Bibliófilos e discófilos constituem uma seita que ama livros e discos acima de todas as coisas. Eles reviram sebos à procura de raridades, podem não ser nem muito eruditos nem muito importantes. Freqüentadores assíduos dos sebos – lugares onde, aos sábados, vários intelectuais também fazem ponto de encontro – eles passam horas, às vezes dias inteiros, garimpando seus “tesouros”, como costumam chamar suas obras raras.
Nos sebos há um pouco de tudo. Vale a lei da oferta e da procura. Vamos encontrar também, volumes gastos, maltratados ou sujos, edições amareladas, poeira fina, páginas rotas e preços às vezes baixos. Portanto, para quem gosta de livros o salão de festas é uma livraria ou uma biblioteca, pública ou particular.
O acervo dos sebos é formado principalmente pela aquisição de bibliotecas. A morte acaba levando os parentes a se desfazerem dos livros, seja pela dificuldade de manutenção ou simplesmente para se livrarem dos objetos que despertam saudades.
Livros ocupam espaços e os apartamentos são cada vez menores, inclusive na altura, que era por onde as estantes podiam espalhar-se. As vezes, os descendentes não tem os mesmos interesses intelectuais que o chefe da família.
As constantes mudanças de casas para apartamentos pequenos também costumam motivar as pessoas a abrirem mão de suas bibliotecas. E há aqueles proprietários, com cara e coragem, vão importunar logo a viúva ou os filhos do colecionador, e em troca de mísera quantia, transformam o seu estabelecimento em entreposto onde os bibliófilos saciam um pouco de sua sede de saber ou da mania de ter coisas... Uma coisa é certa, não é por questões financeiras, as pessoas que têm boas bibliotecas não necessitariam do pequeno rendimento que a venda de seus livros lhes proporcionaria.
Os sebos, tradicionais comércios de vendas, compras e trocas de livros usados, e que em outras cidades é apenas isso mesmo – comércio, embora trabalhando com mercadoria cultural – que aos poucos vai adquirindo traços de verdadeiro movimento cultural em ascensão, trazendo expectativas de um redimensionamento não só aos que trabalham no ramo mas aos próprios caminhos do comportamento de quem impulsiona a cultura.
O comércio de livros usados se perde na noite dos tempos em todos os países de tradição editorial ele existe, como oportunidade de se encontrar obras raras e esgotadas a preço barato. Em Paris, é denominado de “bouquinerie”, e todo turista que visitou a capital francesa conheceu o pitoresco da fileira de bancas de livros às margens do rio Sena.
No Brasil, os estabelecimentos deste tipo receberam a denominação “sebos”. Nas grandes cidades brasileiras, certas ruas e bairros caracterizam-se pela proliferação deles. É o caso do bairro de Pinheiros, em São Paulo ou o da rua São José, no Rio de Janeiro, que durante muito tempo teve esta característica, de rua dos sebos.
Sebo é enriquecimento cultural: é um local onde se encontra material de vanguarda tradicionalista. Sebo é também antropologia: o livro usado é a história de um leitor, com anotações, frases sublinhadas e história muitas vezes documentada em fotos e documentos familiares esquecidos em páginas passadas e repassadas, e que sebistas sensíveis e atentos já estão colecionando e catalogando em pastas apropriadas. Existe até um Guia de Sebos Brasileiros, que teve sua 1a. edição em 1990.
É ainda nos sebos que vão parar alguns dos volumes roubados das Bibliotecas Públicas, do Arquivo Público, do Instituto Geográfico e Histórico, da Academia de Letras, de Instituto e colégios particulares – como atestam os respectivos carimbos.
Já é tempo de que o humanismo dos sebos seja reconhecido em seu papel social e cultural. Que as pessoas aprendam a ter na palavra “sebo”, quando se trata deste tipo especial de comércio, não mais uma palavra agressiva e feia, e sim algo que recorde bons momentos de convivência com estes amigos fiéis e sábios: os livros, os discos, as revistas...
Num país que a crise econômica vem transformando o hábito de ler num verdadeiro luxo, uma saída para não pagar os preços de ficção científica cobrados pelas livrarias é comprar nos sebos. Hoje, os sebos não são só dos caçadores de livros raros ou das classes mais pobres. O universo de consumidores cresceu e sebistas continuam ampliando seus negócios.
Nesses pontos se vendem, se compram e se trocam livros de literatura, filosofia, história, didáticos, enfim, de todas as especialidades e até mesmo pornográficos. Revistas e também coleção de jornais podem ser encontrados.
Não há preço fixo no sebo. Tudo está aberto a negociação. “O preço, agente discute”, diz um proprietário. Para os sebistas conta muito a curiosidade do freguês. E se alguém demonstrar necessidade e urgência em adquirir um certo volume, o sebista anota tudo com a sua psicologia básica. Neste caso o livro é valorizado. O sebista tem faro para negócio, percebe o tipo de freguês e até a forma como paquera um livro usado. Por este motivo é que se questiona o item”raridade de um volume”. O que pode ser raro para um, pode ser figurinha fácil para outro.
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Gilfrancisco é jornalista, pesquisador e professor universitário.
Fonte:
http://www.portrasdasletras.com.br/pdtl2/sub.php?op=literatura/docs/sebo
Nos sebos há um pouco de tudo. Vale a lei da oferta e da procura. Vamos encontrar também, volumes gastos, maltratados ou sujos, edições amareladas, poeira fina, páginas rotas e preços às vezes baixos. Portanto, para quem gosta de livros o salão de festas é uma livraria ou uma biblioteca, pública ou particular.
O acervo dos sebos é formado principalmente pela aquisição de bibliotecas. A morte acaba levando os parentes a se desfazerem dos livros, seja pela dificuldade de manutenção ou simplesmente para se livrarem dos objetos que despertam saudades.
Livros ocupam espaços e os apartamentos são cada vez menores, inclusive na altura, que era por onde as estantes podiam espalhar-se. As vezes, os descendentes não tem os mesmos interesses intelectuais que o chefe da família.
As constantes mudanças de casas para apartamentos pequenos também costumam motivar as pessoas a abrirem mão de suas bibliotecas. E há aqueles proprietários, com cara e coragem, vão importunar logo a viúva ou os filhos do colecionador, e em troca de mísera quantia, transformam o seu estabelecimento em entreposto onde os bibliófilos saciam um pouco de sua sede de saber ou da mania de ter coisas... Uma coisa é certa, não é por questões financeiras, as pessoas que têm boas bibliotecas não necessitariam do pequeno rendimento que a venda de seus livros lhes proporcionaria.
Os sebos, tradicionais comércios de vendas, compras e trocas de livros usados, e que em outras cidades é apenas isso mesmo – comércio, embora trabalhando com mercadoria cultural – que aos poucos vai adquirindo traços de verdadeiro movimento cultural em ascensão, trazendo expectativas de um redimensionamento não só aos que trabalham no ramo mas aos próprios caminhos do comportamento de quem impulsiona a cultura.
O comércio de livros usados se perde na noite dos tempos em todos os países de tradição editorial ele existe, como oportunidade de se encontrar obras raras e esgotadas a preço barato. Em Paris, é denominado de “bouquinerie”, e todo turista que visitou a capital francesa conheceu o pitoresco da fileira de bancas de livros às margens do rio Sena.
No Brasil, os estabelecimentos deste tipo receberam a denominação “sebos”. Nas grandes cidades brasileiras, certas ruas e bairros caracterizam-se pela proliferação deles. É o caso do bairro de Pinheiros, em São Paulo ou o da rua São José, no Rio de Janeiro, que durante muito tempo teve esta característica, de rua dos sebos.
Sebo é enriquecimento cultural: é um local onde se encontra material de vanguarda tradicionalista. Sebo é também antropologia: o livro usado é a história de um leitor, com anotações, frases sublinhadas e história muitas vezes documentada em fotos e documentos familiares esquecidos em páginas passadas e repassadas, e que sebistas sensíveis e atentos já estão colecionando e catalogando em pastas apropriadas. Existe até um Guia de Sebos Brasileiros, que teve sua 1a. edição em 1990.
É ainda nos sebos que vão parar alguns dos volumes roubados das Bibliotecas Públicas, do Arquivo Público, do Instituto Geográfico e Histórico, da Academia de Letras, de Instituto e colégios particulares – como atestam os respectivos carimbos.
Já é tempo de que o humanismo dos sebos seja reconhecido em seu papel social e cultural. Que as pessoas aprendam a ter na palavra “sebo”, quando se trata deste tipo especial de comércio, não mais uma palavra agressiva e feia, e sim algo que recorde bons momentos de convivência com estes amigos fiéis e sábios: os livros, os discos, as revistas...
Num país que a crise econômica vem transformando o hábito de ler num verdadeiro luxo, uma saída para não pagar os preços de ficção científica cobrados pelas livrarias é comprar nos sebos. Hoje, os sebos não são só dos caçadores de livros raros ou das classes mais pobres. O universo de consumidores cresceu e sebistas continuam ampliando seus negócios.
Nesses pontos se vendem, se compram e se trocam livros de literatura, filosofia, história, didáticos, enfim, de todas as especialidades e até mesmo pornográficos. Revistas e também coleção de jornais podem ser encontrados.
Não há preço fixo no sebo. Tudo está aberto a negociação. “O preço, agente discute”, diz um proprietário. Para os sebistas conta muito a curiosidade do freguês. E se alguém demonstrar necessidade e urgência em adquirir um certo volume, o sebista anota tudo com a sua psicologia básica. Neste caso o livro é valorizado. O sebista tem faro para negócio, percebe o tipo de freguês e até a forma como paquera um livro usado. Por este motivo é que se questiona o item”raridade de um volume”. O que pode ser raro para um, pode ser figurinha fácil para outro.
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Gilfrancisco é jornalista, pesquisador e professor universitário.
Fonte:
http://www.portrasdasletras.com.br/pdtl2/sub.php?op=literatura/docs/sebo
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