Comprou para si máscaras rosas. Para Alberto, azuis, e o amaria com elas pela primeira vez nesse pandêmico 2020, transformado em ano-horror de tantas mortes e festival de sandices macabras da TV buscando audiência!
Por isso, apertou os passos a despeito da chuvarada sobre as costas. Já não eram os passos de shopping, demorados diante das vitrines, mas os de chuva com travessias às gordas e potentes enxurradas a molharem os pés, além de se incomodar com os pingos vazados da velha sombrinha. Mas todo esse esforço valeria. Alberto havia falado que chegaria na quinta, e já era terça...
- Ops! já era terça, ou ainda era terça? perguntas bobas que a saudade inventa de inventar na cabeça da gente... – e seguiu com esses pensamentos que a levavam a ora se preocupar com a ausência do amado, ora se incandescer de desejo pela proximidade do dia em que viria... por isso, se sujeitou a sair com o tempo ruim apenas para comprar as ditas máscaras, possibilitando que o namoro acontecesse.
Sem elas, diziam, a Covid faria estrago... Melhor cuidar!
Tateando paredes e cuidando com a chuva, chegou, empurrou o portão, subiu os degraus, meteu a chave na fechadura, torceu, empurrou e entrou. O barulho da água no telhado e a escorrer pela calha abafou o seu estardalhaço de chegada. Aí deixou a sombrinha pingar, a capa no espaldar e a sacola de compras sobre a mesa. Aproveitou para se olhar no espelho já meio embaçado, sorriu, secou o pingo na testa respirando aliviada: - bastava um tico para Alberto chegar.
Desfez os pacotes, separou as máscaras ajeitando-as pelas cores. Não via a hora de, estando mascarada, amá-lo com a paixão ditando ordens, e cantou sussurrando;
- É o amor... que mexe com minha cabeça e me deixa assim, que faz eu pensar em você e esquecer de mim, que faz eu esquecer que a vida é feita pra viver...
Ensaiou uns passos de dança e pensou: - Alberto, ah! Meu Berto... amor da minha vida... se eu pudesse, sabe o que mudaria em você? Somente o seu CEP. Para o meu! Em definitivo...
Nesse instante, como coisa pensada, um barulho vindo dos cômodos a alertou, deixando-a preocupada.
O que seria? Quem seria?
Ao se virar para conferir, a surpresa: era Alberto que tendo chegado minutos antes da chuva, entrara e, com a casa vazia, se deixou descansar da viagem e agora, com ela ali a mexer e a cantarolar, aproveitara para se aproximar, o que a fez apenas abrir os braços, tempo mais que suficiente para abraçá-lo e se derreter no seu abraço, a amolecer-se nos seus beijos, a suspirar nos seus suspiros, para rapidamente se despindo por inteira, suar nos seus suores, tremer nos seus tremores e a gemer nos seus regalos, tão bom e tão suave se mantinha. Tal qual havia imaginado e vivido mais de uma vez em pensamento.
Ali na sala, sobre a mesa, sem qualquer falso pudor, com as roupas jogadas aos pés, alcançaram rapidamente o ápice sem se lembrarem da maldita Covid.
As máscaras? Bem, elas, as azuis e rosas, se espalharam pelo chão pelo reboliço dos corpos sedentos de amor, porque ele, esse tal amor, o mais sublime dos sentimentos quando explode elimina, nem que seja por instante, qualquer ameaça de contágio. O perigo, naquele momento, seria se preocuparem com as malditas que impedem a respiração.
E a vida? Bem, a vida seguiu... e segue bem quando há amor a ser compartilhado, tanto na presença como na ausência, assistido sempre pela constância.
O Alberto que o diga…
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RENATO BENVINDO FRATA, trovador e escritor, nasceu em Bauru/SP, em 1946, radicou-se em Paranavaí/PR. Formado em Ciências Contábeis e Direito. Além de atuar com contador até 1998, laborou como professor da rede pública na cadeira de História, de 1968 a 1970, atuou na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Paranavaí, (hoje Unespar), atualmente aposentado. Atua ainda, na área de Direito. Fundador da Academia de Letras e Artes de Paranavaí, em 2007, tendo sido seu primeiro presidente. Acadêmico da paranaense Confraria Brasileira de Letras. Seus trabalhos literários são editados pelo Diário do Noroeste, de Paranavaí e pelos blogs: Taturana e Cafécomkibe, além de compartilhá-los pela rede social. Possui diversos livros publicados, a maioria direcionada ao público infantil.
Fontes:
Renato Benvindo Frata. Crepúsculos outonais: contos e crônicas. Editora EGPACK Embalagens, 2024. Enviado pelo autor.
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing
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