sábado, 18 de junho de 2011

Ialmar Pio Schneider (O Idoso Apaixonado)


Quem se dispõe a passar algumas horas sentado num banco da praça da Alfândega em frente aos cines Guarany e Imperial, de repente pode assistir a um instantâneo, no mínimo burlesco, qual se descreve abaixo. Faz parte das cenas urbanas que não deixam de ser até certo ponto apreciadas, não obstante, às vezes jocosas e risíveis. Isto não aconteceu ao nosso herói, mas ele as presenciou em diversas oportunidades, conservando-se, no entanto, timidamente, na solidão recôndita, apenas curtindo o sentimento de foro íntimo que o acompanha qual a própria sombra.

Contudo, agora sentira na carne o que representava uma paixão tardia, ainda mais alimentada por certos conselhos ou insinuações de colegas que o faziam para instigar-lhe o interesse por alguém mais jovem. Ainda não queria se considerar coroa, apesar de já estar na terceira idade. Sempre ouvira dizer que vale o espírito mais que a matéria.

Sua vontade era esquecer aquela moçoila que vira num certo dia, atravessando a rua em frente à praça, seguindo rumo ao shopping da Rua da Praia. No auge dos seus sessenta anos, Rodrigues achava ridículo apaixonar-se por alguém de vinte, que poderia ser-lhe neta; e sentado num banco, junto com outros companheiros aposentados, ficava imaginando no que lhe dissera o Torres, num entardecer de outubro: - “Cavalo velho, pasto novo !” De fato, a idade chegara, quase sem que se desse conta, mas ele nunca deixou de apreciar a estética feminina, e aquela moça parecia uma estátua de Fídias, uma Amazona. Sentia-se, entretanto, retraído, pois já presenciara, ali mesmo, certos velhos que mexiam com as meninas serem escorraçados com as seguintes expressões: “Vai conhecer o teu lugar, coroa !” “Te fraga, velho caduco !” “Não te conhece ?” - e outras mais.

Entretanto, desta vez, não iria desistir. Estudava uma maneira de aproximar-se do fruto do seu bem-querer, ainda, que para tanto, fosse necessário sacrifício e dedicação. Nesta quadra da vida, a pessoa se torna mais afável quanto ao estímulo do amor, embora haja quem diga que o velho seja ranzinza. Isto depende de cada sujeito. Todos têm o seu temperamento e Rodrigues é um romântico-melancólico. Chega em seu quarto de pensão e liga o rádio. Casualmente, na Rádio Liberdade, escuta o Sérgio Reis cantando - “panela velha é que faz comida boa” de Moraesinho e fica satisfeito. Existe alguém que o compreende.

Fontes:
Texto enviado pelo autor
Imagem = Fabricia Lima Sales

Monteiro Lobato (Caçadas de Pedrinho) II - A volta para casa


Foi um delírio de contentamento. Os caçadores rodearam a onça morta, discutindo as peripécias da formidável aventura. Emília reclamou logo todas as honras para si.

— Se não fosse a minha espetada com o espeto de assar frango, queria ver...

— O que decidiu tudo foram as facadas que eu dei — alegou Narizinho.

— Qual nada! Juro que foi o meu tiro de canhão — disse Rabicó.

— Pexote! — berrou Pedrinho. — A bala de canhão nem arranhou a pele da onça, não está vendo?

Como daquela disputa pudesse sair briga, o Visconde ponderou gravemente:

— Todos ajudaram a matar a onça e todos merecem louvores. Mas se não fosse a pólvora de Pedrinho, estaríamos perdidos; de maneira que a Pedrinho cabe a melhor parte da vitória. Depois de cegar a onça, tudo ficou mais fácil e cada qual fez o que pôde. Basta de discussões. Em vez disso, tratemos mas é de levá-la para casa.

Os heróis concordaram com o sensatíssimo Visconde e Pedrinho afundou no mato para tirar cipós, visto não terem trazido corda. Logo depois reapareceu com um rolo de cipó ao ombro.

— Segure aqui! Puxe lá! Força! Vamos!...

Pedrinho conduziu o trabalho da amarração da onça ajudado por todos, menos Emília, que se afastara dali e estava numa grande prosa com dois besouros que tinham vindo assistir à cena. Bem amarrada que foi a onça, era preciso conduzi-la até a casa. Foi o que mais custou. Em certo ponto do caminho, Rabicó, que suava em bicas, parou para tomar fôlego.

— Francamente — disse ele — prefiro matar dez onças a puxar uma só! Estou que não posso mais...

Pararam todos para um bem merecido descanso e sentaram-se em cima do pêlo macio da fera morta. Vendo que o sol já ia alto, Narizinho disse:

— Pobre vovó! Passa bem maus momentos por nossa causa. A estas horas deve estar aflitíssima a procurar-nos por toda parte...

— Mas vai consolar-se vendo a bichona que matamos — disse Pedrinho.

“Que matamos, uma ova!”, pensou, lá consigo, Rabicó. “Que eu matei com o meu tiro de canhão, isso sim.”

Pensou apenas. Não teve coragem de o dizer em voz alta, de medo do pontapé que Pedrinho fatalmente lhe pregaria.

Descansados que foram, prosseguiram na caminhada. Duas horas depois avistavam a casa, e viram Dona Benta e Tia Nastácia, muito aflitas, procurando-os pelo pomar. Pedrinho pôs na boca dois dedos e desferiu um célebre assobio que só ele sabia dar. As velhas voltaram-se na direção do som e Tia Nastácia, que tinha melhor vista, enxergou-os logo.

— Lá vêm vindo eles, sinhá! e vêm puxando uma coisa esquisita... Quer ver que caçaram alguma paca?

Aproximaram-se os heróis. Penetraram no terreiro. Narizinho, de longe, gritou:

— Adivinhe, vovó, o que matamos!

Dona Benta respondeu:

— Uns danadinhos como vocês são bem capazes de terem matado alguma paca...

A menina deu uma risada gostosa.

— Qual paca, nem pêra paca, vovó! Suba!

— Então, algum veado — lembrou a velha, começando a arregalar os olhos.

— Suba, vovó!

— Porco-do-mato, será possível?

— Suba, suba!

Dona Benta principiou a abrir a boca.

— Então foi capivara...

— Vá subindo, vovó!

A boa senhora não sabia como subir além duma capivara, que era o maior animal existente por ali. Narizinho, então, chegou-se para ela e disse, fazendo uma careta de apavorar:

— Uma onça, vovó!

O susto de Dona Benta foi o maior da sua vida — tão grande que caiu sentada, com sufocação, exclamando:

— Nossa Senhora da Aparecida! Esta criançada ainda me deixa louca...

Mais corajosa, a negra aproximou-se, viu que era mesmo onça e:

— O mundo está perdido, sinhá — murmurou, de mãos postas. — É onça mesmo...
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continua ... III – Os habitantes da mata se assustam
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Fonte:
LOBATO, Monteiro. Caçadas de Pedrinho/Hans Staden. Col. O Sítio do Picapau Amarelo vol. III. Digitalização e Revisão: Arlindo_San

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 240)


Uma Trova Nacional

Alô, quem fala? – é o Germano.
– Diga-me, o hospício é aí?
– Não senhora, houve um engano.
Nem tem telefone aqui!
–CÉLIA GUIMARÃES SANTANA/MG–

Uma Trova Potiguar

Um locutor, empolgado,
no rádio, com a audiência,
deixa no ar, um som borrado,
por sonora flatulência...
–FABIANO WANDERLEY/RN–

Uma Trova Premiada

1990 - Fortaleza/CE
Tema: ARAPUCA - M/E.

Quando o diabo me cutuca,
dizendo que ela entendeu,
eu preparo uma arapuca,
mas quem cai nela sou eu...
–FLÁVIO ROBERTO STEFANI/RS–

Uma Trova de Ademar

Com sua língua de trapo,
disse, ao ser mandado embora:
– É moleza engolir sapo;
o duro é botar pra fora!
–ADEMAR MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram

Maria, com seu patrão,
faz magia a dois por três:
- numa noite de serão
ganha o salário de um mês!
–VASQUES FILHO/PI–

Simplesmente Poesia

MOTE:
Carro velho e sutiã,
só compra quem é peitudo.

GLOSA:
Se existe coisa vã.
tão falsa como aparente,
é, sem dúvida, minha gente,
carro velho e sutiã.
Digo hoje, digo amanhã,
direi também, e não mudo,
usar o bom senso é tudo;
e, lógico é o que eu digo:
essas duas coisas, amigo,
só compra quem é peitudo.
–JOSÉ LEIROS/RN–

Estrofe do Dia

Viver liso e morar atrás da grade,
jantar leite de saco com biscoito,
trocar uma gatona de dezoito
numa velha de oitenta e seis de idade,
montar grande comércio na cidade
e mandar um ladrão gerenciar,
perguntar se o motel é pra rezar
e se a farmácia tem tripa pra vender;
do que a vida me impõe para eu fazer
são as coisas que eu faço sem gostar!
–LOURO BRANCO/CE–

Soneto do Dia

- ALMA WELT/RS -
Anti-Soneto

Hoje decidi não escrever.
Sinto muito, não haverá soneto.
Não se trata de inspiração não ter,
Mas me faltou este quarteto.

O segundo me parece duvidoso:
É este que só quer aparecer.
Sem ter realmente o que dizer
Poderá criar um círculo vicioso.

Então me reduzi a um terceto:
O próximo, se este me resvale
E seja só um prólogo ou moteto.

Mas pensando bem, é melhor não:
Esta montanha é apenas o seu vale,
Ou uma torre que é só o rés do chão...

Fonte:
Textos enviados pelo Autor

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Cynira Antunes de Moura (Livro de Trovas: Respeito à Natureza)


Trovador é consciente
e respeita a natureza;
quer dar ao munda da gente
tranquilidade e beleza!

Desmatar!...Ânsia incontida
ataque sem precedente...
ousadia contra a vida
que Deus nos deu de presente!

Como vestida de festa,
de flores se acobertando,
a árvore nos atesta
que há esperança nos rondando!

O ser humano é vadio
não cuioda nem de seu lar,
fecha os olhos ao vazio
que as queimadas vão deixar!

Ao homem Deus presenteia
lindo mundo que o acata,
e ele teimoso incendeia
a beleza dessa mata!

Enquanto há vida no mundo
as florestas preservemos,
o viver é oriundo
do quão bem as conservemos!

A natureza e o progressi
precisam se harmonizar,
mas não alcançam sucesso
se o homem não ajudar!

Quem polui o ambiente
é cego que não quer ver,
que a natureza veemente
só nos enseja viver!

O homem mau não vê na chama
com que ele queima a floresta
que essa criminosa trama
queima a vida que lhe resta!

Contra esse gesto inclemente
do homem cego que a desmata
como um protesto veemente
se faz silêncio na mata!

Em resposta à malvadeza
com que o ser humano a atenta,
floresce a mãe natureza...
dá frutos, e nos sustenta!

É choro da natureza
a chuva que cai na mata
tenta salvar com certeza
o que o homem mau desmata!

Santuário verdadeiro
a mata guarda segredos,
mesmo sem ter jardineiro
florescem os arvoredos!

Deus nos dá fonte perfeita
de água cristalina e pura,
mas o homem não respeita
polui...destrói e satura!

Judiada sem piedade
a floresta verdejante,
responde à humanidade
com ar puro e refrescante!

O canto alegre e risonho
das cascatas na montanha,
é melodia de sonho
dá vida à terra que banha!

Fonte:
Trovas entregues pela autora, em Santos/SP

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 239)


Uma Trova Nacional

Doce ternura me invade
sem mesmo eu saber por quê...
e me perco na saudade
nas lembranças de você!
–RENATO ALVES/RJ–

Uma Trova Potiguar

Dar-te-ei um bom conselho
sustentado na moral,
quando me tornar espelho
de minha tela mental.
–IEDA LIMA/RN–

Uma Trova Premiada

2009 - Niterói/RJ
Tema: CRENÇA - M/H.

Tanta gente, amor, insiste
em dizer que em nada crê...
Para eu crer que o céu existe
basta olhar para você!
–A. A. DE ASSIS/PR–

Uma Trova de Ademar

A saudade faz doer
mas finjo não ser verdade.
Me faço forte, sem ser,
pra suportar a saudade.
–ADEMAR MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram

A neblina sobre a mata,
antes que o sol doure a terra,
parece um manto de prata
nos ombros verdes da serra.
–JOUBERT DE ARAUJO/ES–

Simplesmente Poesia

–GILBERTO CARDOSO/RN–
“ Mensagens Poéticas...”

Mensagens poéticas toda manhã
com muita alegria recebo e leio,
Ademar Macedo coloca no e-mail
palavras bonitas da verve mais sã,
é como um unguento que é posto na lã
e que na ferida diminui a dor;
em cada poema se sente o frescor
da inspiração que chega do além,
são textos sagrados, palavras do bem
que põem na alma a brisa do amor.

Estrofe do Dia

Em toda constelação
o poeta procura um lar;
na moradia do vento,
o louco tenta um lugar...
Se "de poeta e de louco
todo mundo tem um pouco",
onde nós vamos parar?
–JOSÉ LUCAS DE BARROS/RN–

Soneto do Dia

–HUMBERTO DE CAMPOS/MA–
Tu...

Quando alguém me pergunta, por ventura,
Quem me faz de outros tempos diferente,
Pensas tu que teu nome se murmura,
Que o exponho à ânsia voraz de toda gente?

Não; digo apenas o seguinte: é pura,
Casta, simples e meiga: é uma dolente
Cauta rola de tímida candura,
Flor que menos se vê do que se sente.

Mimo de graça e de singeleza;
Clara estrela arrancada a um céu profundo:
Doce apoteose da Delicadeza...

Nesse ponto, de súbito, me calo;
E, sem dizer teu nome, todo mundo
Fica logo sabendo de quem falo!

Fonte:
Textos enviados pelo Autor

Leandro Haddad (Livro de Poesias)


BENVINDO

Seja benvindo.
Apenas benvindo.
Você e sua agonia colorida
E sua simpatia aguada,
E sua melodia aflita.
Estive pensando bem,
Não me fale em experiências...
Todas acabam no fundo da lagoa,
E no fundo dos arquivos do pensamento.

VAGANTE

Sozinho,
sou uma figura pálida
sentada num banco de praça
sombra distante
que alimenta pássaros,
adivinha o clima
e polui os dias.

AS CONSTRUÇÕES DO MAR

Erguem-se as cidades no oceano
Por entre torres de esmeralda,
E por entre o verde do novo horizonte.

Que se abram os portais
E a torrente nos arraste
Ao mais profundo econderijo.

EFEITO COLATERAL

Matchu-Pichu foi uma realidade
Tinha colinas verdejantes
E ventos aromáticos.
Efeito colateral
Arrastando-se
Arrastando-se
Pelo chão.
A barganha macrobiótica
Na salada de ferragens
Gotejando.
Mas o exército de formigas
Devorava a plantação.
Efeito colateral
Nos arroubos feministas
No pó mágico do celacanto
Na mariposa prometida
Nos olhos verdes da mãe-d'água
Onde a metamorfose acontece
E a cauda da sereia encanta.
Porcos paridos!
Esculpidos no frenesi.
Efeito colateral
É mais que um simples sim
Ou uma dor de cabeça matinal
É o desencanto explodindo no céu
É o grito do vento enfermo.
No fim de cada arco-íris
Existe um pote de mel.

CLÍMAX CLIMATOLÓGICO


Falo de climas...
E de climátério.
De ponto crítico da vida humana
Tão climatizada.
Sem dúvida, climatizar é preciso...
Pois climas são importantes.
Sempre me deparo com eles.
Sejam climas ardentes, glaciais,
Marítimos ou tropicais.
Atinjo dados climatológicos...
No grau máximo do clímax.

SHAMPOO DE SOLIDÃO

Tudo solidão
O mal ronda, tão só como pode.
Como dizem...continue dançando.
Mas tudo continua bem só.
Tão amarelo...
Eu quero te dar os parabéns
por tudo não rolar por terra,
não leve a mal
se falta açúcar no café.
Essa sucessão
de não se fazer nada,
nem se fazer pouco,
sempre tão imerso nos pensamentos...

Marcelo Spalding (E a Turma da Mônica Cresceu)


Quando em 1959 o jornalista policial Mauricio de Sousa ofereceu aos seus redatores uma tira em quadrinhos sobre um cãozinho e seu dono, Bidu e Franjinha, não imaginava o sucesso que sua turma de personagens alcançaria no Brasil. Dos anos sessenta pra cá, pelo menos três ou quatro gerações conhecem os gibis, tirinhas, filmes e brinquedos com a marca da Mônica. E isso não é pouca coisa! Num tempo de avalanche norte-americana, de Mickey, Pateta e Pato Donald a todo vapor, a Mônica resistiu, e depois resistiu aos Jaspions e Power Rangers, ao Chaves, ao Shrek, firmando-se como a única referência cultural brasileira para crianças.

Claro que os adultos que um dia leram a Turma da Mônica, e por vezes se alfabetizaram lendo a Turma da Mônica, guardam carinho e saudade pelos personagens. Quem já não se identificou com Cascão, Mônica, Cebolinha, Magali, Franjinha, Chico Bento? Quem já não chamou algum cachorro de Floquinho por causa dos pelos, algum menino de Cascão pela falta de banho, alguma menina de Mônica pelo vestido vermelho, ou pelos dentões, ou pela brabeza? Quem não lembra da Magali ao comer melancia, do Cebolinha ao falar elado, da Rosinha ao ver alguém de tranças? Prova de que a maior qualidade de Mauricio de Sousa é a de criar tipos, personagens simples, carismáticos, transpostos do dia-a-dia das famílias brasileiras e reproduzindo, de certa forma, seus valores e preocupações.

Mas não quero aqui voltar aos quadrinhos de minha infância, nem antecipar as comemorações de 50 anos da primeira publicação da Turma. A novidade do momento é a Turma da Mônica Jovem. Na nova série, "eles cresceram", como anuncia a capa, mas não tanto quanto a idade da criação, e sim uns 10, 12 anos, o suficiente para atingir a idade de um grupo de leitores que continuou lendo quadrinhos. Sim, de uma geração para cá as crianças não substituem necessariamente quadrinhos por livros, muitas seguem na leitura de quadrinhos e prova disso são as edições de luxo dos quadrinhos de heróis e a onda de publicações japonesas que chegam por aqui. E é essa a geração que convenceu Mauricio de Sousa a entrar em novo mercado, mexer nas consagradas figuras de Mônica, Cebolinha, Magali e Cascão.

Confesso que não achei o número 1 para comentar nesta resenha, até porque segundo comunicado do próprio Mauricio, publicado no número 2, "a editora teve de religar a impressora várias vezes para atender à demanda explosiva, e de uma previsão que ia pelos 50, 60 mil exemplares, saltamos para mais de 200 mil". Mas o número 2 de certa forma continua uma história iniciada no primeiro, retoma a apresentação das quatro personagens principais e nos dá uma boa noção do projeto.

Em geral, minha principal curiosidade era como adaptar aquelas crianças tão politicamente incorretas para os dias de hoje. Uma coisa é um cartunista em busca de espaço criando suas personagens, outra é um megaempresário de sucesso pensando num novo nicho de mercado em um tempo de consciência ecológica, pacificista, nutricional, social e assim por diante. Tinha certeza que a Magali não seria uma adolescente obesa, apesar de existirem tantas. Que o Cebolinha não falaria elado e nem arrumaria briga com os vizinhos, apesar de tantos o fazerem. Que o Cascão não continuaria fugindo da água, nem fedendo. E, principalmente, que a Mônica não bateria mais nos amigos com ou sem coelho, fosse ou não dentuça. O que, convenhamos, tiraria toda a graça da história.

Mas a solução encontrada pela equipe de Mauricio de Sousa foi engenhosa e pode se tornar bastante produtiva. A Mônica ainda é a líder da turma, um tanto nervosa, mas cresceu, ganhou corpo, altura e o Sansão fica guardado na cama do quarto. A Magali segue esfomeada, mas se cuida, busca uma alimentação saudável e tem um corpão. O Cebolinha foi numa fonoaudióloga e só fala elado quando está nervoso (grande sacada!). Virou namorado da Mônica. E do Cascão foi ampliado o lado moderno, de skatista, das gírias, e mesmo que não goste, agora toma banho sem dramas. Em suma, numa linguagem teórica pode-se dizer que os personagens se tornaram menos planos e mais esféricos, menos simples e mais complexos, sem perderem a essência construída ao longo de 50 anos.

A estética dos gibis, como se tem comentado muito, é mangá, o estilo anime japonês que saltou dos quadrinhos para os desenhos de televisão até quase a exaustão. Mais alinhado ao público jovem, traz ilustrações grandes (algumas de página inteira), cenários mais elaborados, impressão em preto e branco e mais de uma centena de páginas. Esteticamente a adaptação não foi traumática, pelo contrário, atualizou a linguagem simples da Turma da Mônica para uma geração muito acostumada a imagens. A dúvida é se esse alinhamento com o mangá irá provocar também uma mudança de conteúdo.

Se tomarmos como exemplo o número 2, que tenho em mãos, o conteúdo das histórias mudou muito mais do que as personagens, num claro rompimento entre uma e outra geração. As primeiras histórias da Turma da Mônica Jovem nos levam para um mundo de fantasia, com unicórnios, monstrengos, dragões e feiticeiras que precisam ser destruídos. Para combatê-los a Mônica se torna arqueira; o Cebolinha vira guerreiro; a Magali, feiticeira; e o Cascão, ladino (numa clara referência aos RPGs). Os quatro são transportados para outra dimensão e lá precisam resgatar cinco chaves, lutando contra monstros tão feios e perigosos quanto fáceis de serem vencidos.

Para nós, acostumados aos conflitos realistas e cotidianos dos gibis, essa "harrypotterização" da Mônica desagrada, quase ofende. Pode ser que seja apenas um começo, que em breve vejamos a Turma com conflitos de adolescentes, sem pirotecnias e sem apelar para a batida luta entre Bem e Mal, para clichês como fuga em montanha russa, para cenas de lutinha que lembram os desenhos japoneses exaustivamente repetidos na televisão.

E isso não porque a Turma de antes era melhor que a de agora ou porque os adolescentes precisam de algumas lições. Não! Apenas porque um grupo de personagens que sobreviveu a Mickey, Pateta, Pato Donald, Jaspion, Power Rangers, Chaves, Shrek não pode levar surra do Pokémon, não pode se transformar sob o risco de perder a essência que o trouxe até os anos 2000.

Nesse sentido me preocupa um trecho da já citada carta de Mauricio de Sousa na edição nº 2: "vai ser um bom trabalho, com ramificações pra todo lado, desde publicações especiais com a turminha, licenciamento, desenhos animados, a turma da escola, no celular, na música, em shows, como produto de exportação...". Está bem, não sejamos ingênuos, é claro que a Turma da Mônica só sobreviveu a Walt Disney pela visão comercial de Mauricio, mas será mesmo preciso pensar nesse passo importante, nesse novo momento como um novo produto? Será preciso mencionar licenciamentos e porcarias para celular, que certamente farão as crianças obrigarem os pais a gastar? Não haverá bandeiras mais dignas do tamanho da Turma da Mônica, como incentivo a leitura, valorização do nacional, conscientização de problemas sociais que não aparecem na televisão? Espero que sim, espero que aos poucos a turma seja menos Quarteto Fantástico, menos Harry Potter e mais Shrek, Toy Story, Madagascar, bons exemplos de "produtos" para criança capazes de entreter, fazer pensar e ainda divertir os pais que estão acompanhando os filhos.

Porque os leitores cresceram, é verdade. Mas nem todos ficaram altos, bonitos, fortes, atraentes e felizes.

Fonte:
Marcelo Spalding

Daladier da Silva Carlos (Livro de Poesias)


ACELERADA MEMÓRIA

Ah, meu rapaz, já foste esbelto, um belo tipo, com certeza,
Quando atiravas ao rosto da vida tua impetuosa mocidade,
Agindo com deliberada força, portando corpo indomável.
Tudo teu cheirava a novo, pois eras único com teus sonhos,
Então te permitias, sem inútil culpa, ao prazer solitário,
Isto, com certeza, aliviava a carga dos teus fluxos.

As sensações impudicas, tu as levava muito a sério,
Porque te acreditavas um amante quase perfeito,
Na juventude, ao te esgotares, sem medo algum,
Levando ao dia seguinte o ardor que o vigor te oferecia,
Logo te mantinhas pronto para a lida mundana,
Mesmo à custa do esquecido cansaço.

Mas a manhã se fez tarde e o destino te cobriu de nuvens,
A massa líquida desabou sobre a casa dos teus anseios.
Agora, tu não rompes mais com garbo as alegres vigílias,
Mas já o sono tornou-se para ti um apegado companheiro,
Transformou o teu desejo e mandou-o para um ponto distante,
Muito longe das aventuras com que enfrentavas o olhar da noite.

A tua percepção da fêmea agora é um projeto que te agrava,
Aprofunda as marcas do teu tempo na acelerada memória,
Condiciona toda a saudade a instantes tão-somente curtos,
Traz, aos bocadinhos, as imagens delicadas dos devaneios.
Estás velho, meu rapaz, afinal, isto é o que posso te dizer,
Porém, se quiseres, a vida poderá estar apenas começando.

SONETO DO ROMANCE ETERNO

O desejo com que te busco logo vem
E na angústia de amar espatifei a taça.
Sou ruminante do que a memória retém.
Guardo, dos teus lábios, o gosto que ameaça.

Não bebo do vinho, por pura sobriedade.
Preparei, para ler teus versos, o melhor momento,
Ancorando os sonhos aos pés da eternidade,
Antes mesmo de beijar o menor fragmento.

Teus receios nunca me provocam chaça,
Porque sou leve e lento para entender
As cores do teu romance em devassa.

Quanto mais tenho a ti em pessoa,
Para a ternura que as palavras resumem,
Concluo, enfim, jamais ter te amado à-toa.

JEJUM E FOME

Minhas palavras não parecem felizes,
Porque elas escondem o qwue penso.
A lógica que opero é muito fragmentária,
Logo se instala o desacordo,
Revelado entre mim e os amassados sentimentos.

Vou juntando pedaços de tudo,
Para montar um planetário de visibilidades
E ver todas as coisas por todos os ângulos.
Não posso apresentar meus poemas em casa vazia,
Mesmo desconfiando estar entortando versos.

Preciso que a boa sorte fique ao meu lado.
Um pouco de si e ela será bem-vinda,
Mas tenho a intuição dos concretos limites.
O meu relento é o lugar das tantas vozes,
Quando, nele, jejuo parecendo que estou com fome.

NO BICO DA CHALEIRA

Minha vontade é de parir poemas com o coração
E fechar a boca para não cuspir,
Sobre o prato, o elogio desviado de mim,
Porque nunca trabalhei para ser simples.

Se sabiamente dissesse todas as coisas com paixão,
O mal por si teria sido menor à minha conta.
Faria caso, de primeira, de soletrar as pausas,
Corrigir a apressada fala e evitar morder a língua.

Os atos que confiro são os meus focos de resistência,
Algo parecido a teias pendendo do teto
Ou a fragmentos do universo das palavras vãs.

Ainda não conheci a Pasárgada, de Bandeira,
Ora, meus versos lembram nuvens pequeninas,
Espirais de fumaça no bico da chaleira.

Fonte:
texto enviado por Poetas del Mundo

Ialmar Pio Schneider (Baú de Trovas XIV)


1
A brisa sempre é bem-vinda
nestas tardes de calor,
quando apareces tão linda
para preencher meu amor !

2
A esperança, nesta vida,
é tudo que nos conduz,
pela estrada florescida
de sonhos de amor e luz !...

Menção Honrosa no concurso relâmpago da UBT – PORTO ALEGRE – RS – em reunião almoço no dia 19.07.2009, comemorando o Dia do Trovador (18 de julho), no galpão crioulo do Quartel da Polícia do Exército - PE3

3
A mocidade perdida
passou rápida... nem vi;
mas foi o melhor da vida
que passei junto de ti !

4
À tardinha, junto ao cais
no meu porto de Ilusão,
como dói amar demais
a quem não tem coração !

5
Caminhemos pela vida
qual se fôssemos criança,
e por mais ríspida a lida,
nunca nos falte a esperança !

6
Coração sentimental,
a bater desesperado,
ontem teve um ideal,
hoje é brinquedo quebrado !

7
Era menino... e bem cedo
vivia a brincar sozinho;
o meu primeiro brinquedo
foi só... um caminhãozinho...

8
Eu te amei intensamente,
mas foram momentos vãos,
pois vejo que fui somente
um brinquedo em tuas mãos...

9
Luiz Otávio e J. G.,
dois trovadores legais,
criaram para você
os nossos Jogos Florais !

Concurso Interno da UBT Porto Alegre 2009 - Tema: Florais - Vencedor

10
No aconchego dos teus braços
busco ternura e carinho,
quando esqueço meus fracassos
e não vivo mais sozinho...

11
No mundo não há ninguém
mais perfeito que a mulher,
se você souber de alguém,
me conteste, se puder!

Menção Especial

12
O tempo já nos consome
neste começo de inverno,
nada me lembra teu nome
que risquei do meu caderno...

13
Para matar o desejo
que sinto com tanto ardor,
quero a delícia de um beijo
dos lábios do meu amor.

14
Pelos trilhos da saudade
vai correndo o trem do amor;
e ao lembrar a mocidade,
inda sou um sonhador.

Trova em destaque nos II Jogos Florais De Caxias do Sul – 2010 - Tema: Trilhos

15
Roubei-lhe um beijo, ao passar
ao meu lado, sorridente;
e lembrando seu olhar,
de noite, dormi contente...

16
Sou um simples trovador
que vive cantando ao léu;
e faço apenas do amor
o meu precioso troféu !

17
Tenho amor e penso nela
toda noite, todo dia,
cada vez está mais bela
no meu céu de fantasia...

18
Tens a beleza estampada
nos olhos, lábios e faces;
a cada nova alvorada
em meu coração renasces.

Fonte:
Trovas enviadas pelo autor

Carol Carvalho (Entrevista: Por Que é tão Difícil Traduzir um Escritor Brasileiro)


Uma tradução falha custa ao autor 20 anos. Esse é o prazo para que outro profissional possa esboçar uma nova versão da obra e, assim, tentar um improvável retorno às prateleiras. Por isso, a tradução pode ser considerada uma arte, pelo cuidado, dedicação e habilidade que requer. E também pelas paixões e fúrias que desperta. Jorge Amado costumava dizer que uma boa tradução era aquela de que ele não entendesse uma palavra. Desta forma, não teria chance de ver o tempero de seus livros esvair-se a cada página.

Em tempos de crescimento e consolidação de escritores brasileiros no exterior, o americano Cliff Landers, com a propriedade que lhe é de direito, fala ao site de VEJA sobre os meandros da profissão. Um dos tradutores atuais mais requisitados – que já verteu para o inglês clássicos de Jorge Amado e José de Alencar, dos imortais João Ubaldo Ribeiro, Nélida Piñon e Moacyr Scliar, e do não menos importante Rubem Fonseca -, ele explica como funciona o seu ofício. E como se comporta o recluso mercado editorial americano, ideal tão distante dos escritores brasileiros.

Quais autores brasileiros e estilos literários se mostram mais difíceis para tradução?

Até hoje, tenho tido a sorte de trabalhar com autores brasileiros cujos estilos são transparentes e compreensíveis, embora naturalmente haja traços individuais que caracterizam suas obras. Apesar de ter enfrentado pequenos problemas léxicos – por exemplo, com gíria e com questões referentes a diferenças culturais e ortográficas -, até o momento nenhum dos desafios tradutórios mostrou-se insuperável. O mais difícil, já que o inglês é uma língua pragmática, é enxugar algumas frases do português.

Qual a relação entre os tradutores e escritores? Costumam trocar ideias?

Isso depende de vários fatores: da disponibilidade do autor, do prazo de entrega do manuscrito, da compatibilidade entre autor e tradutor e do número de dúvidas linguísticas encontradas no projeto. Alguns autores são totalmente inatingíveis, como um famoso escritor português cujo romance traduzi. Outros, como o célebre Rubem Fonseca, são cem por cento acessíveis ao tradutor e sumamente prestativos.

Que artifícios os tradutores usam para se manter fieis ao estilo do escritor?

Cada tradutor, forçosamente, tem de escolher um modo de transmitir ao leitor da língua-alvo informações já conhecidas pelo leitor da língua-fonte. No caso de uma obra de não ficção, uma nota de rodapé chega a ser praxe. Mas o que fazer em um romance? Eu, particularmente, procuro de evitar ao máximo o uso de notas no rodapé. Às vezes, interpolo ideias, como no exemplo: “Moram no Leblon, um dos bairros mais afluentes do Rio”, uma maneira de dar uma informação sem apelar para as notas no fim da página. Na tradução de Iracema (José de Alencar), tive a oportunidade de escrever uma “Introdução do Tradutor”, em que expliquei o vocabulário especial utilizado (oriundo do Tupi-Guarani) pelo autor. Outras vezes, busco uma ideia equivalente, e, em vez de “guaraná”, uma bebida que ninguém conhece nos Estados Unidos, escrevo “refrigerante” (soft drink, em inglês).

Na opinião do senhor, há grandes autores brasileiros que “se perderam” na tradução?

Eu diria que o exemplo clássico dessa perda é a tradução feita nos anos 1960 de Grande Sertão: Veredas (chamada em inglês The Devil to Pay in the Backlands). Ela é considerada uma tentativa fracassada tanto no Brasil como nos EUA. E, infelizmente, quando se dá uma tradução falha, se impede na prática que se esboce outra tradução por pelo menos vinte anos. No caso da obra-prima de Guimarães Rosa, infelizmente, até hoje não houve outra tentativa. A tradução de Macunaíma (Mário de Andrade), mesmo sendo o romance mais representativo do modernismo brasileiro, foi um desastre – ainda hoje não recuperado. Mas temos de perdoar os tradutores pelas dificuldades linguísticas oferecidas por dois clássicos do século passado.

O senhor acha que existem estilos literários mais atraentes para o mercado americano?

Como foi provado pelo estrondoso sucesso da trilogia Millenium, de Stieg Larsson, o policial é um gênero que, ao que parece, nunca deixa de atrair o grande público. No entanto, para o americano o “estilo” é menos importante do que a atração intrínseca do romance. O ideal são personagens bem delineados, um enredo que prenda o leitor e algo que faça com que ele continue virando a página. Suspense é uma outra opção.

As grandes editoras se mostram receptivas aos brasileiros ou a tradução se dá principalmente pelas universidades americanas?

De modo geral, as grandes editoras americanas só se interessam em publicar traduções de obras que possuam forte potencial comercial, a chamada mentalidade jackpot. Isto é, obras de autores já consagrados – um prêmio Nobel como José Saramago -ou obras do gênero policial e de suspense. Paulo Coelho teve sucesso sem igual nos EUA não por ser um autor brasileiro, mas pela grande receptividade ao gênero autoajuda. As imprensas acadêmicas, porém, recebem melhor as obras proeminentes da literatura, porque podem ser de interesse de estudiosos. É o caso de A Formação das Almas, de José Murilo de Carvalho. Naturalmente, em se tratando de editoras universitárias, a repercussão é limitada, ficando quase exclusivamente no âmbito acadêmico, distante do grande público.

Fonte:
Carol Carvalho (www.veja.com.br) para Poetas del Mundo

Monteiro Lobato (Caçadas de Pedrinho) I - E era onça mesmo!


Dos moradores do sítio de Dona Benta o mais andejo era o Marquês de Rabicó. Conhecia todas as florestas, inclusive o capoeirão dos Taquaruçus, mato muito cerrado onde Dona Benta não deixava que os meninos fossem passear. Certo dia em que Rabicó se aventurou nesse mato em procura das orelhas-de-pau que crescem nos troncos podres, parece que as coisas não lhe correram muito bem, pois voltou na volada.

— Que aconteceu? — perguntou Pedrinho, ao vê-lo chegar todo arrepiado e com os olhos cheios de susto. — Está com cara de Marquês que viu onça...

— Não vi, mas quase vi! — respondeu Rabicó, tomando fôlego. — Ouvi um miado esquisito e dei com uns rastos mais esquisitos ainda. Não conheço onça, que dizem ser um gatão assim do tamanho dum bezerro. Ora, o miado que ouvi era de gato, mas muito mais forte, e os rastos também eram de gato, mas muito maiores. Logo, era onça.

Pedrinho refletiu sobre o caso e achou que bem podia ser verdade. Correu em procura de Narizinho.

— Sabe? Rabicó descobriu que anda uma onça no capoeirão dos Taquaruçus!...

-— Uma onça? Não me diga! Vou já avisar vovó...

— Não caia nessa — advertiu o menino. — Medrosa como ela é, vovó ou morre de medo ou trata de nos levar hoje mesmo para a cidade. Muito melhor ficarmos quietos e caçarmos a onça.

A menina arregalou os olhos.

— Está louco, Pedrinho? Não sabe que onça é um bicho feroz que come gente?

— Sei, sim, como também sei que gente mata onça.

— Isso é gente grande, bobo!

— Gente grande!... — repetiu o menino, com ar de pouco-caso. — Vovó e Tia Nastácia são gente grande e, no entanto, correm até de barata. O que vale não é ser gente grande, é ser gente de coragem, e eu...

— Bem sei que você é valente como um galo garnisé, mas olhe que onça é onça. Com um tapa derruba qualquer caçador, diz Tia Nastácia.

O menino bateu no peito com arrogância.

— Pois quero ver isso! Vou organizar a caçada e juro que hei de trazer essa onça aqui para o terreiro, arrastada pelas orelhas. Se você e os outros não tiverem coragem de me acompanhar, irei sozinho.

A menina arrepiou-se de entusiasmo diante de tamanha bravura e não quis ficar atrás.

— Pois vou também! — gritou. — Uma menina de nariz arrebitado não tem medo de coisa nenhuma. Vamos convidar os outros.

Saíram os dois em busca dos demais companheiros. O primeiro encontrado foi o Marquês de Rabicó, que estava na porta da cozinha, ocupadíssimo em devorar umas cascas de abóbora.

— Apronte-se, Marquês, para tomar parte na expedição que vai caçar a onça aparecida lá na mata.

Aquela notícia fez o leitão engasgar com a casca de abóbora que tinha na boca.

— Caçar a onça? Eu? Deus me livre!...

Pedrinho impôs energicamente:

— Vai, sim, ainda que seja para servir de isca, está ouvindo, seu covarde?

Rabicó tremia que nem geléia fora do copo.

— Um fidalgo! — prosseguiu Pedrinho, em tom de desprezo. — Um filho do grande Visconde de Sabugosa a tremer assim de medo! Que vergonha...

Rabicó não replicou. Bebeu um gole d’água para acalmar os nervos e voltou às suas cascas de abóbora com esta idéia na cabeça: “No momento hei de dar um jeito qualquer. Não tem perigo que eu me deixe comer cru pela onça”.

O luxo dos leitões é serem comidos assados ao forno, com rodelas de limão em redor e um ovo cozido na boca...

O segundo convidado foi o Visconde de Sabugosa, o qual aceitou a proposta com aquela dignidade e nobreza que marcavam todos os seus atos de fidalgo dos legítimos. Iria para vencer ou morrer. Viscondes da sua marca mostram o que valem justamente nos momentos perigosos.

Depois convidaram Emília, que recebeu a idéia com palmas.

— Ora, graças! — exclamou. — Vamos ter enfim uma aventura importante. A vida aqui no sítio anda tão vazia que até me sinto embolorada por dentro. Irei, sim, e juro que quem vai matar a onça sou eu...

Esse dia e o outro foram passados em preparativos. Pedrinho levaria uma espingarda que ele mesmo tinha fabricado escondido de Dona Benta, com cano de guarda-chuva e gatilho puxado a elástico. Estava carregada com a pólvora duns pistolões sobrados da última festa de São Pedro.

A arma que Narizinho escolheu foi a faca de cortar pão, instrumento mestiço de faca e serrote.

O Visconde recebeu um sabre feito de arco de barril, bastante pontudo, mas danado para entortar. Em vista da sua importância e do seu título, também recebeu o comando da expedição.

— E você, Emília, que arma leva? — perguntou Narizinho.

— Levo o espeto de assar frangos. Tenho mais fé naquele espeto do que nas armas de vocês todos.

Restava o Marquês. Como fosse um grande medroso, em vez de arma Pedrinho deu-lhe arreios. Rabicó iria puxando um canhãozinho feito dum velho tubo de chaminé, que o menino havia montado sobre as rodas do seu carrinho de cabrito. Para carregar o canhãozinho foi necessário empregar a pólvora de três pistolões. Servia de bala uma pedra bem redondinha, encontrada nos pedregulhos do rio. Indo atrelado ao canhão, o grande Marquês ficaria impedido de fugir.

No dia marcado tomaram o café com farinha de milho da manhã e saíram na ponta dos pés, para que as duas velhas nada percebessem. Passaram a porteira do pasto, atravessaram a mata dos Tucanos Vermelhos e de lá seguiram rumo ao capoeirão da onça.

Rabicó não havia mentido. Os rastos da onça estavam impressos na terra úmida. Ao fazerem tal descoberta o coração dos cinco heróis bateu mais apressado. Dos cinco, não; dos quatro, porque, como todos sabem, Emília não tinha coração.

— Que é isso, Pedrinho — disse a boneca, notando a palidez do chefe. — Será medo?

— Não é medo não, Emília. É...

— É... receio, eu sei — caçoou a terrível bonequinha.

— Não brinque comigo, Emília! — gritou Pedrinho, avermelhando de raiva. — Você e toda gente sabe que só tenho medo duma coisa neste mundo — maribondo. De mais nada, hem?

O Visconde, que havia trazido a tiracolo o binóculo de Dona Benta, ajustou-o aos olhos para examinar “detetivamente” os rastos.

— É de onça, sim, e de onça-pintada — disse ele.

— Como sabe?

— Estou vendo no chão dois pêlos, um amarelo e outro preto.

Aquela confirmação de que era onça mesmo, e das grandes, desanimou profundamente Rabicó. Gotas de suor frio começaram a pingar da sua testa. Teve ímpetos de soltar-se do canhãozinho e disparar para casa; só não o fez de medo que Pedrinho lhe despejasse no lombo a carga de chumbo destinada à onça. E resignou-se ao que desse e viesse.

Orientados pelos rastos da onça, os caçadores não podiam errar. Era seguir na direção deles, que fatalmente dariam com a bicha.

— Avante, Sabóia! — gritou Pedrinho, espichando no ar a espingarda como se fosse espada.

— Avante! — repetiram todos os outros, menos Rabicó, que estava sem fala.

E com o maior entusiasmo os heroizinhos foram caminhando durante meia hora.

Súbito, o Visconde, que ia na frente, de binóculo apontado, gritou com voz firme:

— A onça...

— Onde? — indagaram todos, ansiosos.

— Lá longe, naquela moita — lá, lá... Realmente, alguma coisa se mexia na moita indicada e não tardou que uma enorme cara de onça aparecesse por entre as folhas, espiando para o lado dos cinco heróis.

Pedrinho dispôs tudo para o ataque. Assestou na direção da moita o canhãozinho e ordenou ao artilheiro Rabicó, enquanto o desatrelava:

— Fique nesta posição. Quando ouvir a voz de “Fogo!” risque um fósforo, acenda a mecha e dispare.

— Disparo para casa? — perguntou o artilheiro, mais trêmulo do que uma fatia de manjar branco.

— Dispare o canhão, idiota! — berrou Pedrinho. Enquanto isso, a onça deixava a moita e com o andar manhoso dos gatos dirigia-se, agachada, para o lado deles. Era o momento. O Visconde ergueu a espada e com voz grossa de comandante superior deu um berro de comando:

— Fogo!

Rabicó, todo treme-treme, não conseguiu nem riscar o fósforo. Foi preciso que Pedrinho viesse ajudá-lo. Por fim riscou-o e deitou fogo à mecha. Ouviu-se um chiado e logo depois um tiro soou — Pum! Mas um tiro chocho que não valeu nada. A bala de pedra rolou a dois passos de distância, imaginem: Havia falhado a artilharia, na qual eles depositavam tantas esperanças.

Pedrinho então disparou a sua espingardinha. Outro tiro chocho que nada valeu e só serviu para irritar a fera. Viram-na arreganhar os dentes e apressar a marcha na direção dos atacantes.

A situação tornava-se muito séria e Pedrinho, desapontado com o nenhum efeito das armas de fogo, berrou a plenos pulmões:

— Salve-se quem puder!

Foi uma debandada. Cada qual tratou de si e, como se houvessem virado macacos, todos procuraram a salvação nas árvores. Felizmente havia ali um pé de grumixama que dava para abrigar o grupo inteiro. Nele treparam, sem dificuldade, Pedrinho, Narizinho e Emília. Já o velho Visconde embaraçou as pernas na bainha da espada e com toda a sua importância estendeu-se no chão, ao comprido. Foi preciso que o menino o pescasse com o gancho dum galho seco.

Rabicó fez coisa de que ninguém nunca o julgaria capaz: botou-se à árvore que nem gato e conseguiu enganchar-se na forquilha do primeiro tronco. Pedrinho e Narizinho, que estavam no galho acima, puderam agarrá-lo pela orelha e içá-lo fora do alcance da onça. Quando a fera chegou, estavam já todos muito bem empoleirados e livres dos seus botes.

A onça, desapontadíssima, ali permaneceu, sentada sobre as patas de trás, com os olhos fixos nos caçadores que a tinham logrado. Parece que sua intenção era ficar de guarda até que eles descessem.

— Espera que te curo — disse Pedrinho, lembrando-se que trazia no bolso um pouco da pólvora dos pistolões. Tomou um punhado e, ajeitando-se no galho que ficava bem a prumo sobre a onça, derramou-lhe a pólvora em cima dos olhos.

A idéia valeu. Completamente cega pela pólvora, a onça pôs-se a corcovear que nem doida, enquanto esfregava os olhos com as munhecas, como se quisesse arrancá-los.

— É hora! Avança, macacada! — gritou Pedrinho, escorregando pela árvore abaixo.

Todos o imitaram. Apanharam as armas e se arrojaram contra a fera com verdadeira fúria. Narizinho esfregou-lhe a faca no lombo, como se a onça fosse pão e ela quisesse tirar uma fatia. O Visconde conseguiu, depois de várias tentativas, enterrar-lhe no peito o seu sabre de arco de barril. Emília fez o mesmo com o espeto de assar frango. Pedrinho macetou-lhe o crânio com a coronha da sua espingarda. Até Rabicó perdeu o medo e, depois de carregar de novo. o canhão, deu-lhe um bom tiro à queima-roupa.

Assim atacada de todos os lados, a onça não teve remédio senão morrer. Estrebuchou e foi morrendo. Quando deu o último suspiro, Pedrinho, no maior entusiasmo de sua vida, entoou um canto de guerra:

— Ale guá, guá, guá...

E todos responderam em coro:

— Hurra! Hurra! Pica-Pau Amarelo!...
----------------------
continua ... II – A Volta para Casa
---------------------
Fonte:
LOBATO, Monteiro. Caçadas de Pedrinho/Hans Staden. Col. O Sítio do Picapau Amarelo vol. III. Digitalização e Revisão: Arlindo_San

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 238)


Uma Trova Nacional

Uma luz quase apagada...
um sonho chegado ao fim...
eis o pedaço do nada
que tu fizeste de mim.
–CONCEIÇÃO ASSIS/MG–

Uma Trova Potiguar

Vejo no espelho da vida
transpor-se, à luz da saudade,
minha face enternecida
dos tempos da mocidade!
–MARA MELINNI/RN–

Uma Trova Premiada

2000 - Barra do Piraí/RJ
Tema: VARANDA - Venc.

Na varanda, o idílio pleno
de ternura envolta em flor...
- qualquer sonho era pequeno
visto à luz do nosso amor!
CAROLINA RAMOS/SP–

Uma Trova de Ademar

Meia noite, à meia luz,
com infinitos lampejos,
na Penumbra eu vejo nus
os meus mais puros desejos...
–ADEMAR MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram

Quem nasceu com a desventura
de não ver a luz do dia
do olhar transfere a ternura
para a mão que acaricia.
–ALFREDO VALADARES/MG–

Simplesmente Poesia

MOTE
Embriagado de estrelas,
tropecei na luz do sol.

GLOSA:
Muito feliz por revê-las
deitei na noite e dormi.
Que belos sonhos vivi
embriagado de estrelas,
por tão perto de mim tê-las
nem mesmo o rubro arrebol
conseguiu com seu anzol
pescar-me daqueles sonhos;
depois... com passos bisonhos
tropecei na luz do sol.
(BONIFÁCIO SANTOS/RN)

Estrofe do Dia

Acordei cedo demais
olhando pra o oriente,
marchava a lua na frente
e uma estrela d’alva atrás;
na copa dos vegetais
soprava a brisa macia,
o nevoeiro surgia,
e o vento atrás empurrando,
e a lua vinha beijando
a linda barra do dia!
OLÍVIO DO LIVRAMENTO/PB–

Soneto do Dia

–DIAMANTINO FERREIRA/RJ–
Luz

Como caminha um cego e de bengala
apalpa seu trajeto, não cair,
arrasto-me na vida e nem se fala
de quantos tombos mais estão por vir;

apesar do infortúnio, é prosseguir
e na estrada da vida, qual na sala,
palmilhar como sempre; e no porvir
eu não perca a esperança de encontrá-la!

Nasci feliz, a luz dentro dos olhos;
mas cresci, tropeçando nos escolhos,
chegados tão somente por te amar!

Perdida a vista, mas...Pior castigo:
nem a esperança de trazer comigo
o sonho de voltar a te enxergar!

Fonte:
Textos enviados pelo Autor

quinta-feira, 16 de junho de 2011

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 237)


Uma Trova Nacional

De estrela toda bordada,
porta aberta para a rua,
a tapera abandonada
abriga os raios da lua!
–SÔNIA SOBREIRA/RJ–

Uma Trova Potiguar


Revendo um porta-retrato
se percebe, a contragosto,
o grande estrago, o mau trato,
que o tempo nos faz no rosto.
–UBIRATAN QUEIROZ/RN–

Uma Trova Premiada


2000 - Barra do Piraí/RJ
Tema : SERESTA - M/H

Vivendo sonhos diversos
de uma paixão infinita,
nossos beijos são os versos
da seresta mais bonita...
–MARIA LUA/RJ–

Uma Trova de Ademar


O mar ouviu de tocaia
os sussurros ofegantes,
vindos à noite, da praia
nos gemidos dos amantes!
–ADEMAR MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


Os currais estão vazios...
o verde fugiu do chão...
e a seca, bebendo os rios,
vai devorando o sertão.
–JOUBERT DE ARAUJO/ES–

Simplesmente Poesia


–SUELY NOBRE FELIPE/RN–
Flor do Cacto

Boquinha da noite
Ribava Ontõe
Guiado pela lua cheia
Disbravano o miaral
Entrecortano a lavoura
Pipadinha de algodão
E ele pobre, sem tostão
Necessitava caçar seu pão.

Podia ser caça rasteira
Também ave de arribação
Pra aliviar a fome do pobre
Deus dava total proteção
Embrenhava-se no mato
Com sua espingarda de soca
Encangado com o cão cruento
Destemido chamado Plutão.

Estrofe do Dia

Ah, se eu pudesse embarcar,
neste barco eu também ia...
Fazer uma volta ao mundo,
distribuindo alegria;
ensinando ao mundo inteiro,
que a sina deste barqueiro
é fazer trova e poesia!
–PROF. GARCIA/RN–

Soneto do Dia


–HAROLDO LYRA/CE–
Corsários de Gabinete

A ganância, talvez, é o que conserva
A vileza nas mentes mais vulgares,
Quais praxes imorais dos lupanares,
Que alimentam os laivos da caterva.

Os ganhos impudentes dos jantares
Açulam o apetite do proterva,
Cuja gula esfaimada o probo enerva
Na inversão dos ufanos populares.

E agigantam-se as deformidades
No estranho festival de amenidades
Fiado nessa imagem impune e crua

Que reflete a pilhagem dos corsários,
Embuçada ao torpor dos mandatários,
Cancro espraiado sobre a honra nua.

Fonte:
Textos enviados pelo Autor
Imagem obtida em http://imagem.us

A. A. de Assis (Francisco, o Poeta)


Gosto muito de Francisco, um santo e tanto, o bom Francisco de Assis. Não somente por ser ele santo, e santo forte e alegre e sábio; mas sobretudo porque além de santo soube Francisco ser poeta, e máximo.

Poeta mesmo, de entender e amar integralmente a gente e o mundo e a vida. Poeta da ternura e da partilha. Poeta do amor valente e generoso e da coragem de doar-se. Poeta do não ter, por lhe bastar o ser. Santo-poeta da total pureza.

Francisco vem há oitocentos anos tentando convencer a humanidade de que a alegria está nas coisas simples. Na festa dos lírios, que não tecem nem bordam, e no entanto se vestem mais belamente do que Salomão. Na traquinice dos pássaros, que não plantam nem ceifam, e no entanto jamais sofreram privações.

Poucos souberam viver tão assumidamente a poesia da fraternidade. Levando paz aos corações tumultuados pela violência. Levando esperança às almas sufocadas pela angústia. Levando luz às mentes perturbadas pelo medo e pela dúvida. Disposto sempre a perdoar antes mesmo de ser perdoado, a amar antes mesmo de ser amado. E ensinando a gente a aceitar a chamada para o céu como aurora da eterna graça.

Francisco foi um descomplicador da vida, virtude própria do poeta intrínseco. Despojou-se de toda coisa inútil, para ser somente um homem bom.

Hoje Francisco seria um dos grandes líderes na luta contra a fome, contra a doença e contra a indigência cultural. Seria um vigoroso apóstolo da natureza, pedindo aos povos que sujem menos o ar e as águas e parem de derrubar os bosques e as florestas. Seria um incansável militante das entidades protetoras dos animais. E por certo encontraria tempo e fôlego para ser também o de que tanto gosta: um entusiasmado animador de todos os grupos empenhados em semear e manter viva a poesia na face da Terra.

Francisco, o poeta. O nosso poeta. O santo da bondade, irmão querido de cada um de nós, irmão do sol, da lua e de cada uma das estrelas, irmão das plantas, irmão das aves, irmão dos peixes, irmão de todos os bichos de todas as matas, e das borboletas que brincam de flores nos jardins. Francisco, irmão da natureza inteira, irmão de tudo quanto Deus criou.

A bênção, meu São Francisco. Me ensine a ser poeta um pouquinho assim como você. O mundo precisa muito de uma urgente franciscanização.

Fontes:
ASSIS, A. A. de. Vida, prosa e verso. Maringá: EDUEM, 2010.
Imagem = Irmão Sol, Irmã Lua

Ialmar Pio Schneider (O Soneto)


Fontes:
Soneto enviado pelo autor
Imagem de fundo obtida em http://luzealegriaparaaalma.spaceblog.com.br

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 236)


Uma Trova Nacional

Colhendo afeto e carinho
desde que a vida chegou,
vou percorrendo o caminho
que o destino me traçou.
–DIAMANTINO FERREIRA/RJ–

Uma Trova Potiguar


Poeta mantém acesa
a chama do amor fecundo,
minimizando a tristeza
e as dores cruéis do mundo.
–DJALMA MOTA/RN–

Uma Trova Premiada

2010 - Curitiba/PR
Tema : IMAGEM - Venc.

É tão vazia a paisagem,
e nem um vulto se vê...
Mas, sem ver qualquer imagem,
consigo enxergar você!
–VANDA FAGUNDES QUEIROZ/PR–

Uma Trova de Ademar


A vida nos cataloga
uma dor que nos revolta:
ver nossos filhos na droga,
numa “viagem” sem volta!
–ADEMAR MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram


Quisera saber um terço
da vida espiritual.
Vem da certidão do berço
o nosso estágio carnal.
–CHICO MOTA/RN–

Simplesmente Poesia


–OLEGÁRIO MARIANO/PE–
Você Nunca Está Só

Você nunca está só. Sempre a seu lado
Há um pouquinho de mim pairando no ar.
Você bem sabe: o pensamento é alado...
Voa como uma abelha sem parar.

Veja: caiu a tarde transparente.
A luz do dia se esvaiu... Morreu.
Uma sombra alongou-se a seus pés mansamente...
Esta sombra sou eu.

O vento ao pôr do sol, num balanço de rede,
Agita o ramo e o ramo um traço descreu.
Este gesto do ramo na parede
Não é do ramo: é meu.

Se uma fonte a correr, chora de mágoa
No silêncio da mata, esquecida de nós,
Preste bem atenção nesta cantiga da água:
A voz da fonte é a minha voz.

Se no momento em que a saudade se insinua
Você nos olhos uma gota pressentiu,
Esta lágrima, juro, não é sua...
Foi dos meus olhos que caiu...

Estrofe do Dia


A pobre da minha vaca
De fome está amarela,
Com dois meses que mal come
Já secou uma costela;
Que quando dar um sereno
Junta água em cima dela...
–FRANCISCO PEREIRA/CE–

Soneto do Dia


–DIVENEI BOSELI/SP–
Luz

Se a vida fosse apenas um brinquedo
e o medo fosse apenas ilusão,
se o amor fosse despido de segredo
e a dedo escolhesse uma emoção,

se a voz tivesse a força de um torpedo,
e a pena fosse um traço de união
e as deusas, num telúrico bruxedo,
tornassem verdadeira a compreensão,

seriam não penas operárias
da indústria, do comércio a mesmo agrárias
as tochas geradoras dessa luz

que eu penso poder ver quando a mulher
dispensa "Cirineus" e, como quer,
carrega sem ajuda a própria cruz!

Fontes:
Textos enviados pelo Autor
Imnagem = http://imagens.us

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 235)

Francisco N. de Macedo [RN] (esquerda) e José Feldman [PR] (direita)
nos Jogos Florais de Santos/SP 2011

Uma Trova Nacional

Muitos sofrem neste mundo,
por falta de pão e teto,
mas o pesar mais profundo,
é ser carente de afeto.
–LISETE JOHNSON/RS–

Uma Trova Potiguar

A imponente arte conserva,
os traços e a singeleza
da bela deusa Minerva:
- musa da mãe natureza!
–LUIZ CLÁUDIO DA SILVA/RN–

Uma Trova Premiada

2000 - Fortaleza/CE
Tema: SORTE - M/E

Teu olhar, por sorte, às águas,
sombra nenhuma deixou,
no entanto deixou-me mágoas
nesta sombra que hoje eu sou!
–GISELDA MEDEIROS/CE–

Uma Trova de Ademar

Quando um amor nos afaga,
acende dentro do peito
a chama que não se apaga...
Não tem jeito, que dê jeito!
–ADEMAR MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram

O vento, pastor estranho,
tangendo as nuvens ao léu,
conduz seu alvo rebanho
pelas campinas do céu!
–JOUBERT DE ARAUJO/ES–

Simplesmente Poesia

–CELINA FIGUEIREDO/MG–
Busca Incessante...

Qual Ismália enlouquecida
vejo uma lua no céu,
vejo outra lua no mar.

Dividida vivendo,
não sou exceção.
Do universo binário,
da unidade de Deus,
sou parcela integrante.
Ser em conflito,
alma barroca,
de um lado a outro
tentando em vão
a mim mesma encontrar.

Estrofe do Dia

No mar um barco desliza
cheio de peixe e sardinha,
volta o pescador feliz
e logo de manhãzinha,
toma uma cana "Ipioca"
com ginga e com tapioca
lá na praia da Redinha.
–ADEMAR MACEDO/RN–

Soneto do Dia


–AMILTON MACIEL MONTEIRO/SP–
Ciúme ou Dissidência...

Verdadeiro tapete de begônia,
em cor bem viva e alegre, magistral,
demonstrando nenhuma cerimônia,
invadiu por completo o meu quintal!

Fez do ordeiro recinto, babilônia;
não respeitou sequer meu roseiral,
que eu cuidava com muita parcimônia,
pelas rosas de tom celestial...

Minhas flores de tanta raridade
não agüentaram a bela crueldade
que as begônias fizeram na invasão.

Não sei se por ciúme ou dissidência;
as rosas não suportam concorrência,
Preferindo morrer ainda em botão!

Fonte:
Textos enviados pelo Autor

José Tavares de Lima (Vozes do Coração) Parte II


Amigo bom não procura
nosso pranto consolar:
pressente a nossa amargura
e não nos deixa chorar! ...

Ao ver-te me causa espantos
tanta beleza, e não nego
que diante dos teus encantos
lamento a sorte do cego...

Confessar-te às vezes tento
que te quero com fervor.
Mas é pouco o meu talento
para expressar tanto amor!

Em cascatas de poesias
eu transformo, comovido,
o rio de águas sombrias
que a minha vida tem sido...

Esquece, o triste passado
que te deixa descontente...
Se o teu "ontem" foi nublado,
põe um sol no teu "presente"!

Faze o bem e, com urgência,
planta o amor em tua estrada,
antes que a tua existência
seja inútil caminhada...

Mais que a tua despedida
e a mágoa imensa dos sós,
dói-me a distância que a vida
insiste em por entre nós...

Mesmo que o sol não desponte
com seu brilho encantador
haverá belo horizonte
nas manhãs do nosso amor!...

Meu grande engano, confesso,
foi pensar ao ver-te enfim,
que a razão do teu regresso
fosse a saudade de mim...

Muitos sonhos de venturas
são cascatas de ilusão:
encantam, lá nas alturas,
mas se desfazem, no chão...

Não chores, que a tua vida
mesmo ingrata aos olhos teus
é sinfonia regida
pela batuta de Deus! ...

Não te iludas com o encanto
que te causa a glória vã...
Quem hoje te aplaude tanto
pode vaiar-te amanhã!

Nas noites que a sós eu passo,
se há luar fico sem sono,
e mesmo sem teu abraço
não me dói tanto o abandono!...

Neste mundo ingrato e rude,
de tantas hipocrisias,
vejo a jóia da virtude
no rol das bijuterias!

No jogo que a vida tece,
a experiência me diz
que a sorte sempre me esquece
quando o prêmio é ser feliz! ...

Nossa paixão louca e plena
às vezes me faz supor
que uma existência é pequena
para conter tanto amor!

O tempo passou ligeiro,
mas deixou comigo o vulto
daquele menino arteiro
que hoje chora ao ver-me adulto!...

O teu desprezo me diz
que eu desista... todavia,
no anseio de ser feliz
ninguém mede a teimosia!

Para o carente, o sozinho,
um pouco de amor faz bem,
porque a fome de carinho
às vezes mata também!

Partiste... Não desespero
porque sei, contendo a ânsia,
que o laço do amor sincero
não se desfaz na distância...

Quando diante de um perigo
sentes o amparo de alguém,
é Deus esse alguém amigo
que não sabes de onde vem!

Quem tem pose envaidecida,
talvez não saiba nem sinta
que é na paisagem da vida
um reles pingo de tinta!...

Se cai neblina, acho graça;
se chove, a chuva bendigo;
pois se o mau tempo não passa,
passas mais tempo comigo!...

Se falhas, com paciência
é necessário que insistas...
Porque se deve à insistência
todas as grandes conquistas!

Segue, atento, a voz segura
dos que têm longa vivência...
Erra menos quem procura
ouvir, mais a experiência!

Sem ter amor, contrafeito,
na minha tristonha lira,
para enganar o meu peão
canto um amor de mentira !

Sonha mais, sonha que a vida
mesmo penosa e tristonha,
é paisagem colorida
para os olhos de quem sonha!...

Fonte:
Colaboração de Darlene A. A. Silva
LIMA, José Tavares de. Vozes do Coração.

Gerson Luiz Colombo (Lançamento de “Uma Candeia sobre o Alqueire” na 27 Feira do Livro de Canoas)


Uma Candeia sobre o Alqueire é a segunda obra literária de Gerson Luiz Colombo. É uma produção independente do autor. O livro trata do tema espírita, seus preceitos e filosofia, baseado em larga pesquisa na literatura de Allan Kardec e outros expoentes da doutrina espírita. Dividido em onze capítulos, o trabalho tem a apresentação e a revisão elaboradas pelo jornalista e escritor Canabarro Tróis filho. A arte da capa foi elaborada sobre detalhe do quadro “Jovem lendo à luz de vela”, de Mathias Stomer.

Gerson Luiz Colombo nasceu em 13/3/1958, em São Leopoldo, RS e reside em Canoas, RS, desde 1994. Possui formação acadêmica em Direito, graduado em Anápolis-GO. Oficial reformado da Força Aérea. Sócio mantenedor da Fundação Cultural de Canoas (FCC) e membro da Associação Canoense de Escritores (ACE). Possui contos e poemas publicados. Cronista colaborador dos jornais O Timoneiro, Diário de Canoas e Pequeno Aprendiz. Colaborador dos Cadernos Canoenses de Tróis Editor, em parceria com a FCC. Participou da coletânea “Contos Canoenses”- ACE/ 2007, com outros contistas integrantes da Associação Canoense de Escritores.

Contato com o autor: (51) 3466.3024 / gersoncolombo@gmail.com

Fontes:
http://www.tcarte.com.br/pastas/livros/uma_candeia.html
Colaboração de Tecnoarte

Editora Delicatta (Participe da Antologia Delicatta VI)


Por um valor de 3 de R$ 70,00 participe da publicação do livro Antologia Delicatta VI - Poesia, contos e crônicas, receba 10 exemplares e concorra a um total de R$ 6.000,00 em prêmios em dinheiro.

Datas dos eventos:

Dia 14/11/2011 - Pré lançamento, Sarau e premiação: Itaú Cultural, Av Paulista, 149, a partir das 18hs

Dia 15/11/2011 - Sarau e Tarde de autógrafos na Livraria Saraiva Mega Store, Shopping Center Norte a partir das 15hs

Além da participação na coletânea, publicamos também seu livro solo:

Por um valor de 4 x de R$ 400,00

PUBLIQUE SEU LIVRO COM A EDITORA DELICATTA E AUTOGRAFE EM 14/11/2011

60 páginas
14x21
ISBN
Papel miolo 75gr
Capa 250gr 4 cores
Com orelhas
Capa Laminado brilhante
100 exemplares

PROMOÇÃO VÁLIDA SOMENTE ATÉ 20 DE JUNHO COM AS ESPECIFICAÇÕES ACIMA

VEJA O LANÇAMENTO DE 2010

http://www.youtube.com/watch?v=kt5Ruk1ZIBU

Abraço,
Luiza Moreira
Editora Delicatta
www.antologia-delicatta.com

Fonte:
Texto enviado pela Editora Delicatta

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 234)

Casarão da Poesia, em Currais Novos
Uma Trova Nacional

No refúgio desmanchamos,
quando ficamos a sós,
esses nós que carregamos
no fundo de todos nós!
–SELMA PATTI SPINELLI/SP–

Uma Trova Potiguar

Ao rever o sítio antigo
do meu passado risonho,
a saudade andou comigo,
lembrando sonho por sonho.
–JOSÉ LUCAS DE BARROS/RN–

Uma Trova Premiada

2004 - Nova Friburgo/RJ
Tema: REFÚGIO - M/H

Velho pomar, foste um dia,
o meu refúgio mais terno:
viste brotar a poesia
em meu primeiro caderno!...
–ERCY Mª MARQUES DE FARIA/SP–

Uma Trova de Ademar

A mais triste Solidão
que os seres humanos têm
é abrir o seu coração...
Olhar e não ver ninguém!
–ADEMAR MACEDO/RN–

...E Suas Trovas Ficaram

Enganam-se os ditadores,
que, no seu furor medonho,
mandam matar sonhadores,
pensando matar o sonho!
–JOUBERT DE ARAUJO/ES–

Simplesmente Poesia

–IARA MARIA CARVALHO/RN–
Destino

Nasci da poeira
e as estrelas
e sobreviverei
até o dia
em que me varrerem
pra baixo
da terra úmida.

Estrofe do Dia

Quando a tarde chega ao fim,
na terra esfria o calor,
a abelha volta ao cortiço,
o sereno cai na flor,
é quando a lua de prata
dança por cima da mata,
deixando o chão de outra cor.
–JOÃO PARAIBANO/PB–

Soneto do Dia

–HERMES FONTES/SE–
Solenemente

Juro por tudo quanto é jura...Juro,
Por mim, por ti, por nós...por Jesus Cristo,
Que hei de esquecer-te! Vê-me ...Estou seguro
Contra teu sólio cuja dor assisto.

E visto que dúvidas tanto...visto
Que ris do que é solene, te asseguro,
Juro mais: pelo ser em que consisto!
Por meu passado! Pelo teu futuro!

Juro pela Mãe Virgem Concebida!
Pelas venturas de que vou ao encalço!
Por minha vida...Pela tua vida!

Juro por tudo que mais amo e exalço:
E depois de uma jura tão comprida
Juro...Juro qu'estou jurando falso!.

Fonte:
Textos enviados pelo Autor

Ialmar Pio Schneider (Mulheres nos Romances de Machado de Assis)


Quando permaneço, por instantes, analisando os trinta e um volumes da coleção dos livros do mestre do Cosme Velho, um sobressai entre os demais. É dele que me aventuro a discorrer, ou melhor, de onde retirei motivos para alguns versos de minha lavra. Acrescento que foram impressões de leitura que já me proporcionaram escrever algumas modestas poesias.

Há muito anos, li pela primeira vez, o romance Quincas Borba, de Machado de Assis, para o qual compus dois sonetos, sendo que um aproveitando o seu final, e que é assim:

“Eia! lamenta dos dois recentes mortos,
se lágrimas tiveres pra chorar,
se só tiveres risos a lhes dar
pois ri nem que sejam risos tortos.”

Só quem amou assim deveras, sabe
que se pode morrer também de amar,
e o afeto que às vezes não nos cabe
é uma desgraça que nos vai matar.

“O Cruzeiro que a divinal Sofia
não quis fitar, como Rubião pedia,
está tão alto pra não discernir

os risos e as lágrimas dos vivos”
que sofrem cá no mundo por motivos
alheios ao seu modo de existir.

Jornal de Novo Hamburgo
em 29.9.2010


Este soneto foi extraído, em parte, do maravilhoso romance de Machado de Assis, Quincas Borba, no enlevo final da leitura.

E o outro, descrevendo o tema romântico do livro, intitulei de Amor Proibido

– Pobre Rubião que quis o amor proibido,
o louco afeto que não era seu,
e sem desabafar num só gemido
nos mares da loucura pereceu.

Sofia há de lembrar o seu pedido
que sem saber por que não atendeu,
e o distante cruzeiro enaltecido
continuará brilhando lá no céu,

como chamando a cativante bela
que calma se aproxime da janela
e que venha fazer-lhe companhia.

E o vento desfolhando as lindas flores
há de chorar incompreensões de amores
por uma voz pungente de elegia…

Pudera haver tanta imagem em páginas de romance de quem sofreu por amor ? Basta ler o Prólogo da 3ª Edição, escrita pelo próprio Machado de Assis: “A segunda edição deste livro acabou mais depressa que a primeira. Aqui sai ele em terceira, sem outra alteração além da emenda de alguns erros tipográficos, tais e tão poucos que, ainda conservados, não encobririam o sentido.

Um amigo e confrade ilustre tem teimado comigo para que dê a este livro o seguimento de outro.

– “Com as Memórias Póstumas de Brás Cubas, donde este proveio, fará você uma trilogia, e a Sofia de Quincas Borba ocupará exclusivamente a terceira parte.” Algum tempo cuidei que podia ser, mas relendo agora estas páginas concluo que não. A Sofia está aqui toda. Continuá-la seria repeti-la, e acaso repetir o mesmo seria pecado. Creio que foi assim que me tacharam este e alguns outros dos livros que vim compondo pelo tempo fora no silêncio da minha vida. Vozes houve, generosas e fortes, que então me defenderam; já lhes agradeci em particular; agora o faço cordial e publicamente.” 1899. M. de A.

O perspicaz crítico literário Franklin de Oliveira, assim se expressou a respeito do romance, falando de algumas mulheres que povoam as obras de Machado de Assis:

Também aquela imagem do negativismo machadiano encontra contestação em suas figuras femininas. O único ser generoso, em Quincas Borba, é uma mulher: Fernanda. E generosas são as suas mulheres, mesmo quando nos parecem emaranhadas numa oculta lascívia, como Capitu, Fidélia, Flora, Virgília e a Sofia, que passeia o seu mistério nas páginas deste romance.”

Nenhum outro escritor brasileiro perscrutou tanto a alma feminina quanto Machado de Assis, fazendo com que as personagens fossem atraentes e misteriosas. A leitura dos seus livros sempre vale a pena, considerando o estilo elegante e a escrita escorreita. E por isto mesmo é sempre atual e exigível para os vestibulares. Leiam-no !

Fonte:
Texto enviado pelo autor