segunda-feira, 8 de setembro de 2025

Asas da Poesia * 88 *


Poema de 
APOLÔNIA GASTALDI
Ibirama/SC

O vento
 
Um dia
bem à tardinha
bate  o  vento
a viração 
e
varre  ligeiro
as  folhas  secas  do  chão
 
Olhei bem aquela cena
do terreiro limpo
e
então
lembrei todos  os  sonhos
que  eu  tinha 
na  coração.
 
Se  você  tivesse  visto
com os olhos  da  alma
a dor
não teria  arrancado
de  mim
aquele  amor
 
Sonho  com o terreiro  limpo
depois de  uma viração.
Um  amor não mata  outro
o que  nos mata 
é a  dor.
= = = = = =

Soneto de 
AMILTON MACIEL MONTEIRO
São José dos Campos/SP

Oh, tempo!

A rua onde brinquei na meninice,
período mais feliz de minha vida,
só fui revê-la agora, na velhice...
E ali... senti minha alma compungida!

Aquela que implorou que eu não partisse...,
que era tão bela e larga, tão comprida,
como pôde encolher? Foi vigarice
do tempo que a tornou tão espremida?

Meu grande espanto fez-me recordar
do imenso amor da minha juventude,
que então julguei ser o maior do mundo...

Mas quando a vida me obrigou provar
a imensidão daquele amor... Não pude,
tão diminuído estava... E moribundo!
= = = = = =

Recordando Velhas Canções
SAMBA TRISTE 
(1960) 
Billy Blanco e Baden Powell 

Samba triste 
A gente faz assim 
Eu aqui 
Você longe de mim, de mim 
Alguém se vai 
Saudade vem e fica perto 
Saudade resto de amor 
De amor que não deu certo 

Samba triste 
Que antes eu não fiz 
Só porque 
Eu sempre fui feliz, feliz 
Agora eu sei 
Que toda a vez que o amor existe 
Há sempre um samba triste, meu bem 
Samba que vem de você, amor
= = = = = = = = = = = = =

Folclore Brasileiro em Versos de
JOSÉ FELDMAN
Floresta/PR

Matinta Pereira

Na bruma da noite, um canto a soar,
Matinta Pereira, sombra a vagar,
com penas de gaivota e mistérios a contar,
guardiã das almas, seu destino a traçar.

Canta para os mortos, em lamento profundo,
e em cada sussurro, um eco fecundo,
protege os perdidos, os que não têm voz,
e em seu olhar sábio, a dor se faz feroz.

Mas quem a desafia, deve ter temor,
pois a força da bruxa é de um grande amor,
que luta na sombra, em busca de paz,

e entre os mistérios, a vida se faz,
Matinta, a lenda, com seu eterno clamor,
nas noites de velas, seu canto é fervor.
= = = = = = 

Soneto de
MÁRIO QUINTANA
Alegrete/RS (1906 – 1994) Porto Alegre/RS

A Rua dos Cata-ventos (I)

Escrevo diante da janela aberta.
Minha caneta é cor das venezianas:
Verde!... E que leves, lindas filigranas
Desenha o sol na página deserta!

Não sei que paisagista doidivanas
Mistura os tons... acerta... desacerta...
Sempre em busca de nova descoberta,
Vai colorindo as horas quotidianas...

Jogos da luz dançando na folhagem!
Do que eu ia escrever até me esqueço...
Pra que pensar? Também sou da paisagem...

Vago, solúvel no ar, fico sonhando...
E me transmuto... iriso-me... estremeço...
Nos leves dedos que me vão pintando!
= = = = = = = = =

Poema de 
GRAÇA PIRES
Figueira da Foz/Portugal

Quero uma Casa

Quero uma casa com paredes azuis,
com varandas vidradas sobre a noite.
Um abrigado lugar no eixo do silêncio.
Um espaço intemporal. Sagrado.
Ancorado perto de um signo lunar,
ou preso a um verão inesperado.
Quero dançar dentro das palavras líquidas:
água, rio, mar, lágrimas,
talvez o orvalho que escorre pelas árvores de madrugada.
Quero atravessar uma crônica de viagem,
conspirando contra os profetas de marés sobressaltadas,
para não morrer sufocada na engrenagem do medo.
Quero ficar seduzida de uma espera,
no imaginário dos que sonham,
e gritar a idade circular de qualquer afeto.
Quero amar o pretexto branco dos meus olhos
sem precipitar a cor translúcida das raízes
que prendem a noite à palidez do sol na sedução do amanhecer,
e deixar, depois, que um azul extenuado me denuncie.
= = = = = = 

Hino de 
BALSA NOVA/ PR

Tua gente sempre acolhedora,
Tem no peito a semente da amizade,
Tem nos olhos luz reveladora
De um povo feliz de verdade.

Balsa Nova cidade criança,
teu futuro é riqueza e bonança.

O teu gado e toda a plantação
Dos teus campos compõem novo desenho
E revelam nobre coração:
De paz, de esperança, de empenho.

Balsa Nova cidade criança,
teu futuro é riqueza e bonança.

O teu chão fecundo, abençoado
O Iguaçu e Papagaio vem banhar,
E tuas matas trazem bom recado:
"Progresso é da vida cuidar".

Balsa Nova cidade criança,
teu futuro é riqueza e bonança. 
= = = = = = = = =

Soneto de
JOÃO BATISTA XAVIER OLIVEIRA
Presidente Alves/SP, 1947 – 2025, Bauru/SP

Sutil olhar

A nova era agora tão veloz
atinge os ares lassos de metais;
a quântica figura não é mais
o mito que atordoa a todos nós.

Os olhos deslumbrados por fanais
que buscam horizontes, antes sós,
percebem muito além de nossa voz
as vibrações sutis de mil sinais.

Desperta criatura limitada!
Aguça a tua aura dos sentidos;
o mundo ao teu redor é quase nada!

A nova era agora tem ouvidos;
o espírito retarda evolução
se olhar de uma segunda dimensão!!
= = = = = = 

Poema de
YVES NAMUR
Bélgica

Figuras do muito obscuro (I)

Evita pois
Olhar no seio do visível

 E
Antes vê as coisas que não vês
E tudo isso que não ouves.

 Pois é aí,
Ao centro de “Nenhures”,
Que sempre o coração vai ter

 E
O passo do inesperado.

Porquê obstinarmo-nos a chamar ainda
Aquele que o não pode ser

E
Nunca há de poder regressar?

 Se não fosse para aumentar o vazio
E a nossa necessidade de ser na imensidão?
(Tradução: Fernando Eduardo Carita)
= = = = = = 

Quadra  Popular

Vou tirar o teu retrato,
no tampo da minha viola,
o dia que não te ver,
teu retrato me consola.
= = = = = = 

Poema de
JOSÉ FANHA
(José Manuel Kruss Fanha Vicente)
Lisboa/Portugal

Grito

De ti que inventaste
a paz
a ternura
e a paixão
o beijo
o beijo fundo intenso e louco
e deixaste lá para trás
a côncava do medo
à hora entre cão e lobo
à hora entre lobo e cão.
De ti que em cada ano
cada dia cada mês
não paraste de acender
uma e outra vez
a flor elétrica
do mais desvairado
coração.
De ti que fugiste à estepe
e obrigaste
à ordem dos caminhos
o pastor
a cabra e o boi
e do fundo do tempo
me chamaste teu irmão.
De ti que ergueste a casa
sobre estacas
e pariste
deuses e linguagens
guerras
e paisagens sem alento.
De ti que domaste
o cavalo e os neutrões 
e conquistaste
o lírico tropel
das águas e do vento.
De ti que traçaste
a régua e esquadro
uma abóboda inquieta
semeada de nuvens e tritões
santidades e tormentos.
De ti que levaste
a volúpia da ambição
a trepar ereta
contra as leis do firmamento.
De ti que deixaste um dia
que o teu corpo se cansasse
desta terra de amargura e alegria
e se espalhasse aos quatro cantos
diluído lentamente
no mais plácido
silente
e negro breu.
De ti
meu irmão
ainda ouço
o grito que deixaste
encerrado
em cada pétala do céu
cada pedra
cada flor.
O grito de revolta
que largaste à solta
e que ficou para sempre
em cada grão de areia
a ressoar
como um pálido rumor.
O grito que não cansa
de implorar
por amor
e mais amor
e mais amor.
= = = = = =

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