CIDINHA FRIGERI
Eu ouço na voz do vento,
quer na brisa ou tempestade,
que a vida é um fugaz momento
nas asas da eternidade.
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Poema de Cachoeira do Sul/ RS
JAQUELINE MACHADO
Eu e o mundo
Eu não tive infância...
Mas Deus não tirou – me a ânsia
de buscar... tocar... saber...
Desde muito menina,
o mistério da vida me fascina...
e de mim indaga sobre coisas que não posso ver...
Eu não tive infância...
Mas essa minha aliança com o universo,
despertou em mim um desejo confesso,
pelas artes do descobrir...
Meus olhos buscavam o céu,
e por detrás de sete véus,
uma voz perguntava:
e se ao invés do tudo, existisse o nada?
Se ao invés do princípio, restasse apenas o fim?
Eu não tive infância...
Mas as eras habitavam minha alma...
E uma senhora de sabedoria infinda,
com doçura me acalentava...
Eu não tive nada.
E por isso, tive tudo...
O mundo adentrou o meu puro ventre.
E eu o amamentei com as lágrimas do meu sofrer
e o ninei com as canções que fazem girar o mundo...
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Trova de Juiz de Fora/MG
DULCÍDIO DE BARROS MOREIRA SOBRINHO
Há uma lição que sem cola
pelo estudante é sabida:
na vida a melhor escola
é a grande escola da vida.
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Soneto sobre Cenas do Cotidiano
FERNANDO ANTÔNIO BELINO
Sete Lagoas / MG
A feira
É puro encantamento e poesia
a feira de domingo na cidade!
Envolve intensamente a sociedade,
num vai-e-vem, repleto de alegria!
Ali, circula gente, nesse dia,
de toda classe e de qualquer idade!
Produtos há de grande variedade,
para atender à imensa freguesia.
Os importados têm presença certa!
Salgados, doces, caldos com pimenta!
Sempre bem-vindos, quando a fome aperta!
Roupa usada, sapato, ferramenta
e um burburinho, que a atenção desperta:
É a fila do pastel que só aumenta!
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Trova Premiada em Barra do Piraí/RJ, 2000
DARLY O. BARROS
São Francisco do Sul/SC, 1941 - 2021, São Paulo/SP
“Não cedas!”, meu sonho manda,
“luta mais, redobra o empenho,
para a casa com varanda
deixar de ser só desenho!”...
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Poema de Portugal
JOÃO MARIA VILANOVA
Madeira/Angola, 1933 – 2005, Vila Nova de Gaia/Portugal
O Poeta vestido a rigor
em nossa terra
o poeta pondera o fato
poeta transcende o fato & a notícia
poeta sem astúcia
poeta sempre sempre com alguma malícia
os racistas temem o poeta
os golpistas temem o poeta
os inimigos do povo oh
esses temem o poeta
o poeta sem teto
o poeta sem teto
o poeta vestido a rigor
em seu cadáver putrefato.
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Trova Popular
Ninguém descubra o seu peito
por maior que seja a dor;
quem o seu peito descobre
é de si mesmo traidor.
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Soneto sobre Cidade do Interior
LUCÍLIA ALZIRA TRINDADE DECARLI
Bandeirantes/ PR
Cidadezinha do interior
Sequer se vê no mapa o seu ingresso…
parece um vilarejo e não cidade.
Gente pacata e afeita à honestidade,
mas sem anseios próprios do progresso.
Das frutas sobrevive a sociedade
com poucos lucros, quase em retrocesso.
Dali se vão os jovens (sem regresso),
e a lentidão prossegue, na verdade.
Ao fim da tarde, o som da “Ave-Maria,”
lá na Matriz, despede-se do dia
e, nas janelas, povo atento à fé.
Carroças e compadres se visitam…
Compartilhando tudo em que acreditam,
comadres vão servindo um bom café…
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Trova do Rio de Janeiro/RJ
LUIZ POETA
Luiz Gilberto de Barros
Desafio aceito: corto
pavios diante do fogo.
Ê assim que me comporto:
vendo a vida como um jogo.
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Poema de Portugal
ALBANO DIAS MARTINS
Aldeia do Telhado (1930 – 2018) Vila Nova de Gaia
Compêndio
Dizias: daqui o mar parece '
uma tarântula
azul. Eu respondi:
vermelhas
são as flâmulas,
das algas e o fermento
das águas.
Escrever
é isso: fazer
da vida uma pauta
e um compêndio de espuma
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Trova Humorística de São Paulo/SP
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA
Sultão velho vende, urgente,
tendas sem uso, importadas.
No aperto, dá de presente,
odalisca e esposa... usadas.
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Soneto sobre Cidade do Interior
RICARDO CAMACHO
Rio de Janeiro/RJ
Humilde lugar
Diante do cenário prazenteiro,
Imerso no silêncio, à luz do dia,
Contemplo o micromundo brasileiro,
Volvido numa doce calmaria.
Na praça, um sorridente pipoqueiro...
E, logo, a criançada, na alegria,
Pula ao sentir o irresistível cheiro,
Rompendo o império da monotonia.
De vez em quando a brisa, sonolenta,
Passa no embalo da carroça lenta
No entardecer pacato do lugar...
A escuridão dos morros argilosos
Mostra o poente e os astros luminosos
Como atração no interior de um lar.
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Trova de Santos/SP
ANTONIO COLAVITE FILHO
Daquele galho tão forte,
onde existe um velho ninho,
eu posso ouvir - e que sorte! -
o cantar de um passarinho!
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Poema de Porto/Portugal
ALBERTO DE SERPA
(1906 – 1992)
Riqueza
Por parques e praças,
Ruas e travessas,
Tu, meu olhar, caças
A vida. E tropeças.
Uma gargalhada
Vem dum par contente.
Guarda-a bem guardada,
Mas caminha em frente.
Surgem-te sorrisos
Dum e de outro lado.
Não faças juízos
Rápidos. Cuidado!
Uma face grave
Nada te revela?
Talvez a dor cave,
Só mais tarde, nela.
Num choro, num grito,
Pressentes a dor?
E quedas, aflito.
Seque, por favor!
Seque, bem aberto
Para cada canto!
Olha o desconcerto
Que parece tanto!
Corre, olhar, em roda!
O que me intimida?
A vida? Só toda
Pode amar-se, a vida.
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Trova de Campinas/SP
ARTHUR THOMAZ
No meio de uma fogueira,
as labaredas farfalham.
Em tua face trigueira,
faíscas de amor se espalham.
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Soneto sobre Cidade do Interior
GILLIARD SANTOS
Fortaleza/CE
Cidadezinha do sertão
Mulheres andam entre as aroeiras,
Enquanto o dia segue sossegado...
Um homem, devagar, conduz o gado
Para o curral e fecha-lhe as porteiras.
Chegando a noite, acendem-se as fogueiras
E o prato principal é milho assado.
Pelos terreiros corre, lado a lado,
A criançada em suas brincadeiras...
Neste cenário rústico e tão belo
Não tenho as mordomias de um castelo,
Mas sigo por caminhos que são meus.
Nenhuma falta sinto da cidade,
Pois neste reino da simplicidade
Eu vivo a vida que pedi a Deus.
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Trova Premiada em Barra do Piraí/RJ, 2000
DOMITILLA BORGES BELTRAME
São Paulo/SP
A vovó não tem memória;
perde os óculos... na testa!
Mas jamais esquece a história
da varanda... e uma seresta!...
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Soneto sobre a Vida no Interior
JÉRSON LIMA DE BRITO
Porto Velho/ RO
Vida interiorana
Entregue à inapetência do ponteiro
que marca seu compasso lentamente,
o tempo, generoso e complacente,
afaga o coração de um povo ordeiro.
A prosa na calçada, o sol dormente,
a brisa, a mata e o clima hospitaleiro
produzem novas linhas do roteiro
escrito na memória dessa gente.
Na rubra passarela preparada
desponta a noite calma e, na chegada,
promete mais brandura ao fim do dia.
Quando a simplicidade prepondera,
nenhum prazer suplanta o da quimera
que a vida interiorana propicia...
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Trova de Maringá/PR
A. A. DE ASSIS
A vida é uma corda bamba,
na qual a esperança eu ponho.
Basta um errinho e descamba
abismo abaixo o meu sonho...
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Pantun de Caicó/RN
PROFESSOR GARCIA
Pantun da alma arrependida
TROVA TEMA:
Na praça da minha vida
vi, de joelhos, em vão,
uma ofensa arrependida
pedindo abraço ao perdão...
José Valdez de Castro Moura
Pindamonhangaba/SP
PANTUN:
Vi, de joelhos, em vão,
um alguém, que nunca via,
pedindo abraço ao perdão
no altar da Virgem Maria.
Um alguém, que nunca via,
Confessa os pecados seus,
No altar da Virgem Maria,
pedindo perdão a Deus.
Confessa os pecados seus,
por sentir-se angustiada;
pedindo perdão a Deus
vi a pobre alma penada.
Por sentir-se angustiada,
tristonha e arrependida,
vi a pobre alma penada
na praça da minha vida.
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Trova da Princesa dos Trovadores
CAROLINA RAMOS
Santos/SP
Boneca sem cor, partida...
uma bola abandonada...
- Saudade mostrando à vida
quanto vale um quase nada!
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Hino de Ponta Grossa/PR
Ponta Grossa aparece na altura
Dominando campanhas natais
Temos crença na glória futura
Da princesa dos campos gerais
Nossa terra sempre será
Por seu gênio varonil
O orgulho do Paraná
Na grandeza do Brasil
Há na história de nossa cidade
O destino de um povo feliz
Dando as mãos em penhor da amizade
Onde agora se eleva a matriz
Nossa terra ainda será
Por gênio varonil
O orgulho do Paraná
Na grandeza do Brasil
Como a pomba que o barco sagrado
Com o ramo da paz retornou
Um casal de pombinhos soltado
No lugar da cidade pousou
Nossa terra ainda será
Por gênio varonil
O orgulho do Paraná
Na grandeza do Brasil
Quantas vezes o tropeiro valente
Não saudou das bandas do sul
Ponta grossa em seu trono virente
Junto à barra do céu sempre azul
Nossa terra sempre será
Por seu gênio varonil
O orgulho do Paraná
Na grandeza do Brasil
Pátria livre! No teu centenário
Férreos braços nos fazem ligar
Briareu com seu dom legendário
Bandeirantes, gaúchos e o mar
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Trova Humorística de Sorocaba/SP
DOROTHY JANSSON MORETTI
Três Barras/SC, 1926 – 2017, Sorocaba/SP
Bêbado morre afogado,
e o "colega" diz, formal:
– Ele num tava habituado,
bebeu água... se deu mal.
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Soneto sobre Cidade do Interior
ARLINDO TADEU HAGEN
Juiz de Fora/MG
Vida no interior
Já não há mais cadeiras nas calçadas
nas maiores cidades do país
mas podem ser às vezes encontradas
na parte onde a nação é mais feliz.
Deixa o progresso a sua cicatriz
ao tornar as pessoas separadas.
Porém no interior a diretriz
é manter sempre as almas irmanadas.
Os laços de amizade permanecem...
Quase todos, de fato, se conhecem.
A vida é mais pacata e mais profunda.
Pela questão somente financeira,
no entanto, muita gente de primeira
vai levando uma vida de segunda.
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Trova de Fortaleza/CE
NEMÉSIO PRATA
Vindo de tão longe, não
se deu conta que chegara
ao seu velho e antigo chão,
que há muito tempo deixara!
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Fábula em Versos da França
JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry, 1621 – 1695, Paris
A ostra e os pleiteantes
Dois peregrinos,
Um dia encontram
Na praia uma ostra,
Que o mar lançara.
Já com os olhos a sorvem, já com o dedo
A apontam um ao outro.
Pôr-lhe dente? Isso é ponto contestado.
Um se debruça
A colher preia,
E o outro o arreda.
E diz: «Saibamos
A quem compete
Ter dela o gozo.
O que a avistou primeiro, a trinque; e o outro
Veja-a com o olho,
Coma-a com a testa!
— Se o negócio, diz o outro, assim se julga,
Tenho — graças a Deus — esperto lúzio (olhos).
— Nem os meus são ruins, disse o primeiro:
Que antes que tu, a vi; por vida o juro.
— Se a viste, a mim cheirou-me.»
Neste comenos,
Chega ao pé deles
Juiz da Casinha,
Nele se louvam.
Mui grave o juiz recebe a ostra e — papa-a.
E os dois a olhar... Refeição feita:
Tomai — lhes diz, em tom de presidente —
Cada um sua casca,
Salva de custas,
E vão-se andando.»
Contai quanto hoje custa uma demanda,
E o que a muitas famílias depois fica;
E vereis que o juiz vos leva o bolo,
E vós ficais com o saco, e com os trebelhos.