhareru”.

Tendo a proteção de Tupã, era cuidadosamente vigiado pelos apiabas, varões escolhidos entre os melhores homens de todas as tribos. Os apiabas desfrutavam de todas as regalias, porém era-lhes vedado o contato com as mulheres, mesmo de suas próprias tribos. A tradição dizia que as mulheres, estando de posse do segredo do Abaretama, revelariam aos quatro ventos e chegada a notícia aos ouvidos do inimigo, esses tomariam o tesouro para si.

Dhui fora escolhido para chefe supremo dos apiabas. Entretanto, não desejava seguir aquele destino. Seu sangue se achava perturbado pelo fascínio feminino. As tribos rivais, ao terem conhecimento do fato, escolheram Aracê Poranga para tentar o jovem guerreiro e tomar-lhe o coração para conseguir o segredo do tesouro.

Não foi difícil Aracê se apaixonar completamente por Dhui. Numa tarde primaveril, Aracê veio ao encontro de Dhui trazendo uma taça de “uirucuri”, o licor de butias, para embebedar Dhui.

No entanto, o amor já se assenhorava de sua razão e ela também tomou o licor, ficando ambos sob a sombra de um Ipê, languidamente entrelaçados.

Tupã vingou-se, desencadeando um terremoto que abalou toda a planície. A antiga planície foi transformada em um conjunto de suaves colinas. Abaretama transformou-se em pedra. O solo rasgou-se em alguns pontos, originando as Furnas. O precioso tesouro fora derretido, formando a Lagoa Dourada. Os dois amantes ficaram petrificados e, entre os dois, a taça ficou como o símbolo da traição. Diz a lenda que as pessoas mais sensíveis à natureza e ao amor, quando passam pelo local, ouvem a última frase de Aracê: xê pocê o quê (dormirei contigo).

E foi assim que Abaretama se tornou Itacueretaba. 
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Vila Velha
A 18 km de Ponta Grossa o cinzel das chuvas e dos ventos esculpiu figuras gigantescas no arenito. A formação arenítica é o resultado do depósito de um grande volume de areia, que aconteceu há aproximadamente 340 milhões de anos, no período carbonífero. Na época, a região estava coberta por um lençol de gelo. Com o degelo, o material foi abandonado no local. Após o retorno da erosão normal e a partir do engrossamento das águas dos riachos da frente glaciária, esses depósitos foram retrabalhados, originando os arenitos de Vila Velha. A transformação do conjunto rochoso não terminou. Vila Velha está exposta à ação da atmosfera, submetida à severa erosão das águas das chuvas e ao trabalho dos ventos. As formações sugerem as mais variadas figuras. Camelo, índio, noiva, garrafa, bota, esfinge e taça são algumas delas.

Fontes: 
http://www.pontagrossa.pr.gov.br/vvelha
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