quarta-feira, 23 de outubro de 2024

José Feldman (O Tempo e os Idosos)

A passagem do tempo é um fenômeno que afeta a todos nós, mas para as pessoas idosas, ela traz consigo um significado profundo e multifacetado. À medida que os anos se acumulam, as experiências vividas transformam-se em memórias, e cada ruga ou fio de cabelo branco conta uma história. Para muitos, a velhice é uma fase de reflexão, onde o tempo é visto não apenas como um número, mas como uma rica tapeçaria de vivências.

Para os idosos, as memórias se tornam tesouros. Cada lembrança é uma janela para um passado que moldou quem eles são hoje. Recordações de infância, momentos marcantes, amores perdidos e conquistas celebradas são revisitados com carinho. Muitas vezes, essas histórias são compartilhadas com familiares e amigos, criando laços entre gerações e transmitindo sabedoria.

“Lembro-me de quando era jovem e sonhava em viajar pelo mundo”, pode dizer um avô, enquanto seus netos escutam com atenção. Essas histórias não são apenas relatos do passado; elas oferecem lições sobre resiliência, amor e a importância de aproveitar cada momento.

Com o passar dos anos, muitos idosos começam a refletir sobre o significado do tempo. A percepção do tempo muda; dias, meses e anos podem parecer passar mais rapidamente. Essa reflexão pode gerar um sentimento de urgência em viver plenamente, levando-os a cultivar relacionamentos e a realizar sonhos que, por muito tempo, foram deixados de lado.

“Não posso deixar para depois o que posso fazer hoje”, é uma frase que pode ecoar nas mentes de muitos. Esse novo olhar sobre a vida e o tempo pode resultar em decisões ousadas, como aprender uma nova habilidade, viajar para lugares que sempre desejaram conhecer ou até mesmo mudar de estilo de vida.

A velhice traz consigo uma sabedoria inestimável. Após anos de vivências, os idosos possuem uma perspectiva única sobre os desafios da vida. Eles aprenderam que a felicidade muitas vezes está nas pequenas coisas — um por do sol, uma conversa com um amigo, ou um momento de silêncio. Essa sabedoria é um presente que eles compartilham, não apenas com seus familiares, mas com a comunidade ao seu redor.

Muitos idosos se tornam mentores, oferecendo conselhos valiosos aos mais jovens. Têm a capacidade de ver além das dificuldades imediatas, lembrando aos outros que “as tempestades passam e o sol sempre volta a brilhar”.

Entretanto, a passagem do tempo também pode trazer desafios. A solidão é uma realidade para muitos idosos, especialmente à medida que amigos e familiares vão se afastando. A perda de entes queridos pode ser uma das experiências mais dolorosas, e a adaptação a essa nova realidade requer tempo e apoio.

Enfim, a passagem do tempo para as pessoas idosas é uma celebração da vida. Cada ruga é um lembrete de risadas, lágrimas e momentos significativos. A velhice pode ser uma fase de desafios, mas também é uma época rica em amor, aprendizado e gratidão.

Nosso papel é ouvir suas histórias, aprender com suas experiências e honrar suas jornadas. Ao fazermos isso, não apenas celebramos a vida dos idosos, mas também nos tornamos mais conscientes do valor do tempo em nossas próprias vidas. Afinal, cada dia é uma nova oportunidade para criar memórias, aprender e amar.

Fonte: José Feldman. Labirintos da vida. Maringá/PR: IA Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul.

Vereda da Poesia = 140 =


Poema de
DANIEL MAURÍCIO
Curitiba/PR

Um dia
o meu
silêncio
vai
te faltar
tanto
que com
espanto
tardiamente
me 
entenderás.
= = = = = = 

Trova de
IZO GOLDMAN
Porto Alegre/RS, 1932 – 2013, São Paulo/SP

Eu, na vida, sou barqueiro
dos meus sonhos sem destino:
sonho bom é o passageiro,
sonho mau é o clandestino.
= = = = = = 

Poema de
LUIZ POETA
Rio de Janeiro/RJ

Minha majestade

Não deixes meu olhar dormir no teu,
Eu corro o doce risco de sonhar
A história linda e triste de um plebeu
Que foi pela rainha se encantar.

Não deixes meu o olhar se apaixonar.
O calabouço escuro de uma dor
É o final feliz de um sonhador
Que um dia descobriu o que é amar.

A ponte levadiça se fechou
E dentro do Castelo, eu percebi
Que em cada verde bosque onde vivi,
Não vi que a liberdade se escondeu.

Amei o teu olhar no meu olhar...
Narcisos é que amam refletir
Seus rostos, mas se o espelho lhes mentir,
Vaidosos, eles tentam se matar.

Se esse teu rei souber dos meus anseios
De amar sua rainha... hás de convir,
A sua espada em mim, há de brandir
E exterminar meus trôpegos enleios.

Mas mesmo assim, teu servo passional
Há de sonhar... Quem há de me impedir?
Que eu morra, vendo o teu olhar sorrir,
...assim, te tornarei mais imortal.

Se sou um camponês, que volte e voe...
Pois quem nasceu no bosque é passarinho
E quando o céu azul é o caminho,
Que eu busque em cada bosque que me abençoe.
= = = = = = 

Trova Premiada em Irati/PR, 2023
THALMA TAVARES 
São Simão / SP

Não te eximas da labuta
que conduz à perfeição...
O talento é pedra bruta
que exige lapidação!
= = = = = = 

Poema de
VANICE ZIMERMAN
Curitiba/PR

Flores de nanquim

A ternura de tuas mãos
Dispersa meus véus -
Em suaves movimentos
O pincel desliza,
Acariciando minha pele,
Faz-me sorrir
E, risca, docemente,
Com a fluidez do nanquim
Flores de cerejeira
Em meu corpo e alma -
A essência de teu olhar
Aquece minha nudez
Sou toda tua -
Atemporal tela...
= = = = = = 

Trova Popular

Não me tentes com fortuna
para contigo casar:
eu prefiro mais que tenha
coração para me dar...
= = = = = = 

Soneto de
FERNANDO ANTONIO BELINO
Sete Lagoas/MG

As grandes águas

As Cataratas, ditas simplesmente,
Foz do Iguaçu, recanto de beleza!
Aqui, teve capricho a natureza,
Moldando este espetáculo imponente!

Fica agitado o coração da gente,
Ao divisar o encanto e a sutileza
Da fauna e flora, unidas à grandeza,
Destas águas, em queda permanente.

Rica dádiva entregue à Humanidade,
Que exige imenso amor, boa vontade.
No zelo de tão belo monumento.

As Cataratas do Iguaçu serão
Eternizadas, feito um deus-trovão
Na voz dos Céus, a ressoar ao vento!

(3° lugar no Concurso Literário-2023, pela Academia Literária do Oeste do Paraná)
= = = = = = 

Trova de
RENATO BATISTA NUNES
Vassouras/RJ (1883 – 1965) Rio de Janeiro/RJ

As dores e os desencantos
têm dois destinos diversos:
- ou se dissolvem nos prantos,
- ou se desfazem nos versos.
= = = = = = 

Trova Humorística de
LUIZ MONTEZI EVANGELISTA
Santos Dumont/MG

O porco acordou suando,
pois teve um sonho confuso:
- Sonhou que estava morando
com a porca... de um parafuso!
= = = = = = 

Soneto de 
AMILTON MACIEL MONTEIRO
São José dos Campos/SP

Chuva na praia

Se o céu trocar a chuva pelo sol
vai agradar e muito a todos nós
que estamos do arrebol ao arrebol
curtindo a praia à moda de arigós!

Garoa bem cerrada, igual lençol
encobre tudo, mais do que os torós
e faz com que seu manto de aerosol
nos deixe até com jeito de bocós!

Queremos ter um dia ensolarado
com a paisagem linda e o azul do céu,
curtindo o verde mar encapelado!

São Pedro tenha dó do interiorano;
chuva na praia é duro e bem cruel
para um sonho de sol e pouco pano!
= = = = = = 

Trova do
Príncipe dos Trovadores
LUIZ OTÁVIO
Rio de Janeiro/RJ, 1916 – 1977, Santos/SP

Lar vazio... o "nada" em tudo...
a vida sem mais porquê...
- E na sala, o piano mudo,
como fala de você!...
= = = = = = 

Soneto de
FLORBELA ESPANCA 
Vila Viçosa, 1894 – 1930, Matosinhos

Versos de Orgulho

O mundo quer-me mal porque ninguém
Tem asas como eu tenho! Porque Deus
Me fez nascer Princesa entre plebeus
Numa torre de orgulho e de desdém!

Porque o meu Reino fica para Além!
Porque trago no olhar os vastos céus,
E os ouros e os clarões são todos meus!
Porque Eu sou Eu e porque Eu sou Alguém!

O mundo! O que é o mundo, ó meu amor?!
O jardim dos meus versos todo em flor,
A seara dos teus beijos, pão bendito,

Meus êxtases, meus sonhos, meus cansaços...
São os teus braços dentro dos meus braços:
Via Láctea fechando o Infinito!...
= = = = = = 

Trova Funerária Cigana

Se além da sentida morte,
o sentimento vigora,
feliz dos restos mortais
que sobre eles se chora.
= = = = = = 

Poemeto de 
SOLANGE COLOMBARA
São Paulo / SP

A madrugada jaz fria
no concreto da cidade
e teu corpo incendiado
aquece os lençóis vazios.
A flor grita, em euforia
nos canteiros agitados;
muda, sente calafrios,
chamas da maturidade.
= = = = = = 

Trova Humorística de 
JOSÉ VALDEZ DE CASTRO MOURA
Pindamonhangaba/SP

É machão! Que fortaleza!
Engrossa a voz e se zanga...
Mas, nos surtos de fraqueza,
fala fino e solta a franga !
= = = = = = 

Poema de 
ÓGUI LOURENÇO MAURI
Catanduva/SP

Oração ao despertar
 
Abrindo os olhos, Senhor,
para um dia a mais viver,
vejo a Luz de Vosso amor
abençoando meu ser.
 
Ponho-me assim na frequência
das Graças que do Alto vêm,
pronto a exercer a clemência,
buscando fazer o bem.
 
Que a fé me tire o desânimo,
o rancor, a impaciência;
deixe o coração magnânimo,
facho de amor por essência.
 
Pai, que durante este dia
eu tenha a oportunidade
de sustentar a harmonia
e de fazer caridade.
 
Nesta jornada, que eu veja
a todos como um irmão,
numa atração benfazeja
a promover compreensão.
= = = = = = 

Trova de
FRANCISCO JOSÉ PESSOA
Fortaleza/CE, 1949 - 2020

Trova de agradecimento para o Feldman, 
pela divulgação dos versos no blog

Meu irmão adocicado* 
quero me fazer presente, 
pra agradecer o pingado 
de versos que cai na gente.

*Obs: Adocicado porque ambos temos diabetes.
= = = = = = 

Soneto de
AUTA DE SOUZA
Macaíba/RN (1876 – 1901) Natal/RN

O Beija-Flor
 
Acostumei-me a vê-lo todo o dia
De manhãzinha, alegre e prazenteiro,
Beijando as brancas flores de um canteiro
No meu jardim - a pátria da ambrosia.
 
Pequeno e lindo, só me parecia
Que era da noite o sonho derradeiro...
Vinha trazer às rosas o primeiro
Beijo do Sol, nessa manhã tão fria!
 
Um dia, foi-se e não voltou... Mas, quando
A suspirar, me ponho contemplando,
Sombria e triste, o meu jardim risonho...
 
Digo, a pensar no tempo já passado;
Talvez, ó coração amargurado,
Aquele beija-flor fosse o teu sonho!
= = = = = = 

Poetrix de
PATRÍCIA ESSINGER
Guaíba/RS

tato

o toque beija:
dedos,
insinuação de lábios.
= = = = = = 

Poema de
ARSENY TARKOVSKY
Kirovohrad/Ucrânia (1907 – 1989)

Pela noite

Pela noite concedias-me o favor,
Abriam-se as portas do altar
E a nossa nudez iluminava o escuro
À medida que genufletia. E ao acordar
Eu diria “abençoada sejas!”
Sabendo como pretensiosa era a bênção:
Dormias, os lilases tombavam da mesa
Para tocar-te as pálpebras num universo de azul,
E tu recebias esse sinal sobre as pálpebras
Imóveis, e imóvel estava a tua mão quente. 
= = = = = = 

Trova Humorística de
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA
São Paulo/ SP

"Zerou" no vestibular !!!
Com vergonha, ela tremeu,
disse ao pai, pra disfarçar:
- Sabe a última ? ... Sou eu !
= = = = = = 

Poema de 
FERNANDO PESSOA
Lisboa/Portugal, 1888 – 1935

Não Sei Quantas Almas Tenho 

Não sei quantas almas tenho. 
Cada momento mudei. 
Continuamente me estranho. 
Nunca me vi nem acabei. 
De tanto ser, só tenho alma. 
Quem tem alma não tem calma. 
Quem vê é só o que vê, 
Quem sente não é quem é, 

Atento ao que sou e vejo, 
Torno-me eles e não eu. 
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu. 
Sou minha própria paisagem; 
Assisto à minha passagem, 
Diverso, móbil e só, 
Não sei sentir-me onde estou. 

Por isso, alheio, vou lendo 
Como páginas, meu ser. 
O que só que não prevendo, 
O que passou a esquecer. 
Noto à margem do que li 
O que julguei que senti. 
Releio e digo: "Fui eu ?" 
Deus sabe, porque o escreveu.
= = = = = = 

Trova da
Princesa dos Trovadores
CAROLINA RAMOS
Santos/SP

Não se queixa de ser pobre,
quem, no seu modesto lar,
trabalha e feliz descobre
que é livre para sonhar!
= = = = = = 

Hino de 
Alagoinha do Piauí/PI

A alvorada do teu amanhecer
Naquele promissor nove de abril
Prenunciava, nosso renascer
Debaixo desse céu cor de anil.

Terra querida, és nossa vida
Terra de sonhos de valores mil
Alagoinha do Piauí, do Piauí, Brasil.

O vento liberdade perfumando
Espalhando a fragrância da bonança
Os elos da corrente se quebrando
O povo a cantar hinos de esperança.

No folclore a beleza e tradição
Novenários, foguetes e bandeiras
Culto misto de fé e diversão
São Gonçalo, reisado e brincadeiras.

Preservando a cultura desta gente
A arte vem ostentada na bandeira
Ficará o legado eternamente
Aos filhos dessa terra hospitaleira.

Teus filhos são gigantes, são guerreiros
A tirar da mãe terra o seu sustento
Terra boa do feijão dos cajueiros
Que não nega aos teus filhos o alimento.

O seu lema é crescer junto ao seu povo
Seu povo forte, simples, altaneiro
Na luta firme por um mundo novo
Um mundo igualitário e sobranceiro.
= = = = = = 

Trova Premiada no Japão
DARLY O. BARROS
São Francisco do Sul/SC, 1941 - 2021, São Paulo/SP

“Há um mundo além do horizonte!”
e, do que almeja, seguro,
o migrante cruza a ponte
entre o presente e o futuro...
= = = = = = 

Poema de 
ANTÓNIO BOTTO
Concavada/Abrantes/Portugal (1897 – 1959) Rio de Janeiro/RJ

Tenho a certeza 
De que entre nós tudo acabou. 
- Não há bem que sempre dure, 
E o meu, bem pouco durou. 
Não levantes os teus braços 
Para de novo cingir 
A minha carne de seda; 
- Vou deixar-te, vou partir! 
E se um dia te lembrares 
Dos meus olhos cor de bronze 
E do meu corpo franzino, 
Acalma 
A tua sensualidade 
Bebendo vinho e cantando 
Os versos que te mandei 
naquela tarde cinzenta! 
Adeus! 
Quem fica sofre, bem sei; 
Mas sofre mais quem se ausenta!
= = = = = = 

Trova Premiada de
RITA MARCIANO MOURÃO 
Ribeirão Preto/SP

Ousar não é ser valente
ao buscar gloria e poder.
Ousadia é quando a gente
humaniza o nosso ser!
= = = = = = 

Fábula em Versos
adaptada das Fábulas de Monteiro Lobato 
JOSÉ FELDMAN
Campo Mourão/PR

Fábula do Lobo e da Ovelha 

No campo, o lobo faminto vagava, 
A ovelha, inocente, pastava e sonhava. 
“Querida ovelha, venha aqui dançar, 
Uma festa linda vou te dar!” 

Mas a ovelha desconfiou da intenção, 
E com astúcia, escapou da armadilha em questão. 
Aprendeu que nem tudo é bondade, 
E a desconfiança é uma proteção à verdade. 

Eduardo Martínez (Amarildo, um homem carregado de devaneios)

Amarildo, homem sem grandes feitos na vida, tentava aplacar a própria mediocridade em devaneios. Desse modo, não raro, imaginava-se na pele de algum desbravador, seja alguém que já teria existido, seja até mesmo algum Indiana Jones das telas do cinema. 

Tamanhos pensamentos, o sujeito já havia atravessado o Atlântico tantas vezes, que perdera as contas. Cinco, seis, nove? Talvez duas dúzias, contando as viagens em navios piratas, sem mencionar aquela outra em uma jangada típica da sua Fortaleza, no Ceará. 

Em uma dessas travessias, eis que houve um motim comandado pelo terrível Barba-Negra. Amarildo, justamente o capitão, foi atirado ao mar repleto de tubarões famintos. Por sorte do resquício de sonho naquele pesadelo, eis que surgiu um golfinho salvador. O homem, agarrado à barbatana dorsal do inesperado amigo, conseguiu sair ileso daquelas mandíbulas ferozes.

Após se ver a salvo, Amarildo se despediu do golfinho. O bicho tinha família e precisava retornar para o lar, doce lar, que ficava ali mesmo no salgado Atlântico. Ademais, o gajo só precisaria dar algumas braçadas para chegar a uma ilha no meio do oceano.

Não tardou, Amarildo pisou na alva areia. O local parecia deserto. Com a barriga roncando, ele tratou de arrumar algo para saciar a fome. Por sorte que às vezes acomete os aventureiros, ele encontrou alguns coqueiros carregados.

Com sua destreza, conseguiu pegar e abrir tantos cocos que desejou. Barriga cheia, sentiu, pela primeira vez desde que foi arremessado do seu navio aos tubarões, um leve sono.

Quase adormecido, Amarildo tomou um susto. Não era possível! O cruel e traiçoeiro Barba-Negra surgiu do nada e encostou a ponta da espada na barriga do Amarildo.

— Pensou que iria me escapar, Amarildo?

— Você de novo, Barba-Negra!

— Sim, Amarildo! 

— Dê-me uma espada para lutarmos de homem para homem.

Barba-Negra, vendo aquele maltrapilho esvaído, teve um raro momento de compaixão. Desembainhou a outra espada que carregava e a jogou na areia ao lado do rival. Este, ligeiro que nem falcão-peregrino, pegou a espada e rolou para o lado para se desvencilhar do primeiro golpe do traiçoeiro rival, que cortou as areias da praia.

As lâminas afiadas logo começaram a travar o combate de uma vida. A cada toque entre elas, faíscas eram liberadas para surpresa dos animais que se juntaram para assistir ao duelo. Enquanto os macacos mostravam os dentes, os papagaios charlavam coisas ininteligíveis, enquanto duas serpentes, atrás de uma moita, sibilavam antes do acasalamento. 

E lá estavam aqueles dois seres humanos digladiando, quando um dos oponentes, justamente o Amarildo, se distraiu com o zumbido de uma mosca e foi atingido na barriga pelo vil metal do Barba-Negra. E lá se foram as tripas do perdedor caírem sobre a areia. Não tardou, lobos, saídos não se sabe de onde, avançaram sobre o banquete de última hora.

Pobre Amarildo, contorcendo-se em dores, foi devorado vivo, enquanto o malvado Barba-Negra gargalhava alto para todos ouvirem. 

— Há, há, há, há!!!

De tão alto, acabou despertando o Amarildo, que dormia na rede pendurada na varanda. Acordou suando em bicas e com forte dor no lado direito da barriga. Por sorte, foi socorrido ao hospital pelos vizinhos do edifício onde morava. Era apendicite.

Fonte:
Blog do Menino Dudu. 22 outubro 2024.

Recordando Velhas Canções (Samba de Orfeu)

(samba, 1959)
Compositor: Luiz Bonfá e Antonio Maria


Quero viver,    
quero sambar 
Até sentir a essência da vida 
me falta ar 
Quero sambar 
quero viver  
Depois do samba, ta bem 
Meu amor, posso morrer 

Quero viver,    
quero sambar 
Até sentir a essência da vida 
me falta ar 
Quero sambar quero viver  
Depois do samba, ta bem 
Meu amor, posso morrer 

Quem quiser gostar de mim 
Se quiser vai ser assim 
Vamos viver 
vamos sambar  
Se a fantasia rasgar  
Meu amor 
eu compro outra  

Vamos sambar, vamos viver  
O samba é livre,  
Eu sou livre também até morrer.

A Liberdade e a Alegria no 'Samba de Orfeu'
A música 'Samba de Orfeu', é uma celebração da vida e da liberdade através do samba. A letra expressa um desejo profundo de viver intensamente e aproveitar cada momento, mesmo diante das adversidades. A repetição da frase 'quero viver, quero sambar' reforça a ideia de que a vida e o samba estão intrinsecamente ligados, sendo o samba uma metáfora para a alegria e a liberdade de viver.

A menção à fantasia que pode se perder, mas que pode ser comprada novamente, simboliza a resiliência e a capacidade de se reinventar. A fantasia, no contexto do samba, representa a alegria, a criatividade e a expressão pessoal. Mesmo que a vida apresente desafios e perdas, a música sugere que é possível recuperar a alegria e continuar a dançar, a viver. A liberdade é um tema central, destacada na frase 'o samba é livre, e eu sou livre até morrer', indicando que a liberdade é um valor inalienável e essencial para a existência plena.

Além disso, a música aborda a aceitação e a autenticidade nas relações pessoais. A linha 'quem quiser gostar de mim, se quiser vai ser assim' sugere que a aceitação deve ser incondicional, sem tentar mudar a essência do outro. 'Samba de Orfeu' é, portanto, uma ode à vida, à liberdade e à autenticidade, celebrando o samba como uma expressão máxima desses valores.

segunda-feira, 21 de outubro de 2024

José Feldman (O Escritor e o Filósofo)

Era uma vez, em uma pequena aldeia cercada por montanhas e florestas, um escritor chamado Hirram e um filósofo chamado Hermes. Ambos eram conhecidos por suas habilidades excepcionais: Hirram era famoso por suas histórias encantadoras e por criar mundos imaginários, enquanto Hermes era reverenciado por suas reflexões profundas sobre a vida e a existência. 

Certa manhã, enquanto caminhavam pelo bosque, Hirram teve uma ideia. “Hermes, que tal fazermos uma competição? Cada um de nós pode apresentar uma obra que represente a nossa visão do mundo. Aquele que tocar mais corações será proclamado o vencedor!” 

Hermes, sempre ponderando, concordou. “É uma proposta interessante, mas devemos lembrar que a verdadeira sabedoria não é apenas sobre vencer, mas sobre aprender e compartilhar.” 

E assim, decidiram que cada um teria uma semana para trabalhar em sua obra. Hirram, entusiasmado, sentou-se em sua mesa e começou a escrever. Em suas histórias, ele criou heróis que enfrentavam dragões e viajantes que descobriam terras mágicas. Seu mundo era colorido e vibrante, repleto de aventuras e emoções. 

Hermes, por outro lado, passou seus dias contemplando. Ele caminhou pelas florestas, observou os riachos e escutou os pássaros cantando. Em vez de escrever imediatamente, ele refletiu sobre as questões que o intrigavam: o que era a felicidade? Como encontrar propósito na vida? A natureza e a essência do ser humano tornaram-se seus temas centrais. 

Ao final da semana, ambos se reuniram na praça da aldeia para apresentar suas criações. O povo estava animado, curioso para ouvir o que cada um tinha a dizer. 

Hirram foi o primeiro. Com a voz vibrante, ele contou uma história épica sobre um jovem que partiu em uma jornada para salvar seu reino. As reviravoltas, os desafios e as conquistas emocionaram a plateia. A cada palavra, os ouvintes eram transportados para um mundo de magia e esperança. Ao final, aplausos ecoaram na praça, e muitos estavam visivelmente emocionados. 

Em seguida, foi a vez de Hermes. Ele levantou a voz serena e começou a compartilhar suas reflexões. Falou sobre a natureza da vida, a efemeridade do tempo e a busca por significado. Seus pensamentos eram profundos e desafiadores, e ele fez perguntas que ecoavam na mente de todos. A plateia ouvia atentamente, absorvendo cada palavra como se fossem pérolas de sabedoria. 

Quando terminou, um silêncio reverente tomou conta da praça. As pessoas estavam pensativas, imersas em suas reflexões. A competição parecia ter tomado um rumo inesperado. 

Após as apresentações, a aldeia decidiu que não haveria um vencedor. Ambos, Hirram e Hermes, tinham oferecido algo valioso: um mundo de sonhos e uma visão da realidade. O povo percebeu que, enquanto as histórias de Hirram os transportavam para longe, as reflexões de Hermes os traziam de volta ao presente, ajudando-os a entender melhor suas próprias vidas. 

Certa noite, enquanto caminhavam juntos sob a luz das estrelas, Hirram virou-se para Hermes e disse: “Eu desejava vencer, mas agora vejo que ambos temos nosso valor. Você me ensinou que a vida é tão rica em significado quanto em imaginação.” 

Hermes sorriu. “E você me lembrou que as histórias têm o poder de conectar as pessoas, de fazer com que sonhem e sintam. Juntos, somos mais fortes.” 

Moral da História 
A verdadeira sabedoria reside na união entre a imaginação e a reflexão. Enquanto a criatividade nos leva a sonhar, a filosofia nos ajuda a entender a realidade. Ambos são necessários para uma vida plena e significativa.

Fonte: José Feldman. Labirintos da vida. Maringá/PR: IA Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul.