domingo, 7 de setembro de 2025

Asas da Poesia * 87 *


Poema de
LAIRTON TROVÃO DE ANDRADE
Pinhalão/PR

Doce realidade
"As vigas de nossa casa são de cedro;
suas traves, de cipreste”
(Ct. 1.16)

Lembram o azul do brilhante
Teus radiantes olhos vivos,
Contemplando a liberdade,
Que não mais te está distante.
Que dia feliz é este,
Oh, doce realidade!

Têm o frescor do jasmim
Os teus discretos cabelos;
Aroma e suavidade,
Que nunca se viu assim.
Que dia feliz é este,
Oh, doce realidade!

O mais ardoroso humor
Cora tua face tão alva,
Com suspiros de ansiedade
De um coração de amor.
Que dia feliz é este,
Oh, doce realidade!

Libertar-te-ão dos grilhões,
Meiga pomba dos meus sonhos,
Unirá a felicidade
Os nossos dois corações.
Que dia feliz é este,
Oh, doce realidade!

Que vá embora a tristeza!
Enxuga a lágrima, amor!
Abraçando a liberdade,
Serás feliz, com certeza...
Que dia!.. Quanta alegria!.
Oh, doce realidade!..
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QUADRA POPULAR

A árvore do amor se planta
no centro do coração;
só a pode derrubar
o golpe da ingratidão.
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Poema de
ARTUR DA TÁVOLA
(Paulo Alberto Moretzsohn Monteiro de Barros)
Rio de Janeiro/RJ,  1936 – 2008

Manhãs

Manhãs indefinidas,
O Cisne de Tuonela
Vagueia na alma.
O vento está enigmático.

Manhãs sem sol,
Nem definição de vida,
Esparsas lembranças,
Atiçam o burlar deveres.

Manhãs molengas,
Somos todo interioridades,
Lembranças do ignoto
Sem alegria ou tristeza.

Manhãs brumosas
O céu indefinido.
Nenhuma cor predomina
Na alma estapafúrdia.

Manhãs ganho-perdidas
Na falta de vontade
E um torpor com algo de delícia
Pacifica a imposição do poema

Manhãs serenas
Nem preguiça nem ações
Espaço da alma em preparo,
Sem recados, alusões ou deveres.

Manhãs sorrateiras,
O bem e o mal em silêncio.
Uma dor que alivia
O susto de existir.
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Soneto de 
RAUL DE LEONI
Petrópolis/RJ, 1895 – 1926

História Antiga

No meu grande otimismo de inocente,
Eu nunca soube por que foi… um dia,
Ela me olhou indiferentemente,
Perguntei-lhe por que era… Não sabia…

Desde então transformou-se de repente
A nossa intimidade correntia
Em saudações de simples cortesia
E a vida foi andando para a frente…

Nunca mais nos falamos… vai distante…
Mas, quando a vejo, há sempre um vago instante
Em que seu mudo olhar no meu repousa,

E eu sinto, sem no entanto compreendê-la,
Que ela tenta dizer-me qualquer cousa,
Mas que é tarde demais para dizê-la…
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Trova de 
ADELIR COELHO MACHADO 
São Gonçalo/RJ, 1928 - 2003, Niterói/RJ 

Se a noite chega cansada
de caminhar sempre ao léu,
Deus dá vinhos de alvorada
na taça rubra do céu.
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Poema de
ÉLBEA PRISCILA DE SOUZA E SILVA
Piquete/SP, 1942 – 2023, Caçapava/SP

Cromo

Tro – pe – ga – men – te
sobe a ladeira,
bengala em punho,
passo de rola cansada.

Estanca… é hora
de atravessar a larga avenida.

Vermelho? Verde? Olha o sinal,
o sol é forte, seus olhos fracos,
o mundo, jovem, e ela… tão velha!

Ela vacila: – Será que há tempo?
Suor frio sob o sol quente…

- Vamos, vovó?
E a mão macia
Conduz a sua.

O sol sorriu ao ver a cena,
a tarde aplaudiu
e o pano se fecha
guardando o pequeno e imenso gesto
de cordialidade…
cordial… de coração…
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TROVA FUNERÁRIA CIGANA

Brilhava em céu azulado...
Negra nuvem me toldou...
Por perder quem me seguia,
minh'alma aflita chorou.
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Soneto de 
BENI CARVALHO
Aracati/CE, 1886 – 1959, Rio de Janeiro/RJ

O cais

Quando te vejo, velho cais, em ruínas,
perscruto a tua vida secular:
— Manhãs radiosas em que te iluminas!
— Serenas noites de encantado luar!

Viste, partindo, ao canto das matinas,
velhas naus, brancas velas, pelo mar:
— Dourados sonhos, ilusões divinas,
ânsia de descobrir e conquistar!

Hoje, todo em tristeza, te esbarrondas;
mas uma voz oculta, dentre as ondas,
te diz: "A sorte não te foi tão má:

Terás, em ti, esta legenda impressa:
— Recolheste o sorrir do que regressa
e a saudade de quem não voltará".
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Trova de
LEONILDA YVONNETI SPINA 
Londrina / PR

Com fé, ao romper da aurora,
vai à luta o agricultor;
de sol a sol, não tem hora
para findar seu labor.
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Poema de 
ÓGUI LOURENÇO MAURI
Catanduva/SP

Procura-se um Papai Noel

Procura-se um Papai Noel bem brasileiro,
Com total verde-amarelo em seu visual.
Nada de indumentária vinda do estrangeiro,
Terá que mostrar sua origem tropical.

Procura-se um Papai Noel de tez morena,
Trazendo às crianças o sabor da surpresa,
Magia que o comércio retirou de cena
Na ânsia de vender, de acumular riqueza.

Procura-se um Papai Noel que abrace forte,
Um abraço bem ao modo tupiniquim...
Um gesto sem a frieza do Polo Norte,
Bem ao estilo dos que meu pai dava em mim.

Procura-se um Papai Noel, sorriso aberto,
Que a criança possa tocar, ver e curtir.
E que seu presente só seja descoberto
No exato momento em que o "Velhinho" partir.

Procura-se um Papai Noel de nossa gente.
Viajante de trenó e renas, jamais!
Nós almejamos alguém que esteja presente.
Muito nosso, sim!... Dos Pampas aos Seringais.
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Trova de
A. A. DE ASSIS
Maringá/PR

A renúncia corresponde, 
muita vez, a muito amar; 
como quando o Sol se esconde 
para que brilhe o luar! 
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Soneto de
OVÍDIO FERNÁNDEZ RIOS
Montevidéu/Uruguai, 1883 – 1963

Elogios

Teus olhos têm momentos desiguais;
sua luz ora é plácida, ora é ardente,
é o suave fluir da água corrente
ou o relampejar de dois punhais.

Estranhos pirilampos de savanas
brilhando nos meus céus tão desolados,
são dois negros diamantes resguardados
por tuas magníficas pestanas.

Únicos olhos que hão por mim chorado,
únicos olhos que hão interpretado
toda a minha alma lutadora e forte;

quero que sejam, com sua luz querida,
os únicos a rir em minha vida,
os únicos que chorem minha morte.
(Tradução de Othon Costa)
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Trova de
CAROLINA RAMOS
Santos/SP

Lembrando a ternura antiga,
minha saudade se exalta...
- Bendigo a penumbra amiga
que me esconde a tua falta!
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Hino de 
MOSSORÓ/RN

I
Nas crônicas da gente brasileira,
Queremos um lugar pra Mossoró,
Cidade centenária e pioneira,
Desbravadora do ínvio Sertão;
Sofreram os seus filhos a canseira;
Viveram na esperança a vocação:

Mas assim se fez a sorte
Com inusitado amor;
A cruel gleba gleba domaram
E fluíram seu valor

Estribilho
Mossoró de Baraúnas a terra;
heroico sítio da Virgem Luzia;
Teu nome sonoro remonta a era
De índios valentes das margens do rio
Que longe nasce no Oeste bravio.

II
Lembramos hoje teus anos de glória:
Ousada foste sempre Mossoró;
Por ti começa, a senda da vitória
Na luta ao cangaceiro lampião;
Precursora exemplar da Pátria História
Em abolir a negra escravidão:

Nem a seca já temeste
Com seu infernal calor;
Encontraste a boa linfa
Que teu povo saciou

III
Bondosa se mostrou a Natureza
Em cumular de dons a Mossoró:
Das várzeas e do sol vem a riqueza,
O Sal, precioso sal, que o mar produz;
Nas matas da Caatinga ao estio acessa,
A nívea vela do Algodão reluz;

Vem a brisa do Nordeste,
Mensageira do alto Mar,
As carnaubeiras belas,
Sussurrantes, embalar

IV
Ao povo, a seus feitos, à cidade,
Cantemos este hino de louvor,
Legado de esperança à mocidade
Em grandiosos dias no porvir;
Moldado desta forma se retrate
Como em gesso fiel nosso sentir:

Seja nosso grande lema,
Construindo pela Paz,
A conquista do Progresso
Que feliz o povo faz
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Trova de 
JOSÉ MACHADO BORGES
Belo Horizonte/MG

Do peixe, como eu dizia, 
sem pretensão de iludi-los, 
somente a fotografia 
pesava mais de oito quilos!
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Poema de 
CASSIANO RICARDO
São José dos Campos/SP (1895 – 1974) Rio de Janeiro/RJ

O acusado

Quando eu nasci, já as lágrimas que eu havia
De chorar, me vinham de outros olhos.

Já o sangue que caminha em minhas veias pro futuro
Era um rio.

Quando eu nasci já as estrelas estavam em seus lugares
Definitivamente
Sem que eu lhes pudesse, ao menos, pedir que influíssem
Desta ou daquela forma, em meu destino.

Eu era o irmão de tudo: ainda agora sinto a nostalgia
Do azul severo, dramático e unânime.
Sal - parentesco da água do oceano com a dos meus olhos,
Na explicação da minha origem.

Quando eu nasci, já havia o signo do zodíaco.

Só, o meu rosto, este meu frágil rosto é que não
Quando eu nasci.

Este rosto que é meti, mas não por causa dos retratos
Ou dos espelhos.

Este rosto que é meu, porque é nele
Que o destino me dói como uma bofetada.
Porque nele estou nu, originalmente.
Porque tudo o que faço se parece comigo.
Porque é com ele que entro no espetáculo.
Porque os pássaros fogem de mim, se o descubro
Ou vêm pousar em mim quando eu o escondo.
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Trova de
DIONEZINE DE FÁTIMA NAVARRO 
Ponta Grossa / PR

Mil auroras já vivi
e a que almejo é sem igual:
Pura tela em frenesi,
joia rara e... boreal!
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Fábula em Versos de
JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry/França, 1621 – 1695, Paris/França

O faceto* e os peixes

À mesa dum fidalgo
Um faceto jantava.
Graúdos peixes servem aos convivas;
A ele, um mui pequeno.
«Esperem, que eu lhes conto!» — diz consigo;
E, pegando no peixe,
Finge baixo falar-lhe, — e de resposta
Parece estar à espera,
Pasmam todos, perguntam
Da charada o conceito.
«É que receio, —
Diz então o faceto, — que um amigo,
De infância um companheiro, naufragasse
Da Índia na carreira.
Informar-me tentei deste peixinho;
Porém diz-me que sendo ainda tão novo
Nada pode contar-me; que os mais velhos
Decerto me esclarecem.
Permitam, pois, senhores, que interrogue
Algum dos mais graúdos!»
* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * 
faceto = brincalhão, humorístico, folgazão
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Trova de
GERALDO TROMBIM 
Americana / SP

Vida de noites sombrias,
de sonhos jogados fora:
é sinal de que os meus dias
não são mais feitos de aurora!
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