ALMAS
PRIMAVERAIS
A tarde
brinca em meu quintal sem cores
E sem
saber da dor que existe em mim,
Pendura
um sol no céu, colore flores
E o meu
quintal então vira um jardim.
Tardes
primaverais chegam assim...
Desvanecendo
nossos dissabores
E nos
dão esperanças e favores
A nos
sorrir e a nos dizer que sim.
Como
essas tardes claras de esplendor,
Que um
dia esquecemo-nos de notar,
Existem
almas que só dão amor.
São
essas almas as criaturas boas
Que só
vieram ao mundo para amar
A vida
sem amor de outras pessoas.
A
MÃE E A ROSEIRA
Essa
roseira, sempre silenciosa,
Não teve
em sua vida outros caminhos
E desde
que perdeu a última rosa
Dobrou-se
sob o peso dos espinhos.
E essa
mãe, que ora passa esperançosa,
Amparando
os seus filhos com carinhos,
Faz-me
crer de uma forma tão piedosa
Que vi
Nossa Senhora e os seus anjinhos.
A
roseira, a chorar as suas dores,
Fica no
meu canteiro, ao sol e à lua,
Descrente
do milagre de outras flores.
E a mãe
que passa em frente, continua...
Esquecida
dos próprios dissabores
Vai
beijando os seus filhos pela rua...
CASINHA
DE BONECA
Um dia
ela guardou os seus segredos,
Pois que
sentiu que o amor ao longe vinha,
Trancou
no quarto todos seus brinquedos
E o
sonho da boneca e da casinha.
E foi
buscar aquilo que não tinha
No
alegre faz de conta dos seus dedos,
Contou
tristezas e chorou sozinha,
Depois
sorriu das mágoas e dos medos.
Passou o
tempo e ela seguiu a sina,
E assim,
com a decência que ilumina,
Também
andou por aonde o mal caminha...
Quanta
ternura tem essa velhinha,
Que fica
no seu quarto de menina,
Brincando
de boneca e de casinha!
CRENÇA
Quando firmava
o azul e o sol abria
Ao dia a
sua bem-aventurança,
O homem
bom repartia à vizinhança
Toda
espécie de estima que sentia.
E
amanhecia cheio de esperança
De vir o
dia, após um novo dia,
Para lhe
dar apreço e cortesia
Conforme
a sua ingênua confiança.
Depois
curvava a fé que lhe convinha
À
soleira da porta, e de tardinha
Fiava as
horas, crédulo a sorrir.
E a
noite o recolhia nesse afã
De estar
sempre esperando esse Amanhã
E sempre
esse Amanhã tardando a vir...
DESESPERANÇA
Eu
conservo comigo, desde criança,
E trago
no meu rosto sorridente,
A crença
conformada da confiança
Que
carrego na vida para frente.
Meu pai
deu-me um sorriso por herança,
E eu
fui, como o bom filho obediente,
Seguindo
ruas, conhecendo gente,
Cheio de
ingenuidade e de esperança!
Deixei
abraços, saudações e avisos,
E em vez
de deparar rostos serenos
Só
encontrei olhares indecisos.
Não
recebi de volta os meus sorrisos,
E nem os
meus abraços: nem ao menos
Alguém
retribuiu os meus acenos...
DESPERCEBIMENTO
Dentro
dos seus sapatos desbotados
Ele saiu
de casa e foi distante;
E foi
além da conta: andou bastante,
Até
achar caminhos nunca achados.
Esse
homem, descontente e itinerante,
Não deu
adeus quando se foi aos lados,
Deixou
atrás de si rostos molhados
E
colocou a Sorte vida adiante.
Depois
voltou trazendo na memória
O que o
Mundo não lhe pode servir;
E
entrando em sua casa, ó Sorte inglória!
Nenhum
sorriso amado viu sorrir:
Chamou,
cantou, chorou, contou história,
Mas
ninguém quis saber e nem ouvir...
HISTÓRIA
SEM FINAL
Abro o
caderno onde escrevi outrora
As
minhas ilusões de amor e rima
E o que
esses versos me dirão agora
Se já
não tenho crença e nem estima?
Procuro
uma palavra que me exprima
Um
pensamento bom, que não se aflora,
E quando
a luz da idéia se aproxima
A sombra
da esperança vai embora.
Meus
frágeis versos, vítimas de mim,
Leguei-lhes
toda herança do meu mal
Em
pobres frases vãs e inacabadas.
Serão
eternos por não terem fim
E
viverão nas páginas fechadas
Do meu
livro de história sem final.
O
VENDEDOR DE BONEQUINHOS
De
manhãzinha à beira da calçada
Todo dia
uma corda eu estendia
E
pendurava nela uma braçada
De
bonequinhos feios que eu vendia.
Eram
polichinelos que eu fazia
De
trança de algodão, à mão desfiada…
No pano
das feições não conseguia
Puxar-lhes
traços de melhor fachada.
Ao
desbotar o azul no fim do dia,
Quando
eu os desatava dos alinhos,
Desse
varal de cordeação brilhante,
Esses
desengonçados bonequinhos
Desciam-me
nas mãos com alegria
E me
davam abraços de barbante!
PORTA-RETRATOS
Vivemos
em distâncias sem medida,
Depois
do agora existe o além do após,
As horas
estão sempre de partida
E nada
volta inteiro para nós.
O Amanhã
é uma crença indefinida,
(Não há
ninguém que escute a mesma voz?)
O Tempo
passa os dias com a Vida
A nos
fazer de filhos, pais e avós...
Por isto
flerto os seus olhos abstratos,
Que me
espreitam da estampa do papel
Pelos
vitrais do seu porta-retratos...
Preciso
ir ao infinito lhe encontrar!
Vou
entrar nestes olhos para o céu
E nunca
mais voltar do seu olhar!
SONETO PARA O POETA TRISTE
Nessas
horas de folga e de doçura,
Que
passo o tempo a ler meu poeta triste,
Eu sinto
o quanto a sua idéia apura
E o
espírito de luz que nela existe.
O meu
poeta que é doloroso insiste
Compor
num poema de elegância pura
As dores
que a minha alma não resiste
E eu
sinto pena dele com ternura.
Fecho o
livro e me ponho a caminhar
Pelo
parque sem cor, e as horas morrem,
E outros
soluços sobem-me no olhar.
E quando
passo sobre o açude, as águas,
Que dos
meus olhos lentamente escorrem
Entornam
lá no lago as minhas mágoas.
VELHO
ÓRFÃO
Desde
cedo esperei o que não vinha
E a
minha vida foi perdendo o prazo:
Fui
vendo a minha sombra mais sozinha
E o meu
destino cada vez mais raso.
Enquanto
andei do quarto até a cozinha,
Pesou-me
o passo e me causou atraso,
Desfolharam-se
os dias na folhinha
E o
tempo foi morrendo em meu ocaso.
Súbitos
longos anos tão estreitos,
Sinto
vê-los perdidos sem proveitos,
E sem
proveitos não me presto mais...
Eu sou
aquele velho desolado,
Que vive
a andar atrás do seu passado,
Como a
criança órfã que procura os pais.
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