terça-feira, 4 de março de 2025

Vereda da Poesia = 222


Soneto de
ANÍBAL BEÇA
Manaus/ AM, 1946 – 2009

MALA COM ALÇA

É da lama essa mala que retiro
para subir a encosta (como a pedra
que Sísifo ainda empurra todo dia)
numa viagem cheia de sequelas.

Não há como negar tantos espinhos
na travessia turva de mistérios
que vão-se descobrindo nos caminhos:
a mão negada, a fome, o vitupério,

o rito solidário que esquecemos
em troca a vaidade transitória.
Somos do barro e ao barro voltaremos.

A verdade do Homem e de sua Hora
vem com mala e alça, disto sabemos,
mais o peso do corpo e sua história.
= = = = = = = = =  

Trova de
HUMBERTO RODRIGUES
São Paulo/SP

Vê como a sorte judia 
do nosso amor (coitadinho!):
a tua cama tão vazia,
e eu na minha tão sozinho!
= = = = = = 

Poema de
SILVIAH CARVALHO
Manaus/AM

AMO

Amo os beijos da sua boca
E o enlace dos seus braços

Amo, como quem ama... Somente
Como um amor outrora ausente... Que volta
No deslace do desejo ardente

Amo o calor do corpo seu
Tudo em ti que, agora é meu

Amo o fogo que não se apaga
A fonte que encandeia

O vento que nos abrasa
 Nas noites de lua cheia

Amo o tempo moroso
E  o amor que, em amor se encerra
Puro, eterno... Gostoso.
= = = = = = = = =  

Trova de
RENATO ALVES
Rio de Janeiro/RJ

Eu peço a Deus que a Esperança
nunca venha a ter um fim,
que sempre alimente a criança
que mora dentro de mim!
= = = = = = 

Poema de
DOMINGOS FREIRE CARDOSO
Ilhavo/ Portugal

QUANDO EU VOLTAR À TERRA DE ONDE VIM
(Glória Marreiros in "Colar de Pérolas", p. 19)

Quando eu voltar à terra de onde vim
Não chorem que essas lágrimas não trazem
O meu olhar ao chão onde se fazem
As rosas que incendeiam um jardim.

Nem rezem, nesse já morto Latim
Ladainhas que em nada satisfazem
As pálidas lembranças em que jazem
Os restos do melhor que havia em mim.

Entreguem o meu corpo ao fogo santo
Que o limpe do pecado e do quebranto
Até que dele sobre apenas pó.

E o meu penar talvez não seja em vão
Vendo que o trigo, antes de ser pão
Primeiro há de passar por qualquer mó.
= = = = = = = = = 

Trova de
DOROTHY JANSSON MORETTI 
Três Barras/SC, 1926 – 2017, Sorocaba/SP

Tecendo trovas ao vento 
nascidas do coração, 
num pouco de luz e alento, 
eu disfarço a solidão.
= = = = = = 

Soneto de
AFONSO FREDERICO SCHMIDT
Cubatão/ SP, 1890-1964, São Paulo/SP

O POEMA DA CASA QUE NÃO EXISTE

Onde a cidade acaba em chácaras quietas
e a campina se alarga em sulcados caminhos
achei a solidão amiga dos poetas
numa casa que é ninho, entre todos os ninhos.

Térrea, branquinha, com portadas muito largas,
desse azul português das antiquadas vilas
e uma decoração de laranjas amargas
que perfumam da tarde as aragens tranquilas.

Ergue-se no pendor suave da colina,
escondida por trás dos eucaliptos calmos;
tem jardim, tem pomar, tem horta pequenina,
solar de Liliput que a gente mede aos palmos ...

Neste ponto, a ilusão, a miragem, se some;
olho para você, eu triste, você triste.
Enganei uma boba! O bairro não tem nome,
a estrada não tem sombra, a casa não existe!
= = = = = = 

Trova do 
PROFESSOR GARCIA
Caicó/ RN

O outono da vida ingrata,
chega fazendo atropelos:
Joga tinta cor de prata,
na tinta dos meus cabelos!
= = = = = = 

Poema de
FILEMON MARTINS
São Paulo/ SP

APÓS A TEMPESTADE

O vento chega e sopra muito forte
anunciando, em trovões, a tempestade,
as folhas arrancadas com vontade
revoam à mercê da injusta sorte.

Raios cortam o céu de Sul a Norte,
um prenúncio de horror, calamidade,
estrondos são ouvidos na cidade
gerando medo, caos e a própria morte.

Tristonha, a tarde se vestiu de escuro,
e a chuva desabou estrepitosa
como se castigasse o povo impuro.

A noite chega e adentra pela fresta,
céu estrelado e a lua tão formosa
e a Natureza, eu vi, estava em festa!
= = = = = = = = =  

Trova de
VIVIANE ROSSI CHAVES
Bandeirantes/PR

Minha mãe sempre falava:
"Não existe assombração..."
Mas eu sempre perguntava:
E "cheque-fantasma", então?
= = = = = = 

Balaio de Versos de
NEMÉSIO PRATA
Fortaleza/CE

A MENTIRA

Mentira tem perna curta... 
diz o dito popular; 
e só em quem dela se furta 
devemos acreditar! 

Se tu mentes, eu proponho: 
não mintas! Mesmo dormindo 
isto é feio, e nem em sonho 
eu quero te ouvir mentindo! 

A mentira só tem graça 
dita pelo Pantaleão; 
na verdade ela é uma traça 
que corrói qualquer união! 

Sabe, aquela "mentirinha" 
dita..., sem má intenção? 
Pois é..., como esta "coisinha" 
fere o nosso coração; 
e a dor por ela causada 
só pode ser reparada 
quando se pede perdão! 

Quem planta uma "mentirinha" 
no pomar do coração 
mal sabe que esta "plantinha" 
destrói toda plantação; 
e deve logo arrancá-la 
pela raiz, e queimá-la 
na fogueira do perdão! 
= = = = = = 

Trova de
APARÍCIO FERNANDES
Acari/RN, 1934 – 1996, Rio de Janeiro/RJ

Nome dos mais esquisitos,
que, aliás, não foi bem posto;
há na Rua dos Aflitos
uma calma que faz gosto…
= = = = = = 

Soneto de
HEGEL PONTES
Juiz de Fora/MG (1932 – 2012)

LADAINHAS DA SAUDADE

Vem, companheira,
encostar o silêncio de tua fronte
no meu ombro de espera
e derramar no meu peito
a maciez de teus cabelos.

Que madrugadas vazias
alongavam teus pensamentos
no caminho do silêncio?

Entendo que não digas.

A solidão,
que pintava a tristeza nos teus olhos,
também segredava em meus ouvidos
ladainhas e ladainhas de saudade.

Vem, companheira,
para o leito dos meus braços
desmentir angústias
de noites indetermináveis.

Minhas mãos
transbordam carícias
que tua inventou…

Vem, companheira,
fecha os olhos
e deixa que anoiteça.
= = = = = = = = =  = = = = 

Trova de
FERNANDO REIS COSTA
Coimbra/Portugal

Pra mim, a fé e a esperança
devem andar de mãos dadas:
Pois quem tem fé, sempre alcança
as coisas mais desejadas!
= = = = = = = = = 

Cantiga Infantil de Roda
PASSARINHO DA LAGOA 
(cateretê/toada, 1949)

É uma roda de meninas, cantando:

Passarinho da lagoa
Se tu queres avoar
Avoa, avoa
Avoa já

O biquinho pelo chão
As asinhas pelo ar
Avoa, avoa
Avoa já

Quando dizem — O biquinho pelo chão — todas se curvam, imitando o passarinho. 
Quando cantam — As asinhas pelo ar — todas levantam os braços e balançam, imitando o bater das asas dos pássaros
= = = = = = = = =  

Quadra Popular de
AUTOR ANÔNIMO

Resposta branda e suave
quebra da ira o furor;
palavras duras excitam
ressentimento e rancor.
= = = = = = = = =  

Poema de
VANICE ZIMERMAN
Curitiba/PR

SEMENTES DE CEREJAS

Hoje, no fim de tarde,
Acariciei  a terra
E à sombra do teu sorriso
Plantei com amor,
As sementes de cerejas,
Cerejas que colhi para você…
= = = = = = 

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