quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Olivaldo Júnior (A Felicidade)

É com lágrimas nos olhos que lhe conto esta história. Foi há muito tempo, quando as cidades, por mais próximas que fossem, eram sempre um pouco mais longe do que são hoje. Ontem, parece que foi ontem que tudo aconteceu. Tem um tempo sobrando? Pois, então, chega aqui, senta mais perto.

Era um menino de calças curtas, com a esperança de chegar a ver quem desde sempre ouviu falar. Era alguém que esperava a Felicidade. Felicidade... "Será que ela é velha? Deve ser! Minha avó já falava nela! Deus, que ela não morra até me ver, ou melhor, até que eu veja ela!...", era o pensamento do menino cujo nome era Tomé. Tomé, sim, nome de santo, de quem se diz que só acredita em algo quando vê, toca, cheira, escuta e prova o que existe. Mas, coitado, se assim fosse mesmo, jamais conheceria a Felicidade, que essa coisa, ou pessoa, ou ente, não se vê, não se toca, não se cheira, não se escuta, nem se prova. Só é possível intui-la. A intuição da Felicidade é o que nos faz vê-la, tocá-la, cheirá-la, escutá-la, prová-la e, aí sim, experimentá-la. Você já experimentou a Felicidade? Viu, tocou, cheirou, escutou, provou e intuiu o mundo pelas mãos desse poder, dessa fada hermética, divina?

- Ei, menino! Menino! Quer saber onde é que mora a Felicidade?, perguntou ao garoto um senhor, o Cego da Estação, um homem tão pobre que vivia da compaixão daquela velha cidade.

- Quero, sim, senhor! É o que mais quero na vida!!!, respondeu o menino ao cego. E fazia um dia lindo, com um azul lustroso no céu, carneirinhos de lã pastando ao longe, perto do Sol.

- Está vendo aquela montanha, depois do fim da cidade, pertinho de Deus? É lá que ela mora. Eu iria com o menino, mas, como vê, sou cego de nascença, enjeitado de pai e mãe, sem nada...

O menino, mesmo radiante com a informação, entendeu o que o cego lhe pedia e tirou do bolso as moedinhas que tinha. O dia estava ao meio. Se corresse, chegaria logo ao topo da montanha e, depois de tanta espera, finalmente se encontraria com aquela que, mesmo pedida como presente de Natal, não era trazida, a Felicidade. Que mistério o aguardaria? Como será que ela era? Como?

Voltou para casa e, escondido da mãe, pegou seu embornal de aventuras e saiu correndo em direção à montanha, depois do fim da cidade, pertinho de Deus.

O terreno a se escalar na montanha era íngreme, cheio de pedras que, ao toque do minúsculo pé do menino, rolavam montanha abaixo, espantando os urubus que já se amontoavam, ardilosos, à espera de que o pior ocorresse. "Um menino daquele tamanho escalando? Ah, vai dar em queda!...", pensavam.

Meus olhos já se enchem de lágrimas de novo. Desculpe-me. É que a vida, o menino, ai, ai...

Já eram quase três da tarde. O topo estava próximo. "Como custa a chegar!", pensou o menino. "Há de valer a pena! A Felicidade!..". Um tanto cego pela luz que reluzia cruelmente nas pedras, um pouco antes de chegar ao topo, viu uma luz sem igual. "Era ela! Estou perto!", disse para si mesmo o pequeno. "Não me escapa! Vou te pegar, Felicidade!...". E a luz lhe revelava uma caverna, de que a luz ficava mais forte a cada suave passo do pobre. Pé ante pé, suor no rosto, passos titubeantes, sol do deserto, e... zás! Uma coruja lhe vem de encontro e lhe sangra os olhos, derrubando-o no chão! Os urubus, enfileirados, previam a morte iminente, mas, desconfiada, a mãe do garoto pediu a um velho amigo que o seguisse. Chegou tarde. Quando alcançou o menino, este, que já estava com as mãos cobrindo os olhos, chorava, soluçava e gritava que não era justo, tinha que vê-la, tinha que vê-la, o cego mentiu!

Num dos ombros do amigo da mãe, desceu a montanha, cruzou a cidade, chorando, chorando muito. Ao longe, o cego, sabendo o que tinha feito, se riu e começou a cantar um velho cântico.

O menino usava calças curtas e mantinha a esperança de chegar a ver quem desde sempre ouviu falar. Era alguém que esperava a Felicidade. Felicidade... "Será que ela é velha? Deve ser! Minha avó já falava nela! Deus, que ela não morra até me ver, ou melhor, até que eu veja ela!...", era o pensamento do menino cujo nome era Tomé. Sim, Tomé, nome de santo.

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