domingo, 11 de maio de 2025

Hans Christian Andersen (Mãe)


Sentada ao pé do leito do filhinho, a mãe angustiada receia que ele morra. O rosto da criança empalideceu, e ele fechou os olhinhos. Respirava com dificuldade, e de vez em quando parecia suspirar. E nesses momentos o olhar da mãe era ainda mais cheio de ternura.

Batem à porta. Entra uma velha pobre, envolta em um velho manto: bem precisava ela de alguma roupa quente, na verdade, pois esta história se passou em pleno inverno. Lá fora tudo estava coberto de gelo e de neve, e soprava um vento tão cortante, que gretava o rosto.

A velha tiritava, e  como a criancinha adormecera por um instante, a mãe foi por na lareira uma caneca de cerveja, para que a velha a bebesse quentinha. A visitante sentou-se na cadeira, e ficou acalentando a criança, enquanto a mãe se acomodou em uma cadeira velha, ao seu lado; tinha os olhos fixos no filhinho doente, que respirava com dificuldade, e segurava-lhe a mãozinha.

- Não te parece que não vou perdê-lo? Deus Nosso Senhor não me tirará, não é?

A velha - que era a Morte - sacudiu a cabeça de uma maneira estranha, que tanto podia significar sim, como não. A mãe baixou os olhos, derramando lágrimas. Pesava-lhe a cabeça; havia três dias e três noites que não pregava olho. E adormeceu, por um único minuto. Despertou sobressaltada, transida de frio; olhou em volta, aflita. Sumira-se a velha, sumira-se a criança. No seu canto, o velho relógio sussurrava e rangia. O forte peso de chumbo ia até o chão. E de repente...Pum! ...O relógio parou .

Saiu a pobre mãe correndo, e gritando pelo filhinho.

Lá fora, no meio da neve, estava sentada outra mulher, com um vestido preto muito comprido, que lhe disse:

- Quem esteve no teu quarto foi a morte. Vi quando ela fugiu, levando teu filhinho. Anda mais veloz que o vento, e nunca devolve o que tirou.

-Dize-me que caminho ela tomou - é só o que te peço! Dize-me por onde ela foi, hei de encontrá-la!

- Eu sei o caminho - disse a mulher de preto - Mas antes que o mostre, canta-me todas as canções que cantaste para o teu filhinho. Gosto delas: ouvi-as, em tempos passados. Sou a noite, e vi tuas lágrima, quando as cantava.

- Cantá-las-ei para ti - todas, todas! Mas tem piedade! Não faças perder tempo: preciso alcançá-la, preciso recuperar o meu filhinho.!

Mas a noite ali ficou, muda e imóvel. Então a mãe, torcendo as mãos, cantou: cantava, chorando. Foram muitas as canções, mas ainda as lágrimas. E a Noite disse então:

- Entra à direita daquele pinheiral tenebroso. Vi a Morte tomar esse  rumo, levando o teu filhinho.

Dentro da floresta cerrada o caminho bifurcava-se e ela ficou sem saber que lado tomar. Mas viu um espinheiro, despido de flores ou folhas, porque era inverno rigoroso; os galhos estavam cheios de flocos de gelo.

- Não viste passar a Morte com o  meu filhinho?

- Vi, sim. Mas só te direi que caminho tomou, se me aqueceres no teu peito. Estou morrendo de frio! Já estou gelado!

E ela apertou o espinheiro firmemente ao peito para que ele degelasse. Os espinhos se lhe cravavam na carne, o sangue escorria em grandes gotas. Mas o espinheiro brotou: na noite glacial, rebentou em folhas e flores - tão grande é o calor , junto ao coração dolorido de uma mãe. Então lhe mostrou o caminho.

E a mãe chegou a um grande lago, sem barco nem balsa. Não estava tão gelado que pudesse suportar o seu peso; nem tão livre e raso, que desse passagem à vau. Todavia ela precisava atravessá-lo, para encontrar o filho. Então a mãe se deitou, para beber o lago e assim esgotá-lo. Nenhum ser humano pode conseguir semelhante coisa. Mas a mãe, no meio da sua imensa dor, esperava que se produzisse um milagre.

- Não, nunca o conseguirás! - disse o lago. - Vamos ver se podemos chegar a um acordo. Eu gosto de colecionar pérolas, e teus olhos são duas das mais fascinantes que já vi. Se quiseres deixá-los cair em mim, juntamente com as tuas lágrima, levar-te-ei para a grande estufa onde mora a Morte, cultivando flores e árvores. Cada planta ali é uma vida humana.

- Que não daria eu para chegar até onde está meu filhinho! - disse a mãe.

E ela chorou e chorou, e seus olhos caíram no fundo do lago, e lá viraram em duas pérolas preciosas. Mas o lago, como se fosse um balanço, ergueu-a e, num tirão só, levou-a até a outra margem. havia lá uma casa, maravilhosa, de uma légua de comprimento; nem se sabia bem se aquilo era um cerro, cheio de bosques e cavernas, ou uma obra de carpintaria. A pobre mãe, contudo, não a podia ver, porque chorara os olhos, juntamente com as lágrimas.

- Onde poderei encontrar a Morte, que carregou meu filhinho?

- Ela ainda não chegou - disse uma velha de cor embaciada, que andava por ali vigiando a estufa da Morte. - Mas como encontraste o caminho? Quem  te auxiliou?

- O Senhor Deus me ajudou. Ele é misericordioso e tu também o serás agora. Onde poderei encontrar meu filhinho?

- Não o conheço. E tu não enxergas. Esta noite murcharam muitas flores e muitas árvores. A Morte não tardará a chegar, para as transplantar. Sabe bem que cada criatura humana tem uma árvore ou uma flor da vida, conforme a sua índole. Tem a aparência de plantas comuns, mas possuem coração, que bate. O coração das crianças também pode pulsar. Guia-se pelas pulsações: talvez  reconheças a do teu menino. Mas que me darás tu para que te diga o que ainda será preciso fazeres?

- Nada tenho para dar - respondeu a mãe, angustiada. - Mas irei para ti até o fim do mundo, se quiseres.

- Não tenho negócios por lá - disse a velha. - Mas podes dar-me teu lindo cabelo preto. Sabes, certamente, que é lindo, não é? Pois gosto muito deles! Em troca, podes levar o meu, todo branco. sempre é alguma coisa...

- Se é o que desejas - exclamou a mãe - dou-te meu cabelo com muita alegria.

E deu-lhe os lindos cabelos, recebendo em troca a cabeleira branca da velha.

Entraram então na grande estufa da Morte, onde cresciam em maravilhosa convivência, árvores e flores. Havia ali belos jacintos, abrigados em redomas, e grandes peônias, vigorosas como árvores. e plantas aquáticas, umas bem frescas e viçosas, outras meio doentes, que tinham cobras d'água na corola, e caranguejos pretos seguros à haste. Viam-se também palmeiras esplêndidas, carvalhos e plátanos; salsa e tomilho em flor. Todas as árvores e flores tinham nome, e cada uma representava uma vida humana. E esse seres humanos estavam ainda vivos, um na China, outro na Groenlândia – por todas as partes do mundo. Haviam árvores grandes em vasos pequenos, de modo que as raízes ficavam apertadas, e vasos estavam a ponto de estourar; outras flores frágeis e franzinas, achavam-se em terra forte, rodeadas de musgo, mimadas e bem tratadas. A mãe aflita debruçava-se sobre todas as plantas pequenas, para escutar-lhes as pulsações do coração. E, entre milhões, reconheceu o coração do seu filhinho.

- Aqui está ele! - gritou ela, estendendo os braços para um pequeno açafrão, que, doentio, já estava derreado.

- Não toques na flor! - gritou a velha. - Quando a Morte chegar - espero-a a todo instante - não a deixes a arrancar a planta; dize-lhe que arrancarás todas as outras flores. Ela ficará assustada com essa ameaça, porque é responsável perante Deus. Nenhuma delas deve ser arrancada antes que Ele o permita.

Nesse momento passou pela sala um sopro glacial, e a mãe cega sentiu que era a Morte que chegava.

- Como conseguiste achar o caminho? Como foi que chegaste mais cedo do que eu?

- Sou mãe.

A Morte estendeu o braço em direção à pequenina flor fanada, mas a mãe a cerrava entre as  mãos, abrigando-a com firmeza - com tanto carinho, que não tocava em uma só pétala, A Morte soprou-lhe nas mãos, e a mãe sentiu que aquele hálito gelado era mais frio do que o vento mais gélido. E as mãos penderam-lhe inerte.

- Nada podes contra mim! - disse ela.

- Mas Deus pode - respondeu a mãe.

- Eu faço apenas o que Ele manda. Sou o Seu  jardineiro. Tomo todas as Suas flores e árvores, a fim de transplantá-la para o grande jardim do paraíso, no país desconhecido. Não te posso dizer, porém, de que modo elas crescem ali, nem como vivem.

- Devolve-me meu filho! - suplicou a mãe. exclamando.

E segurou nas mãos as duas flores mais bonitas,

- Apanharei todas as tuas flores... tamanho é o meu desespero!

- Não toques nelas! - gritou a Morte. - Dizes que és tão infeliz , e queres fazer com que outra mãe seja igualmente infeliz?

- Outra mãe? - murmurou a pobre mulher, largando imediatamente as duas flores.

- Toma teus olhos! - disse a Morte. - Pesquei-os no lago, Seu brilho subia do fundo, e eu não sabia que eram teus. Fica com eles: agora estão ainda mais límpidos do que eram antes. Lança um olhar para o fundo desse poço profundo. Direi o nome das duas flores que querias arrancar, e verás o que tencionava destruir e aniquilar.

A mãe olhou para dentro do poço. Grande alegria era ver uma das flores, que se tornava uma benção para ao mundo, espalhando felicidade e alegria ao redor de si. Depois apareceu a vida da outra, formada de preocupação e de miséria, de tristeza e calamidades.

- Ambas as coisas saem da vontade de Deus – disse a Morte.

- Qual das duas é a flor da desgraça, e qual é a abençoada?

- Não te direi. mas fica sabendo: uma dessas flores é a do teu filho. O que viste é o destino do teu filhinho, o futuro do teu próprio filho!

Ouvindo essas palavras a mãe lançou um grito de aflição.

- Qual é a de meu filho: Dize-me! Liberta a inocente criança! Redime o meu filho daquela miséria! Antes leva-o contigo! Leva-o para o reino de Deus! Esquece as minhas lágrimas! Esquece os meus rogos, esquece tudo o que fiz!

- Não te compreendo - disse a Morte. - Queres que eu te devolva o teu filho, ou devo levá-lo para aquele lugar que não conheces?

E a mãe, torcendo as mãos, ajoelhou-se, para suplicar a Deus:

- Senhor! Não me escutes, se eu te pedir uma coisa contra a Tua vontade, que é sempre a melhor! Não me escutes, não me escutes!

E baixou a cabeça sobre o peito.

E a Morte foi embora, levando a criança para o país desconhecido.
* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * 

Hans Christian Andersen foi um escritor dinamarquês, autor de famosos contos infantis. Nasceu em Odense/Dinamarca, em 1805. Era filho de um humilde sapateiro gravemente doente morrendo quando tinha 11 anos. Quando sua mãe se casou novamente, Hans se sentiu abandonado. Sabia ler e escrever e começou a criar histórias curtas e pequenas peças teatrais. Com uma carta de recomendação e algumas moedas, seguiu para Copenhague disposto a fazer carreira no teatro. Durante seis anos, Hans Christian Andersen frequentou a Escola de Slagelse com uma bolsa de estudos. Com 22 anos terminou os estudos. Para sair de uma crise financeira escreveu algumas histórias infantis baseadas no folclore dinamarquês. Pela primeira vez os contos fizeram sucesso. Conseguiu publicar dois livros. Em 1833, estando na Itália, escreveu “O Improvisador”, seu primeiro romance de sucesso. Entre os anos de 1835 e 1842, o escritor publicou seis volumes de contos infantis. Suas primeiras quatro histórias foram publicadas em "Contos de Fadas e Histórias (1835). Em suas histórias buscava sempre passar os padrões de comportamento que deveriam ser seguidos pela sociedade. O comportamento autobiográfico apresenta-se em muitas de suas histórias, como em “O Patinho Feio” e “O Soldadinho de Chumbo”, embora todas sejam sobre problemas humanos universais. Até 1872, Andersen havia escrito um total de 168 contos infantis e conquistou imensa fama. Hans Christian Andersen mostrava muitas vezes o confronto entre o forte e o fraco, o bonito e o feio etc. A história da infância triste do "Patinho Feio" foi o seu tema mais famoso - e talvez o mais bonito - dos contos criados pelo escritor. Um dos livros de grande sucesso de Hans Christian Andersen foi a "Pequena Sereia", uma estátua da pequena sereia de Andersen, esculpida em 1913 e colocada junto ao porto de Copenhague/ Dinamarca, é hoje o símbolo da cidade. Quando regressou ao seu país, com 70 anos de idade, Andersen estava carregado de glórias e sua chegada foi festejada por toda a Dinamarca. Após uma vida de luta contra a solidão, Andersen logo se viu cercado de amigos. Faleceu em Copenhague, Dinamarca, em 1865. Devido a importância de Andersen para a literatura infantil, o dia 2 de abril - data de seu nascimento - é comemorado o Dia Internacional do Livro Infanto-juvenil. Muitas das obras de Andersen foram adaptadas para a TV e para o cinema.

Fontes:
Hans Christian Andersen. Contos. Publicados originalmente entre 1835 – 1872. Disponível em Domínio Público
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing

sexta-feira, 9 de maio de 2025

Asas da Poesia * 19 *


Trova de
LUÍZA FILLUS
Irati/PR

Bendita realidade
quando a paz for preservada
não deixar a humanidade
viver mais desamparada.
= = = = = = = = =  

Poema de
SOLANGE COLOMBARA
São Paulo/SP

Soneto de um amor impossível

E devagar você foi chegando...
No meu coração se aconchegando.
Os meus dias frios tornaram-se verão,
De tanto carinho, houve a explosão.

Que vício delicioso é sua boca.
Nossos corpos colados sem roupa.
Nunca imaginei sentir algo assim,
Maravilhoso do começo ao fim.

Fomos felizes ao estarmos juntos.
Ríamos como dois adolescentes,
Nos olhávamos profundamente.

Era meu refúgio, meu bem querer.
Sem você, tudo perdeu o sentido.
Sem você, não conseguirei viver.
= = = = = = = = =  

Trova de
LUCILIA A.T. DECARLI
Bandeirantes/PR

O tempo intervém nos passos
e a vontade predestina,
se elimino os meus fracassos,
ou me curvo à triste sina!
= = = = = = = = =  

Soneto de
DOMINGOS FREIRE CARDOSO
Ilhavo/ Portugal

Antes que vosso amor meu peito vença
(Soror Violante do Céu in "Cem Sonetos Portugueses", p. 31)

Antes que vosso amor meu peito vença
Eu me entrego ao exército inimigo
Desse olhar que me traz em grande perigo
De eu mesma já não ser de mim pertença.

É uma peleja a vossa benquerença
Mesmo sem espada a que haveis comigo
E antes que, por derrota, ache castigo
A minha mão vos dou, em recompensa.

Madrigais foram armas da batalha
Insistindo fenderam a muralha
Onde eu guardava a minha castidade.

A vós se rende, alegre, o coração
Fazei dos vossos braços a prisão
Onde eu, feliz, me sinta em liberdade.
= = = = = = = = =  

Trova de
JESSÉ FERNANDES DO NASCIMENTO
Angra dos Reis/ RJ

Contemplo maravilhado,
me inspirando em cada verso,
o céu noturno estrelado
embelezando o universo.
= = = = = = 

Poema de
ATÍLIO ANDRADE
Curitiba/PR

Poeira

A poeira
que o tapete
esconde
é a divisória
entre nós…
Do saber
e do não ver,
do ver e crer
e do não querer saber.
É na decência
que se ilumina
a descrença
na utopia
do dia a dia.
= = = = = = 

Trova de
MARIA HELENA URURAHY CAMPOS DA FONSECA
Angra dos Reis/ RJ

Quando a noite em seu langor
se despede embriagada,
o amanhecer, em louvor,
ilumina a madrugada.
= = = = = = 

Poema de
CARLOS FERNANDO BONDOSO
Alcochete/ Portugal

Vi-te no vento

olho-te
nos passos dos meus olhos
vejo escolhos
solidão e silêncios

lanço os braços agasalhos
frios pensamentos
afagados por momentos
no teu rosto quente

sinto-te
na difusa luz da minha mente

amor
por ti estou aqui
o brilho que sinto
no espaço que serpenteias
são teias teares e meias
que me vestem
nos silêncios

danças dançarinas
embaladas não foram meninas
foram melodias acabadas pelo som dos tambores
foram canções onde brotei amor e falei de ti

vi-te no vento

diluindo fugiste
deixas-te as partículas da dor
no tempo
corro e não consigo abraçar
o momento
que passa e que graça

agarro o Sol o brilho marfim
espiga
o teu sorriso de mulher
na minha alma de poeta
sim!
= = = = = = = = = 

Trova de
LÉLIA MIGUEL MOREIRA DE LIMA
Angra dos Reis/ RJ

Aquela folha que vaga,
naquela mata sou eu!
Aquele vento que afaga,
lembra quando tu eras meu.
= = = = = = 

Poema de
OLAVO BILAC
Rio de Janeiro/RJ, 1865 – 1918

A boneca

Deixando a bola e a peteca,
Com que inda há pouco brincavam,
Por causa de uma boneca,
Duas meninas brigavam.

Dizia a primeira: “É minha!”
— “É minha!” a outra gritava;
E nenhuma se continha,
Nem a boneca largava.

Quem mais sofria (coitada!)
Era a boneca. Já tinha
Toda a roupa estraçalhada,
E amarrotada a carinha...

Tanto puxaram por ela,
Que a pobre rasgou-se ao meio,
Perdendo a estopa amarela
Que lhe formava o recheio.

E, ao fim de tanta fadiga,
Voltando à bola e à peteca,
Ambas, por causa da briga,
Ficaram sem a boneca...
= = = = = = 

Trova de 
ADEMAR MACEDO
Santana do Matos/ RN, 1951 – 2013, Natal/ RN

Em humor não me destaco, 
mas, por pura peraltice; 
mesmo não sendo macaco, 
vou fazendo macaquice.
= = = = = = 

Poema de 
CRIS ANVAGO
Lisboa/ Portugal

Existe sim, uma força maior,
um querer, um desejo
de caminhar lado a lado

O coração só quer amar
E ser amado!
= = = = = = 

Trova de
IZO GOLDMAN
Porto Alegre/RS, 1932 – 2013, São Paulo/SP

Ficou rico o Zé Maria
na seca do Juazeiro,
vendendo "fotografia 
de chuva"... por "dois cruzeiro"...
= = = = = = 

Poema de
CÉLIA EVARISTO
Lisboa/Portugal

Leva-me contigo

Leva-me contigo
sempre que viajares por aí.
Guarda-me de mansinho,
seguirei deveras em ti.
Mas não vás sem mim,
não me deixes, por favor, assim.

Não me trates como uma desconhecida,
como se não te tivesse tocado jamais.
Fazes-me sentir perdida,
apenas mais uma entre as demais.
És o caminho que tanto sigo,
leva-me contigo.

E se não me levares,
que eu aprenda a sossegar o meu coração
que respira e palpita,
que sangra por dentro e por fora,
que a ansiedade devora,
ao sabor desta emoção.
= = = = = = 

Trova de
CAROLINA RAMOS 
Santos/ SP

Se a ternura nos aquece
e um grande amor nos ampara,
é quando a penumbra desce
que a vida fica mais clara!
= = = = = = 

Hino de
OSASCO/SP

De mãos dadas, unidos, mil sonhos
Gestaremos no sul do querer
O ontem vitória dos tempos
Faz o hoje feliz florescer
É Osasco cantando a História
As glórias de um povo em ação
O movimento dos autonomistas (bis)
E voos que a vista
Dá no coração

Osasco
Osasco brilha
Na América do Sul
Foi em Osasco que o Homem
Sonhou e conquistou
O céu azul

Osasco
Osasco trilha
Os corações do porvir
Do trabalho ao esporte: a semana (bis)
A arte proclama
Um jeito de ser Brasil

De mãos dadas, cultura e raças
Se embalaram num mesmo querer
E do sonho se fez a cidade
Que hoje se orgulha de ser
"Osasco-Cidade Trabalho"
Bandeira de um povo em ação
Unido na fé e esperança (bis)
Brasão da vitória
Do "SIM" sobre o "NÃO"

Osasco
Osasco brilha
Na América do Sul
Foi em Osasco que o Homem
Sonhou e conquistou
O céu azul

Osasco
Osasco trilha
Os corações do porvir
Do trabalho ao esporte: a semana (bis)
A arte proclama
Um jeito de ser Brasil
= = = = = = = = =  

Trova de
SÍLVIA ALICE DE CARVALHO SOARES
Angra dos Reis/ RJ

No jogo do “perde e ganha”
Da guerra da Humanidade,
até sonho se barganha,
pois falta autenticidade!
= = = = = =

Poema de
APARECIDO RAIMUNDO DE SOUZA
Vila Velha/ES

Mudez

Sentado na calçada
do meu silêncio,
escuto vozes de parentes
que já se foram...
Não sei se irei revê-los
um dia,
em algum lugar, talvez, quem sabe...
e o silêncio, nada esclarece...
Apenas, como eu,
segue ao meu lado, sem dizer nada.
= = = = = = = = =  

Trova de
NEUSA APARECIDA MOREIRA MAIA
Angra dos Reis/ RJ

Coração apaixonado
não se cansa de esperar,
retorna sempre ao passado,
para o amor reencontrar.
= = = = = = = = =  

Poema de 
ANTERO JERÓNIMO
Lisboa/ Portugal

Impunidade

Das muralhas frontais da tua determinação
Pensamento vigilante nas ameias da coragem
Com o fogo do sangue correndo nas veias
Implodiste a vontade de respirar liberdade
Na noite longa clareaste a madrugada

Hoje as muralhas estão corroídas
erodidas por ventos agrestes de corrupção
As ameias enfraquecidas de valores
não conferem proteção ao amor pelo próximo
Corre pelas veias o sangue da indiferença
cobiça e inveja são armas dilacerantes
O dia cinzento ecoa em seu prolongado lamento.

Levantem-se as sentinelas da integridade
Sacuda-se das vestes o cheiro bafiento* a impunidade!
= = = = = = = = =  
* Bafiento = mofado
= = = = = = = = =  = = = = 

Trova de
RITA MOURÃO
Ribeirão Preto/ SP

Minha casa é pequenina, 
com janelas sem vidraça, 
mas tem a luz genuína 
que do céu me vem de graça.
= = = = = = = = =

Aldravia de
LUIZ GONDIM
Rio de Janeiro/RJ

incorporo
emoções
onde
debruço
meus
cansaços
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Poema de
PEDRO MACHADO ABRUNHOSA
Porto/ Portugal

Viagens

Já vai alta a noite, vejo o negro do céu,
deitado na areia, o teu corpo e o meu.
Viajo com as mãos por entre as montanhas e os rios,
e sinto nos meus lábios os teus doces e frios.
E voas sobre o mar, com as asas que eu te dou,
e dizes-me a cantar: "É assim que eu sou".
Olhar para ti e ver o que eu vejo,
olhar-te nos olhos com olhares de desejo.
Olhar para ti e ver o que eu vejo,
olhar-te nos olhos com olhares de desejo.
Eu não tenho nada mais pra te dar,
esta vida são dois dias,
e um é para acordar,
das historias de encantar,
das historias de encantar.
Viagens que se perdem no tempo,
viagens sem princípio nem fim,
beijos entregues ao vento,
e amor em mares de cetim.
Gestos que riscam o ar,
e olhares que trazem solidão,
pedras e praias e o céu a bailar,
e os corpos que fogem do chão.
= = = = = = = = =  

Poema de
ALESSANDRA GUIMARÃES
Ubiratã/PR

Madrugada fria

Todos dormem,
num profundo sono.
Rua deserta e silenciosa,
pássaros quietos, se escondem.
Somente gotículas de orvalho,
caindo sobre a calçada,
na madrugada fria.

A lua se esconde,
atrás de uma nuvem que passa,
tornando a noite mais escura.
Nuvens formosas,
carregadas d’água,
se congelam,
na madrugada fria.

O brilho das estrelas,
no infinito desaparecem.
O riacho murmura, levemente,
o vento sopra calmamente,
o eco se cala lentamente,
somente o amor vibra,
na madrugada fria.
= = = = = = = = =  

Quadra Popular
AUTOR ANÔNIMO

Vai-te, carta venturosa,
vai ver a quem quero bem,
diz-lhe que eu fico chorando
por não poder ir também.
= = = = = = = = =  

Décimas de
UGOLINO DO SABUGI
(Ugolino Nunes da Costa)
Teixeira/PB, 1830 – 1893

As obras da natureza 

As obras da Natureza 
     São de tanta perfeição, 
     Que a nossa imaginação 
     Não pinta tanta grandeza! 
     Para imitar a beleza 
     Das nuvens com suas cores, 
     Se desmanchando em louvores 
     De um manto adamascado, 
     O artista, com cuidado, 
     Da arte, aplica os primores.

Brilham, nos prados, verdumes 
     De um tapete aveludado; 
     Brilha o rochedo escarlado*, 
     Das penhas seus altos cumes; 
     Os montes formam tais gumes, 
     Que a gente, os observando, 
     Vê como que se alongando, 
     Sumir-se na imensidade ... 
     Nossa visibilidade 
     os perde se está olhando.
= = = = = = = = =  
* Escarlado = Cor brilhante de carmesim vivo
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Triverso de
PAULO LEMINSKI
Curitiba/PR, 1944 – 1989

tudo dito,
nada feito,
fito e deito
= = = = = = = = =  

Soneto de
PEDRO MELLO
União da Vitória/PR

Pequeno tratado sobre a dor

A dor do infarto, dor que chama a morte,
a dor que ataca um mal cuidado dente,
a dor pós-cirurgia, a dor do corte,
a dor da cãibra, o músculo torcente...

o chute acidental... e um homem forte
da partida-batalha sai dormente...
a dor do câncer faz perder o norte,
a dor do parto abala quem a sente...

Mas entre dores tantas, afinal,
qual é a que faz alguém perder o sono
e despencar o pranto sem contê-lo?

...É a dor de todos, dor universal,
amargo resultado do abandono,
a dor pior... é a dor de cotovelo…
= = = = = = = = =  

Trova de
OLIVALDO JUNIOR
Mogi-Guaçu/SP

Entre velhos pergaminhos,
chilreando feito gralhas,
namorados são pombinhos
que dividem as migalhas.
= = = = = = = = =  

Spina de
ISABEL PERNAMBUCO
Maceió/AL

Jardim em flor...

Passeio num jardim
de flores perfumadas
regadas com carinho

Lindas borboletas celebram a vida,
atraídas pelas cores que cintilam!
Colibri em liberdade constrói ninho,
sugando suave néctar das amarílis!
Rosas, lírios, ipês, ornam caminho.
= = = = = = = = =  

Haicai de
GUILHERME DE ALMEIDA
Campinas/SP, 1890 – 1969, São Paulo/SP

Equinócio

No fim da alameda
há raios e papagaios
de papel de seda.
= = = = = = = = =  

Epigrama de
MILLÔR FERNANDES
Rio de Janeiro/RJ, 1923- 2012

Aqui jaz minha mulher
que partiu para o Além.
Agora descansa em paz
e eu também.
= = = = = = = = =  

Soneto de
IALMAR PIO SCHNEIDER
Porto Alegre/RS

O soneto

Para escrever quatorze linhas, tenho
que dedicar o tempo disponível,
e embora seja humilde meu engenho,
vale a pena, afinal, tornar possível

esta tarefa nobre de alto nível...
É preciso sonhar e ter empenho
de alimentar um grande amor incrível,
somente realizável por um gênio...

Sinto, no entanto, que não devo alçar
voo tão alto, e me penitenciar
de assim querer e então me comprometo

a desobedecer esta vontade;
e caindo, por fim, na realidade,
aqui me despedir... Eis o Soneto !…
= = = = = = = = =  

Limerique de 
TATIANA BELINKY
São Petersburgo/Rússia, 1919 – 2013, São Paulo/SP

Quem pensa que eu sou uma ogra
No seu pensamento malogra.
Língua bifurcada?
Só quando enfezada.
Porque eu sou mesmo é sogra.
= = = = = = = = =

A. A. de Assis (Você tem um horológio?)


Aposto que tem, ou já teve, um ou mais. Ninguém vive hoje sem ele; aliás somos quase todos escravos dele. Mas vamos começar pelo começo.

A mitologia tem deuses para tudo. Para cuidar das coisas relacionadas com o tempo há pelo menos dois: Cronos e Hórus. Daí que o dedo deles aparece com frequência no vocabulário.

Da família de Cronos temos, por exemplo, “cronômetro” (aparelho utilizado para medir o tempo decorrido); “crônico” (que dura todo o tempo); “cronologia” (estudo dos eventos na ordem do tempo, ou seja, em ordem cronológica).

Da família de Hórus, temos “hora” (tempo equivalente a 60 minutos), bem como “horário”, além do primo “horóscopo”, que entra aí por ter a ver com os astros, e a medição do tempo é baseada no movimento dos astros.

Mas a  história do “horológio” é muito antiga – vem desde aquele engenhozinho conhecido como ampulheta. Porém, segundo os alfarrábios, o horológio só começou a pegar mesmo o jeito de horológio a partir do século 725 dC. Um monge budista chinês chamado Yi Ching teria sido o fabricante do primeiro horológio mecânico de que se tem notícia. Funcionava com um conjunto de engrenagens e 60 baldes de água, que correspondiam a 60 segundos.

Mas tudo o que existe precisa ter um nome. Não sei como era em chinês. No mundo ocidental os romanos deram à preciosa ferramenta um epíteto adequado: “horologium” (marcador das horas).

Só que na passagem do latim para o português o povão não entendeu bem a palavra, e ao reproduzi-la por escrito grafava “o relógio”. Em espanhol aconteceu algo parecido (“reloj”), mas no francês continuou “horloge” e no italiano só perdeu o “h” (orologio).

Com o rolar dos séculos as coisas vão se modificando, algumas para pior, porém a maioria para melhor. O  relógio, por exemplo, se aperfeiçoou tanto que hoje alguns deles são classificados como joias.

Uma história bonita e longa. Até o nosso Santos Dumont aparece no enredo, visto que a ele tem sido atribuída a invenção do reloginho de pulso. Na verdade, todavia, não teria sido realmente ele o inventor, mas foi ele quem popularizou o aparelhinho, que costumava usar enquanto pilotava o 14-Bis.

Todo mundo continua tendo um horológio. A diferença é que agora o nome é “celular.

(Crônica publicada no Jornal do Povo – Maringá – 24.4.2025)
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A. A. DE ASSIS (Antonio Augusto de Assis), poeta, trovador, haicaísta, cronista, premiadíssimo em centenas de concursos nasceu em São Fidélis/RJ, em 1933. Radicou-se em Maringá/PR desde 1955. Lecionou no Departamento de Letras da Universidade Estadual de Maringá, aposentado. Foi jornalista, diretor dos jornais Tribuna de Maringá, Folha do Norte do Paraná e das revistas Novo Paraná (NP) e Aqui. Algumas publicações: Robson (poemas); Itinerário (poemas); Coleção Cadernos de A. A. de Assis - 10 vol. (crônicas, ensaios e poemas); Poêmica (poemas); Caderno de trovas; Tábua de trovas; A. A. de Assis - vida, verso e prosa (autobiografia e textos diversos). Em e-books: Triversos travessos (poesia); Novos triversos (poesia); Microcrônicas (textos curtos); A província do Guaíra (história), etc.

Fontes:
Texto enviado pelo autor.
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Carol Canabarro (Dicas de escrita) Por que definir o público-alvo dos seus textos?


A primeira vez que ouvi do Prof. Marcelo Spalding que para um texto ser considerado bom, dentre outras coisas, o autor precisa conhecer seu público, os pelos da minha sobrancelha se arrepiaram. Como escrever com tantas pessoas sussurrando em meus ouvidos?

Produzi meus textos sem levar em conta a orientação e, só quando fui publicar meu primeiro texto, compreendi que a importância de definir o público-alvo está em:

1. Limitar para expandir

Estabelecer o público-alvo, por mais paradoxal que pareça, não é restringir o alcance da sua obra, mas reconhecer suas fronteiras para, em alguns casos, extrapolá-las. Se você vende sapatos, uma padaria não é o melhor lugar para ofertá-los, assim como livros de ficção científica podem não ter grande saída entre religiosos.

Ressalva: Uma vez que sua obra está no mundo, nada impede que pessoas de fora do seu público originário as leiam.

2. Você é responsável pelo que cativa

Literatura é arte que escorre da ponta dos dedos de escritores para a retina dos leitores. Nesse sentido, definir o público-alvo é essencial para que o diálogo autor-leitor se torne assertivo e envolvente. Além do mais, como artistas que são, os escritores devem escrever com responsabilidade. Sua visão de mundo seguirá nas páginas muito tempo depois dele mesmo.

3. A linguagem é como uma pele

Toda temática é passível de virar literatura, mas como será entregue difere para cada público. Por exemplo, o luto foi abordado de uma maneira suave e didática em "Menina Nina", de Ziraldo, e profunda e reflexiva por Aline Bei em "O peso do pássaro morto". Mesmo tema, duas possibilidades de abordá-lo, duas obras necessárias.

4. Não se perca no País das Maravilhas

Plagiando Lewis Carroll: "Para quem não sabe com quem fala, toda ou nenhuma orelha serve". Sua obra é como uma carta a ser entregue, sem destinatário ela permanecerá lacrada. Conheça onde moram, como vivem e o que pensam as pessoas que têm maior similaridade com seu trabalho. Um livro onde a personagem principal faz refeições magníficas talvez não seja indicado para pessoas enfrentando distúrbios alimentares. Além de responsável, o escritor deve ser empático.

5. Escritor também paga boleto

Vivemos (até o momento) em um mundo capitalista. Como artista, o escritor jamais deve se vender, mas sua obra pode ser fonte de sustento. Saber para quem, quando e como ofertar seu produto é tão crucial para o engorde da sua conta bancária quanto o livro em si. Definir o público-alvo é o primeiro passo para estabelecer estratégias de marketing.

6. Não se corrompa pela vaia ou pelo aplauso

Escrever para agradar o outro é colocar mil mãos por cima da sua. Deixe as expectativas externas do lado de fora (sic) e lide apenas consigo. Você terá batalhas mais do que suficientes para vencer diante do espelho.

Como diz o professor Assis Brasil: "Seu compromisso, perene, reconhecido e inalienável, é consigo mesmo e com a arte que escreve." Porque, ouso complementar, antes de existir o leitor é preciso que exista o autor.
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Carol Canabarro, é de Porto Alegre/RS, apaixonada por literatura e animais. Foi atleta, garçonete, especuladora financeira e professora. pós-graduanda em Literatura, Arte e Filosofia da PUC-RS. Escritora, formada no curso de Escrita Criativa da Metamorfose, autora de "Mirando o gol, acertando as estrelas".

Fontes:
Escrita Criativa. Metamorfose.
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