terça-feira, 11 de março de 2008

O Anão e o Gigante

Um anão que media apenas dois palmos e era mais terrível do que a fome, certo dia saiu em busca de trabalho, pois estava muito necessitado. Procurou por toda parte, mas ninguém queria lhe dar emprego. Por fim, encontrou um gigante, que disse:
– Vou contratar seus serviços, mas com uma condição.
– E que condição é essa?
– Você terá que fazer as mesmas coisas que eu. Se não fizer, será morto. Se fizer, ficará rico.
– De acordo. Se eu me sair bem, serei um homem próspero. Se não, você me matará.
– Isso.
Na manhã seguinte, o gigante convidou o anão para roubar lenha numa fazenda cujo dono tinha fama de ser violento, sobretudo com aqueles que ousavam invadir sua propriedade. E os dois lá se foram.
Ao chegar à fazenda, o gigante começou a trabalhar. Juntou um imenso feixe de lenha e o ergueu nos ombros. Mas o anão, sem se impressionar com a façanha do gigante, pegou uma corda muito comprida e estendeu-a no chão. Depois começou a recolher gravetos, arrumando-os cuidadosamente, um ao lado do outro, sobre a corda.
O gigante, curioso, perguntou:
– O que você está fazendo?
O anão, sem interromper sua meticulosa tarefa, respondeu:
– Ora, esse feixe que você está levando não é nada.
– Não? Pois quero ver você carregar um igual.
– Farei muito melhor – respondeu o anão. – Enquanto não colocar sobre a corda toda a madeira que há neste bosque, não sairei daqui.
– Mas, homem, você está maluco! – o gigante exclamou assustado. – Desse jeito, o dono da fazenda vai nos descobrir e nos matar!
– Pouco me importa – disse o anão. – Já decidi e não volto atrás: ou levo o bosque inteiro ou não levo nada.
– Então, deixe estar. Esta você ganhou. Mas vamos sair daqui, rápido.
E lá se foram, o gigante com seu grande feixe, o anão com as mãos nos bolsos.
No dia seguinte, o gigante convidou o anão para buscar água.
A alguns quilômetros de distância havia uma nascente que, com suas águas límpidas e puras, supria os habitantes do povoado.
– Vamos lá – disse o gigante, pegando dois baldes enormes.
– Eu não carrego baldes – disse o anão. – Para mim, bastam uma picareta e uma pá.
– E para que diabos você quer essas ferramentas?
O anão nada respondeu. Os dois caminharam em silêncio até a nascente. Lá chegando, o gigante repetiu a pergunta, dessa vez num tom ameaçador. Muito calmo, o anão disse:
– Para mim não tem graça carregar baldes. O que eu quero mesmo é desviar toda essa água para sua casa. Assim, você poderá viver tranquilamente, sem pensar mais nesse assunto.
Pegando a picareta e a pá, o anão começou a cavar, enquanto dizia:
– Talvez eu demore um pouco, mas vou fazer o fluxo de água mudar de rumo.
O gigante reagiu assustado:
Você ficou maluco, homem! Se o pessoal do povoado descobrir isso, estaremos perdidos.
– Pouco me importa – respondeu o anão, sem interromper o que fazia. – Ou levo toda a água da nascente para casa ou não levo nada.
– Já chega de cavar – disse o gigante, entregando os pontos. – Você também ganhou esta.
No dia seguinte, os dois foram ao centro do povoado. No pátio da prefeitura, alguns homens treinavam para um torneio de lançamento de dardos, que aconteceria em breve. O gigante resolveu entrar no jogo. Pegou um dardo e lançou-o muito longe, bem mais do que todos os outros jogadores. Voltando-se para o anão, disse:
– Agora é a sua vez.
O anão escolheu um dardo, examinou-o com atenção e ordenou:
– Afastem-se, pois preciso de espaço para jogar.
Todos recuaram, mas o anão insistiu:
– Para trás! Muito mais para trás, minha gente!
– Mas aonde você pretende atirar este dardo? – perguntou o gigante.
Apontando uma casa, no topo de uma colina, o anão respondeu:
– Está vendo aquela janela, a mais alta? Pois é lá que vou atirar.
– Mas o que há com você, homem?
– Nada, oras. Só que me deu vontade de acertar lá, que com certeza é a janela do sótão.
– Mas aquela é a casa do prefeito. E se você jogar mesmo esse dardo, iremos parar na cadeia.
– Pois ou acerto a janela, ou não jogo mais.
– Então, vamos parar por aqui – disse o gigante.
– E como ficam nossas contas?
– Você também ganhou esta.
Na manhã seguinte, o gigante carregou um burro com dois alforjes cheios de dinheiro. Chamou o anão e disse-lhe que podia ir embora, pois o trato estava terminado. O anão montou o animal, despediu-se de seu ex-patrão e partiu.
A mulher do gigante, que estava a par de tudo, repreendeu-o severamente:
– Como você é estúpido! Nem percebeu que aquele anão trapaceou o tempo todo. E ainda por cima saiu ileso, levando seu burro e seu dinheiro.
Caindo em si, o gigante respondeu:
– Tem razão. Agora mesmo vou acabar com aquele salafrário.
O anão já ia longe, quando viu que o gigante se aproximava furioso. Então escondeu o burro atrás de uns arbustos e colocou-se bem no meio da estrada, a cabeça jogada para trás, a mão em concha sobre os olhos fixos no céu, como se procurasse algo.
Logo o gigante chegou e disse:
– O que é que você está olhando?
E o anão, calmo como sempre, respondeu:
– Nada…É que o burro que você me deu não estava podendo com a carga e começou a empacar. Então, dei-lhe um pontapé com tanta força, que ele foi parar lá no alto e até agora não caiu. Estou só esperando que chegue aqui embaixo para lhe dar outro. E com esse, garanto, ele nunca mais vai descer.
Ao ouvir isso, o gigante correu de volta para casa muito assustado:
– Meu Deus, Nossa Senhora, que todos os santos do Céu me protejam! Se me descuido, ele fará isso comigo também.
E assim o anão retomou a viagem em paz, com seu burro, seu dinheiro, suas artes, suas manhas.

Fonte:
Contos Populares Espanhóis. Tradução e seleção Yara Maria Camillo. São Paulo: Landy Editora, 2005. p. 13-16.

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