domingo, 14 de setembro de 2025

Asas da Poesia * 93 *


Poema de 
LAIRTON TROVÃO DE ANDRADE
Pinhalão/PR

Vou-me embora
"Gosto de sentar-me à sua sombra."
(Ct. 2.3)

Foi assim tão de repente
Que falaste, sem demora,
Entre lágrima dolente*:
'"Tchau, amor, eu vou-me embora!"

Oh, não! Fica mais um pouco!
Jamais sejas meu açoite!
Apenas, por ti, sou louco!
Fica!.. Fica até à noite!

Não me dês a solidão!
Fica mais, não vás embora!
Este amor não é em vão!
Fica, pois, até a aurora!

Quem te fala é um grande amor,
Não o deixes na saudade!
És o meu maior valor!
Fica... até à eternidade!

E não fales mais assim!
Vê que muito te suplico:
Vive um pouquinho pra mim!
Dize-me somente; "Eu fico!"

Com tais rogos de aflição,
Que de sobra aqui se vê,
Disseste, dando-me a mão;
"Vou-me embora... com você!"
* * * * * * * * * * * * * * * * * *
*Dolente: Magoada, cheia de dor, lastimosa.
= = = = = = = = =  

Soneto de
ANTERO DE QUENTAL
Ponta Delgada/Portugal. 1842 – 1891

Transcedentalismo

Já sossega, depois de tanta luta,
Já me descansa em paz o coração.
Caí na conta, enfim, de quanto é vão
O bem que ao Mundo e à Sorte se disputa.

Penetrando, com fronte não enxuta,
No sacrário do templo da Ilusão,
Só encontrei, com dor e confusão,
Trevas e pó, uma matéria bruta...

Não é no vasto Mundo - por imenso
Que ele pareça à nossa mocidade -
Que a alma sacia o seu desejo intenso...

Na esfera do invisível, do intangível,
Sobre desertos, vácuo, soledade,
Voa e paira o espírito impassível!
= = = = = =

Soneto de
JOÃO BATISTA XAVIER OLIVEIRA
Presidente Alves/SP, 1947 – 2025, Bauru/SP

Joio

Por que nós complicamos singelezas
pelo simples sabor de afirmação;
por que não escutar o coração
que pulsa as vibrações das incertezas...

se temos ao alcance o corrimão;
degraus que facilitam mãos coesas;
o dom de emocionarmos às belezas...
Por que só ver a luz na escuridão?

Estamos de passagem simplesmente.
Abrindo com desvelo nossa mente
o mundo é bem maior em nosso espaço.

Por que nós complicamos as passagens
seguindo a realidade das miragens?
A vida é bela e o tempo é bem escasso!
= = = = = = 

Triverso de
TAMAIALE AKSENEN 
Irati/PR

Férias de verão
Dormir até mais tarde
Ui! Galo chato.
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Poema de
ANTERO JERÓNIMO
Lisboa/Portugal

Dom

Que vontade te impele
a ausentares-te dos demais
no ermo desse horizonte infinito.
A escutares o silêncio onde esculpes
apurada arte de aprofundares o mundo
dom de sussurrares palavras sentidas ao vento
impregnadas de acentuadas essências multicores.
Sementes engravidando a imponência da montanha
numa tocante melodia, elevada ao céu da eternidade.
= = = = = = 

Fábula em Versos
adaptada dos Contos e Lendas do Brasil
JOSÉ FELDMAN
Floresta/PR

O Saci e a Natureza

No verde profundo, o saci se esconde 
entre as folhas… ele observa e guia 
com seu olhar sagaz… a vida responde, 
e a natureza pulsa em harmonia. 

As pessoas sentem a força do vento 
com o saci, a terra ganha voz 
e em cada lenda, um novo intento 
de respeitar o mundo… somos todos nós. 

Ele traz a sabedoria do chão, 
e ensina a ouvir o canto das flores, 
a arte da vida em plena união, 
Celebra as cores e os nossos amores. 

Assim, no ciclo eterno de toda ação, 
o saci é a ponte entre o céu e a criação.
= = = = = =

Poema de 
SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN
Porto/Portugal, 1919 – 2004, Lisboa/Portugal

Navio naufragado

Vinha de um mundo
Sonoro, nítido e denso.
E agora o mar o guarda no seu fundo
Silencioso e suspenso.

É um esqueleto branco o capitão,
Branco como as areias,
Tem duas conchas na mão
Tem algas em vez de veias
E uma medusa em vez de coração.

Em seu redor as grutas de mil cores
Tomam formas incertas quase ausentes
E a cor das águas toma a cor das flores
E os animais são mudos, transparentes.

E os corpos espalhados nas areias
Tremem à passagem das sereias,
As sereias leves dos cabelos roxos
Que têm olhos vagos e ausentes
E verdes como os olhos de videntes.
= = = = = =

Quadra Popular

Chamaste-me tua vida,
eu tua alma quero ser:
a vida acaba com a morte,
a alma não pode morrer.
= = = = = = 

Soneto de
JERSON BRITO
Porto Velho/RO

Meiga flor

Esse encanto sem par me extasia
E conduz aos portais do pecado
Plenamente envolvido, abismado
Sou refém duma rara euforia

Provocante, tu és a culpada
Das torrentes de amor, desvario
Tua ausência produz um vazio
Meiga flor, em meu ser tatuada

Aspirando o frescor desse aroma
Enclausuro-me em doce redoma
Onde encontro um prazer colossal

Quando imerso nas cores da bruma
Que meus passos domina e perfuma
Provo, enfim, d'alegria integral
= = = = = =

Spina de 
SOLANGE COLOMBARA
São Paulo / SP

Um Certo Tom Lilás 

Gratidão ao abençoado 
dia reina mansamente, 
confabulando a poesia 

em entrelinhas do meu verso
com o universo. Em sorrisos
amanheço no ar da calmaria
das rimas. No horizonte azul
o crepúsculo voa na sintonia.
= = = = = =

Hino de 
ROSÁRIO DO SUL/RS

Terra fértil de ricas colheitas
de rebanhos e verdes cereais
tua praia de areias eleitas
lembra imenso lençol de cristais

Estribilho: 
Rosário do Sul, Rosário do Sul
Do povo gaúcho contente e feliz
orgulho da gente, cidade bendita
que sonha e palpita no sul do país

O brasão da cidade retrata
as origens que a história traduz
em seus rios, a pureza da prata
sobre o verde à que o ouro dá luz

O rosário, a cabeça de touro
e as armas que em paz hoje estão
simbolizam no verde e no ouro
que Rosário engrandece a nação

Quem o rio contemplar das barrancas
vendo as águas e a vida passar
essas praias de areias tão brancas
dentro d'alma vai sempre levar
= = = = = =

Soneto de 
AMILTON MACIEL MONTEIRO
São José dos Campos/SP

Por quê?

Não sei por que é que Deus me fez assim
completamente tolo e apaixonado,
que só para ficar sempre ao seu lado,
acabo me esquecendo até de mim!

Pois desde que você me deu seu sim
e eu confiei que foi um sim pensado,
não permiti jamais que houvesse um fim
em nosso amor tão meigo e desejado!

Você é meu sonho todo santo dia!
E o dia todo desde o amanhecer...
E logo após também, quando adormeço!

E nestes sonhos cheios de alegria
e de utopias, só tenho prazer...
Tanto prazer que eu sei que não mereço!
= = = = = =

Soneto de 
ALFREDO SANTOS MENDES
Lisboa/Portugal

Heresia

Talvez minha garganta revoltada.
Espinhosa ficasse, e enrouquecesse.
Ou para meu castigo enlouquecesse,
Por a manter tão muda, tão calada!

Quero falar, a voz sai embargada,
Como se algum mal eu lhe fizesse.
Eu juro que não fiz, e isso acontece.
Minhas cordas vocais fiquem paradas!

Eu preciso gritar minha revolta,
Engolir todo o mal que não tem volta,
E na glote se encontra aprisionado!

Eu quero ler a minha poesia.
Limpar do meu passado, a heresia,
Engolir as tristezas do meu fado!
= = = = = =

Recordando Velhas Canções
EU SEI QUE VOU TE AMAR 
(samba-canção, 1959) 

 Eu    sei que vou te amar
Por toda a minha vida
Eu vou te amar
Em cada despedida eu vou te amar
Desesperadamente eu sei que vou te amar

E cada verso meu será      
pra te dizer
Que eu sei que vou te amar
Por toda minha vida

Eu sei que vou chorar
A  cada ausência tua eu vou chorar
Mas cada volta tua há de apagar
O que esta ausência tua me causou

Eu sei que vou sofrer
A eterna desventura de viver
A espera de viver ao lado teu
Por toda a minha vida.

Eu sei que vou sofrer
A eterna desventura de viver
A espera de viver ao lado teu
Por toda a minha vida.
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José Feldman (Reescrevendo o Mundo: Vozes Femininas e a Construção de Novas Narrativas) – Introdução


Prefácio
por Cailin Dragomir (Timisoara/Romênia, 1949)

A literatura tem sido, ao longo dos séculos, um espelho da sociedade, refletindo suas nuances, tensões e transformações. No entanto, por muito tempo, as vozes femininas foram silenciadas ou relegadas a papéis secundários. "Reescrevendo o Mundo: Vozes Femininas e a Construção de Novas Narrativas" propõe uma jornada pelas páginas da literatura, explorando como as mulheres têm desafiado e reconfigurado narrativas, trazendo à tona suas experiências, lutas e conquistas.

Desde os primórdios da literatura, figuras como Christine de Pizan, no século XIV, já se destacavam ao questionar o lugar da mulher na sociedade e na escrita. Sua obra "A Cidade das Damas" não apenas defendeu a capacidade intelectual das mulheres, mas também lançou as bases para um movimento que reverberaria por séculos. Avançando no tempo, o século XIX trouxe autoras como Jane Austen e Emily Brontë, que exploraram a condição feminina com uma profundidade que ainda ressoa hoje. Elas desafiaram as normas sociais, utilizando a ficção como uma ferramenta de crítica e empoderamento.

O século XX foi marcado por uma explosão de vozes femininas que, através de suas histórias, começaram a desconstruir o patriarcado e a reivindicar espaço no cânone literário. Autoras como Virginia Woolf e Simone de Beauvoir não apenas escreveram sobre a experiência feminina, mas também questionaram as estruturas que limitavam essa experiência. Woolf, em "Um Teto Todo Seu", argumentou sobre a necessidade de espaço e liberdade para que as mulheres escrevessem, enquanto Beauvoir, em "O Segundo Sexo", desafiou as normas que definem o que significa ser mulher.

Hoje, vivemos um momento em que a escrita feminina se tornou uma força poderosa e transformadora. Autoras contemporâneas como Chimamanda Ngozi Adichie, Elena Ferrante e Margaret Atwood não apenas expandem as narrativas femininas, mas também abordam questões de identidade, raça, classe e sexualidade, revelando a complexidade das experiências femininas. Elas estão reescrevendo o mundo, criando novas narrativas que refletem a diversidade e a riqueza da vida das mulheres.

Este livro é uma celebração dessa evolução. Cada capítulo explorará não apenas a obra de escritoras icônicas, mas também as vozes emergentes que estão redefinindo a literatura. Discutiremos como essas narrativas não apenas empoderam as mulheres, mas também provocam mudanças sociais, oferecendo novas perspectivas sobre o que significa ser mulher em um mundo em constante transformação.

Ao longo das páginas que se seguem, convidamos você a refletir sobre a importância da escrita feminina como um ato de resistência e criação. As histórias contadas por mulheres são essenciais para a construção de uma nova visão de mundo, uma onde suas vozes não apenas são ouvidas, mas celebradas. Juntas, essas narrativas formam um mosaico poderoso que nos permite imaginar e construir um futuro mais inclusivo e igualitário.

Em seu conteúdo, as escritoras não são apenas personagens em suas próprias histórias; elas são arquitetas de novas realidades, reescrevendo o mundo à sua maneira. Que suas palavras inspirem, provoquem e, acima de tudo, empoderem.


1. INTRODUÇÃO

A escrita feminina desempenha um papel crucial na desconstrução social, atuando como uma força transformadora em várias dimensões:

1.1. Visibilidade e Representação
A escrita feminina traz à tona histórias e experiências que, muitas vezes, foram marginalizadas ou ignoradas. Ao dar voz a mulheres de diferentes origens, etnias e classes sociais, a literatura feminina desafia a narrativa hegemônica e busca uma representação mais justa e diversificada da sociedade. Essa visibilidade é fundamental para que as experiências femininas sejam reconhecidas e validadas.

1.2. Desafio às Normas de Gênero
Autoras como Virginia Woolf e Simone de Beauvoir questionaram normas de gênero e papéis tradicionais atribuídos às mulheres. Suas obras não só expuseram a opressão que as mulheres enfrentavam, mas também propuseram novas formas de pensar sobre identidade e feminilidade. Essa desconstrução ajuda a criar um espaço onde as mulheres podem se libertar das expectativas sociais restritivas.

1.3. Crítica Social
A literatura feminina frequentemente serve como uma ferramenta de crítica social. Autoras como Chimamanda Ngozi Adichie e Angela Davis abordam temas como racismo, sexismo e desigualdade econômica, desafiando as estruturas de poder estabelecidas. Ao expor injustiças sociais, a escrita feminina estimula a reflexão e o debate sobre questões fundamentais da sociedade.

1.4. Empoderamento e Autonomia
A escrita é um meio de empoderamento. Ao escrever, as mulheres não apenas reivindicam seu espaço, mas também afirmam sua autonomia. Através da literatura, elas podem explorar suas próprias histórias, desejos e lutas, ajudando a construir uma identidade mais forte e autêntica. Esse empoderamento é vital para a construção de uma sociedade mais igualitária.

1.5. Solidariedade e Comunidade
A escrita feminina também promove a solidariedade entre mulheres. Autoras frequentemente compartilham experiências comuns, criando um senso de comunidade e apoio. Essa conexão ajuda a fortalecer movimentos sociais e a lutar por mudanças coletivas, mostrando que a luta pela igualdade é um esforço compartilhado.

1.6. Reimaginando o Futuro
As narrativas femininas não se limitam a descrever o presente ou o passado; elas também imaginam futuros alternativos. Autoras de ficção especulativa, como Margaret Atwood, exploram cenários que questionam as normas sociais e políticas, oferecendo visões de um mundo mais justo. Essas histórias inspiram a reflexão sobre o que é possível e encorajam a ação em direção a mudanças sociais.

1.7. Educação e Conscientização
A literatura feminina é uma ferramenta poderosa para a educação. Ao abordar questões como violência de gênero, sexualidade e direitos humanos, as obras escritas por mulheres ajudam a conscientizar leitores sobre problemas sociais. Essa conscientização é o primeiro passo para a mudança, pois promove o entendimento e a empatia.


A importância da escrita feminina na desconstrução social reside em sua capacidade de desafiar normas, promover a diversidade e fomentar a transformação. Ao dar voz às experiências das mulheres, a literatura não apenas enriquece o panorama cultural, mas também contribui para a construção de uma sociedade mais equitativa e inclusiva. Através da escrita, as mulheres continuam a moldar narrativas que ressoam profundamente, provocando reflexão e ação em prol de um futuro melhor.
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JOSÉ FELDMAN, poeta, trovador, escritor, professor e gestor cultural. Formado em técnico de patologia clínica trabalhou por mais de uma década no Hospital das Clínicas de São Paulo. Foi enxadrista, professor, diretor, juiz e organizador de torneios de xadrez a nível nacional durante 24 anos; como diretor cultural organizou apresentações musicais e oficina de trovas. Morou 40 anos na capital de São Paulo, onde nasceu, ao casar-se mudou para Curitiba/PR, radicando-se em Maringá/PR, cidade onde sua esposa é professora da UEM. Consultor educacional junto a alunos e professores do Paraná e São Paulo. Pertence a Confraria Brasileira de Letras, Confraria Luso-Brasileira de Trovadores, etc. Possui os blogs Singrando Horizontes desde 2007, Voo da Gralha Azul (com trovas do mundo). Assina seus escritos por Floresta/PR. Dezenas de premiações em crônicas, contos, poesias e trovas no Brasil e exterior.
Publicações: 
Publicados: “Labirintos da vida” (crônicas e contos); “Peripécias de um Jornalista de Fofocas & outros contos” (humor); “35 trovadores em Preto & Branco” (análises); “Canteiro de trovas”.
Em andamento: “Pérgola de textos”, "Chafariz de Trovas", “Caleidoscópio da Vida” (textos sobre trovas), “Asas da poesia”, "Reescrevendo o mundo: Vozes femininas e a construção de novas narrativas".

Fontes:
José Feldman. Reescrevendo o Mundo: Vozes Femininas e a Construção de Novas Narrativas. Floresta/PR: Plat. Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul.
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing

Aparecido Raimundo de Souza (Foi assim, inexplicavelmente incrível)


O MEU DIA nasceu cedo e com promessas. As seis e meia da manhã, ao abrir a janela do meu quarto, me deparei com um céu, tremendamente azul como esperança recém-pintada. Tudo parecia conspirar a favor. Mas foi então que ela se ergueu. Uma nuvem escura, densa, sem pedir licença. Não veio aos poucos, não se esgueirou pelas bordas do horizonte. Ela simplesmente se levantou inteira, se alçou como quem já sabia que seria protagonista. 

E eu, que só queria pular da cama, preparar um desjejum tranquilo e em seguida desfrutar de um pouco de paz antes de começar a escrever meu texto, vi meu dia que prometia ser maravilhoso se curvar diante dela. A luz que eu havia acendido, mudou de tom, a música vinda do radinho de cabeceira se calou em chiados esquisitos e espaçosos.

A alegria que antes dançava leve, se recolheu num canto, tímida. Não era tempestade, mas silêncio. Desses que no meu entender pesam mais que o ribombar de um trovão enfurecido A nuvem não anunciou chuva. Apenas ficou. E às vezes, é isso que mais machuca o que permanece assim do nada, sem explicação. Meu Deus, o que está acontecendo? Era um dia bonito, desses que parecem prometer redenção. Sem falar na magia do céu. 

Entretanto, por algum motivo, a beleza que dele emanava, não impediu que a nuvem se distendesse — e se fizesse pesada, escura, cheia de lembranças que não cabiam mais no meu presente. Com ela, de braços dados, a solidão. Também essa criatura não alardeou estrondo. Veio vindo e se instalou como quem já conhecia a casa: e, de fato, conhecia. Se recostou numa mesinha de canto ao lado da minha cama e no minuto seguinte se levantou indo até meu guarda-roupas.  

Mexeu nas gavetas da memória, acendeu a luz de outros cômodos, inclusive aqueles dos meus escondidos que eu tentava manter apagados. Para destruir, de vez, meu dia, a tristeza veio logo no encalço. Sem pedir licença, se abancou ao meu lado trazendo o fracasso como companhia. E eu, que só queria me levantar, tomar meu dejejum e ir para o escritório no começo do corredor e escrever meu texto, me vi parado, olhando para o nada com olhos cheios de tudo. 

A melancolia, como ensinava Santo Agostinho “credo quia absurdum(Creio porque é absurdo) tem um jeito estranho de se fazer presente. E a gente só acredita numa coisa, quando não consegue explicar, até porque essa coisa não aperta, mas também não solta. Porém, me fez lembrar dos rostos que não vejo mais, das vozes que o tempo calou, dos abraços que ficaram no passado. A saudade é cruel: ela não mata, mas também não deixa a gente viver direito.

As minhas “pessoas queridas” e apartadas do meu convívio, não são apenas ausência. São presenças em forma de falta. São os lugares onde o quieto fala mais alto. São os aniversários que não têm mais sentido, os finais de semana que perderam o cheiro e o gosto do desjejum, do almoço e do café e claro, das conversas nascidas para serem jogadas fora. E assim eu sigo, com a nuvem ainda pairando, esperando que no minuto seguinte ela se dissolva. Ou que eu aprenda a caminhar sob ela, sem perder a beleza de olhar para o céu. 

Ela se engrandeceu sem aviso, sem dizer a que veio, como quem já sabia que o meu dia bonito não duraria. A nuvem escura não pintou no meu pedaço com trovões e relâmpagos, mas com lembranças. E essas, sim, fazem um estardalhaço que chega a ser ensurdecedor.

Nesses lances rápidos, lembro de mamãe. Recordo do cheiro do bolo no forno, do jeito como ela sabia quando eu estava triste, mesmo sem dizer uma palavra. Mamãe partiu cedo demais, como quem sai de cena antes dos aplausos derradeiros. E desde então, o mundo parece menos acolhedor. A minha casa, quase de esquina, continua de pé, mas não tem mais aquele gosto, ou melhor dito, não tem mais aquele cheiro forte e peculiar de lar. 

Meus filhos cresceram, casaram, descasaram e seguiram. E eu fiquei aqui, tentando entender em que ponto da estrada nos desencontramos. Meus rebentos vivem as suas vidas, e eu, apesar dessas lacunas, os adoro e os amo em silêncio, mesmo não ligando (aliás, nunca ligaram), e esquecem que também sinto falta. Isso, bem sei, não é abandono, é distância. Não importa. Dói aqui dentro, esse incômodo, como se fosse algo mais tenebroso. A saudade dos que partiram cedo demais (mamãe Ana e meu pai Roberto), são feridas abertas que não se enrugam, nem se encarquilham.

As atimias* consternadas dos filhos e filhas que não trazem os netos, também contribuem para a solidão se tornar maior. A gente, entretanto, aprende a conviver com “esses vácuos, com essas ausências”, como quem se limita e se acostuma a andar com pedras nos sapatos. Às vezes, elas apertam mais. Em outras, parecem ter sumido. Mas basta uma voz no quintal do vizinho, uma música alta vinda do bar do seu Arthur, ou uma foto achada ao acaso — e lá estão elas, inteiras de novo massacrando o sossego dos calinhos e os joanetes de estimação. 

A nuvem escura continua ali, firme e forte. Não sei se vai embora. Talvez essa agourenta tenha vindo para ficar. E oxalá, com o tempo, (ainda que a poder de pauladas nos costados), eu aprenda a olhar para ela com menos medo. No fundo, no fundo, ela só existe porque houve amor. E isso, nem o tempo apaga. Coisa de uma semana, lembrei do cheiro das roupas lavadas que minhas filhas Amanda e Luana espalhavam pela casa.

O varal era quase um altar — ali pendurava não só fraldas, vestidinhos e calças plásticas, mas também o cuidado, o zelo, o amor incondicional da Marlucia que não precisava de palavras. Quando elas sorriam, por algum motivo bobo e corriqueiro, até os dias nublados pareciam menos pesados. A casa de repente ficou grande demais. O relógio do corredor que acessa a cozinha, continua marcando as horas, mas parece que o tempo estancou junto com os ponteiros enferrujados. 

O som da chaleira fervendo ainda ecoa, mas não há mais as mãos carinhosas e meigas para servir o café. E o sofá da sala, diante da tevê preto e branco, antes tão disputado, agora é só um lugar onde o vazio se senta. Ainda aqui pela casa, alguns brinquedos estão guardados, a bem da verdade, como relíquias de um tempo em que a casa se fazia cheia de risos e correrias. Hoje, Narjara, Eduardo, Amanda e Luana vivem as suas vidas, e eu os vejo de longe, como quem observa um trem que já partiu.

Às vezes, me pergunto se lembram do cheiro do bolo, das histórias antes de dormir, dos banhos, dos abraços apertados. O celular toca menos. E quando se faz presente, é rápido, urgente, quase protocolar. E não são meus filhos. A saudade não tem espaço nas agendas deles. Mas eu, firme, forte e incansável, continuo esperando, aguardando como quem espera por um “oi, pai,” ou um “oi, vô,” que talvez nunca cheguem. Olho-me no espelho do banheiro, quando vou fazer a barba e vejo alguém que carrega muitas histórias, mas poucas testemunhas. 

A minha juventude foi embora, se mandou de mala e cuia com os verões, e o rosto agora guarda marcas que ninguém mais pergunta como surgiram. O dia do enterro de mamãe Ana foi ensolarado, como se o céu quisesse contrariar a dor. As flores se faziam bonitas demais para aquele momento. E mesmo cercado de gente, foi ali, foi exatamente ali, que a solidão se instalou de vez dentro de meu ser.

No dilatado do dia, o céu se moldou, se enfeitou como se zombasse da minha agonia. As flores que chegaram se fizeram bonitas demais para aquele momento. E mesmo cercado de gente, foi ali, bem ali que a solidão supliciante efetivamente se instalou de vez, como uma pena severa a ser levada à cabo. O telefone, repito, toca menos. E quando dá sinais de vida, é rápido, urgente, quase sem alma. A prostração dos que partiram cedo demais é uma ferida constante que não sangra, mas que também não cicatriza. 

A gente aprende a conviver com ela, e a aceitar, como escreveu Nélida Piñon em seu livro “O Calor das coisas”, “nós aprendemos a respirar com metade dos pulmões.” E então, hoje, logo pela manhã, a nuvem se ergueu de novo. Contudo, algo nela estava meio que diferente. Intrigado, abri a porta da sala e saí para a varanda. A rua estava vazia. O céu, seguia escuro. No chão, meu Pai Santíssimo, no chão quase embaixo do portão, um envelope. Dentro, uma tirinha de papel. Na verdade, um bilhete. Letras amareladas, tremidas. Peguei-o pressuroso e li. Dizia apenas:

"Mamãe está aqui. Mas não como você se lembra de mim."    
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* Atimia – Ausência de manifestações afetivas.
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Aparecido Raimundo de Souza, natural de Andirá/PR, 1953. Em Osasco, foi responsável, de 1973 a 1981, pela coluna Social no jornal “Municípios em Marcha” (hoje “Diário de Osasco”). Neste jornal, além de sua coluna social, escrevia também crônicas, embora seu foco fosse viver e trazer à público as efervescências apenas em prol da sociedade local. Aos vinte anos, ingressou na Faculdade de Direito de Itu, formando-se bacharel em direito. Após este curso, matriculou-se na Faculdade da Fundação Cásper Líbero, diplomando-se em jornalismo. Colaborou como cronista, para diversos jornais do Rio de Janeiro e Minas Gerais, como A Gazeta do Rio de Janeiro, A Tribuna de Vitória e Jornal A Gazeta, entre outras.  Hoje, é free lancer da Revista ”QUEM” (da Rede Globo de Televisão), onde se dedica a publicar diariamente fofocas.  Escreve crônicas sobre os mais diversos temas as quintas-feiras para o jornal “O Dia, no Rio de Janeiro.” Acadêmico da Confraria Brasileira de Letras. Reside atualmente em Vila Velha/ES.

Fonte:
Texto enviado pelo autor. 
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing  

sábado, 13 de setembro de 2025

Asas da Poesia * 92 *


Poema de
LAIRTON TROVÃO DE ANDRADE
Pinhalão/ PR

O Rouxinol
"Nosso leito é um leito verdejante."
(Ct. 1.16)

Fica comigo nesta noite, amor!
A voz do rouxinol quisera ter!
Desejo ser teu único cantor,
Pra te afagar até no amanhecer!

Quem dera, ouvisses belas melodias,
Que só um rouxinol sabe cantar!
Na rede de carinho cairias
Pra que o amor te fosse balançar!

Esquece, agora, as noites enfadonhas,
Que passaste chorando abandonada!
É hora de viver tudo o que sonhas,
Sentindo-te do mundo a mais amada.

Que bom, se ouvisses líricas poesias
Na voz suave de um trovador!
No leito de ternura estremecias,
Gozando dos embalos deste amor.

Não terias cruentos dissabores,
Que te amarguram tanto o coração;
Bem longe do demônio dos horrores,
Serias bem feliz, minha paixão!

Oh, noite escura! - Noite sem luar!
Verei a luz brilhar na escuridão;
Teus olhos vão meus olhos namorar,
E vou encher de amor teu coração.

Fica comigo nesta noite, ó flor!
A voz do rouxinol quisera ter!
Nesta noite terias muito amor!
- Que bom se não houvesse o amanhecer!…
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Soneto de 
AMILTON MACIEL MONTEIRO
São José dos Campos/SP

Saudade

Saudade é o amor que fica e nos conforta
depois que a gente perde, com pesar,
o nosso ser amado e não suporta
a ausência triste que nos quer matar!

E para mim é a luz que entra na porta
e não permite o escuro me cegar;
mas se o amargor me vem, é ela que o exorta,
e põe consolo amigo em seu lugar!

Assim, acho até bom sentir saudade
e a deixo me envolver bem à vontade,
só para amenizar alguma dor...

Pois o seu gosto é meio adocicado
e nunca me deixou nem agitado...
Saudade para mim é afim do amor!
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Gabinete de
OTACÍLIO BATISTA
São José do Egito/PE (1923 – 2003)

     O povo deseja ouvir
     Um Gabinete bonito;
     Poeta, só acredito
     Se você não me mentir.
     Trate de se prevenir
     Para poder cantar bem
     Eu comprei um cartão
     Para viajar no trem:
     Sem cartão ninguém vai,
     Sem cartão ninguém vem!
     Vai e vem, vem e vai,
     Vem e vai, vai e vem.
     Quem não tem o que eu tenho,
     Morre danado e não tem!
     Quem estiver com inveja,
     Se esforce e faça também ...
     Cavalo bom é ginete;
     Quem não canta Gabinete,
     Não é cantor pra ninguém!
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Aldravia de
MARÍLIA SIQUEIRA LACERDA
Ipatinga/MG

chuva
cai
música
embala
sono
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Soneto de
JOSÉ XAVIER BORGES JUNIOR
São Paulo/SP

Divina peça

És todas as lembranças de alegrias,
És todos os sorrisos que sorri,
És todos os ocasos dos meus dias,
És todos os carinhos que acolhi.

És todo esse mistério que vivi,
És luz, escuridão, és harmonias,
És fel que pela vida assim sorvi,
Buquê das minhas taças tão vazias...

És doce salvação que me condena,
A aurora que precede o triste ocaso,
Perdão que hoje me obriga a cumprir pena,

Botão que não vingou neste meu vaso,
O pano que desceu na última cena,
Da peça que encenamos ao acaso…
= = = = = = 

Poema de 
CECÍLIA MEIRELES
Rio de Janeiro/RJ, 1901 – 1964

Mar em redor

Meus ouvidos estão como as conchas sonoras:
música perdida no meu pensamento,
na espuma da vida, na areia das horas...

Esqueceste a sombra no vento.
Por isso, ficaste e partiste,
e há finos deltas de felicidade
abrindo os braços num oceano triste.

Soltei meus anéis nos aléns da saudade.
Entre algas e peixes vou flutuando a noite inteira.
Almas de todos os afogados
chamam para diversos lados
esta singular companheira.
= = = = = =

Quadra Popular

Eu quero bem, mas não digo
a quem é que quero bem;             
quero que saibam que eu quero,  
mas que não saibam a quem!
= = = = = = 

Hino de 
CARAUARI/ AM

Carauari, és brasileira
terra de minhas razões
que teus filhos altaneiros
sejam sempre soberanos
no progresso e na união.

O teu sacado sereno
caprichos do rio Juruá
criação da natureza
em momentos singular.

No verão, tuas vazantes,
que se mostram prazenteiras,
desafiam tuas barrancas
com promessas alvissareiras.

Carauari, rio Juruá,
terra boa para se cantar
a nossa voz no meio da floresta,
em nossa volta a natureza em festa.

Carauari, no Amazonas,
és beco de tradições,
para tantos que te amam,
nordestinos os teus filhos,
tem raízes no teu chão.

Batata vinda do céu,
teu nativo te chamou,
com sua sabedoria
o teu solo abençoou.
Carauari, és brasileira,
terra de minhas razões,
que teus filhos altaneiros
sejam sempre soberanos
no progresso e na união.

O teu sacado sereno,
caprichos do rio Juruá,
criação da natureza
em momentos singular.

No verão tuas vazantes,
que se mostram prazenteiras,
desafiam tuas barrancas
com promessas alvissareiras.

Carauari, rio Juruá,
terra boa para se cantar,
a nossa voz no meio da floresta,
em nossa volta a natureza em festa.

Carauari, no Amazonas,
és beco de tradições,
para tantos que te amam,
nordestinos os teus filhos,
tem raízes no teu chão.

Batata vinda do céu,
teu nativo te chamou,
com sua sabedoria
o teu solo abençoou.

Enquanto tuas terras firmes
envolvem na vastidão
vestígios de ouro negro,
o tesouro desta nação (2x)
= = = = = =

Soneto de 
ALPHONSUS DE GUIMARAENS FILHO
Ouro Preto/MG, 1870 – 1921, Mariana/MG

Soneto da morte

Entre pilares podres e pilastras
fendidas, te revi subitamente;
eras a mesma sombra em que te alastras,
feita carícias de uma face ausente.

Eras, e me afligias. Tormentosa,
vi-te crescer nos muros desabados.
Cruel, cruel; contudo, mais saudosa,
mais sensível que os céus e os descampados.

Bolor, pátina espessa, calmaria,
vi-te a sofrer no fundo da cidade
como um grande soluço percutindo

sobre os olhos, as mãos e a boca fria.
E de repente um grito de saudade.
Depois a chuva, sem cessar, caindo.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  =

Recordando Velhas Canções
NINGUÉM CHORA POR MIM 
(bolero, 1961) 

Mas se um dia eu tiver que chorar 
Ninguém chora por mim 

Hoje a notícia correu 
Vieram logo me dizer 
Mas a verdade é que eu 
Já estava farto de saber. 

Um comentário é fatal 
A um grande amor que chega ao fim 
E quem sou eu afinal 
Para mudar coisas assim. 

Os meus problemas são meus 
Deixem comigo a solução 
Os meus fracassos a Deus 
É que eu revelo quantos são. 

Um conselho é tão fácil de dar 
Qualquer um cita exemplos no fim 
Mas se um dia eu tiver que chorar 
Ninguém chora por mim.
= = = = = = = = = = = = =

O Romance Policial no Brasil

HISTÓRICO

O romance policial no Brasil tem uma trajetória rica e diversificada, refletindo as transformações sociais, culturais e políticas do país. 

Surge no século XIX, fortemente influenciado pela literatura europeia, especialmente os clássicos de Edgar Allan Poe e Arthur Conan Doyle. Embora as bases do gênero já estivessem se formando, o primeiro romance policial brasileiro amplamente reconhecido é "O Mistério do Crime de São Paulo" (1887) de Joaquim de Almeida e Silva. No entanto, muitos estudiosos citam o impacto das obras de Machado de Assis, que, embora não sejam romances policiais no sentido estrito, exploram temas de mistério e crime em obras como "Memórias Póstumas de Brás Cubas".

O gênero começa a ganhar forma e popularidade nas primeiras décadas do século XX. Autores como Mário de Andrade e, posteriormente, Agatha Christie começam a influenciar a escrita de romances policiais. Em 1924, publica-se "O Caso Morel" do escritor argentino Adolfo Bioy Casares, que combina elementos de ficção científica e mistério, mostrando a versatilidade do gênero.

Na década de 1940, vários autores começam a se destacar no Brasil. Um dos pioneiros é Rubem Fonseca, que traz uma abordagem urbana e contemporânea ao gênero, refletindo a violência e a complexidade social do Brasil. Seus contos e romances, como "Feliz Ano Novo", são marcos dessa nova fase do romance policial.

Durante as décadas de 1970 e 1980, o romance policial brasileiro começa a ter uma voz mais forte e crítica. O crime e a corrupção se tornam temas recorrentes, refletindo a realidade política do período da ditadura militar. Autores como João Gilberto Noll e os influenciados pela Escola de Escritores de São Paulo incorporam elementos do gênero noir, apresentando personagens complexos e tramas sombrias. 

Neste período, as publicações começaram a se diversificar, e surgiram editoras dedicadas ao gênero, que possibilitaram a publicação de novas vozes e narrativas.

Nos anos 1990 e 2000, o gênero passa a conquistar um público cada vez maior. Autores como Luiz Ruffato, com "Estação das Chuvas", e os romances de policial de contador de histórias como a série "O Sétimo" de Lúcia Hiratsuka, vão ganhando espaço nas prateleiras.

O best-seller "O Silêncio dos Inocentes", que foi adaptado para o cinema e se tornou fenômeno mundial, também influenciou o mercado brasileiro, fazendo com que mais autores tentassem explorar essa narrativa cheia de suspense e reviravoltas.

Na contemporaneidade, o gênero policial brasileiro é extremamente prolífico e diverso. Autores como Patrícia Melo, com suas tramas policiais que exploram a marginalidade da sociedade, e Raphael Montes, que traz uma abordagem mais psicológica e perturbadora, têm atraído a atenção tanto de críticos quanto de leitores.

Além disso, a literatura policial brasileira começa a se expandir para outras mídias, como séries de televisão e filmes, aumentando sua visibilidade e popularidade.

Em suma, o romance policial no Brasil evoluiu de influências estrangeiras para uma identidade própria, refletindo as complexidades da sociedade brasileira. Através de suas histórias, os autores abordam questões sociais, dilemas morais e as nuances do comportamento humano, consolidando o gênero como uma das expressões literárias mais vibrantes do país.

ELEMENTOS DO ROMANCE POLICIAL

O romance policial é um gênero literário caracterizado por uma série de elementos que, quando combinados, criam tramas intrigantes e envolventes. Abaixo estão os principais elementos que compõem um romance policial:

1. Crime

O crime é o núcleo central da narrativa policial. Geralmente, envolve um ato ilícito, como um assassinato, um roubo ou um sequestro. O crime serve como ponto de partida para a investigação, e o autor deve apresentar os detalhes de como e por que o crime ocorreu.

2. Detetive ou Investigador

O protagonista muitas vezes é um detetive, seja profissional (como um policial, investigador particular) ou amador. Esse personagem é encarregado de resolver o crime e geralmente possui habilidades de percepção e raciocínio lógico aprimoradas. O detetive é fundamental para a condução da história, guiando o leitor através da investigação.

3. Suspeitos

Os romances policiais tipicamente apresentam uma lista de suspeitos - indivíduos que podem ter motivos e oportunidades para cometer o crime. Cada suspeito traz suas próprias características, motivos e segredos, que o detetive (e o leitor) deve desvendar ao longo da narrativa.

4. Pistas e Indícios

As pistas são os elementos que podem levar à solução do crime. Elas podem ser físicas (como objetos deixados na cena do crime), testemunhos ou comportamentos suspeitos. O autor deve distribuir as pistas de maneira estratégica, permitindo que o leitor também tente solucionar o mistério ao lado do detetive.

5. Investigação

A investigação é o processo pelo qual o detetive coleta informações, interroga suspeitos e analisa evidências. Esse elemento é central ao enredo e envolve muitas reviravoltas e revelações. O desenvolvimento da investigação deve ser claro e intrigante, conduzindo o leitor através de uma série de descobertas e deduções.

6. Revelação ou Clímax

Ao longo do romance, as tensões aumentam em direção a um clímax, onde o detetive apresenta suas descobertas. Essa revelação crucial geralmente oferece a solução do crime e pode incluir uma reviravolta surpreendente que desafia as expectativas do leitor.

7. Motivo e Contexto

O motivo é a razão pela qual o crime foi cometido. Pode envolver questões como vingança, ganância ou ciúme. O contexto social, cultural e psicológico também desempenha um papel importante, proporcionando profundidade à história e explicando por que os personagens agem da maneira que fazem.

8. Ambiente

O ambiente onde a história se desenrola pode influenciar a trama e os personagens. Pode ser uma cidade grande, uma área rural, ou um espaço fechado, como uma casa ou barco. O cenário pode ser utilizado para criar uma atmosfera de mistério e suspense.

9. Narrador

O ponto de vista do narrador é crucial na narrativa policial. Pode ser em primeira pessoa, do ponto de vista do detetive ou de um personagem interessado, ou em terceira pessoa, oferecendo uma visão mais ampla sobre a trama. A escolha do narrador pode impactar a carga emocional e as revelações da história.

10. Finalização

O desfecho do romance policial geralmente resolve as questões levantadas ao longo da narrativa. Uma conclusão satisfatória revela a verdade sobre o crime e fornece um encerramento para a história dos personagens, embora algumas obras possam deixar espaço para interpretações ou reflexões mais profundas.

Considerações finais

Esses elementos trabalham em conjunto para criar uma narrativa envolvente, que mantém os leitores intrigados e ansiosos para descobrir a resolução do mistério. O sucesso de um romance policial muitas vezes depende não apenas de um enredo bem construído, mas também da habilidade do autor em manipular os elementos mencionados para surpreender e prender a atenção do leitor.

Bibliografia:
– Abreu, Augusto de. “O Romance Policial Brasileiro: Uma Análise de sua Evolução”. *Revista Brasileira de Literatura Comparada, n° 12, 2010.
– Bakewell, Joan. Edgar Allan Poe: A Biografia. Editora Rocco, 2006 (sobre a influência de Poe no gênero).
– Eagleton, Terry. A História da Literatura. Editora Oxford, 2013. 
– Pereira, Roberta. “Outras Vozes no Crime: A Literatura Policial Contemporânea no Brasil”. Cadernos de Literatura Comparada, v. 4, p. 112-127, 2014.
– Rowland, Barbara. The Detective's Companion: A Guide to the Mystery Genre. Blackstone Publishing, 2003.
– Wagner, Luiz Rufatto. O Libre.to: Ensaios sobre a Literatura Policial. Editora Saã Paulina, 2016.

Fontes:
José Feldman. Literatura tintim por tintim. Floresta/PR. Bibl. Voo da Gralha Azul. 
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing