quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

FC, evolução genética e o cinema (André Carneiro)

A tecnologia evolui em progressão geométrica. A aceitação ou adaptação do ser humano às comodidades cibernéticas etc., ocorre pacificamente, quase sem surpresas. Há pouco tempo atrás, “falar sozinho” significava alguém desesperado ou psicótico. O aumento repentino de pessoas nas ruas aparentemente “falando sozinhas” é surpreendente. No Brasil são agora milhões, colidem umas com as outras, com celulares nos ouvidos. .

A maioria confunde o contínuo melhoramento de nosso cenário com a nossa evolução genética, estacionária, pelo menos há trinta mil anos, quando inteligentes “primatas” desenhavam nas paredes de suas cavernas, sem banheiros, cozinhas e portas.

Mesmo entre universitários, alguns duvidam, quase ofendidos, quando se afirma: um bebê daquela época, se pudesse ser transportado para hoje, se desenvolveria em igualdade de condições mentais e físicas, semelhantes a um bebê das nossas maternidades. Um bebê de hoje, fosse criado em uma caverna daquele tempo, não se distinguiria dos outros. Alguns cientistas ousam a hipótese perturbadora: o gênero humano está em decadência, enxerga, ouve e sente menos odores do os nossos ancestrais. Não somos mais fortes, nem mais inteligentes, honestos e bondosos do que eles foram. Nossa violência, até parece ter crescido, se observarmos as manchetes diárias.

É interessante analisar a discrepância entre o valor das obras de Arte e o nosso contínuo aperfeiçoamento instrumental. Uma criação destinada a nos dar mais comodidade ou possibilidades, como qualquer parafernália industrial, tem uma vida eficiente muito curta. Objetos funcionais são logo ultrapassados e substituídos por outros mais aperfeiçoados. Isso não ocorre nas criações artísticas, de qualidades subjetivas, emocionais. Um retrospecto sobre as artes plásticas, música, literatura, mostra como elas mantêm suas qualidades através do tempo. As chamadas obras primas continuam emocionando e atraindo a admiração através dos anos. Citamos o desenho das cavernas. Até hoje seus traços sintéticos, seu valor artístico continuam no mesmo nível dos melhores desenhos contemporâneos.

Bosh, Bach, Leonardo, Picasso, atravessam os séculos, são os chamados clássicos, se mantêm na escala mais alta, sempre. Sade, Shakespeare, Kafka, tratam os temas essenciais e permanentes da humanidade, que permanecem os mesmos.

É dispensável citar outros exemplos. A razão das obras “eternas” serem assim chamadas é simples. O ser humano não evoluiu geneticamente. Com pedras, espadas ou metralhadoras nas mãos, somos os mesmos. A única diferença é que a espada primitiva matava um de cada vez, e as novas armas liquidam dezenas, ou milhares.

O Cinema, inventado dentro da revolução industrial, é a primeira arte nascida como um fruto da moderna ciência tecnológica. Ela manobra uma ilusão ótica para um resultado dinâmico que originou uma nova linguagem de grande poder comunicativo. É bom não olvidar que o ser humano é um animal racional tecnológico. Pinceis, telas para a pintura, caneta, livros na literatura, são instrumentos ou suportes tecnológicos.

O que torna o Cinema um típico filho da máquina é que ele fixa as suas imagens com um aparelho (tradicional ou digital) e necessita de outro aparelho para a obra ser visualizada.

Uma realidade estatística pouco conhecida é que a temática da ficção científica, não por mera coincidência, teve um destaque quantitativo surpreendente desde os primeiros anos da arte cinematográfica. Nos Estados Unidos, de 1897 até 1910 produziram mais de 50 filmes de ficção científica, projeções futuras do ser humano manobrando novas tecnologias. “Metrópolis”, “Frankenstein”, Solaris”, 2001”, as vezes são citados como predecessores, esquecidas as centenas que os precederam. Qualquer obra criativa artística, mesmo as de menor valor estético, refletem uma vivência humana, suas características e ideologias, sejam as chamadas reais, do nosso tempo ou as utópicas, que pretendam adivinhar um mundo futuro. A impropriamente chamada ficção científica, embora possa ser encontrada na poesia, dramaturgia e em outras artes, ocupa na literatura e na produção cinematográfica uma grande porcentagem temática.

O “leit-motiv” principal do cinema de FC é a violência do “homem” ou de um imaginado alienígena. Alguns termos, como “judiar”, provocam justas campanhas, neste caso, da comunidade judaica, por óbvias razões. A palavra “homem” é geralmente usada como sinônimo de “ser humano”. Ignoro se já se fez uma pesquisa ou tese sobre esse fato, analisando um evidente preconceito contra o sexo feminino, embora seja comum mulheres, até eruditas, usarem o Homem como sinônimo de Humanidade. Quando se fala na violência do homem, será que as mulheres estão ou não incluídas? Talvez a sub liminar desimportância das mulheres tenha se acentuado com os filósofos gregos, amplamente citados até hoje e que deixavam as mulheres completamente fora das elocubrações do Homem.

Para não ser dubitativo, posso afirmar que a violência do ser humano até este começo do terceiro milênio, é uma verdade incontestável. Esse fato é até defendido, argumenta-se que a violência, o egoísmo, a ganância movimentam as disputas, as guerras tem sido provocadoras do progresso, e até a tecnologia criada para a fabricação das bombas definitivas tem ajudado o desenvolvimento... do “homem”. As religiões pregam o amor, à solidariedade e outras qualidades adicionais.
Estatisticamente, não parece causar nenhum efeito, protestantes e católicos se assassinam na Irlanda e na Terra Santa, a mortalidade causada pelas crenças é terrível. Não é preciso buscar o velho Freud para explicar inutilmente a violência do ser humano. Vivemos nos esgueirando dentro dessa realidade. Também nós todos sabemos que o ser humano se deleita com a notícia, a descrição sangrenta dos crimes diários. Os protestos furiosos contra os crimes hediondos, não convencem os legisladores a elaborar leis mais eficientes. Assim como uma grande porcentagem dos que bradam contra as drogas ou contra o jogo, são usuários ou freqüentadores das casas lotéricas, lentamente se transformando em bancos ou repartições publicas, pois aceitam pagamentos de impostos etc. Tudo isso, costuma-se dizer, é feito pelo homem. Se a Academia Brasileira de Letras resolvesse oficializar também o termo “mulher” como sinônimo de humanidade, o que aconteceria?

A violência do ser humano poderá ser controlada, haverá meios de convencer homens e mulheres que não basta freqüentar igrejas, ouvir padres ou pastores pregarem o que ninguém segue, século adiante de século?

A resposta (não a solução) é muito fácil.

É preciso que haja mutação genética para o ser humano se transformar em coisa melhor. Baseando-se na ciência, a mutação natural, fruto do ambiente ou de alguma inexplicável reação, pode demorar séculos, ou milênios. Os relógios cósmicos são desanimadores. Nossa galáxia leva 250 milhões de anos para dar uma só volta. Por isso é razoável admitir que a violência ainda vá se repetir com trinetos dos trinetos dos trinetos em anos luz.

Há outra solução? Sim, já se começa a discuti-la, e a possibilidade está provocando um movimento internacional contrário. A ciência, desbravando o DNA, já é capaz de provocar mutações artificiais, embora ainda não consiga fazê-las com um receituário somente favorável. Os religiosos não admitem que se toque ou se manipule embriões humanos, ou se empregue órgãos dos falecidos em experiências laboratoriais, nem querem uma gestação fora do útero. Talvez temam qual seria a reação dos demônios quando o ser humano, geneticamente honesto, não mais ligasse para as tentações.
Se as normas éticas cristãs forem todas naturalmente obedecidas por um ser humano “modificado” cientificamente, as igrejas e intermediários entre Deus e os seres humanos seriam dispensáveis. O que é difícil de prever é qual seria a moral sexual desse (ou dessa) admirável “homem” ou “mulher” nova sem pecado.

Analisando a enorme criação cinematográfica dentro da FC. pode-se observar, praticamente, uma ausência de historias onde humanos ou alienígenas sejam pacíficos. Ou somos atacados e brilhantemente reagimos, como demonstra patrioticamente o cinema americano, ou...a violência dos nossos micróbios resolve a luta.
Se daqui a 50, 500 ou 5.000 anos, planetas civilizados desta galáxia confessarem ter desprezado ou sabotado contatos conosco, baseados na análise dos filmes aqui produzidos, bem... teremos de concordar com essa prudência. Não se pode confiar no homem. E a mulher? Gostaria de saber o que elas pensam.

Fonte:
artigo enviado por e-mail por André Carneiro

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