sábado, 6 de dezembro de 2025

José Feldman (Ecos da Violência em um Mundo em Desacordo)


Vivemos em tempos em que a dor e o terror parecem estar cada vez mais entrelaçados em nosso cotidiano. As guerras se multiplicam como ervas daninhas, brotando em qualquer parte do mundo onde líderes, ávidos por poder e controle, não hesitam em sacrificar a paz em nome de ambições pessoais. É um espetáculo trágico, onde o valor da vida é reduzido a meras estatísticas, enquanto as balas e os bombardeios ressoam como uma sinfonia macabra, privando a vida de milhares de pessoas sem um respingo de amor pela vida humana.

A televisão, um dos principais meios de formação de opinião e comportamento, tornou-se um campo de batalha onde a violência é glorificada. Os programas que atraem a atenção dos jovens estão recheados de cenas grotescas, onde vampiros e zumbis dominam narrativas que banalizam a morte e o sofrimento. Entre uma série e outra, há uma programação que mistura a ficção mais aterrorizante com os realities mais cruéis, trazendo uma nova forma de entretenimento que, na verdade, reflete uma sociedade em profunda crise. Enquanto a realidade clama por vozes de justiça e compaixão, enredamo-nos em histórias que alimentam a violência ao invés de promover a compreensão.

Os ecrãs se tornam janelas para um abismo que ecoa sentimentos destrutivos. As crianças e adolescentes, diante desses conteúdos, modelam suas perspectivas e comportamentos. Ao invés de imaginarem um mundo repleto de possibilidades pacíficas, absorvem uma visão distorcida, onde a força e a agressão se tornaram a norma. As conversas que poderiam girar em torno do amor e da solidariedade são substituídas pela retórica do “nós contra eles”, perpetuando barreiras que deveriam ser destruídas.

Nos séculos passados, a humanidade fez progressos impressionantes em ciência e tecnologia. As inovações nos conectaram de maneira que nunca antes se viu. Contudo, essa mesma evolução parece despontar uma falência moral. A arte e a educação, potências para o desenvolvimento humano, são frequentemente ofuscadas pelo brilho da violência. O retrato atual é o de uma sociedade em que a empatia e o respeito pelo próximo parecem resquícios de um passado que não se revisitou.

E em meio a essa turbulência, as mulheres continuam a ser tratadas como objetos, corpos que, em muitas culturas, são vistos como prêmios em disputas, ou vítimas em circunstâncias que escandalizam os mais sensíveis. Em um mundo que deveria ser de igualdade, a misoginia ainda ressoa com força, como se houvesse um consenso silencioso de que suas vidas têm menor valor. Assistimos a atos brutais, discursos odiosos e uma cultura que perpetua a ideia de que é aceitável desumanizar a mulher. O que é mais chocante: o ato em si ou a indiferença que o rodeia?

As novas gerações erguem-se sob o peso desse legado de desamor e agressão. É desesperador pensar que, ao invés de estarmos moldando um futuro de paz, estamos semeando as sementes da discórdia e da intolerância. O mundo digital, que poderia ser uma plataforma de troca de ideias e construção de pontes, acaba se tornando um terreno fértil para o ódio e a divisão.

Entretanto, há uma esperança latente. Cada crise traz consigo uma oportunidade de reflexão e transformação. É possível que as vozes que clamam por paz e por equidade ganhem força em meio ao ruído ensurdecedor da violência. Educadores e artistas têm um papel fundamental na reconstrução do tecido social. É através da arte que podemos inspirar mudança, e por meio da educação que podemos abrir os olhos das futuras gerações, mostrando que um mundo baseado no respeito e na empatia é não apenas desejável, mas possível.

A verdadeira evolução não está apenas nas máquinas que criamos, mas na capacidade de nos entendermos e apoiarmos uns aos outros. A resistência à violência começa com pequenos atos de bondade, com diálogos abertos sobre as verdades que nos machucam e com um compromisso coletivo de construir um futuro que respeite a dignidade de todos.

Que possamos, então, ser agentes de mudança nesse cenário nebuloso, ampliando a luz em vez de alimentar a escuridão. Porque no fim, a verdadeira luta é aquela que travamos no interior de nós mesmos. A guerra que queremos vencer não é contra um inimigo distante, mas contra os preconceitos e as barreiras que nos afastam um dos outros. Se de fato quisermos um amanhã, cabe a nós plantarmos as sementes dessa revolução silenciosa e poderosa.
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JOSÉ FELDMAN, poeta, trovador, escritor, professor e gestor cultural. Formado em patologia clínica trabalhou por mais de uma década no Hospital das Clínicas de São Paulo. Foi enxadrista, professor, diretor, juiz e organizador de torneios de xadrez a nível nacional durante 24 anos; como diretor cultural organizou apresentações musicais e oficinas de trovas. Morou 40 anos na capital de São Paulo, onde nasceu, ao casar-se mudou para Curitiba/PR, radicando-se em Maringá/PR, cidade onde sua esposa é professora da UEM. Consultor educacional junto a alunos e professores do Paraná e São Paulo. Pertence à Confraria Luso-Brasileira de Trovadores. Possui os blogs Singrando Horizontes desde 2007 e Voo da Gralha Azul (com trovas de trovadores vivos e falecidos). Assina seus escritos por Floresta/PR. Dezenas de premiações em crônicas, contos, poesias e trovas no Brasil e exterior.
Publicações: 
Publicados: “Labirintos da vida” (crônicas e contos); “Peripécias de um Jornalista de Fofocas & outros contos” (humor); “35 trovadores em Preto & Branco” (análises); “Canteiro de trovas”.
Em andamento: “Pérgola de textos”, "Chafariz de Trovas", “Caleidoscópio da Vida” (textos sobre trovas), “Asas da poesia”, "Reescrevendo o mundo: Vozes femininas e a construção de novas narrativas”

Célio Simões (O nosso português de cada dia) “Agora, Inês é morta”


A frase se tornou um ditado popular que expressa uma decisão já foi tomada, uma ordem expedida, um fato consumado, uma oportunidade perdida ou um erro grave cometido, sem possibilidade de retorno. Quando é utilizada, reflete de imediato uma situação irreversível do ponto de vista fático, perante a qual qualquer ação no sentido de modificá-la, revela-se inútil. 

Por incrível que pareça, essa expressão se originou numa tocante história de amor entre D. Pedro I, príncipe herdeiro de Portugal e dona Inês de Castro, nos idos do século XIV. A partir da tragédia que permeou esse relacionamento amoroso, seu significado é apenas um – de que não adianta fazer ou tentar fazer coisa alguma ou chorar pelo leite derramado, pois a situação não se reverte, o estrago já está feito, o que era possibilidade virou certeza, restando induvidoso ser tarde demais para resolver ou mitigar o problema.

A charmosa Inês de Castro era a dama de companhia predileta da esposa do príncipe D. Pedro I. Era filha de D. Pedro Fernandes de Castro, mordomo-mor do rei D. Afonso XI de Castela e da dama portuguesa Aldonça Lourenço de Valadares. Seu pai era neto, por via ilegítima, de D. Sancho IV de Castela, um dos fidalgos mais poderosos do Reino de Castela.  

D. Pedro, herdeiro do trono português, casou-se com dona Constança, porém foi pela sua mais bela dama de companhia que ele viria a se apaixonar perdidamente, ficou por ela, como dizem vulgarmente, “arriado dos quatro pneus”. E esse proibitivo romance obviamente não foi aceito pela Corte, na conservadora Europa daquele tempo. E tamanho foi o incômodo daquele romance de alcova, que o Rei de Portugal mandou exilar dona Inês de Castro num distante castelo, situado nos limites da fronteira com a Espanha, esperando que o proposital isolamento operasse o efeito do esquecimento entre os dois, tentativa vã - diga-se de passagem - pois apesar nos limitados meios de comunicação daquele século, os amantes continuavam a se corresponder frequentemente, como de resto acontece nas melhores famílias da atualidade.

Com a morte de dona Constança, surgiu para D. Pedro a oportunidade de ouro de finalmente realizar seu sonho e desposar dona Inês, mesmo contra a vontade paterna. Por isso fez gestões no sentido de providenciar seu imediato regresso à Corte para com ela se unir, desta vez sem impedimentos, o que não foi suficiente para deixar de escandalizar a nobreza de Portugal, fazendo surgir  aberta hostilidade entre pai e filho, pois era intenção do rei realizar o casamento do seu primogênito com uma dama da nobreza, de sangue azul, iniciativa solenemente repudiada por D. Pedro, que recusou incisivamente esse novo casamento de fachada, com alguém que não amava.

Do relacionamento dos dois amantes, visto pela nobreza como absurdamente irregular, resultou intensa prole (4 filhos), o que serviu para agravar ainda mais as já deterioradas relações entre o Rei e o Príncipe, exacerbada pela boataria da ameaça política dos fofoqueiros de plantão, que se dedicavam a especular quem seria desses rebentos o futuro herdeiro do trono, todos torcendo para que o Rei D. Afonso IV tomasse uma posição mais firme, drástica se fosse necessário, no sentido de pôr fim àquela incômoda e instável situação.

Essa oportunidade surgiu quando o Rei, aproveitando a ausência de D. Pedro em rápida viagem, foi pessoalmente com alguns fiéis escudeiros até onde se encontrava dona Inês e sem mais delongas, a executaram sem piedade, provocando sua morte, como era de se esperar, a profunda fúria e justificada revolta de D. Pedro contra D. Afonso IV, situação que perdurou até o falecimento deste último, quando então D. Pedro se tornou de fato e de direito o oitavo rei de Portugal em 1357, com o título de D. Pedro I.  

Vendo-se legitimado no trono, fez o novo monarca o que toda pessoa vingativa faz com seus adversários, ontem ou hoje: perseguiu e matou de forma particularmente cruel e sofrida cada um dos assassinos de D. Inês, arrancando-lhes o coração antes do golpe fatal, escapando ileso apenas um deles, que conseguiu fugir para a França e já em seu leito de morte, anos depois, conseguiu ser perdoado pelo seu abominável crime.   Consumada a vindita, D. Pedro mandou construir um imponente túmulo para D. Inês de Castro no mosteiro de Alcobaça, para onde trasladou o corpo de sua amada. 

Reza a lenda que antes da inumação do corpo para sua definitiva morada, Dom Pedro I promoveu uma macabra cerimônia de coroação do cadáver, obrigando todos os nobres da corte, que antes a hostilizavam, a beijarem a mão sem vida do cadáver, como forma de submissão, desagravo e público reconhecimento de que ela fora um dia a verdadeira rainha de Portugal. 

Outra lenda, tão improvável quando essa, diz que as lágrimas de D. Inês, vertidas quando estava prestes a ser assassinada pelo Rei e seus asseclas, formaram a Fonte das Lágrimas em Coimbra, no interior da Quinta das Lágrimas belo sítio cercado por jardins exuberantes e matas históricos (onde também existe a Fonte dos Amores) à margem esquerda do Rio Mondego, que nasce na Serra da Estrela e deságua no Atlântico junto à Figueira da Foz.. 

Com um tema propício a tantas especulações e usado popularmente para definir situações irremediáveis, a música popular brasileira não deixou por menos e a banda CE-040, concebeu uma música com essa temática, cuja letra se inspira no controvertido episódio da história portuguesa, aqui narrado:

“Agora é tarde, Inês é morta...
Cedo ou tarde, pouco me importa.
Depois, quem era essa Inês?
E o que foi que ela fez?
Ao menos não dessa vez,
Não quero ouvir clichês. 
Sou eu que vou dizer,
Querer pra mim é poder.
Posso chorar no leite derramado (...)”.

A expressão popular “AGORA, INÊS É MORTA” tornou-se também o nome de banda de punk paulista, que com sucesso, lançou um EP de 6 músicas e outro de 2 denominados INÊS É MORTA (em 2018); os EPs “Abismo” (em 2019); “Mentir” (em 2020), “Sozinha” (2021), “Espectro do Tempo” (em 2021), “Quarta Parede” (também 2021) e “Apogeu”, já no ano de 2022, quando felizmente foi superada a fase mais aguda da pandemia do Covid 19, de triste, sofrida e desagradável memória para todos nós.
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CÉLIO SIMÕES DE SOUZA é paraense, advogado pós-graduado em Direito e Processo do Trabalho, escritor, professor, palestrante, poeta e memorialista. É membro da Academia Paraense de Letras, membro e ex-presidente da Academia Paraense de Letras Jurídicas, fundador e ex-vice-presidente da Academia Paraense de Jornalismo, fundador e ex-presidente da Academia Artística e Literária de Óbidos, membro da Academia Paraense Literária Interiorana, da Academia de Letras e Artes da Polícia Militar do Pará e da Confraria Brasileira de Letras, no Paraná. Foi juiz do TRE-PA, é sócio efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, sócio correspondente do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, fundador e membro da União dos Juristas Católicos de Belém e membro efetivo do Instituto dos Advogados do Pará. Tem seis livros publicados, é coautor de outros quatro e recebeu três prêmios literários.

Fontes:
Texto enviado pelo autor. 
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing 

sexta-feira, 5 de dezembro de 2025

Asas da Poesia * 139 *


Haicai de
A. A. DE ASSIS
Maringá/PR

A lua enluara
a reza, a seresta, a ceia.
E os que ainda sonham
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Poema de
NEMÉSIO PRATA
Fortaleza/CE

Não deixa te levar pela vingança, 
pois isto não é coisa de Cristão: 
perdoa! Com amor, e sem tardança 
vai lá, e abraça, e beija o teu Irmão! 

Se um dia alguém te fizer qualquer mal, 
não vira-lhe o rosto, imita a Jesus, 
o grande perdoador que, no final, 
perdoou os que lhe puseram na Cruz! 

Se alguma ovelha encontra-se afastada, 
procura-a, pois, pra Deus ela é preciosa; 
encontra-a, e traze-a de volta, "puxada" 
pelas cordas do amor..., esta "teimosa"!
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Soneto de
ANTÔNIO OLIVEIRA PENA
Volta Redonda/RJ

O Caminho

Dize a palavra que te encerre o sonho,
aquela que resuma o teu desejo;
evita aquela de pesar medonho,
aquela de lamento malfazejo.

Dize a palavra que te encerre o sonho
com a mesma intensidade do teu beijo!
Evita o murmurar insano, e põe o
teu pensamento a trabalhar, que vejo

que aquilo que dizemos é que é ouvido,
ainda que o façamos em segredo...
— Não há palavra sem repercussão!...

Na estrada em que o homem vai, tão comovido,
seja de sua pátria, ou do degredo,
antes, por ela, andou seu coração!
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Quadra de
ANTONIO ALEIXO
Vila Real de Santo António/Portugal, 1899 — 1949, Loulé/França

Esses por quem não te interessas
produzem quanto consomes:
vivem das suas promessas
ganhando o pão que tu comes.
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Poema de
DILMA DAMASCENO
Caicó/RN

A Menina de Caicó

Imagino as “madeixas do sertão”,
com tranças enfeitadas de bonina,
realçando a paisagem campesina,
- a confundir-se com a plantação -,
no decorrer da flórida estação!

… E nas águas do Itans azul-turqueza,
- ao sabor indelével da pureza -,
imagino “a menina de Caicó”,
- pintando sonhos e remando só -,
em sintonia com a natureza!
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Trova Popular

Menina dos olhos verdes,
dá-me água pra beber;
não é sede, não é nada,
é vontade de te ver.
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Soneto de
JANSKE NIEMANN SCHLENCKER
Curitiba/PR

Deixa que eu brinque

Deixa que eu brinque por aí, à toa;
as aves brincam, brinca a ventania...
Brincam as flores com a luz do dia
e a borboleta que por elas voa.

Deixa que eu brinque, ainda que me doa
ver escapar-se a límpida alegria
do mesmo olhar, cuja inocência via
em qualquer coisa alguma coisa boa.

Deixa que eu brinque como se, inocente,
eu não soubesse que viver é queixa,
é choro apenas... E eu só peço: deixa...

Deixa que eu brinque levianamente
como se tudo - a nossa vida inteira -
jamais passasse de uma brincadeira...
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Poema de
FLORBELA ESPANCA
(Florbela d'Alma da Conceição Espanca)
Vila Viçosa/Portugal, 1894 — 1930, Matosinhos/Portugal

Poetas

Ai as almas dos poetas
Não as entende ninguém;
São almas de violetas
Que são poetas também.

Andam perdidas na vida,
Feitos as estrelas no ar;
Sentem o vento gemer
Ouvem as rosas chorar!

Só quem embala no peito
Dores amargas e secretas
É que em noites de luar
Pode entender os poetas

E eu que arrasto amarguras
Que nunca arrastou ninguém
Tenho alma para sentir
A dos poetas também!
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Soneto de
VINÍCIUS DE MORAES
(Marcus Vinícius da Cruz de Melo Moraes)
Rio de Janeiro/RJ (1913 – 1980)

Soneto do Maior Amor

Maior amor nem mais estranho existe
Que o meu, que não sossega a coisa amada
E quando a sente alegre, fica triste
E se a vê descontente, dá risada.

E que só fica em paz se lhe resiste
O amado coração, e que se agrada
Mais da eterna aventura em que persiste
Que de uma vida mal-aventurada.

Louco amor meu, que quando toca, fere
E quando fere vibra, mas prefere
Ferir a fenecer — e vive a esmo

Fiel à sua lei de cada instante
Desassombrado, doido, delirante
Numa paixão de tudo e de si mesmo.
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Poema de
HÉLDER PROENÇA
Bolama/Guiné Bissau, 1956 – 2009, Bissau/Guiné Bissau

Não posso adiar a palavra

Quando te propus
um amanhecer diferente
a terra ainda fervia em lavas
e os homens ainda eram bestas ferozes

Quando te propus
a conquista do futuro
vazias eram as mãos 

negras como breu o silêncio da resposta

Quando te propus
o acumular de forças
o sangue nômade e igual
coagulava em todos os cárceres

em toda a terra
e em todos os homens

Quando te propus
um amanhecer diferente, amor
a eternidade voraz das nossas dores
era igual a «Deus Pai todo poderoso criador dos céus e da terra» 

Quando te propus
olhos secos, pés na terra, e convicção firme
surdos eram os céus e a terra
receptivos as balas e punhais

as amaldiçoavam cada existência nossa

Quando te propus
abraçar a história, amor
tantas foram as esperanças comidas
insondável a fé forjada

no extenso breu de canto e morte

Foi assim que te propus
no circuito de lágrimas e fogo, Povo meu
o hastear eterno do nosso sangue
para um amanhecer diferente!
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Soneto de
ALMA WELT
Novo Hamburgo/RS, 1972 – 2007, Rosário do Sul/RS

A Câmara Escura

Há momentos em que nos despedaçamos
Contra as arestas do nosso próprio ser,
Então a duras penas nós juntamos
Nossos cacos num mosaico de viver.

Na imagem interior restam fissuras
Como fossem cicatrizes das batalhas
Que travamos não com outras criaturas
Mas conosco mesmo e nossas falhas.

“Mas então, onde é que entra o mundo
Nessa tua síntese autofágica,
Se consideras só teu ser profundo?”

Na câmara da alma é o contrário:
O mundo é o ser na caixa mágica
Como reflexo invertido num armário...
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Poema de
MARCIANO LOPES E SILVA
Porto Alegre/RS (1965 – 2013) Maringá/PR

Na Correnteza do Tempo

Negro impasse:
erguer ruínas
ou contorná-las 
em abismo?

Perplexo, vivo à deriva:
caçador de cacos
na correnteza do tempo.
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Indriso de
ISIDRO ITURAT
Villanueva e La Geltrú/Espanha

Cantiga do Viajante sem Sono

Não podem dormir os meus olhos,
não podem dormir,
porque a serrana diz

que quisera ver-me amanhã.
Não podem dormir os meus olhos,
não podem dormir,

porque a verei no prado,

porque a verei amanhã.
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Hino de 
Manacapuru/ AM

Salve, Manacapuru
Taba altiva do rio Solimões,
Salve, Manacapuru
Tu plasmaste nossos corações
Salve, Manacapuru
Terra fértil de um povo viril,
Os teus filhos se orgulham de ti,
E engrandecem a todo o Brasil

Eme a má, ene a na, tens maná
Ce a cá, manacá tens tu
Pê u pu, erre uru, formado está
O teu nome Manacapuru

Salve, Manacapuru
Tens nas águas piscosas, fartura,
Salve, Manacapuru
Teus rebanhos a carne assegura
Salve, Manacapuru
Tens, minério, castanha e madeira
A instrução de moral e civismo
De há muito é a tua Bandeira.
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Poema de
HAROLDO DE BRITTO GUIMARÃES
Goiatuba/GO (1928 – 1998) Goiânia/GO

O Disco 

Dispa-se de toda angustia
de toda a paixão, de todo o ódio:
- Olhe o disco rodando.
Sinta-o não porque ele traga
Chopin, - um, samba, moda de viola, um valsa,
um tango para os desesperados desta noite.

Sinta todo o encantamento da infância
num disco a girar! coisa estranha é, voz humana
brotando de pedra escura do limbo
que gravou a natureza selvagem da Noite.
Sinta a sua infância ou a sua velhice
observe um disco a girar:
girando no tempo, na face das águas ...
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Fábula em Versos de
JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry/França, 1621 – 1695, Paris/França

Os peixes e o pastor que toca flauta

Tirso, jovem amante pegureiro,
Que aos sons da flauta o canto acrescentava,
Tocava um dia à borda de um ribeiro
Que com as linfas os prados refrescava.

Tocava Tirso; e a sedutora Aninha
Pescava ao mesmo tempo;
Mas — fatal contratempo! —
Nem um só peixe lhe acudia à linha!

O pastor, que com seu mavioso canto
Atraía inumanas,
Aos tais das barbatanas
Desta sorte cantou: «Deixai o encanto

Da náiade que amais; d’outra mais bela
Não temais a prisão:
Cruel pode ser ela
Com os humanos — com os peixes, não!

Cruel fosse!... a morrer quem não se afoita
Àquelas mãos galantes?»
Os tais peixinhos — moita!...
Não acodem à linha como dantes.

Tirso vê que se cansa
Em vão cantar; na água a rede lança;
E aos pés da pastorinha
Depõe o peixe que fugira à linha.

Reis, que em razões sutis fazeis estudo
Para convencer a estranhos,
Malograis vossos empenhos;
Lançai as redes. O poder faz tudo.
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quinta-feira, 4 de dezembro de 2025

Sammis Reachers (Deambulações urbanas num domingo carioca)


São dezessete horas de um domingo de primavera. Cumprindo uma missão agora há pouco na UERJ do Maracanã, aquele monstro de concreto, ao sair me deparei com os vazios e desertos de uma cidade grande aos domingos de tarde. Foi instantâneo: me recordei de quando era rodoviário e solteiro e, ao trabalhar nos domingos, por vezes ao largar daquele trampo feito de sacolejar e de pessoas, saía sozinho pelos vazios urbanos de Niterói ou Rio, desarvorado, desavisado e destemidamente. Sem destino ou maiores objetivos. Que solidão especial, trotando lotada de melancolia e levando na carroça sua refém apaixonada, pois adoentada da Síndrome de Estocolmo, a poesia... Sim, muitos poemas nasceram nessas andanças. Não, nunca fui assaltado ou indagado. Deus e minha cara de cana (e minha decana bolsa atravessada nas costas) talvez tenham me guardado.

Outro detalhe que me traz reflexão é que a melancolia de andar numa mata, campo ou descampado deserto é diferente da de andar num deserto urbano. Cada qual tem sua docilidade, mas o campo fala de sentimentos atávicos, instintivos ou transcendentes do que é puramente humano; já a urbe possui uma "linha de ansiedade" (é o melhor termo que pude) toda própria, o humano se celebra e exaure em seus próprios maquinários concretos e simbólicos, num jogo de topofilia/ topofobia que nos faz querer continuar o jogo do ver e do rever, do estar e do deixar de estar, enquanto somos acolhidos/moídos pelo espaço que incessantemente nos ressignifica enquanto o ressignificamos. Jogo por sinal tão caro à corrente da Geografia que me apraz, a Geografia Humanista ou Fenomenológica.

Divagações livres, mas as deambulações (deambular é justamente andar à toa) hoje interditadas a um homem casado.

Bem, melhor assim.
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Sammis Reachers Cristence Silva nasceu em 1978, em Niterói/RJ, mas desde sempre morador de São Gonçalo/RJ, ambos municípios fluminenses. Sammis é poeta, escritor, antologista e editor. Licenciado em Geografia atua em redes públicas de ensino de municípios fluminenses. É autor de dez livros de poesia, três de contos/crônicas e um romance, e organizador de mais de cinquenta antologias.  Aos 16 anos inicia seus escritos e logo edita fanzines, participando do assim chamado circuito alternativo da poesia brasileira, com presença em jornais e informativos culturais. Possui contos e poemas premiados em concursos do Brasil, bem como textos publicados em antologias e renomadas revistas de literatura.

Fontes:
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing  

A. A. de Assis (Filharada rebelde)


Um poeta paulistano, em crônica recente, confessou que foi um guri ranheta e levado da breca. Se mais tarde se tornou um rapaz bonzinho, foi graças à boa e firme educação que recebera da mãe: “Mamãe me ‘domesticou’, arrancou as ervas daninhas do meu íntimo, amansou a fúria de um espírito quase indômito. Quem me conhece talvez ache que estou exagerando. Mas eu era uma criança difícil, de gênio bravio, impulsivo e inconsequente. Dei muito trabalho a ela, mas valeu a pena. Com ela aprendi a ter bons modos, pedir a bênção aos meus tios, tratar as mulheres com respeito e igualdade e não ser machista, ser pontual e cumprir minhas obrigações,  chamar os mais velhos de ‘senhor’ ou ‘senhora’. Sobretudo, ela me incutiu a crença em Deus, a reverência a um Ser Superior”.      

Súbito pensei: ele é então uma sinédoque  ou metonímia da história humana. A humanidade é quenenzinho se fosse um guri rebelde e inquieto que Deus criou com máximo amor e faz tempo vem tentando civilizar, na esperança de algum dia vê-lo apto a ser transferido para um lugar bonito e alegre chamado Céu. 

Tal qual foi o menino, assim é a filharada de Deus: uma criançada “difícil, de gênio impulsivo e inconsequente”. Tem dado muito trabalho ao Pai, mas vale a pena insistir. Falta ainda  arrancar muita erva daninha, porém a essência é boa.

Deus é um Pai paciente e entende muito bem de crianças. Vai deixando a gente fazer traquinagens, dar topadas, cair-levantar, dar de cara na parede. Adota a velha didática do aprender errando. Errando e aprendendo, numa hora dessas a gente finalmente toma tenência na vida, pega rumo e vira gente de verdade.

O Pai poderia simplesmente dar um “stop” nessa maluquice geral, pronunciar um novo “Fiat” e num de repente mudar a cabeça, o coração e a alma da filharada toda, deixando todo mundo bonzinho. Estaria assim inaugurada a era do pleno amor.

Ninguém mais brigaria com ninguém, ninguém mataria, ninguém roubaria, ninguém mentiria, ninguém humilharia os diferentes, ninguém faria maldades contra os mais fracos, ninguém mais fabricaria bombas e mísseis, ninguém mais morreria de doenças  tipo egoísmo-ambição-inveja-raiva-rancor-arrogância-preconceito.

Só que o Pai prefere deixar a gente aprender por experiência própria. Desse jeito o aprendizado será mais consistente. Quando Ele achar que chegou a hora, reunirá a filharada toda numa grande festa. Até lá, poeta.  
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(Crônica publicada no Jornal do Povo – Maringá – 30.10.2025)
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A. A. DE ASSIS (Antonio Augusto de Assis), poeta, trovador, haicaísta, cronista, premiadíssimo em centenas de concursos nasceu em São Fidélis/RJ, em 1933. Radicou-se em Maringá/PR desde 1955. Lecionou no Departamento de Letras da Universidade Estadual de Maringá, aposentado. Foi jornalista, diretor dos jornais Tribuna de Maringá, Folha do Norte do Paraná e das revistas Novo Paraná (NP) e Aqui. Algumas publicações: Robson (poemas); Itinerário (poemas); Coleção Cadernos de A. A. de Assis - 10 vol. (crônicas, ensaios e poemas); Poêmica (poemas); Caderno de trovas; Tábua de trovas; A. A. de Assis - vida, verso e prosa (autobiografia e textos diversos). Em e-books: Triversos travessos (poesia); Novos triversos (poesia); Microcrônicas (textos curtos); A província do Guaíra (história), etc.
Fontes:
Texto obtido no facebook do autor.
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quarta-feira, 3 de dezembro de 2025

Asas da Poesia * 138 *


Poema Indígena de
PAULA BELMINO
Lagoa Nova/RN

Sangue de Índio

Sou filha de índio
Aprendi com eles a dançar
Na luta pela mata virgem
Pela floresta livre a passear
Tenho seu sangue
Guerreiros sempre a lutar
Cantam e seus males espantam
Assim com eles vivo a cantar
Sou filha de índio
E os animais são meus companheiros
Amo a natureza
E a ela tenho por minha mãe
Planto, reciclo, não derrubo as árvores,
Alimento-me do suor de minha mão
Sou filha de índio
E respeito a diversidade
Faço barulho pra alegrar a vida
Num ritual de felicidade
Sou pintura e riso
Sou cultura em qualquer parte
Sou filha de índio
Sou beleza, cor e arte.
O sorriso é minha arma
Ecoando pelos quatro cantos do mundo
Na dança de amor pelo futuro.
Não esquecendo as raízes
Quero uma terra sem sangue,
Em paz! Homens felizes!
Sou filha de índio
Meu sangue é deles
E por eles existo e vivo
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Soneto de
VICENTE DE CARVALHO
Santos/SP (1866 – 1924)

Velho tema (IV)

Eu não espero o bem que mais desejo:
Sou condenado, e disso convencido;
Vossas palavras, com que sou punido,
São penas e verdades de sobejo.

O que dizeis é mal muito sabido,
Pois nem se esconde nem procura ensejo,
E anda à vista naquilo que mais vejo:
Em vosso olhar, severo ou distraído.

Tudo quanto afirmais eu mesmo alego:
Ao meu amor desamparado e triste
Toda a esperança de alcançar-vos nego.

Digo-lhe quanto sei, mas ele insiste;
Conto-lhe o mal que vejo, e ele, que é cego,
Põe-se a sonhar o bem que não existe.
= = = = = = = = =  x 

Poema de
WISLAWA SZYMBORSKA 
Kornik/Polônia (1923 - 2012)

Álbum

Na minha família ninguém morreu de amor.
Se alguma coisa houve não passou de historieta.
Tísicas de Romeu? Difterias de Julieta?
Alguns envelheceram até ganhar bolor.
Ninguém a definhar por falta de resposta
a uma carta molhada e dolorosa.
Apareceu sempre por fim algum vizinho
com lunetas e uma rosa.
Ninguém a desfalecer no armário de asfixia
de algum marido voltando sem contar.
E os mantos e os folhos e as fitas de apertar
a nenhuma impediram de ficar na fotografia.
E nunca no espírito satânico de Bosch!
E nunca pelos quintais de arma em punho!
De bala na cabeça teve a morte outro cunho
e em macas de campanha alguém os trouxe.
De olheiras fundas como após a grande folia,
até esta aqui de carrapito estático,
se fez ao largo em grande hemorragia
mas não por ti, ó bailarino, e com viático.
Talvez antes do daguerreótipo, alguém,
mas nos deste álbum, ninguém, que eu verifique.
Tristezas dissiparam-se, os dias sucederam-se,
e eles, reconfortados, sumiram-se de gripe.
(Tradução: Júlio Souza Gomes)
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Trova Popular

Por te amar perdi a Deus,
por teu amor me perdi,
agora vejo-me só,
sem Deus, sem amor, sem ti.
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Soneto de
GILSON FAUSTINO MAIA
Petrópolis/RJ

Primavera 

Então ela chegou mostrando as cores, 
transformando a tristeza em alegria, 
trazendo borboletas, poesia, 
suavizando o encontro dos amores. 

Aqui e ali, já estão brotando as flores, 
e os passarinhos, ao raiar o dia, 
no pomar fazem sua sinfonia. 
Vibrem poetas, cantem trovadores! 

Modifica-se, inteira, a natureza. 
A musa mostrará sua beleza 
e o jovem perderá seu coração. 

O sol irá brilhar mais claro agora! 
Capim novo, refaz-se a nossa flora, 
há mais vida no ar e em nosso chão.
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Poema de
JONAS ROGÉRIO SANCHES
Catanduva/SP

Semeaduras de Amor e Sangue

Sulquei a terra e ali plantei
sonhos, sangue e lágrimas;
depois de um tempo eu colhi
mil flores de cores áridas.

Semeaduras de almas inocentes
onde o amor foi a semente,
onde a dor foi o adubo
que fez crescer perdão na gente.

Terras de arados tão febris
que alimentam paixões pueris
que atormentam o trovador
que resolveu morrer de amor.

Terras plantadas, flor que condiz
na madrugada seu olor matiz,
noite enluarada e uma cicatriz
no peito que mata o amor motriz.

Plantei meu sangue pelos terreiros
desse sertão tão meu, brasileiro;
colhi meus sonhos tão inconsequentes
e fui feliz amando a minha gente.
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Soneto de 
CLÁUDIO MANOEL DA COSTA
Mariana/MG, 1729 – 1789, Ouro Preto/MG

VIII

Este é o rio, a montanha é esta,
Estes os troncos, estes os rochedos;
São estes inda os mesmos arvoredos;
Esta é a mesma rústica floresta.

Tudo cheio de horror se manifesta,
Rio, montanha, troncos, e penedos;
Que de amor nos suavíssimos enredos
Foi cena alegre, e urna é já funesta.

Oh quão lembrado estou de haver subido
Aquele monte, e as vezes, que baixando
Deixei do pranto o vale umedecido!

Tudo me está a memória retratando;
Que da mesma saudade o infame ruído
Vem as mortas espécies despertando.
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Poema de
INGMAR HEYTZE
Utrech/Holanda

Trabalho Noturno

O tic-tac do despertador. O sussurro da caldeira.
O fremir do frigorífico quando liga e desliga.
Os batimentos da chuva contra a janela.
A escuridão apodera-se de nós.

 O sono entrega o coração e a respiração
ao ritmo da noite.
A alma a secar calmamente pendurada
nas suas cordas branco-prateadas.

A manhã inverte os papeis.
O barulho do chuveiro. O apito da chaleira.
O café a gotejar. A escuridão
esconde-se nas cortinas

e espera, e espera, apenas espera e,
espera.
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Soneto de
BASTOS PORTELA
Recife/PE, 1890 – 1956

Esplendor efêmero

És moça e bela. Assim, hoje pões e dispões;
E, feliz, num requinte fátuo de vaidade,
Vais pela vida, altiva, a esmagar corações...
Nada encontras no amor que te amargure ou enfade!

Mas, quando, um dia, enfim, atingires a idade
Em que se perdem, para sempre, as ilusões,
Tu me dirás, então, o que é sentir saudade
E o que é chorar no horror de longas solidões...

A beleza desfeita, humilde, decadente,
Serás a flor que, num jardim, murcha e descora,
Ao crepúsculo azul da tarde, mansamente...

E vendo-te passar, como os fantasmas, eu...
Eu sofrerei, talvez, como quem lembra ou chora
Uma bela mulher que se amou, e morreu!
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Poema de
FERNANDO NAMORA 
Condeixa-a-Nova/ Portugal, 1919 – 1989, Lisboa/Portugal

Poema para Iludir a Vida

Tudo na vida está em esquecer o dia que passa.
Não importa que hoje seja qualquer coisa triste,
um cedro, areias, raízes,
ou asa de anjo
caída num paul. 

O navio que passou além da barra
já não lembra a barra.
Tu o olhas nas estranhas águas que ele há de sulcar
e nas estranhas gentes que o esperam em estranhos portos.
Hoje corre-te um rio dos olhos
e dos olhos arrancas limos e morcegos.
Ah, mas a tua vitória está em saber que não é hoje o fim
e que há certezas, firmes e belas,
que nem os olhos vesgos
podem negar.
Hoje é o dia de amanhã.
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Hino de 
Jaraguá do Sul/SC

Entre montes te vejo engastada,
Marginando corrente prateada...
Vibra um povo querendo progresso,
Crescimento, trabalho e sucesso.

Jaraguá do Sul és vibrante,
Não haverá quem te suplante,
Teu povo alegre e varonil,
Tem por lema: Avante Brasil.

De teus campos abertos em flor,
Da indústria a todo vapor,
Brotam rios de riqueza a sorrir.
Para o dia de amanhã que surgir.

Teu brasão tem o verde: é esperança,
O vermelho, este povo que avança.
Ao lufar da bandeira marchamos
Pela terra que é nossa e que amamos.
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Fábula em Versos de
JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry/França, 1621 – 1695, Paris/França

A raposa e o busto

Era um busto famoso, um todo teatral...
Por entre a multidão, o burro, esse animal
Que não sabe julgar senão as aparências,
Gabava da escultura as raras excelências.

A raposa, porém, um tanto mais sabida,
Aproxima-se e diz: «Não vi, por minha vida,
Cabeça tão perfeita!... É mágoa verdadeira
A falta que lhe faz lá dentro a mioleira!»

Aos centos, pelo mundo, os homens conto
Que são bustos perfeitos neste ponto.
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Quadrão em Oito* de
LACERDA FURTADO**

Quadrão para Joaquim Batista de Sena

Namorando a Salomé, 
Vi a barca de Noé, 
Palestrei com Josué, 
Com Jacó e Salomão; 
Travei luta com Sansão, 
Nadei no delta do Nilo, 
Montado num crocodilo, 
Cantando os oito em Quadrão!
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* QUADRÃO EM OITO
Ao longo do tempo, o Quadrão tem sido o gênero a receber o maior número de alterações, não só na sua forma interna, mas, também, na estrutura das estrofes, em geral. O Quadrão antigo é formado por uma estância de oito linhas, pertencente à família dos setessílabos, rimando o primeiro verso com o segundo e o terceiro; o quarto com o oitavo, e o quinto com o sexto e o sétimo, contando, no final, o estribilho de sua denominação. O Quadrão em oito apareceu com ligeira modificação na sua forma interna, isto é, o quarto verso que rimava somente com o oitavo passou a rimar também com o quinto. (http://www.bahai.org.br/cordel/generos.html)

Após modificações no universo multifacetado da cantoria, os Quadrões foram incluídos nas Décimas e hoje temos quatro modalidades deste gênero com dez pés, todos mantendo o estribilho na última linha das estrofes.  Além dos cantadores Antônio Batista Guedes, Simplício Pereira da Silva e Manoel Furtado, os saudosos irmãos Batista (Dimas, Lourival e Otacílio), foram os grandes mestres deste estilo especial de cantoria, inclusive tendo sido (os Batista) os criadores do famoso “Quadrão Perguntado”, que recebeu esta denominação por ser uma espécie de diálogo constituído de perguntas e respostas intercaladas, obedecendo a métrica e a rima, pelos dois cantadores. (Fonte: Lilian Maial ) 

** Lacerda Furtado = não encontrei dados de nascimento e/ou morte deste poeta. Se alguém souber, favor me enviar para atualizar no blog.
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