quarta-feira, 6 de junho de 2012

Alvarenga Peixoto (Caderno de Sonetos)


A MARIA IFIGÊNIA

 Em 1786, quando completava sete anos.

 Amada filha, é já chegado o dia,
 em que a luz da razão, qual tocha acesa
 vem conduzir a simples natureza,
 é hoje que o teu mundo principia.

 A mão que te gerou teus passos guia,
 despreza ofertas de uma vã beleza,
 e sacrifica as honras e a riqueza
 às santas leis do filho de Maria.

 Estampa na tua alma a caridade,
 que amar a Deus, amar aos semelhantes,
 são eternos preceitos da verdade.

 Tudo o mais são idéias delirantes;
 procura ser feliz na eternidade,
 que o mundo são brevíssimos instantes.

"AO MUNDO ESCONDE O SOL SEUS RESPLENDORES"

Ao mundo esconde o Sol seus resplendores,
 e a mão da Noite embrulha os horizontes;
 não cantam aves, não murmuram fontes,
 não fala Pã na boca dos pastores.

 Atam as Ninfas, em lugar de flores,
 mortais ciprestes sobre as tristes frontes;
 erram chorando nos desertos montes,
 sem arcos, sem aljavas, os Amores.

 Vênus, Palas e as filhas da Memória,
 deixando os grandes templos esquecidos,
 não se lembram de altares nem de glória.

 Andam os elementos confundidos:
 ah, Jônia, Jônia, dia de vitória
 sempre o mais triste foi para os vencidos!

"EU VI A LINDA JÔNIA E, NAMORADO"

Eu vi a linda Jônia e, namorado,
 fiz logo voto eterno de querê-la;
 mas vi depois a Nise, e é tão bela,
 que merece igualmente o meu cuidado.

 A qual escolherei, se, neste estado,
 eu não sei distinguir esta daquela?
 Se Nise agora vir, morro por ela,
 se Jônia vir aqui, vivo abrasado.

 Mas ah! que esta me despreza, amante,
 pois sabe que estou preso em outros braços,
 e aquela me não quer, por inconstante.

 Vem, Cupido, soltar-me destes laços:
 ou faze destes dois um só semblante,
 ou divide o meu peito em dois pedaços!

"EU NÃO LASTIMO O PRÓXIMO PERIGO"

Eu não lastimo o próximo perigo,
 Uma escura prisão, estreita e forte;
 Lastimo os caros filhos, a consorte,
 A perda irreparável de um amigo. 

 A prisão não lastimo, outra vez digo, 
 nem o ver iminente o duro corte, 
 que é ventura também achar a morte 
 quando a vida só serve de castigo. 

 Ah, quão depressa então acabar vira 
 este enredo, este sonho, esta quimera, 
 que passa por verdade e é mentira! 

 Se filhos, se consorte não tivera 
 e do amigo as virtudes possuíra, 
 um momento de vida eu não quisera.

"NÃO ME AFLIGE DO POTRO A VIVA QUINA"

Não me aflige do potro a viva quina;
 Da férrea maça o golpe não me ofende;
 Sobre as chamas a mão se não estende;
 Não sofro do agulhete a ponta fina. 

 Grilhão pesado os passos não domina;
 Cruel arrocho a testa me não fende;
 À força perna ou braço se não rende;
 Longa cadeia o colo não me inclina. 

 Água e pomo faminto não procuro;
 Grossa pedra não cansa a humanidade;
 A pássaro voraz eu não aturo. 

 Estes males não sinto, é bem verdade;
 Porém sinto outro mal inda mais duro:
 Da consorte e dos filhos a saudade!

Fonte:
www.sonetos.com.br

Alvarenga Peixoto (1744 -1793)


Inácio José Alvarenga Peixoto (Rio de Janeiro 1744 – Ambaca, Angola 1793), foi filho de Simão Alvarenga Braga e Maria A. Braga. 

Estudou no Colégio dos Jesuítas no Rio de Janeiro, tendo se transferido para Portugal, onde obteve o Bacharelato, com louvor, em Direito na Universidade de Coimbra. Aí conheceu o poeta Basílio da Gama (São José do Rio das Mortes, atual Tiradentes - MG 1740 – Lisboa, Portugal 1795) de quem se tornou um grande amigo. 

Exerceu o cargo de Juiz de Fora da Vila de Sintra em Portugal, bem como a de Senador pela cidade mineira de São João Del-Rei. 

Também exerceu o cargo de Ouvidor da comarca de Rio das Mortes. Alvarenga, por esse tempo, se dedicou à agricultura e à mineração. 

O poeta tinha um caráter entusiasta e generoso, mas, ao mesmo tempo era ambicioso e perdulário. Com isso conquistou amigos, inimigos e muitas dívidas. Foi amigo dos poderosos da época e partilhava com os demais intelectuais de seu tempo idéias libertárias advindas do Iluminismo. Por fim, pressionado pelas dívidas e pelos altos impostos, acabou se envolvendo na Inconfidência Mineira. 

A temática amorosa era uma das vertentes da poesia de Alvarenga Peixoto que era casado com a poeta Bárbara Heliodora (São João Del-Rei, MG 1758 – São Gonçalo do Sapucaí 1819). 

Alvarenga era amigo dos poetas Cláudio Manoel da Costa (Ribeirão do Carmo, atual Mariana, MG 1729 – Vila Rica, atual Ouro Preto 1789) e Tomás Antônio Gonzaga (Porto, Portugal 1744 – Maputo, Moçambique 1810). 

Em seus poemas é fácil perceber uma postura crítica quanto à sociedade da época. Entre os poetas árcades, Alvarenga foi o que mais se envolveu na Conjuração. Sua diminuta obra foi recolhida por Rodrigues Lapa e apresenta alguns dos sonetos mais bem acabados do arcadismo brasileiro. 

O poeta frequentava constantemente Vila Rica. Denunciado como participante da trama foi deportado para Angola onde veio a falecer.

Fontes:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Inácio_José_de_Alvarenga_Peixoto
http://www.recantodasletras.com.br/biografias/36161

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 570)


Uma Trova de Ademar  

Em inspirações imerso, 
fiz do sol o próprio guia 
para conduzir meu verso 
nos caminhos da poesia! 
–ADEMAR MACEDO/RN– 

Uma Trova Nacional  

Ausência é pena doída, 
vazio amargo e medonho. 
É o findar da própria vida 
no acordar de um lindo sonho. 
–ELIANA PALMA/PR– 

Uma Trova Potiguar  

Nas asas de um vento brando, 
na espuma branca do mar... 
as ondas chegam cantando, 
trazendo o sal potiguar! 
–PROF. GARCIA/RN– 

Uma Trova Premiada  

2011 > CTS-Caicó/RN 
Tema > PEGADA > 10º Lugar 

Olhando as velhas estradas 
por onde andei nos teus braços, 
eu vejo em tuas pegadas 
o raio-x dos meus passos! 
–ARLINDO TADEU HAGEN/MG– 

...E Suas Trovas Ficaram  

Desde minha mocidade 
que a saudade me ronda; 
pra me livrar da saudade 
não sei onde me esconda. 
–CHICO MOTA/RN– 

Uma Poesia  

Não queria que tudo terminasse
entre nós desta forma e desse jeito,
nosso elo com o tempo foi desfeito
pus um ponto final no nosso enlace;
foi você que lançou na minha face
o veneno mortal da ingratidão,
paralítico eu fiquei sem reação
até hoje eu me lembro desse dia;
os garranchos da sua covardia
arranharam demais meu coração. 
–JUNIOR ADELINO/PB– 

Soneto do Dia  

Por Que? 
–DIVENEI BOSELI/SP–

Homem, que te deitaste, ousado, em minha cama
e comigo fizeste os filhos que tivemos,
como é comum ao ser que vive, luta e ama
e mostra a todo mundo a farsa que vivemos;

homem, que me envolveste em ardilosa trama,
comigo tripudiaste e, em brigas, nos batemos,
como é comum a quem faz da comédia o drama
e vai expor na feira os sonhos que vendemos;

a quem eu escrevi meu verso mais amargo,
por quem cedo verti a lágrima mais linda
e tarde desprezei, audaz, com gesto largo;

se até já te esqueci, se a nossa trilha é finda,
por que te escrevo agora estes versos de embargo?
Se não te quero mais, por que te escrevo ainda?...

Calendário de Festas de Concursos de Trovas- 2012


15, 16 e 17 de junho
Jogos Florais de Curitiba

23 de junho
Concurso de Maranguape

21 e 22 de julho
Concursos de São Paulo

11 a 14 de outubro
Natal e Caicó

27 de outubro
Jogos Florais de Cantagalo

26, 27 e 28 de outubro
Ouro Fino

24 e 25 de novembro
Jogos Florais de Niterói

Fonte:
Calêndula Literária. UBT Porto Alegre. Edição nº 408 - Junho de 2012.

terça-feira, 5 de junho de 2012

José Feldman (Saudades de um Amigo)



Meu amigo 

Hoje é 5 de junho de 2012. Já se faz 1 ano e 11 meses que nos deixou. Este ano farias 12 anos de idade. 

A saudade que deixaste é uma cratera imensa que nunca vai se fechar. A vida de nós humanos, não é uma vida, mas são momentos que morrem pouco a pouco e vai mitigando nossa alma. As vezes, quando escuto latidos no meio da noite, penso que é você que retornou e apesar do frio, procuro você na escuridão da noite. Queria poder tocar em você novamente e poder sentir seu pêlo entre os dedos. Estás agora livre, a correr pelas planícies do paraíso. Feliz estou em saber de que és uma alma livre. Não sei como é o lugar onde estás, mas desejo que a benção da luz esteja contigo onde estiver, a luz exterior e a luz interior. E se houver um sol, e mereces muito mesmo que haja, que a santa luz do sol brilhe sobre ti, e aqueça teu coração até que ele resplandeça como um grande fogo e se houver alguém necessitado, possa vir e nele se aquecer, como um amigo que sempre fostes.

Que a luz brilhe de dentro de teus olhos, como candeia colocada na janela de uma casa, oferecendo ao peregrino um refugio na tormenta.

E se houver chuva, que a benção da chuva, da chuva suave e boa, seja contigo. Que ela tombe sobre tua alma para que as pequenas flores todas possam surgir e derramar suavidade na brisa.

Que a benção das grandes chuvas seja contigo, caindo em tua alma para lavá-la bem lavada, nela deixando muitas poças reluzentes onde o azul do céu possa brilhar e, às vezes, uma estrela.

E que a benção da terra, da grande terra redonda, seja contigo. Que sempre tenhas uma saudação amiga aos que passam por ti ao longo dos caminhos.

Que a terra seja macia debaixo de ti onde repousas, e, leve, ela descanse sobre ti por estar deitado nela. E que seja um tapete de flores que sirva de conforto para você.

Que a tua alma que tão cedo se libertou de seu peso, livre e leve, esteja junto de Deus, que seja sempre abençoada.

Obrigado pela sua amizade, meu amigo. Seja luz!!!!
Saudades, muitas, muitas, muitas saudades

Trova 220 - Marcley de Aquino (Fortaleza/CE)


Mário Quintana (Presença)


É preciso que a saudade desenhe tuas linhas perfeitas,
teu perfil exato e que, apenas, levemente, o vento
das horas ponha um frêmito em teus cabelos...
É preciso que a tua ausência trescale
sutilmente, no ar, a trevo machucado,
as folhas de alecrim desde há muito guardadas
não se sabe por quem nalgum móvel antigo...
Mas é preciso, também, que seja como abrir uma janela
e respirar-te, azul e luminosa, no ar.
É preciso a saudade para eu sentir
como sinto - em mim - a presença misteriosa da vida...
Mas quando surges és tão outra e múltipla e imprevista
que nunca te pareces com o teu retrato...
E eu tenho de fechar meus olhos para ver-te.

Renato Russo (A Carta)


Escrevo-te estas mal traçadas linhas, meu amor
Porque veio a saudade visitar meu coração
Espero que desculpes os meus erros por favor
Nas frases desta carta 
que é uma prova de afeição
Talvez tu não a leias mas quem sabe até darás
Resposta imediata me chamando de meu bem
Porém o que me importa
é confessar-te uma vez mais
Não sei amar na vida mais ninguém

Tanto tempo faz,
que li no teu olhar
A vida cor-de-rosa que eu sonhava
E guardo a impressão
de que já vi passar
Um ano sem te ver,
um ano sem te amar
Ao me apaixonar,
por ti não reparei
Que tu tivestes só entusiasmo
E para terminar, amor assinarei
Do sempre, sempre teu...

Pablo Neruda (Saudade)



Saudade é solidão acompanhada, 
é quando o amor ainda não foi embora, 
mas o amado já... 

Saudade é amar um passado que ainda não passou, 
é recusar um presente que nos machuca, 
é não ver o futuro que nos convida...

Saudade é sentir que existe o que não existe mais... 

Saudade é o inferno dos que perderam, 
é a dor dos que ficaram para trás, 
é o gosto de morte na boca dos que continuam... 

Só uma pessoa no mundo deseja sentir saudade: 
aquela que nunca amou. 

E esse é o maior dos sofrimentos: 
não ter por quem sentir saudades, 
passar pela vida e não viver. 

O maior dos sofrimentos é nunca ter sofrido.

Carlos Drummond de Andrade (A Um Ausente)


Tenho razão de sentir saudade,

tenho razão de te acusar.
Houve um pacto implícito que rompeste
e sem te despedires foste embora.
Detonaste o pacto.
Detonaste a vida geral, a comum aquiescência
de viver e explorar os rumos de obscuridade
sem prazo sem consulta sem provocação
até o limite das folhas caídas na hora de cair.



Antecipaste a hora.
Teu ponteiro enlouqueceu, enlouquecendo nossas horas.
Que poderias ter feito de mais grave
do que o ato sem continuação, o ato em si,
o ato que não ousamos nem sabemos ousar
porque depois dele não há nada?



Tenho razão para sentir saudade de ti,
de nossa convivência em falas camaradas,
simples apertar de mãos, nem isso, voz
modulando sílabas conhecidas e banais
que eram sempre certeza e segurança.



Sim, tenho saudades.
Sim, acuso-te porque fizeste
o não previsto nas leis da amizade e da natureza
nem nos deixaste sequer o direito de indagar
porque o fizeste, porque te foste

Olivaldo Junior (Saudades)



Tenho saudade. Saudade das estrelas que eu contava no seu rosto, das estradas que eu contava no seu passo, dos passeios que eu fazia nos meus sonhos. Sonhar é bom até que chegue a solidão, que também se chama amor. Amor é uma bela poesia que não foi escrita. Poema é amor consumido, sumido em si mesmo. O amor que eu tinha me estafa. Um dia o amor me mata e eu viro flor: saudade sua. 

Olivaldo 

Trovas 
Saudade

A saudade é um velho jeito
de entender meu coração:
quando bate em tom perfeito
não tem som: tem solidão.

A saudade é um chinelinho
que se arrasta na memória,
despertando o meu vizinho
para ouvir a minha história.

A saudade é um pé de cravo
num jardim que já morreu:
jardineiro é mesmo escravo
das "roseiras" que perdeu.

Fonte:
O Autor

Ademar Macedo (Mensagens Poéticas n. 569)


Uma Trova de Ademar  

Com insônia... Apaixonado, 
sinto-me feliz porque... 
Passando a noite acordado 
eu penso mais em você! 
–ADEMAR MACEDO/RN– 

Uma Trova Nacional  

Orvalho, brilho de prata 
sob a densa luz da lua, 
que em solene passeata 
faz espelho em minha rua... 
–MARIA DE LOURDES PAIVA/SP– 

Uma Trova Potiguar  

Quando me perco na rota 
dos pensamentos dispersos, 
reagrupo minha frota 
numa enseada de versos. 
–HÉLIO PEDRO/RN– 

Uma Trova Premiada  

1995 > UBT-São Paulo/SP 
Tema > CHEGADA > Venc. 

Na vida, vindas e idas,
contrastes de nossa sorte,
chegada lembrando a vida,
partida lembrando a morte!
–JAIME PINA DA SILVEIRA/SP– 

...E Suas Trovas Ficaram  

A saudade em horas mortas, 
sem ver que o tempo passou, 
teima em abrir velhas portas 
que há muito a vida fechou ... 
–WALDIR NEVES/RJ– 

Uma Poesia  

É de noite na hora da dormida
que a saudade cruel perturba o sono,
não importa o motivo do abandono
pois todos nos levam a despedida,
é lembrando o momento da partida
que a saudade chegando rouba a paz;
e essa dor que nos toma é tão vorás,
quanto mais passa o tempo aumenta o drama;
é distante de alguém que a gente ama
que o amor verdadeiro aumenta mais. 
–WELTON MELO/PE– 

Soneto do Dia  

Ser Poeta. 
–MARCOS MAIA/RN– 

Ser poeta é fazer da vida um verso,
é caçar seus amores do seu jeito.
É enxergar que o amor não tem defeito 
e pintar de outra cor todo o universo. 

Ser poeta é viver o adverso
sem fingir, sem fugir, sem preconceitos.
É lutar por seus sonhos, seus conceitos,
não calar, não viver no submerso. 

Ser poeta é ficar em outra esfera,
é cumprir o papel que lhe espera
e gravar em poesia o sentimento. 

É um anjo de paz, um sonhador
que no solo da vida planta o amor
pra o leitor consumir como alimento.

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Wagner Marques Lopes (Trova Rio +20) 1


Sotero Silveira de Souza (O Trovador da Lira Triste) Parte 3, final


Dizem que a paixão é louca,
E os beijos de ternura,
Como o amor, tem vida pouca,
É eterno enquanto dura!

Os teus seios palpitantes,
Que afago com calor,
São dois coxins odorantes,
Onde durmo com amor!

As aves de grande porte,
Adejam sem sobressalto,
Se elas temessem a morte,
Não voariam tão alto!

Sempre a alma padece,
Quando no amor não há sorte;
tolice, ninguém merece,
O preço de nossa morte!

Agradeço o teu beijo,
Que me deste com calor,
Veio matar o meu desejo,
E aumentar meu amor!

Quisera ser passarinho,
Para bem alto voar,
Depois, pousar no raminho,
De laranjeira e cantar!

O teu corpo delicado,
Que demonstra perfeição,
Foi por Deus emoldurado,
Pra tentar meu coração!

Perdi-me no areal da vida,
Fraco, sedento de amor,
E ao encontrar-te querida,
Tornei-me um trovador!

Eu vi as garças voando,
Caçando junto à lagoa,
O pantanal enfeitando,
Sobressaltadas à toa!

Não sei dizer o que sinto,
Quando vejo o teu olhar,
É uma alegria, não minto,
Que vontade de casar!

Não sei porque tu me deixas,
Com orgulho, com desdém,
Escuta as minhas queixas,
Voltes de novo meu bem!

Diz que o passado não morre,
E não para de passar,
É como o rio que corre,
Tristonho, no rumo do mar!

Setenta e um anos vividos,
Com fé, saudade e amor,
Entre anseios, beijos e gemidos;
Hoje, só, frio, sem calor!

Por que a vida madrasta,
Quando se trata de amor;
O ciúme atroz nos desgasta,
Só fica tristeza de cor!

Para uns a morte é linda,
Para outras é querida,
É uma espera infinda,
pois ela é outra vida!

Recordo-me da cigana,
Que olhou na minha mão,
Olhei-a com tanta gana,
Beijando-a com emoção!

Como Deus, Jesus foi Santo,
sendo assim, jamais pecou;
Como homem, eu garanto,
Que Jesus também amou!

Jesus deve ter amado,
Com mente pura e sadia,
Como um lírio imaculado,
Na virente penedia!

Teus olhos verdes, luzentes,
Que jorram cintilação,
São quais estrelas cadentes,
Na noite de um coração!

Teus olhos verdes vagos,
Que às vezes tento mirar,
Tem o mistério dos lagos,
Na hora de crepuscular!

Teus olhos verdes, fulgentes,
Brilhando na solidão,
São esmeraldas pingentes,
Num rico colar de sultão!

Teus olhos verdes tristonhos,
Que nunca pude sondar,
São dois pedaços de sonhos,
São duas negas de mar!

Não vires as costas pra mim,
Pois o anjo não tem costas,
Quanto mais tu fazes assim,
Eu sei que de mim mais gostas!

Abracei teu corpo lindo,
Quando contigo dançava,
E vi, que estavas sorrindo,
Enquanto eu suspirava!

Eu sei que não mereço,
Mas vou tentar te amar,
Querida, eu te agradeço,
A bondade do teu olhar!

Feliz por te conhecer,
nasceu em mim esperança,
Jamais hei de me esquecer
Do teu corpo naquela dança!

Toda de branco catita,
Com rosa de rubra cor;
Não sei quem é mais bonita,
Se a mulher ou a flor!

Te implorei a vida inteira,
Que me desses um retrato,
Foste bela companheira,
Mas de coração ingrato!

A mãe que trabalha é nobre,
É um fato que consola;
Digna é a mão do pobre,
Aberta, pedindo esmola!

Há muita gente vaidosa,
Que o orgulho se consome;
Chega a sorrir prazerosa,
Vendo o pobre passar fome!

Teu rosto lindo, morena,
E o teu corpo encantador,
Faz-me lembrar de açucena,
Num ramalhete de flor!

Ao ver-te altiva, serena,
Com teu talhe sedutor,
Penso da deusa morena,
Fugida do templo do amor!

O preto velho chorava,
E sorria com emoção,
Ao ver que o neto brincava,
Liberto da escravidão!

É belo assistir nos campos,
A noite amena chegar,
A dança dos pirilampos,
Estrelas mil a brilhar!

Quando passo pela estrada,
Descanso, à sombra do ipê,
Com sua copa dourada,
Que me viu beijar você!

É triste de ouvir na roça,
A pomba rola arrulhar,
No colmo de uma palhoça,
Quando a noite vai chegar!

Mirando o tom azulado,
Dos tão lindos olhos teus,
O céu é mais desbotado,
Que obra prima de Deus!

Que importa se a rima é pobre,
Se o nome termina em ão;
Existe coisa mais nobre,
Que a palavra do coração!

Quando passa o cavaleiro,
Nas picadas do sertão,
O burro trota ligeiro,
Sem medo da escuridão!

Ana Lúcia Santana (Romance Policial)


O Romance Policial é uma categoria literária estruturada em torno da ocorrência de um assassinato, das indagações, pesquisas, inquirições de testemunhas e, finalmente, da descoberta do criminoso. Todo o enfoque do autor recai sobre o mecanismo de desvendamento dos segredos envolvidos no crime, levado a cabo normalmente por um detetive profissionalizado ou de natureza amadora.

Este gênero literário deixa claro que não há atividade criminosa perfeita, e que não deve haver espaço para tolerância à criminalidade nem para carência de punição. Geralmente o indivíduo que comete o crime é descrito psicologicamente como uma criatura inusitada, à margem da racionalidade que move os mecanismos da vida social.

A ficção policial é povoada por ingredientes como o temor, o inexplicável, a pesquisa dos dados que cercam o crime, a inquietação intelectual diante dos fatos, a perplexidade, a sede de descobrir o criminoso e os motivos que o impulsionam a cometer o ato ilícito, todos convenientemente combinados nas devidas proporções, conforme o estilo de cada escritor e seu contexto. O modelo tradicional se apóia na total verossimilhança, o que leva investigadores como Sherlock Holmes a buscarem a contribuição da própria Ciência em sua obsessiva procura da verdade.

A história deste gênero tem início com a obra Assassinatos na Rua Morgue, do renomado Edgar Allan Poe, lançado há mais de um século; este clássico determinou as principais qualidades estéticas do romance policial. Poe praticamente dita as regras que serão seguidas por seus sucessores; quase todos adotam a figura do parceiro do detetive, que lhe vale como suporte. Também não faltam a aparência austera e a solidão que acompanha o investigador.

Muitas destas obras apostam igualmente na caracterização psicológica dos personagens; são seres normais, como qualquer um, mergulhados em seus dramas pessoais, repletos de aflições, tristezas, ansiedades, pavores e expectativas. Seu público-alvo devora todos os livros de seu escritor dileto, não estão enquadrados em gêneros ou faixas etárias definidas e geralmente navegam pelo romance de uma única vez.

Boa parte dos escritores deste gênero escreve em língua inglesa, confirmando a tradição desta ficção, nascida nos Estados Unidos; são nomes como Arthur Conan Doyle, Aghata Christie, Rex Stout, Raymond Chandler, Dashiell Hammett, Denis Lehanne, P.D. James, Patricia Cornwell, entre outros.

A galeria de detetives famosos também é vasta e conhecida; dificilmente alguém habituado a viajar pelas páginas de um livro irá desconhecer personagens como Sherlock Holmes, Hercule Poirot, Maigret, Sam Spade, e outros tantos. São figuras de destaque no imaginário de cada leitor.

No Brasil a ficção policial vem ganhando impulso com escritores como Luiz Alfredo Garcia-Roza, um mestre na arte de caracterizar psicologicamente seus personagens, e em retratar cenários cariocas, onde são ambientadas suas narrativas, protagonizadas pelo detetive Espinosa; e Patrícia Melo, autora, entre outros, de Inferno, vencedor do Prêmio Jabuti em 2001, especialista em mergulhar na mente dos criminosos. Em São Paulo o campo de ação é de Joaquim Nogueira e seu investigador Venício. É impossível deixar de lado a clássica obra de Rubem Fonseca, ex-policial que se vale da própria experiência na criação de suas tramas, nas quais desfilam os velhos colegas de profissão.